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A crise humanitária e de direitos humanos na Venezuela acontece após anos de desmantelamento de instituições democráticas. © 2018 Cesar Muñoz / Human Rights Watch

“Gabriela” é uma menina venezuelana de 10 anos que, com paralisia da cintura para baixo, usa uma cadeira de rodas. Dois anos atrás, precisou interromper suas idas ao hospital porque sua família não podia arcar com os custos da viagem.

Naquele momento, o hospital também não forneceria mais as sondas urinárias que precisava. Há meses sua família vinha reutilizando sondas descartáveis, lavando-as com vinagre, o que resultou infecção nos rins e exigiu medicação diária.

Quando seus pais não conseguiram mais obter medicamentos, Gabriela começou a ter febre e pés inchados, deixando-os sem opção que não fugir da Venezuela em busca de tratamento.

Neste cenário, é pavoroso que o recém eleito governador de Roraima, Antonio Denarium, proponha fechar a fronteira e estabelecer um programa para “devolver” os venezuelanos.

Os pais de Gabriela vieram ao Brasil com seus cinco filhos, fazendo a pé parte do percurso de 215km entre Pacaraima e Boa Vista. Pelo menos uma das crianças veio sentada no colo de Gabriela, na cadeira de rodas, que o pai empurrava. Em Boa Vista, moraram nas ruas, alimentando-se com comida do lixo, como muitos venezuelanos.

A família de Gabriela está entre os três milhões de venezuelanos que fugiram do país pela falta de remédios e alimentos, repressão política, hiperinflação e insegurança. Seu desespero reforça como o sistema de saúde colapsou no país. Gabriela precisava de cuidados especializados, mas mesmo serviços básicos, como vacinas e tratamento de doenças infecciosas, estão indisponíveis.

Os surtos de sarampo e difteria estão aumentando na Venezuela, e os casos de malária e tuberculose atingiram os números mais elevados em 30 anos. 87% das pessoas vivendo com HIV não estão recebendo o tratamento para o qual estão cadastradas, e o aumento da desnutrição agrava a crise de saúde. Gabriela teve sorte e veio ao Brasil, onde tem recebido cuidado, mas e os que estão doentes demais pra viajar?

A crise humanitária e de direitos humanos na Venezuela acontece após anos de desmantelamento de instituições democráticas, incluindo a independência judicial, que remonta à presidência de Chávez. Desde que assumiu o poder em 2013, Maduro intensificou a forte concentração de poder, usando-a para cometer todo tipo de abuso.

O presidente eleito Jair Bolsonaro acerta quando diz que os venezuelanos não são “mercadorias”, a serem simplesmente “devolvidas”. Propôs a criação de "campos de refugiados" para venezuelanos no Brasil, sem dar maiores detalhes. O que ele deve saber é que a melhor resposta não deve ser isolá-los e sim fortalecer programas para integração dos venezuelanos na sociedade, em Roraima e outros estados. Esses programas devem permitir igual tratamento a pessoas com deficiência, como Gabriela.

O Brasil, apesar de muitos desafios, fez esforços consideráveis ​​para receber os venezuelanos, não apenas com abrigo, alimentos e assistência médica, mas também adotando regras para conceder residência e permitindo refúgio.

Como presidente, Bolsonaro deve manter essas políticas e ao mesmo tempo trabalhar com outros países e agências da ONU para elaborar um plano de resposta regional. A comunidade internacional deve redobrar a pressão sobre a Venezuela para que reconheça a gravidade da crise e aceite a ajuda internacional necessária para que crianças como Gabriela não enfrentem a escolha entre deixar o país ou morrer.

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