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Brasil: Remova Garimpeiros de Território Indígena na Amazônia

Políticas de Bolsonaro estimulam o desmatamento em terras indígenas

Sede da  Associação de Mulheres Munduruku Wakoborun, no município de Jacareacanga, Pará, depredada em 25 de março de 2021.  © Arquivo MPF/PA

(São Paulo, 12 de abril de 2021) – As autoridades federais brasileiras devem remover imediatamente os garimpeiros que invadiram a terra indígena Munduruku na floresta amazônica, disse hoje a Human Rights Watch.

Indígenas Munduruku na região do Tapajós – epicentro do ouro ilegal na Amazônia – no sudoeste do estado do Pará denunciaram o recrudescimento de invasões de suas terras por garimpeiros armados desde 14 de março de 2021. O Ministério Público Federal alertou sobre o risco de conflito entre locais e os garimpeiros, e instou a mobilização da Polícia Federal e outras autoridades para remover os invasores. Mas o governo ainda precisa agir. A tensão aumentou nas últimas semanas depois que um grupo de garimpeiros trouxe pás carregadeiras para a área.

“Os indígenas no território Munduruku estão enfrentando invasões de terras, destruição ambiental e sérias ameaças por grupos criminosos envolvidos no garimpo ilegal”, disse Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil. “A menos que o governo tome medidas decisivas para fazer cumprir a lei e expulsar os invasores, a situação se tornará ainda mais perigosa.”

O garimpo ilegal contribui significativamente para o desmatamento na Amazônia brasileira e tem sido associado a níveis perigosos de contaminação por mercúrio – utilizado na extração de ouro – em várias comunidades Munduruku na região da bacia do Tapajós. Os indígenas também temem que os garimpeiros possam disseminar o vírus da Covid-19 nos territórios.

Em nota pública no dia 16 de março, o Ministério Público Federal informou que um helicóptero parecia monitorar os garimpeiros e seus equipamentos, indicando “uma ação orquestrada” de grupos criminosos. Também relatou que a incursão estaria ocorrendo em associação com uma “pequena parcela” de indígenas que apoiam o garimpo.

Indígenas Munduruku que se opõem ao garimpo e denunciam as invasões às autoridades disseram que sofrem ameaças e intimidações. Em 19 de março, homens armados teriam impedido um grupo indígena de desembarcar de seus barcos em uma área dentro do território. Em 25 de março, no município de Jacareacanga, garimpeiros e apoiadores invadiram o escritório coletivo da Associação das Mulheres Munduruku Wakoborũn e outras organizações que se opõem ao garimpo. Os indivíduos destruíram móveis e equipamentos e colocaram fogo em documentos, segundo lideranças indígenas.

Sede da  Associação de Mulheres Munduruku Wakoborun, no município de Jacareacanga, Pará, depredada em 25 de março de 2021. © Arquivo MPF/PA

O território Munduruku há tempos sofre com as invasões por garimpeiros, mas a situação “claramente piorou” no governo Bolsonaro e reflete um aumento mais amplo da mineração ilegal na região, disse um membro do Ministério Público Federal à Human Rights Watch.

A atividade mineradora ilegal e o desmatamento associado também ameaçam a saúde e as fontes de alimento dos povos da bacia do Tapajós. Um estudo recente da Fiocruz, instituição vinculada ao Ministério da Saúde, e WWF-Brasil concluiu que o mercúrio, uma substância tóxica, contaminou os peixes que indígenas Munduruku do território Sawré Muybu dependem para sua subsistência. Em três aldeias, 58 por cento dos participantes do estudo apresentaram níveis de mercúrio acima do limite considerado seguro. A contaminação por mercúrio pode causar danos no cérebro e outros problemas de saúde graves e irreversíveis.

O Ministério Público Federal iniciou uma apuração sobre o fracasso das autoridades federais em conter as atividades ilegais de garimpo em terras dos indígenas Munduruku no sudoeste do Pará. Em 2017, o Ministério Público Federal recomendou às agências ambientais – o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis ​​(IBAMA) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) – que conduzissem fiscalizações periódicas contra o garimpo ilegal na região, e ajuizou uma ação na Justiça Federal em 2018 exigindo a realização de operações.

