22 de Setembro de 2007
A maioria das pessoas nunca ouviu falar de Ahmad Harun. Mas, para os aldeãos de Bindisi, Kodoom, Arawala e Mukjar, Ahmad Harun é o seu pior pesadelo.
Há quatro anos, Harun estava encarregado da segurança no Darfur, ao mesmo tempo que as tropas governamentais do Sudão e as suas milícias Janjaweed levavam a cabo uma campanha de terra queimada, massacres, violações, destruição e deslocação de populações.
Harun andava pelas aldeias, mas não para lhes garantir a segurança e, durante o período em que ele assumiu esse papel, houve centenas de pessoas assassinadas e milhares arrancadas às suas casas. Muitos destes crimes foram, alegadamente, cometidos pelo próprio Harun, outros foram cometidos sem que ele os tentasse impedir.
Harun seria posteriormente objecto de 42 acusações de crimes contra a humanidade e crimes de guerra por parte do Tribunal Penal Internacional (TPI).
Os juízes do TPI consideraram que havia indícios razoáveis que levavam a acreditar que Harun tinha sido responsável pela perseguição, violação, ataque e assassínio de civis em quatro aldeias do Darfur entre 2003 e 2004. As provas também indicavam que Harun teria recrutado, pago e fornecido armas às milícias Janjaweed que levaram a cabo os ataques.
Apesar da emissão de um mandado de captura internacional, Harun continua em liberdade. Na realidade, ele é actualmente o ministro de Estado sudanês para os Assuntos Humanitários e está encarregado de cuidar das Mesmas pessoas que ele obrigou a fugir das suas casas.
Somando um insulto a outro insulto, Harun foi recentemente nomeado co-presidente de uma comissão criada para ouvir as queixas das vítimas de violência no Darfur – o que signifi ca que foi encarregado de investigar os mesmos crimes de guerra de que é acusado de cometer.
Apesar de tudo isto, talvez haja algo ainda mais chocante do que a sua nomeação: a reacção da União Europeia, que se remeteu ao mais completo silêncio.
A União Europeia foi fulcral no encaminhamento da questão do Darfur para o TPI, tendo defendido que a administração da justiça era uma componente essencial para pôr fi m à violência na região. Agora, na sua pressa em
aplaudir o Governo sudanês pela sua relutante aceitação de uma nova força de manutenção de paz no Darfur, os diplomatas começam a voltar as costas ao princípio da aplicação da lei.
Compreende-se que a promoção da paz no Darfur exige diplomacia, incluindo o diálogo com o Presidente Bashir e com os seus apoiantes, mas há limites para a diplomacia.
É evidente que Cartum está a dizer ao mundo que, apesar de ter sido obrigado a aceitar a presença no Darfur de uma força internacional de manutenção da paz, não está preocupado em proporcionar justiça às vítimas.
A UE devia responder com a sua própria mensagem, deixando claro que a justiça para as vítimas dos crimes de guerra é uma prioridade para si e que não tolerará a recusa de cooperação com o TPI por parte de Cartum.
Se se pretende atingir uma paz durável, a impunidade deve terminar e a União Europeia deve exigir que Cartum entregue Harun à Haia para ser julgado.
Os Estados-membros da União Europeia devem, por seu lado, deixar de estender a passadeira vermelha ao Presidente do Sudão, Omar al-Bashir. Sem uma total cooperação com o TPI, incluindo a entrega de Harun, o Presidente Bashir deve ser excluído da futura cimeira UE-África em Lisboa. A justiça não é um luxo moral. A UE deve pôr fim ao silêncio e falar em nome das vítimas do Darfur.