Angola tem sido notícia pelas piores razões. Cada vez mais alegações têm sido feitas de que as forças de segurança angolanas mataram centenas de pessoas, supostamente membros de uma seita religiosa, durante um motim na província de Huambo no qual foram mortos nove policiais. O governo já negou enfaticamente as alegações.
Nenhum investigador internacional conseguiu até agora ter acesso à área para confirmar ou refutar as acusações, mas talvez algum jornalista ou ativista angolano corajoso consiga encontrar alguma forma de recolher provas sobre o que realmente aconteceu em Huambo.
No entanto, não será o mais destacado jornalista e defensor dos direitos humanos de Angola, Rafael Marques de Morais, a fazê-lo. O jornalista está preparando sua defesa contra uma ação judicial com motivações políticas. Em 14 de maio, Rafael se apresentará perante a corte, na capital, Luanda, para se defender de uma lista de acusações de difamação.
As acusações têm por base o livro de Rafael Marques, publicado em 2011, Diamantes de Sangue: Corrupção e Tortura em Angola, que explica como oficiais militares angolanos e empresas de segurança privada mataram e aterrorizaram cidadãos angolanos residentes em áreas rurais para proteger lucrativas operações de extração de diamantes. O livro descreve 500 casos de tortura e 100 assassinatos levados a cabo por agentes privados de segurança e soldados angolanos nos distritos do Cuango e Xá-Muteba.
Imediatamente após a publicação do livro, Rafael Marques registrou uma denúncia em Luanda, na qual acusava nove generais angolanos de crimes contra a humanidade relacionados com a extração de diamantes. Em resposta, sete dos generais e alguns membros dos conselhos de administração de duas empresas de diamantes, a Sociedade Mineira do Cuango (SMC) e a ITM Mining, instauraram uma série de ações judiciais contra Marques, alegando difamação. A ação que instauraram em Portugal, onde o livro foi publicado, foi arquivada por falta de provas.
No entanto, o Procurador-geral angolano permitiu que o processo dos generais continuasse a seguir os trâmites legais em Angola. Ao mesmo tempo, o governo de Angola não deu seguimento à denúncia original de Rafael Marques, nem instaurou nenhuma investigação dos assassinatos e casos de tortura detalhados em seu livro.
Trata-se claramente de uma acusação com motivações políticas. As autoridades estão fazendo uso da legislação existente em matéria de difamação para ameaçar o jornalista com uma pena de prisão, o que se trata de uma punição extremamente severa e desproporcional para um mero exercício de liberdade de expressão. De certa forma, o fato de, aparentemente, os oficiais angolanos sentirem a necessidade de tomar medidas tão extremas − e ilegais − para silenciá-lo, é testemunho do poder do trabalho de Rafael Marques.
Rafael pode vir a pagar um preço bastante alto por sua coragem: até nove anos de prisão. No entanto, quem sai mais prejudicado deste julgamento é a população angolana, que continuará a sofrer com a corrupção e os crimes levados a cabo pela elite política e militar de Angola.