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Emilio Román, pai de três jovens que foram presos e acusados de participarem dos protestos em julho de 2021 contra o governo de cuba, mostra uma foto de seus filhos em sua casa no bairro de La Güinera, Havana, em 29 de março de 2022. © 2022 Yamil Lage/AFP via Getty Images

(Nova York) – O governo cubano cometeu sistemáticas violações de direitos humanos na resposta aos protestos massivos contra o governo em julho de 2021, com o aparente objetivo de punir manifestantes e impedir futuras manifestações, disse a Human Rights Watch em um relatório divulgado hoje, quando os protestos completam um ano.

O relatório “Prisão ou Exílio: A Repressão Sistemática de Cuba aos Manifestantes de julho de 2021”, com 36 páginas (em inglês), documenta uma ampla gama de violações de direitos humanos no contexto dos protestos, incluindo detenções arbitrárias, processos abusivos e tortura. A repressão do governo e sua indisposição para resolver os problemas fundamentais que levaram os cubanos às ruas, incluindo o acesso limitado a alimentos e remédios, geraram uma crise de direitos humanos que aumentou drasticamente o número de pessoas deixando o país.

“Há um ano, milhares de cubanos protestaram, exigindo direitos e liberdades, mas o governo deu a muitos deles apenas duas opções: prisão ou exílio”, disse Juan Pappier, pesquisador sênior da Human Rights Watch. “Os governos da América Latina e da Europa deveriam intensificar urgentemente o escrutínio dos direitos humanos sobre Cuba e priorizar uma resposta multilateral e coordenada antes que esta crise de direitos humanos se torne ainda pior.”

Em 11 de julho de 2021, milhares de cubanos saíram às ruas na maior manifestação nacionais contra o governo desde a revolução cubana de 1959. Esses protestos pacíficos foram uma resposta às restrições de longa data a direitos, à escassez de alimentos e medicamentos e à resposta do governo à pandemia de Covid-19.

A Human Rights Watch entrevistou mais de 170 pessoas em Cuba, incluindo vítimas de abuso, seus familiares e advogados. A Human Rights Watch também analisou documentos e verificou fotografias e vídeos enviados diretamente aos pesquisadores e encontrados em redes sociais. Membros do Independent Forensic Expert Group “IFEG” (Grupo Independente de Especialistas Forenses), e do International Rehabilitation Council for Torture Victims “IRCT” (Conselho Internacional para Reabilitação de Vítimas de Tortura), grupos internacionais de peritos proeminentes, forneceram opiniões de especialistas sobre algumas evidências de abusos.

Assim que iniciaram os protestos, o presidente Miguel Díaz-Canel convocou os apoiadores do governo e as forças de segurança a responderem aos protestos com força. “Chamamos todos os revolucionários para ir às ruas para defender a revolução”, disse ele. “A ordem para lutar foi dada”.

O manifestante Diubis Laurencio Tejeda, um cantor de 36 anos, morreu, aparentemente nas mãos da polícia. O grupo cubano de direitos humanos Cubalex informa que mais de 1.400 pessoas foram detidas, incluindo mais de 700 que permanecem atrás das grades.

Os policiais detiveram sistematicamente pessoas que protestavam pacificamente, prenderam críticos enquanto se dirigiam às manifestações ou os proibiram de deixar suas casas por dias ou semanas.

Na maioria dos casos documentados, as pessoas detidas foram mantidas incomunicáveis por dias, semanas e, às vezes, meses, sem poder telefonar ou receber visitas de seus familiares ou advogados. Algumas foram espancadas, forçadas a agachar-se nuas ou submetidas a maus-tratos, incluindo privação de sono e outros abusos que, em alguns casos, constituem tortura.

Mais de 380 manifestantes e transeuntes, incluindo vários adolescentes, foram processados e sentenciados. Muitos julgamentos ocorreram em tribunais militares, o que viola o direito internacional. Muitos foram processados por “sedição” e condenados a penas desproporcionais, de até 25 anos de prisão, por supostamente participarem de incidentes violentos, como atirar pedras durante os protestos.

