O presidente Jair Bolsonaro tentou sabotar medidas contra a disseminação da Covid-19 no Brasil e impulsionou políticas que comprometem os direitos humanos, disse a Human Rights Watch em seu Relatório Mundial 2021, publicado hoje. O Supremo Tribunal Federal (STF) e outras instituições democráticas foram forçadas a intervir para proteger esses direitos com frequência.
O governo Bolsonaro promoveu políticas que contrariam os direitos das mulheres e os direitos das pessoas com deficiência, atacou a mídia independente e organizações da sociedade civil, e enfraqueceu os mecanismos de fiscalização da legislação ambiental, na prática dando carta branca às redes criminosas envolvidas no desmatamento ilegal na Amazônia e que ameaçam e atacam os defensores da floresta.
“O presidente Bolsonaro expôs a vida e a saúde dos brasileiros a grandes riscos ao tentar sabotar medidas de proteção contra a propagação da Covid-19”, disse Anna Livia Arida, diretora adjunta da Human Rights Watch no Brasil. “O Supremo Tribunal Federal e outras instituições se empenharam para proteger os brasileiros e para barrar muitas, embora não todas, as políticas anti-direitos de Bolsonaro. Essas instituições precisam permanecer vigilantes”.
Na 31ª edição do Relatório Mundial 2021, de 761 páginas (na versão em inglês), a Human Rights Watch analisa a situação dos direitos humanos em mais de 100 países. Em seu capítulo introdutório, o diretor executivo, Kenneth Roth, argumenta que a nova administração dos Estados Unidos deveria incorporar o respeito aos direitos humanos em sua política interna e externa, de forma a aumentar as chances desse compromisso ser mantido em futuras administrações dos EUA que possam estar menos empenhadas na defesa dos direitos humanos. Roth enfatiza que, embora o governo de Trump tenha praticamente abandonado a proteção dos direitos humanos, outros governos se mobilizaram para defendê-los. O governo de Biden deveria apoiar, e não suplantar, esse novo esforço coletivo.
O presidente Bolsonaro minimizou a gravidade da Covid-19, que ele chamou de “uma gripezinha” e disseminou informações equivocadas.
Instituições democráticas impediram algumas de suas políticas mais prejudiciais e intervieram para proteger os brasileiros e as brasileiras.
O STF decidiu contra as tentativas do governo Bolsonaro de retirar dos estados a competência de restringir a circulação de pessoas para conter a propagação da Covid-19; de, na prática, suspender a lei de acesso à informação; e de deixar de publicar dados completos sobre a Covid-19.
O Congresso aprovou um projeto de lei obrigando o governo a fornecer cuidados de saúde emergenciais para os povos indígenas, e o STF ordenou que o governo Bolsonaro elaborasse um plano para combater a disseminação da Covid-19 para povos indígenas.
O governo Bolsonaro não tratou da superlotação nas prisões, mas o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que regulamenta o funcionamento do sistema judiciário, recomendou a juízes que reduzissem prisões provisórias durante a pandemia e considerassem a saída antecipada de alguns detentos. Até 16 de setembro, juízes tinham determinado a transferência de quase 53.700 pessoas para prisão domiciliar em resposta à Covid-19, de acordo com dados oficiais. Além disso, o STF suspendeu o veto presidencial a artigo de uma lei aprovada pelo Congresso exigindo o uso de máscaras em unidades prisionais.
O presidente Bolsonaro não tem enfrentado a violência policial, tendo, por vezes, até mesmo a encorajado. No Rio de Janeiro – o estado com o maior número de mortes por policiais –, o STF suspendeu a maioria das operações em comunidades de baixa renda durante a pandemia, o que levou a uma queda de 70 por cento nas mortes em decorrência de intervenções policiais entre junho e setembro, em comparação com o mesmo período em 2019. As mortes por policiais subiram novamente em outubro, aparentemente depois que a polícia aumentou o número de operações, e caíram em novembro.
A imprensa brasileira também desempenhou um papel importante ao continuar proporcionando um espaço para o debate público e fiscalizando os poderes do Estado, apesar da estigmatização, críticas e ameaças de ação judicial contra comunicadores por parte da administração Bolsonaro.
No entanto, as instituições democráticas não conseguiram barrar as políticas e a retórica do presidente Bolsonaro contra a proteção do meio ambiente, as quais contribuíram para a destruição de cerca de 11.000 quilômetros quadrados de floresta amazônica entre agosto de 2019 e julho de 2020 – a maior taxa em 12 anos. O número de focos de incêndio na Amazônia aumentou 16 por cento em 2020. A fumaça resulta em níveis prejudiciais de poluição do ar, que causam danos à saúde de milhões de moradores.
As queimadas na Amazônia são causadas intencionalmente com o objetivo de suprimir a vegetação, em grande parte de forma ilegal. “As políticas do presidente Bolsonaro têm sido um desastre para a floresta amazônica e para as pessoas que a defendem”, disse Anna Livia. “Ele culpa indígenas, organizações não governamentais e moradores pela destruição ambiental, em vez de agir contra as redes criminosas que impulsionam a ilegalidade na Amazônia.”