A indústria de diamantes continua manchada pela relação entre diamantes e abusos de direitos humanos, financiamento de conflitos e corrupção. Embora a indústria de diamantes não seja o único setor a enfrentar esse desafio, ela é única em sua particular indisposição e incapacidade de dar passos genuínos para atingir uma conduta empresarial responsável. Nós, abaixo assinados, representando diversas organizações da sociedade civil, unimos esforços para romper os vínculos entre diamantes e abusos, conflitos e corrupção, bem como para assegurar que os governos e indústrias envolvidos no setor desempenhem seu necessário e devido papel.
É preciso que avanços na promoção de uma cadeia de fornecimento responsável, do desenvolvimento sustentável e da transparência em todos os níveis da indústria sejam priorizados pelo setor, cuja reputação vem sendo prejudicada nas últimas décadas por seus elos com abusos de direitos humanos, conflitos e corrupção.
Infelizmente, esses elos continuam a prosperar, como evidenciado pelo papel dos diamantes no conflito em curso na República Centro-Africana. Fazemos um apelo a governos, associações da indústria de diamantes, e todas as empresas para que combatam abusos dos direitos humanos, conflitos e corrupção na cadeia de suprimento de diamantes, comprometendo-se com uma reforma substancial e transparente, alinhada com o direito internacional e normas de direitos humanos e de exploração responsável de minerais.
Enquanto período de reforma do Processo de Kimberley (KP, na sigla em inglês), o biênio 2017-2018 trouxe esperança de mudanças concretas. Mas, infelizmente, a falta de transparência do KP deixou o público sem saber o que esperar de uma agenda de reformas que seria capaz de impulsionar avanços do KP.
O que foi divulgado sobre tentativas de reforma evidencia que a agenda é quase idêntica à de 2012-2013 – última vez que o KP procurou avançar reformas. Esse não é o sinal de uma iniciativa que esteja avançando ou trazendo progresso significativo em campo, e apelamos à União Europeia, como presidente para o ano de 2018, e a todos os participantes para que redobrem esforços no sentido de realizar uma reforma substancial e há muito tempo necessária.
Ainda mais preocupante é o fato de que pouco foi divulgado sobre a agenda de reformas, ou suas atividades gerais, pois o KP está caminhando com um foco maior na "confidencialidade". Nenhuma iniciativa séria das partes interessadas deve comprometer a publicidade da informação sobre seu funcionamento ou inibir aqueles que tentem desempenhar um papel crucial de monitoramento, incluindo, em especial, dentro das regiões a serem beneficiadas. Nós recomendamos fortemente que os participantes se oponham a esforços do tipo.
Dadas as persistentes falhas do KP em mostrar qualquer progresso em suas operações, é fundamental que o setor de diamantes fortaleça seu engajamento em outros fóruns sobre fornecimento responsável, em busca de uma abordagem abrangente e harmonizada em relação a todos os problemas evidentes no setor.
No entanto, também temos preocupações sobre a indústria de diamantes de forma mais ampla. Como ressaltado pela campanha liderada pela Human Rights Watch, lançada no início deste ano, iniciativas como o Conselho de Joalheria Responsável e esforços específicos de empresas não conseguiram alinhar-se suficientemente a padrões internacionais ou promover significativamente o fornecimento responsável. Ao contrário, nossos esforços de pesquisa e de atuação em campo revelam muitas áreas em que as empresas são capazes de definir sua própria agenda em termos de responsabilidade, muitas vezes às custas de medidas de devida diligência e de rastreamento da origem em toda a cadeia de produção. Isto inclui não permitir a transmissão de informações sobre fontes de origem ao longo da cadeia de produção e impedir a avaliação das partes interessadas em relação a padrões de transparência.
Ademais, embora alguns grandes atores corporativos pareçam ter adotado medidas para promover uma produção responsável, estamos preocupados que seus esforços não estejam seriamente comprometidos com sua verdadeira missão. Essas iniciativas não apenas deixam de enfrentam sérios abusos de direitos humanos associados à mineração em larga escala, como também não são capazes de desenvolver atividades extrativas por comunidades artesanais que possam impactar positivamente os meios de subsistência locais ao ganhar escala como tempo.
Considerando a experiência recente e passada do compromisso da indústria, nos preocupamos que os esforços estejam sendo usados para desviar a atenção da necessidade de um progresso significativo em toda a indústria.
A indústria como um todo – da mineração ao varejo – precisa avançar rumo a práticas de fornecimento responsável, clara e comprovadamente alinhadas ao Guia da OCDE sobre a Devida Diligência para Cadeias de Fornecimento Responsáveis de Minerais provenientes de Áreas Afetadas por Conflitos e de Alto Risco, assim como os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos. Ela também precisa auxiliar comunidades mineradoras artesanais para avançar na realização do desenvolvimento sustentável. Esses atores estão lamentavelmente subrepresentados nas filiações ou governança junto a órgãos da indústria, e seus interesses e preocupações precisam ser ouvidos.
O conflito na República Centro-Africana ocorre cerca de duas décadas após os conflitos com diamantes em Angola, Libéria, Serra Leoa e República Democrática do Congo terem desencadeado a criação do KP. Tanto a indústria de diamantes quanto a comunidade internacional deveriam estar profundamente preocupados que a relação entre diamantes, abusos de direitos humanos, conflitos e corrupção continuam sendo uma realidade e que as medidas atuais não consigam responder adequadamente a essa situação inaceitável.
A indústria de diamantes está ficando para trás de outros setores minerais em suas práticas de fornecimento responsável. Até que ela tome medidas em conformidade com o que foi aqui exposto, diamantes provavelmente continuarão desempenhando um papel devastador na vida de comunidades locais que se encontram cercadas de conflitos que não são de sua responsabilidade. Todo o setor, incluindo grandes empresas, precisa demonstrar disposição para tomar decisões difíceis que promovam os interesses de todos dentro do setor, incluindo as comunidades de mineração.
Estamos à disposição para cooperarmos diretamente com governos e indústrias no alcance desses objetivos.
ANISTIA INTERNACIONAL / AMNESTY INTERNATIONAL
ENOUGH PROJECT
GLOBAL WITNESS
HUMAN RIGHTS WATCH
IMPACT