Os promotores enquadraram protesto pacífico e insultos ao presidente ou a polícia, exercícios legítimos da liberdade de expressão e associação, como atos criminosos. Pessoas foram condenadas com base em evidências não confiáveis ou não corroboradas, como declarações exclusivamente de agentes de segurança ou supostos “vestígios de odor” de pedras nos acusados.

As vítimas e seus familiares disseram que forças de segurança as assediaram sistematicamente, em alguns casos levando-as a deixar o país.

Orelvys Cabrera Sotolongo, um jornalista de 36 anos do site de notícias Cubanet, foi preso em Cárdenas, província de Matanzas, ao deixar as manifestações em 11 de julho. Policiais o interrogaram repetidamente, dizendo que ele não voltaria a ver sua família. Cabrera só foi autorizado a fazer um telefonema 10 dias após sua prisão. Ele passou parte da detenção com outros oito detentos em uma cela de dois por um metro e meio, com pouca ou nenhuma ventilação, luz ou acesso à água.

Ele foi libertado em 19 de agosto, mas agentes disseram repetidamente que ele deveria deixar o país. Em dezembro, ele e seu parceiro fugiram e pediram asilo nos Estados Unidos.

Agentes de inteligência prenderam Elier Padrón Romero, um ajudante de pedreiro de 26 anos, em 21 de julho em La Güinera, um bairro de em situação de vulnerabilidade na província de Havana. Sua mãe disse que os policiais o espancaram, assim como outros detidos, dizendo que “desapareceriam se continuassem a pensar” como pensavam.

Em dezembro, um juiz em Havana condenou Padrón Romero por “sedição” porque ele supostamente incitou pessoas a participar de um protesto de 12 de julho e a avançar contra uma barricada policial. Ele foi condenado a 15 anos de prisão, reduzida para 10 anos após um recurso.

As autoridades cubanas também atuaram para desmantelar o limitado espaço cívico que permitiu que esses protestos ocorressem. Em maio de 2022, os legisladores aprovaram um novo código penal com várias infrações excessivamente amplas, que podem ser usadas para criminalizar a oposição pacífica ao governo. O novo código também prevê a pena de morte para uma série de crimes, incluindo “sedição”, do qual muitos manifestantes do 11 de julho foram acusados, e “atos contra a independência do Estado cubano”.

O número de cubanos que fogem do país aumentou dramaticamente. A Patrulha de Fronteira dos EUA deteve mais de 118.000 cubanos entre janeiro e maio de 2022 – em comparação com 17.000 no mesmo período de 2021. A Guarda Costeira dos EUA interditou mais de 2.900 cubanos no mar desde outubro de 2021, de longe o número mais alto em cinco anos. Muitos cubanos também fugiram para outros países.

Os governos latino-americanos, os Estados Unidos, o Canadá e a União Europeia deveriam tomar medidas para garantir uma abordagem multilateral e coordenada em relação a Cuba e que priorize os direitos humanos. Eles deveriam condenar a repressão de forma inequívoca e chamar atenção para a situação nos órgãos relevantes das Nações Unidas, particularmente no Conselho de Direitos Humanos.

A alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, que raramente condenou os abusos em Cuba, deveria condenar publicamente essas violações sistemáticas antes de deixar o cargo no final de agosto.

Durante décadas, o governo cubano se beneficiou de uma resposta disfuncional da comunidade internacional que não conseguiu promover efetivamente o avanço dos direitos humanos no país, disse a Human Rights Watch.

O amplo embargo econômico do governo dos Estados Unidos, em vez de isolar Cuba, tem isolado os EUA ao permitir que o governo cubano angarie simpatia no exterior.

Muitos governos latino-americanos, incluindo recentemente o México e a Argentina, relutam em criticar Cuba e até elogiam o governo cubano, apesar de seu péssimo histórico de direitos humanos.

“Os corajosos manifestantes que saíram às ruas em Cuba no ano passado têm todos os motivos para sentir que foram abandonados por grande parte da comunidade internacional”, disse Pappier.

Acesse o relatório “Prisão ou Exílio: A Repressão Sistemática de Cuba aos Manifestantes de julho de 2021” em inglês ou espanhol.

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