Skip to main content

EUA/El Salvador: Tortura de deportados venezuelanos

Parem de enviar pessoas para situações perigosas; garantam a responsabilização de perpetradores

Um migrante venezuelano supostamente ligado a organizações criminosas sentado dentro de uma cela no CECOT em 16 de março de 2025, em Tecoluca, El Salvador.  © 2025 Governo salvadorenho via Getty Images
  • Os cidadãos venezuelanos que o governo dos EUA enviou para El Salvador em março e abril foram torturados e submetidos a outros abusos, incluindo violência sexual.
  • Os casos de tortura e maus-tratos a venezuelanos em El Salvador não foram incidentes isolados cometidos por só alguns guardas ou policiais abusivos, mas sim violações sistemáticas de direitos humanos.
  • O governo Trump é cúmplice de tortura, desaparecimento forçado e outras violações graves, e deve parar de enviar pessoas para El Salvador ou qualquer outro país onde elas corram risco de tortura.

(Washington, DC) – Os cidadãos venezuelanos que o governo dos Estados Unidos enviou para El Salvador em março e abril de 2025 foram torturados e submetidos a outros abusos, incluindo violência sexual, afirmaram a Human Rights Watch e a Cristosal em um relatório divulgado hoje. 

O relatório de 90 páginas, intitulado “Você chegou ao inferno: tortura e outros abusos contra venezuelanos na megaprisão de El Salvador”, fornece um relato detalhado do tratamento dado a essas pessoas em El Salvador. Em março e abril de 2025, o governo dos Estados Unidos enviou 252 venezuelanos, incluindo dezenas de requerentes de asilo, para a megaprisão Centro de Confinamento do Terrorismo (CECOT) em El Salvador, apesar de relatos confiáveis de graves abusos dos direitos humanos nas prisões de El Salvador. Os venezuelanos foram submetidos a refoulement ou devolução — que consiste no envio de pessoas a um lugar onde correm risco de sofrer tortura ou perseguição —, detenção arbitrária, desaparecimento forçado, tortura, condições desumanas de detenção e, em alguns casos, violência sexual.

“O governo Trump pagou milhões de dólares a El Salvador para deter arbitrariamente venezuelanos, que foram então abusados pelas forças de segurança salvadorenhas quase diariamente”, disse Juanita Goebertus, diretora da Human Rights Watch para as Américas. “O governo Trump é cúmplice de tortura, desaparecimento forçado e outras violações graves, e deve parar de enviar pessoas para El Salvador ou qualquer outro país onde corram o risco de serem torturadas.”

Entre março e setembro de 2025, pesquisadores entrevistaram 40 dos venezuelanos que foram detidos no CECOT e 150 de seus familiares, advogados e conhecidos. Os pesquisadores analisaram fotografias de ferimentos, bancos de dados de antecedentes criminais, documentos relacionados ao status de imigração dessas pessoas nos Estados Unidos e dados divulgados pela Agência de Imigração e Alfândega dos Estados Unidos (ICE) sobre suas deportações. Os pesquisadores também corroboraram as alegações dos detidos por meio de análises forenses realizadas pelo Grupo Independente de Peritos e pesquisas de fontes públicas realizadas pelo Laboratório de Investigação do Centro de Direitos Humanos da Universidade da Califórnia, em Berkeley.

A Human Rights Watch e a Cristosal solicitaram informações aos governos dos Estados Unidos e de El Salvador sobre essas detenções, mas não receberam resposta.

O governo dos EUA reportou que forneceu pelo menos US$4,7 milhões a El Salvador, incluindo para cobrir os custos de detenção dos homens. Alguns venezuelanos enviados a El Salvador estavam buscando asilo nos Estados Unidos após fugirem da perseguição na Venezuela.

© 2025 Human Rights Watch

A Human Rights Watch e a Cristosal descobriram que cerca de metade dos venezuelanos enviados para a CECOT não tinham antecedentes criminais e apenas 3% haviam sido condenados nos Estados Unidos por crimes violentos ou potencialmente violentos. Verificações adicionais de antecedentes mostraram que muitos não haviam sido condenados por crimes na Venezuela ou em outros países latino-americanos onde haviam vivido. 

