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Responsabilidade do Brasil na Solução da Crise dos Refugiados

Publicado em: O Globo

Nesta segunda-feira, 19 de setembro, líderes mundiais se reunirão em Nova York para uma importante reunião sobre a crise global de refugiados e migrantes. Esta reunião é tida como oportunidade para a criação de um sistema global mais ágil e coordenado para oferecer respostas às necessidades de milhões de pessoas deslocadas – a maioria delas fugindo da guerra e perseguição. O objetivo é garantir um apoio muito maior aos países na linha de frente da chegada dessas pessoas. Muitas vezes estes países têm de responder, sozinhos, às emergências quando grande número de refugiados cruza suas fronteiras.

Novas formas de financiamento poderiam ajudar o Brasil a oferecer apoio para que refugiados encontrem moradia e trabalho. Poderiam ajudar o Brasil a melhorar a sua capacidade para promover a integração de refugiados, proteger direitos e oferecer serviços para aqueles que estão expostos a maior risco.
Maria Laura Canineu & Bill Frelick

Diretora para o Brasil & Diretor da divisão de direitos dos refugiados

Brasil está a um oceano de distância das maiores crises de refugiados, e por isso sido poupado da responsabilidade que países como o Líbano, Quênia, Paquistão, Jordânia e Tailândia tiveram que assumir.

Na verdade, a contribuição do Brasil no compartilhamento de responsabilidade sobre o reassentamento de refugiados do mundo é insignificante. O país ocupa o último lugar na lista do ACNUR, a agência das Nações Unidas para os refugiados, entre os 30 países que participam em programas de reassentamento, na proporção de refugiados reassentados por habitantes. Com uma população de mais de 206 milhões, o Brasil recebeu 6 refugiados por meio de programas de reassentamento em 2015, um único refugiado para cada 34 milhões de pessoas no país.

Hoje, com apoio insuficiente da Europa e América do Norte, países vizinhos da Síria começam a fechar suas fronteiras a solicitantes de refúgio. Dezenas de milhares de sírios estão confinados, há mais de dois anos, em uma faixa de deserto na fronteira da Jordânia. Há mais de um ano, a Turquia afasta sírios de suas fronteiras, às vezes disparando contra os que delas se aproximam.

Uma imagem do vídeo mostra Omran, o menino de 5 anos de idade que foi retirado dos escombros após um ataque aéreo em Aleppo, Síria. 17 de Agosto, de 2016. © 2016 Aleppo Media Centre via Youtube

Os brasileiros ficaram horrorizados com as imagens das pequenas crianças sírias feridas ou mortas em suas jornadas para escapar da violência. Agora não é a hora de fechar nossas portas.

Na reunião na ONU, o Brasil poderia mudar o curso da sua atuação e ser um exemplo para os poderosos países do norte que não estão cumprindo sua parte, assumindo um compromisso de aceitar, de forma significativa, mais refugiados sírios.

O Brasil deu passos iniciais com a emissão de mais de 8 mil vistos humanitários aos sírios. Por meio destes vistos, mais de 2 mil sírios se instalaram aqui. Ainda que esse não seja o modelo tradicional de reassentamento e não seja um programa permanente, está ajudando pessoas a mudarem de locais altamente vulneráveis para lugares mais seguros. Logo antes de deixar o cargo no governo de Dilma Rousseff, em agosto, o ex-ministro da Justiça, Eugênio Aragão disse que, com a ajuda internacional, o Brasil poderia receber 100 mil refugiados sírios, em grupos de 20 mil por ano.

Até agora, entretanto, o novo governo brasileiro manteve-se silente sobre o destino dos milhões de refugiados que desesperadamente precisam de ajuda. Pior, não foi dada continuidade às negociações com a Alemanha e a União Europeia, iniciadas pela administração anterior, para o financiamento de um programa de reassentamento no Brasil.

Novas formas de financiamento poderiam ajudar o Brasil a oferecer apoio, como a Alemanha faz, para que refugiados encontrem moradia e trabalho. Poderiam ajudar o Brasil a melhorar a sua capacidade para promover a integração de refugiados, proteger seus direitos e oferecer serviços especiais para aqueles que estão expostos a maior risco de discriminação, abuso e negligência.

Em 2004, o Brasil propôs um programa regional de reassentamento, principalmente para refugiados vindos de outros países latino-americanos. Em uma conferência regional realizada em 2014, em Brasília, a "Declaração de Brasil" reafirmou o compromisso com o programa.

Receber e reconhecer refugiados diante desta crise monumental é uma questão de responsabilidade compartilhada e solidariedade internacional. A reunião na Assembleia Geral da ONU oferece ao Brasil a oportunidade de reabrir as negociações com Alemanha e Europa e obter fundos internacionais para o reassentamento de refugiados. O Brasil deve voltar a se posicionar como um líder global compassivo e comprometido com a acolhida e integração dos refugiados.

 

Uma versão deste artigo foi publicada pelo jornal O Globo.

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