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UNASUL: Condene os Abusos Cometidos na Venezuela

Visita ao país deve focar-se nas detenções arbitrárias e abusos contra manifestantes

(New York) - A União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) deve condenar as graves violações aos direitos humanos cometidas pelo governo venezuelano contra opositores políticos e manifestantes, declarou hoje a Human Rights Watch. A Venezuela também deve libertar aqueles que foram presos arbitrariamente e levar à justiça os responsáveis pelos abusos cometidos contra manifestantes.

No dia 20 de fevereiro de 2015, o secretário-geral da UNASUL, Ernesto Samper, anunciou que os ministros das relações exteriores do Brasil, Colômbia e Equador viajariam à Venezuela nos próximos dias para "abrir canais de diálogo e entendimento" no país. Nem a UNASUL nem seus Estados membros – com exceção da Colômbia e do Chile – tem demonstrado de maneira efetiva preocupação com a prisão de opositores políticos e abusos generalizados contra manifestantes e terceiros cometidos nos protestos ocorridos na Venezuela ao longo do ano passado.

"Se a UNASUL quer promover um diálogo genuíno, deve primeiramente demandar que o governo venezuelano pare de prender as pessoas com as quais deveria estar dialogando", disse José Miguel Vivanco, diretor executivo da Human Rights Watch para as Américas. "Este órgão regional deve insistir na liberação imediata de todos os opositores do governo que foram detidos arbitrariamente e exigir justiça para os abusos generalizados cometidos contra manifestantes ao longo do ano passado".

Em 24 de fevereiro, a UNASUL "lamentou" a morte de Kluibert Ferney Roa, um estudante de 14 anos que, de acordo com o relato de testemunhas à imprensa, foi morto  por um membro da Polícia Nacional Bolivariana durante um protesto contra a escassez de alimentos e medicamentos em San Cristóbal, no Estado de Táchira. Relatos da imprensa sugerem que o policial atirou em Kluibert à curta distância com balas de borracha. Durante seu programa de TV naquele mesmo dia, o presidente Nicolás Maduro condenou o assassinato, dizendo ter este ocorrido por conta da resposta da polícia a manifestantes violentos, declarando ainda que “a repressão armada é proibida na Venezuela” e que os policiais responsáveis pela morte do adolescente haviam sido detidos. No dia 25 do mesmo mês, a Procuradoria Geral da República declarou que um policial havia sido indiciado por homicídio doloso, entre outros crimes.

Em 19 de fevereiro, membros do Serviço Bolivariano de Inteligência prenderam o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, que é membro de um partido de oposição. O prefeito foi posteriormente indiciado por “conspiração” e “associação criminosa”, e está sendo mantido sob custódia em uma prisão militar. Ao longo do ano passado, o governo instaurou procedimentos criminais contra pelo menos cinco outros políticos da oposição; três foram presos, dois dos quais foram condenados em julgamentos que violaram garantias básicas do devido processo legal, disse a Human Rights Watch.

Leopoldo López, outro líder da oposição que responde a processos criminais, foi acusado pelo governo de incitar manifestações violentas, incluindo ataques a repartições e veículos públicos, durante uma manifestação ocorrida em 12 de fevereiro de 2014. Ele se encontra detido na prisão militar de Ramo Verde, nos arredores de Caracas, desde que se entregou voluntariamente no dia 18 de fevereiro.

Depois que o jornal Últimas Noticias publicou evidências de que policiais uniformizados – em conjunto com homens armados vestidos com roupas civis – foram responsáveis por uma das mortes do dia 12 de fevereiro, a Procuradoria Geral da República foi forçada a voltar atrás e retirar as acusações de homicídio inicialmente incluídas no mandado de prisão de Leopoldo López. No entanto, o Leopoldo López está sendo acusado de vários outros crimes. Durante seu julgamento, que começou em julho e segue em curso, o juiz negou à defesa a inclusão da maior parte de suas provas e os promotores ainda não apresentaram evidências críveis que embasem suas acusações.

Em 17 de fevereiro de 2014, um mandado de prisão foi expedido contra Carlos Vecchio, membro do mesmo partido de Leopoldo López. As acusações incluem incitamento público e associação criminosa. Em janeiro, o presidente governista da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, acusou Vecchio, que vive atualmente nos Estados Unidos, de “planejar atos violentos contra o povo da Venezuela”. O governo ainda não apresentou evidências críveis para embasar tais alegações.

Em abril de 2014, dois prefeitos da oposição – Daniel Ceballos de San Cristóbal, no Estado de Táchira e Enzo Scarano de San Diego, no Estado de Carabobo – foram presos por não conseguirem remover obstáculos que impediam a livre circulação de pessoas nas ruas de suas cidades onde os manifestantes protestavam. Ambos foram condenados em processos criminais que violaram garantias legais básicas, como o direito de recorrer de suas condenações, disse a Human Rights Watch. O Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Detenções Arbitrárias concluiu que Ceballos não teve acesso a uma defesa adequada e que seu direito de ser julgado por uma corte independente havia sido violado.