Familiares e advogados afirmaram que pelo menos 62 dos venezuelanos foram removidos durante o processo de asilo nos Estados Unidos, apesar de terem sido aprovados na triagem inicial de “fundado temor”, que lhes dava o direito a uma audiência completa sobre seus pedidos de asilo perante um juiz de imigração. Três afirmaram ter chegado aos Estados Unidos após serem totalmente avaliados e processados pelo programa Safe Mobility Offices, estabelecido pelo governo dos Estados Unidos.

Os governos dos Estados Unidos e de El Salvador se recusaram repetidamente a divulgar informações sobre o destino ou paradeiro dos venezuelanos, o que equivale a desaparecimentos forçados sob o direito internacional. Cristosal ajudou os familiares a entrar com 76 pedidos de habeas corpus perante a Câmara Constitucional da Suprema Corte de El Salvador, que não se pronunciou sobre os casos. 

As pessoas detidas no CECOT foram submetidas a graves abusos físicos, verbais e psicológicos regulares por parte dos guardas prisionais e da polícia de choque salvadorenhos. De acordo com o direito internacional dos direitos humanos, os abusos constituíram tratamento cruel, desumano ou degradante e, em muitos casos, tortura. Os guardas prisionais e a polícia de choque espancavam regularmente os venezuelanos, inclusive durante as revistas diárias às celas, por pequenas infrações às regras — como falar alto ou tomar banho na hora errada — ou por solicitar assistência médica. 

© 2025 Human Rights Watch

“Os guardas vinham fazer uma revista nas celas todos os dias”, disse um deles. “Eles nos tiravam das celas, nos faziam ajoelhar, algemavam nossas mãos atrás das costas e colocavam nossos braços sobre a cabeça, e nos espancavam com cassetetes, chutes e socos... e depois nos deixavam ajoelhados por 30 ou 40 minutos.”

Vários ex-detentos disseram que os agentes os espancaram depois que conversaram com membros do Comitê Internacional da Cruz Vermelha durante sua visita ao CECOT em maio. Um deles disse que os guardas “continuaram me batendo, no estômago, e quando tentei respirar, comecei a engasgar com o sangue”. 

Três pessoas detidas no CECOT disseram ter sido vítimas de violência sexual. Um deles disse que quatro guardas abusaram sexualmente dele e o forçaram a fazer sexo oral em um deles. “Eles brincavam com seus cassetetes no meu corpo”, disse ele. 

A Human Rights Watch e a Cristosal concluíram que os casos de tortura e maus-tratos a venezuelanos no CECOT não foram incidentes isolados por parte de guardas ou policiais de choque abusivos, mas sim violações sistemáticas. Os abusos parecem ter feito parte de uma prática destinada a subjugar, humilhar e disciplinar os detidos, afirmaram a Human Rights Watch e a Cristosal. A brutalidade e a natureza repetitiva dos abusos também parecem indicar que os guardas e a polícia de choque agiram com base na crença de que seus superiores apoiavam ou, no mínimo, toleravam seus atos abusivos.

Os venezuelanos foram mantidos em condições desumanas, com comida escassa e inadequada, higiene e saneamento precários, acesso limitado a cuidados de saúde e medicamentos e sem acesso a recreação ou educação.

Em meados de julho, o governo salvadorenho enviou as 252 pessoas para a Venezuela em troca de 10 cidadãos americanos ou residentes permanentes que haviam sido detidos pelo governo de Nicolás Maduro, em muitos casos arbitrariamenteA Venezuela tem sofrido uma crise humanitária e violações sistemáticas dos direitos humanos, o que levou quase 8 milhões de pessoas a fugir. 

“O governo dos Estados Unidos não está envolvido em atos de tortura sistemática nessa escala desde Abu Ghraib e a rede de prisões clandestinas durante a guerra ao terror”, disse Noah Bullock, diretor executivo da Cristosal. “Desaparecer pessoas e colocá-las nas mãos de um governo que as tortura vai contra os princípios que historicamente fizeram dos Estados Unidos uma nação pautada em leis.”

GIVING TUESDAY MATCH EXTENDED:

Did you miss Giving Tuesday? Our special 3X match has been EXTENDED through Friday at midnight. Your gift will now go three times further to help HRW investigate violations, expose what's happening on the ground and push for change.
Região/País

Mais vistos