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Brasil: Investigação independente sobre possível franco-atirador no Rio de Janeiro é necessária

A Polícia Federal, e não a Polícia Civil, deveria apoiar a investigação do Ministério Público

Vitima mostra curativo sobre ferimento, Rio de Janeiro, Brasil, janeiro de 2019. © Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro
O Brasil deveria realizar uma investigação independente e minuciosa sobre alegações de que um ou mais franco-atiradores da polícia civil mataram pelo menos duas pessoas na comunidade de Manguinhos no Rio de Janeiro, disse hoje a Human Rights Watch.

Testemunhas disseram que os tiros vieram de uma torre do principal complexo da polícia civil do Rio de Janeiro. Moradores disseram que as vítimas não representavam ameaça para ninguém quando foram baleadas.

“É imperativo que haja uma investigação independente desses assassinatos”, disse Daniel Wilkinson, diretor adjunto da divisão das Américas da Human Rights Watch.

“Dada a possibilidade de que o assassino seja um policial civil atirando de uma instalação da polícia civil, a investigação não deveria ser liderada pela polícia civil, mas pelo Ministério Público do estado do Rio de Janeiro e pela polícia federal”.

O Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (GAESP), constituído por promotores públicos encarregados de investigar abusos policiais, abriu formalmente uma investigação no dia 14 de fevereiro. A Polícia Federal deveria fornecer apoio forense e outras assistências ao GAESP para que a unidade não precise depender da polícia civil, disse a Human Rights Watch.

A Defensoria Pública do Rio de Janeiro também pediu que a investigação seja realizada por um órgão independente da polícia civil.

Em uma decisão de 2017 em um caso envolvendo homicídios cometidos pela polícia no Rio de Janeiro, a Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou que o Brasil assegure que as investigações de homicídios supostamente cometidos pela polícia sejam conduzidas por um “órgão independente e diferente da força pública envolvida no incidente, como uma autoridade judicial ou o Ministério Público, assistido por pessoal policial, técnico criminalístico e administrativo alheio ao órgão de segurança a que pertença o possível acusado, ou acusados”.

No dia 25 de janeiro, Carlos Eduardo Santos Lontra, 27, foi morto a tiros em um cruzamento no final da Rua São Daniel, na favela de Manguinhos. Quatro dias depois, Rômulo Oliveira da Silva, 37, também foi morto a tiros, enquanto passava de moto por uma barraca de legumes na praça.

Um terceiro homem, um ajudante de pedreiro de 22 anos, foi baleado na praça no mesmo dia que Rômulo, mas sobreviveu. Ele contou à Human Rights Watch que foi atingido pelo tiro quando estava ao lado de um poste de luz, do outro lado da rua da barraca de legumes. “A bala entrou e saiu do meu corpo”, ele disse.

A bala entrou pelas costas, perto das costelas direitas. Ele foi levado para o hospital e está se recuperando dos ferimentos em casa.

É imperativo que haja uma investigação independente desses assassinatos.
Daniel Wilkinson

Diretor-adjunto, Divisão das Américas
O homem acredita que o tiro tenha vindo de uma torre de dentro da Cidade da Polícia, o principal complexo da polícia civil do Rio de Janeiro. A torre fica a menos de trezentos metros de onde o homem foi atingido. Vários outros moradores, incluindo uma mulher que estava sentada na praça quando o homem foi baleado, disseram à Human Rights Watch que acreditam que o tiro tenha sido disparado da torre.

Quando a Human Rigths Watch visitou o local, no dia 4 de fevereiro, uma barraca de cachorro quente na praça, na linha de visão da torre, tinha dois buracos que pareciam ser de bala. A mulher que estava sentada na praça no momento dos tiros disse acreditar que os buracos foram feitos por balas disparadas da torre. A Human Rights Watch não está revelando sua identidade, assim como de outras testemunhas, por razões de segurança.

Moradores contaram à Human Rights Watch que pelo menos outras quatro pessoas foram mortas em 2018 no mesmo perímetro como resultado de tiros que acreditam terem sido disparados da torre da polícia civil. A Human Rights Watch não pôde confirmar os detalhes de essos casos.

Moradores disseram que denunciaram os tiros vindos da torre aos representantes da polícia civil e militar durante as reuniões do Conselho e Segurança Comunitária no ano passado. A ata de uma reunião do Conselho em setembro de 2018, obtida pelo repórter Rafael Soares do jornal Extra, confirma que um pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), próxima do local, levantou a questão. Os participantes disseram à Human Rights Watch que a polícia respondeu que seria impossível atirar da torre.

No dia 11 de fevereiro, uma equipe do GAESP e peritos criminais da polícia civil visitaram a torre. Segundo informações dadas pelo Ministério Público à Human Rights Watch, os especialistas concluíram que seria sim possível um franco-atirador deitado no telhado da torre atirar em pessoas na praça.

A polícia matou 1.530 pessoas em 2018 no Rio de Janeiro, de acordo com o Instituto de Segurança Pública (ISP), o maior número desde que o estado começou a coletar os dados em 1998. Esses foram todos casos em que policiais informaram terem matado suspeitos durante o serviço. Pesquisas da Human Rights Watch mostram que muitas mortes causadas pela polícia são execuções extrajudiciais.

A polícia civil tem um histórico ruim de investigação sobre mortes cometidas por policiais. As pesquisas da Human Rights Watch mostram que os investigadores rotineiramente não cumprem com os requisitos mais básicos de uma investigação de homicídio, como examinar a cena do crime e questionar a polícia e as testemunhas adequadamente.

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