(Bruxelas) – A União Europeia e seus Estados membros devem fazer tudo ao seu alcance para garantir passagem segura e tratamento justo para todos os civis que fogem da Ucrânia, disse hoje a Human Rights Watch. Os ministros da Justiça e dos Assuntos Internos que estarão reunidos de 3 a 4 de março de 2022 deveriam endossar um plano de ação abrangente que inclua medidas para garantir acesso ao território, proteção e apoio a todos que fogem da guerra.
“Temos visto uma demonstração rápida e encorajadora de solidariedade com os ucranianos e aplaudimos a prontidão da UE em facilitar o acesso a proteção aos refugiados ucranianos por meio da Diretiva de Proteção Temporária da UE”, disse Judith Sunderland, diretora associada da Europa e Ásia Central da Human Rights Watch. “É de vital importância que todos os estados e instituições da UE trabalhem para ajudar a todos, incluindo os não ucranianos, a alcançarem a segurança e obter os cuidados, a proteção e a assistência necessárias.”
Centenas de milhares de pessoas fugiram de suas casas na Ucrânia desde que a invasão russa em larga escala começou em 24 de fevereiro. De acordo com o Alto Comissariado para os Refugiados da ONU (ACNUR), em 28 de fevereiro, mais de 500 mil pessoas tinham deixado o país para países vizinhos e 100 mil foram deslocados dentro da Ucrânia. O ACNUR pediu a todos os países receptores que recebam a todos que fogem do conflito e da insegurança na Ucrânia “independentemente de nacionalidade e raça”.
A Human Rights Watch e outros têm documentado graves violações das leis de guerra pelas forças russas, incluindo o uso de munições cluster que atingiram um hospital e uma pré-escola. De acordo com as Nações Unidas, o número de civis atingidos nos primeiros quatro dias do conflito são de 406, sendo 102 mortes.
Os países da UE vizinhos à Ucrânia – Polônia, Hungria, Eslováquia e Romênia – não deveriam ser os únicos a assumirem a responsabilidade sobre os refugiados da Ucrânia. Acordos deveriam ser feitos para assegurar uma partilha equitativa de responsabilidades por todos os Estados membros, inclusive por meio de um plano de realocação eficiente e justo que leve em consideração os laços familiares e, na medida do possível, as preferências individuais.
É de vital importância que todos os países vizinhos da Ucrânia permitam a entrada de qualquer pessoa com a menor burocracia possível. Aqueles com amigos ou familiares com quem possam ficar devem ser autorizados a prosseguir para esses destinos, e os indivíduos e famílias que necessitem de alojamento devem ter acesso a uma habitação digna e adequada. Serviços essenciais, como cuidados de saúde, incluindo cuidados de saúde mental, e serviços de apoio para crianças devem ser disponibilizados, e elas devem ter a possibilidade de retomar sua educação o mais rápido possível.
Essas condições devem se aplicar igualmente a ucranianos e não-ucranianos que fogem do conflito, disse a Human Rights Watch. As instituições e os estados membros da UE devem esclarecer às autoridades ucranianas que aceitarão todos os civis que saírem da Ucrânia, sem distinção, e trabalhar ativamente com as autoridades ucranianas para garantir que as pessoas possam exercer seu direito de sair sem atrasos desnecessários e facilitar o trânsito e o acesso ao território da UE.
A Human Rights Watch conversou com estrangeiros que disseram que as autoridades ucranianas os impediram de embarcar em trens de evacuação ou de chegar à fronteira solicitando que dessem passagem para mulheres e crianças ucranianas. A União Africana emitiu uma declaração em 28 de fevereiro pedindo que “todos os países respeitem as leis internacionais e mostrem a mesma empatia e apoio a todas as pessoas que fogem da guerra, independentemente de sua identidade racial”. Há também relatos de alguns cidadãos estrangeiros que enfrentam problemas nas fronteiras da UE. Em 1º de março, enquanto elogiava os países vizinhos por manterem suas fronteiras abertas, o ACNUR disse estar “consciente dos desafios enfrentados por alguns cidadãos de outros países que tentam entrar na Polônia”.
O provável movimento para invocar a Diretiva de Proteção Temporária é positivo, disse a Human Rights Watch. Esta seria a primeira vez que a UE acionaria a diretiva, adotada em 2001 na sequência dos movimentos de refugiados causados pela guerra na ex-Iugoslávia. A diretiva permitiria uma proteção simplificada e abrangente por até três anos para pessoas deslocadas pela guerra na Ucrânia e incapazes de retornar ao seu país de origem. Os estados e instituições membros da UE devem garantir que os não ucranianos em situação semelhante recebam a mesma proteção e direitos, e que todos os não ucranianos que saírem da Ucrânia tenham acesso ao território da UE e que seus direitos e dignidade sejam respeitados. Os nacionais de outros países que fogem da Ucrânia e que pretendam regressar aos seus países de origem devem receber assistência adequada para isso.
Os países da UE devem também garantir o status dos ucranianos já em seu território. Isso inclui trabalhadores migrantes com vistos de trabalho temporário, bem como ucranianos programados para retornar à Ucrânia. Qualquer cidadão ucraniano detido pendente de deportação deve ser libertado. Todos os estados membros da UE que designaram a Ucrânia como um “país seguro” em uma lista de países seguros para fins de devolução devem alterar a lista para refletir a dramática mudança nas circunstâncias.
“Este é um divisor de águas para a Europa e uma oportunidade para a União Europeia remediar os erros do passado e enfrentar a ocasião com genuína compaixão e solidariedade”, disse Sunderland. “Isso requer um compromisso verdadeiramente coletivo para manter a porta e corações abertos a todos que fogem da Ucrânia.”