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Conselho Nacional do Ministério Público  © Marcos Oliveira/Agência Senado, 2017

Uma mudança legal pode aumentar a segurança das crianças nas escolas em 2025. Em dezembro, o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) emitiu uma inovadora recomendação que destaca o papel fundamental da educação em direitos humanos e da educação integral em sexualidade na promoção de escolas mais seguras.

Nela, o CNMP, órgão nacional que supervisiona promotores de justiça do Brasil, oferece diretrizes para o enfrentamento da violência escolar e enfatiza a importância de se combater o racismo estrutural, a misoginia, a LGBTfobia e outras formas de discriminação. Também defende a liberdade de cátedra do professorado na abordagem dessas agendas.

A recomendação é crucial, pois a educação em direitos humanos e em sexualidade enfrenta ataques contínuos há mais de uma década. Legisladores, autoridades e grupos contrários aos direitos humanos têm usado a educação como ferramenta para obter ganhos políticos, alegando que discussões sobre racismo, gênero, sexualidade e outros tópicos importantes constituem “doutrinação” ou “ideologia de gênero”.

O conceito falacioso de “ideologia de gênero” surgiu nos anos 1990, criado por setores católicos ultraconservadores para atacar avanços nos direitos das mulheres e da população LGBTQIA+ na ONU. Nos últimos anos, a extrema direita o adotou para gerar pânico moral e desqualificar políticas públicas de promoção da igualdade.

A recomendação do CNMP surge em meio a uma crise de violência escolar. Em 2023, uma série de assassinatos brutais em escolas levou o governo a caracterizar o fenômeno como uma “epidemia” e a adotar medidas para enfrentá-lo. Especialistas apontam que, além de fatores como conteúdo nocivo online e o isolamento na pandemia, o assédio a professores e os ataques à educação inclusiva exacerbam o problema.

A supressão de discussões sobre direitos humanos e sexualidade prejudica os esforços para criar uma cultura antidiscriminatória, que supere práticas violentas e promova a compreensão mútua nas escolas e fora delas.

A recomendação não é vinculante, mas oferece orientação normativa sobre como promotores deveriam atuar frente a ataques à educação em direitos humanos e em sexualidade, ao instar o desenvolvimento de regras, processos e estruturas para o apoio a professores e a estudantes. A recomendação também pode coibir a atuação ideológica de alguns promotores contra esse material educacional protegido.

Em um relatório de 2022, a Human Rights Watch analisou mais de 200 projetos de lei e leis aprovadas nos níveis federal, estadual e municipal que visam proibir discussões sobre gênero e sexualidade nas escolas, com base em levantamento realizado pelas pesquisadoras Fernanda Moura e Renata Aquino. Professores que entrevistamos enfrentaram assédio por autoridades eleitas e membros da comunidade, além de processos judiciais por abordarem essas agendas, sendo que alguns foram intimados a prestar depoimentos à polícia ou a outras autoridades.

Há anos, especialistas em educação e grupos de advocacy brasileiros, como a Articulação contra o Utraconservadorismo na Educação, a Ação Educativa e os Professores Contra o Escola Sem Partido, também têm alertado sobre esses graves ataques.

Em 2018 e 2022, oitenta organizações de educação e direitos humanos no Brasil publicaram e atualizaram um manual para proteger professoras e professores em resposta às tentativas de proibir discussões nas escolas sobre gênero, raça, sexualidade e de perspectivas críticas sobre a história e a realidade desigual brasileira, bem como ao aumento de perseguições, censura e assédio judicial contra profissionais de educação.

Apesar desses desafios, houve avanços, grande parte decorrente da atuação de setores organizados da sociedade civil. Em 20202024, o Supremo Tribunal Federal julgou a inconstitucionalidade de leis que visavam proibir a educação em direitos humanos e em sexualidade, determinando que o Estado brasileiro a promova, como forma de combater o abuso sexual de crianças e adolescentes e a violência contra meninas, mulheres e população LGBTQIA+.

Em outubro de 2023, a Câmara dos Deputados realizou a primeira audiência pública sobre assédio contra professores por temas abordados em sala de aula. Em 2023, os ministérios da Educação e de Direitos Humanos apoiaram o lançamento do Observatório Nacional de Violência contra Educadores/as visando construir estratégias para o enfrentamento do assédio e da censura a professores.

Em resposta à onda de violência escolar, o governo também anunciou medidas de apoio às escolas, incluindo o financiamento à formação em segurança e à infraestrutura. O governo também criou um Grupo de Trabalho Técnico para Enfrentamento ao Bullying, ao Preconceito e à Discriminação na Educação. O grupo visa contribuir para ocumprimento de uma decisão do Supremo que determinou o estabelecimento de ações de prevenção e enfrentamento à discriminação por gênero, identidade de gênero e orientação sexual nas escolas.

A nova recomendação do CNMP é mais um passo na direção certa e responde ao anseio expresso pela população brasileira na pesquisa Educação, Valores e Direitos (2022): 73% das pessoas manifestaram ser favoráveis à educação sexual nas escolas e mais de 90% compreendem que ela é fundamental para prevenir o abuso sexual de crianças e adolescentes.

As assembleias legislativas estaduais e as câmaras de vereadores deveriam revogar ou rejeitar quaisquer leis ou projetos de lei que proíbam o acesso à educação em direitos humanos e em sexualidade. Além disso, as secretarias de educação deveriam apoiar os docentes, garantindo segurança ao ensinar esses conteúdos essenciais. Somente assim o Brasil poderá combater causas estruturais que alimentam a violência escolar e criar um ambiente onde estudantes e educadores possam desenvolver uma educação crítica e criativa, livre de discriminações e violências.

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