Skip to main content

Um grande retrocesso para a justiça no Brasil

Tribunal anula julgamento de 73 policiais militares

Em 2 de outubro de 1992, o sangue de 111 detentos mortos literalmente inundava os corredores do Centro de Detenção do Carandiru, em São Paulo. Esta semana, a 4ª  Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo anulou as condenações de 73 policiais militares pela participação nas mortes. "Não houve massacre. Foi legítima defesa", declarou o desembargador relator do caso.

Mas as evidências apresentadas no processo desmascaram a tese de legítima defesa e aponta para um nível de brutalidade difícil de compreender.

Detentos no Carandiru, onde 111 presos morreram durante ação policial, dizem aos jornalistas que o incidente foi um "massacre" e fazem apelo para que grupos de direitos humanos investiguem as condições do centro de detenção - o maior do Brasil - perigosamente superlotado. 06 de outubro de 1992. © 1992 Reuters/Jamil Ismail

Tudo começou às 14:00h, quando uma rebelião eclodiu no presídio, que abrigava mais de 2.000 detentos – mais que o dobro de sua capacidade. A polícia militar impediu qualquer negociação com os presos e, por volta das 16:30h, invadiu o Pavilhão 9. Nenhum policial foi ferido por tiros.

A análise forense concluiu que todos os tiros partiram de armas da polícia e também atestou que os policiais alteraram a cena do crime. Muitos detentos foram mortos quando estavam nus, de joelhos, com as mãos para cima. Há também evidências de que policiais executaram detentos que testemunharam o ocorrido, que foram feridos, ou que foram forçados a remover corpos.

Dizer que não houve massacre naquele dia é uma afronta às famílias das vítimas e ao Estado de Direito.

Por muitos anos, a investigação não levou a nada. O Centro para Justiça e Direito Internacional (CEJIL), a Comissão Teotônio Vilela de Direitos Humanos e a Human Rights Watch, conjuntamente, apresentaram o caso Carandiru à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, e, em 2000, a Comissão concluiu que o Estado brasileiro violou suas obrigações de direitos humanos no caso.

Ninguém foi responsabilizado.

Em 2001, um júri condenou o comandante da operação, Ubiratan Guimarães, sob 102 acusações de homicídio, mas em segunda instância foi absolvido. Entre 2013 e 2014, cinco júris condenaram os 73 policiais militares por sua participação nas mortes. Eles permaneceram em liberdade enquanto pendente recurso, e em 27 de setembro, dois desembargadores da 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiram pela anulação dos julgamentos argumentando que não há elementos para mostrar os crimes que foram cometidos por cada um dos policiais. O desembargador relator decidiu que os 73 agentes deveriam ser absolvidos. O Ministério Público planeja recorrer.

Policiais matam milhares de pessoas todos os anos no Brasil. Algumas dessas mortes são execuções extrajudiciais, e a impunidade por abusos continua a ser a regra, conforme a Human Rights Watch e outras organizações têm documentado.

Se ninguém for responsabilizado pelo massacre do Carandiru, se reforçará a percepção generalizada de que policiais podem fazer o que quiserem no Brasil, mesmo cometer as maiores atrocidades e permanecerem impunes.

Your tax deductible gift can help stop human rights violations and save lives around the world.

Região/País

Mais vistos