Essa ação desencadeou apenas uma operação desses órgãos ambientais em dois anos, em maio de 2018, disse um membro do Ministério Público Federal à Human Rights Watch.

Em junho de 2020, o Ministério Público Federal cobrou novamente agências federais para combaterem o garimpo nas terras Munduruku e solicitaram a atuação da Polícia Federal para a desintrusão de invasores. Dois meses depois, o Ibama iniciou uma operação nas terras indígenas Munduruku e Sai Cinza, mas o Ministério da Defesa suspendeu a operação para “reavaliação” após encontro do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, com um grupo de indígenas favoráveis às atividades de mineração. No dia seguinte, o Ministério da Defesa também impediu que aeronaves usadas pelo Ibama decolassem de um campo de provas da Aeronáutica no Pará. A operação não foi retomada.

Em dezembro de 2020, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) instou o Brasil a proteger os direitos à saúde, à vida e à integridade pessoal dos membros do Povo Indígena Munduruku. A comissão expressou preocupação com garimpeiros ilegais e outros invasores que poderiam propagar a Covid-19 em comunidades sem acesso suficiente aos serviços de saúde. Em resposta à comissão, o governo Bolsonaro afirmou que estava protegendo as comunidades e que o Ministério da Justiça e Segurança Pública estaria elaborando planos de ação para a retirada de terceiros não autorizados das terras indígenas.

“Ainda que tenham planos de desintrusão em andamento, isso não deve impedir autoridades de atuarem imediatamente para conter o cenário de violência que estamos observando”, disse o membro do Ministério Público Federal à Human Rights Watch.

O governo Bolsonaro enfraqueceu os órgãos encarregados de proteger o meio ambiente, na prática encorajando as redes criminosas envolvidas na extração ilegal de madeira, mineração, entre outros, na Amazônia.

A suspensão dos esforços de fiscalização em 2020 foi indicativa de um declínio na cooperação mais ampla entre o Ministério Público Federal e os órgãos ambientais desde a posse do presidente Bolsonaro. “Costumávamos dialogar diretamente com os órgãos federais, mas não existe mais um bom ambiente para essa interação com a nova agenda do Ibama”, disse o membro do Ministério Público Federal.

Sem a adequada fiscalização, indígenas Munduruku precisam patrulhar e proteger suas terras por conta própria, correndo grande risco ao fazê-lo, e relatam as invasões às autoridades.

“Exigimos que os órgãos federais cumpram com seus deveres constitucionais urgentemente”, disse o Movimento Ipereg Ayu, organização do povo Munduruku que defende a floresta, em 21 de março. “Se algo acontecer com nosso povo responsabilizamos o Estado brasileiro que mesmo depois de diversas denúncias de invasões e destruições do nosso território no meio de uma pandemia, não age.”

Sob o governo Bolsonaro, o desmatamento em terras indígenas por toda a Amazônia é o maior da última década, de acordo com dados oficiais, e as invasões aumentaram 135% em seu primeiro ano, segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Outras comunidades indígenas na Amazônia que enfrentam invasões de garimpeiros incluem os Yanomami e Ye’kwana no estado de Roraima.

O presidente Bolsonaro já sinalizou sua aversão à proteção das terras indígenas. Como candidato, afirmou que não demarcaria “um centímetro a mais” de terra indígena. Seu governo paralisou a demarcação de terras indígenas – há 237 requisições –, deixando comunidades indígenas ainda mais vulneráveis ​​a invasões, desmatamentos e violência. O território Munduruku é demarcado.

Em 2020, Bolsonaro apresentou um projeto de lei no Congresso que permitiria a mineração e outras atividades em terras indígenas. O projeto está tramitando no Congresso e é listado como uma das prioridades de Bolsonaro.

“Governos anteriores também não conseguiram proteger o território Munduruku do garimpo ilegal”, disse Canineu. “A diferença agora é que o governo tem ativamente enfraquecido a fiscalização ambiental e a proteção das terras dos povos indígenas no Brasil.”

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