Scarano foi sentenciado a 10 meses de prisão e libertado em fevereiro, após cumprir pena. Ceballos permanece preso, cumprindo pena de 12 meses.

Em dezembro, o Ministério Público acusou outra líder política da oposição, María Corina Machado, de conspiração por seu suposto envolvimento com um plano para assassinar o presidente Nicolás Maduro. O presidente chamou María Corina de “assassina”, enquanto Cabello, o presidente da Assembleia Nacional, a acusou de apagar os e-mails que seriam as únicas evidências que os promotores disseram ter contra ela.

Em 19 de fevereiro, dezenas de membros do Serviço Bolivariano de Inteligência entraram à força no escritório do prefeito Ledezma em Caracas e o prenderam sem exibir um mandado de prisão, de acordo com declarações de sua esposa à imprensa. No mesmo dia, o presidente Maduro disse em rede nacional que Ledezma responderia por seus crimes “contra a paz, a segurança e a Constituição do país”.

No dia 20 de fevereiro, a Procuradoria Geral acusou Ledezma por sua suposta participação em “uma conspiração para organizar e executar atos violentos contra o governo democraticamente eleito”. As evidências contra Ledezma incluem uma declaração, obtida sob coerção de um ex-militar, que o acusa de participação em uma tentativa de golpe, relatou seu advogado à imprensa. Se condenado, Ledezma poderia ficar até 26 anos na prisão. Ele está sob custódia na prisão militar de Ramo Verde.

Um ano depois da repressão violenta contra manifestantes pacíficos e terceiros, não houve praticamente nenhuma responsabilização pelas dezenas de abusos – incluindo mortes, prisões arbitrárias, espancamentos e tortura – cometidos pelas forças de segurança, como mostram informações disponibilizadas pelo governo. Embora alguns manifestantes tenham usado de violência em alguns dos protestos de 2014, investigações da Human Rights Watch mostram que as forças de segurança recorreram repetidamente ao uso ilegal da força contra manifestantes desarmados e terceiros.

Segundo dados oficiais, até novembro último, os promotores haviam recebido 242 denúncias de supostas violações dos direitos humanos durante os protestos, incluindo dois casos de tortura, embora a documentação feita pela Human Rights Watch relate um número ainda maior. O Ministério Público informou que os promotores concluiram 125 investigações, iniciando processos contra 15 agentes das forças de segurança, e que dois policiais foram condenados por “eventos que ocorreram” durante os protestos, mas não ofereceu informações sobre a natureza dos crimes ou sobre as condenações.

Em outubro, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos pediu urgência à Venezuela na libertação dos manifestantes e políticos detidos arbitrariamente. O Comitê das Nações Unidas Contra a Tortura declarou em novembro que a Venezuela deve libertar o prefeito Leopoldo López imediatamente, além de “todos que foram detidos arbitrariamente por exercerem seu direito de protestar e se expressar pacificamente”.

No dia 24 de fevereiro de 2015, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos pediu à Venezuela que “não criminalize os líderes políticos da oposição, garanta a participação de todos os setores da sociedade na vida política da Venezuela e garanta os direitos humanos daqueles que se identificam com a oposição ao governo”.

O governo dos Estados Unidos impôs sanções específicas contra 50 agentes públicos venezuelanos acusados de cometerem abusos. As sanções incluem a negativa ou cancelamento de vistos e o congelamento de bens pessoais nos Estados Unidos.

Sob o Tratado Constitutivo da UNASUL de 2008, “a integração e a união sul-americana se baseiam nos princípios da (...) democracia, participação cidadã e pluralismo; [e] nos direitos humanos universais, interdependentes e indivisíveis”. O tratado também declara que “instituições democráticas plenamente eficazes e o respeito irrestrito pelos direitos humanos são condições essenciais para a construção de um futuro comum de paz, prosperidade social e econômica e para o desenvolvimento dos processos de integração entre os Estados membros”.

No entanto, a imensa maioria dos governos latino-americanos da UNASUL permaneceram silentes em relação à situação dos direitos humanos na Venezuela. Em janeiro, o governo da Colômbia quebrou o silêncio coletivo ao pedir a libertação de López, depois que o governo venezuelano impediu  que os ex-presidentes da Colômbia, Andrés Pastrana, e do Chile, Sebastián Piñera, visitassem López na prisão. Em fevereiro, o presidente colombiano Juan Manuel Santos também pediu a libertação de López. O ministro das relações exteriores do Chile e outros políticos do partido do governo e da oposição também expressaram preocupação com a situação na Venezuela.

“Ao permanecer em silêncio sobre os abusos na Venezuela, os membros da UNASUL estão traindo seus princípios norteadores e mandando um sinal muito perigoso ao governo de Maduro para que se sinta livre para continuar prendendo opositores politicos e espancando manifestantes”, disse Vivanco.

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