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(Washington, DC) - Um novo decreto presidencial do governo Obama relacionado a prisioneiros de Guantanamo detidos em nome da ‘lei de guerra' oferece um novo nível de revisão até então inexistente. No entanto, o decreto mantém a prática de prisão indefinida sem julgamento, prática esta que viola o direito internacional, disse hoje a Human Rights Watch.

O decreto presidencial anunciado no dia 7 de março de 2011 permite aos prisioneiros que não serão soltos, por serem considerados de alta periculosidade pelo governo, e que tampouco serão processados,  contestarem sua detenção perante uma nova Comissão de Revisão Periódica (Periodic Review Board ). Os prisioneiros cobertos pelo decreto serão reexaminados no prazo de um ano para determinar se eles representam ou não uma ameaça à segurança dos Estados Unidos.

Os prisioneiros poderão apresentar provas documentais a cada seis meses, mas comparecerão diante do júri completo apenas uma vez a cada três anos. Um "representante" será designado pelos militares para cada prisioneiro mas estes podem ser representados por um advogado de sua escolha sem qualquer ônus para o governo.

Muito embora esta nova disposição seja um grande avanço em relação ao sistema atual, que não considera esta revisão, a prática americana de detenção indefinida sem julgamento ainda não atende aos elementos mais básicos do devido processo legal de acordo com o direito internacional, disse a Human Rights Watch.  No entanto, é importante ressaltar que este novo decreto se aplica estritamente aos prisioneiros atualmente detidos em Guantanamo, e não aos prisioneiros que possam vir a ser capturados no futuro. Essa distinção imposta pelo novo decreto é uma limitação significante da exigência pela renúncia total de autoridade sobre as detenções  pleiteada pelos críticos da administração.

"A revisão adicional é um grande avanço? Sem dúvida. Legaliza a política de detenção americana? Não", disse Andrea Prasow, consultora sênior de contra-terrorismo da Human Rights Watch. "Assinar um decreto presidencial não legaliza a detenção e a prisão indeterminada de indivíduos sem apresentar provas de que cometeram um crime".

Atualmente, 172 prisioneiros estão detidos em Guantanamo. O governo Obama condenou 47 a detenção indefinida sem direito a julgamento, e encaminhou outros 36 a julgamento. Os 89 restantes foram transferidos. O decreto presidencial limita-se aos 47 prisioneiros que foram condenados a prisão indefinida, bem como qualquer outro prisioneiro que tenha sido identificado para ser processado mas que não tenha ainda qualquer acusação pendente. Ao limitar desta maneira a alçada do decreto presidencial - e excluindo futuros suspeitos de terrorismo do decreto - a Casa Branca mostrou certa relutância em expandir a detenção indefinida para além dos casos que herdou do governo Bush.

"Autorizar a detenção indefinida de futuros suspeitos de terrorismo teria criado uma ameaça real de um regime permanente de detenção indefinida para qualquer pessoa que o governo considere perigosa", disse Prasow. "Mas ao limitar a abrangência do decreto para um número específico de prisioneiros, o Presidente Obama restringiu seu governo a adotar esta prática apenas para os casos mal conduzidos deixados por seu antecessor".

Estava incluído no decreto o anúncio de uma decisão do governo Obama de procurar ratificar o Protocolo II Adicional das Convenções de Genebra de 1949 sobre conflitos armados não-internacionais, que a Human Rigths Watch apóia firmemente. Muito embora a Human Rights Watch há muito tempo venha insistindo que o governo americano também ratifique o  Protocolo Adicional I sobre conflitos internacionais armados, o reconhecimento do artigo 75, que versa sobre as garantais fundamentais como sendo uma "obrigação legal" por parte da Casa Branca é um grande avanço.

Juntamente com o decreto, a Casa Branca também anunciou que retomaria o uso dos processos conduzidos pelas comissões militares em Guantanamo. O uso das comissões para o julgamento de novos casos foi suspenso logo após a posse de Obama ficando no aguardo de uma revisão abrangente, recém concluída pelo governo, da situação de cada prisioneiro de Guantanamo. O decreto também afirma que o governo Obama tem o firme propósito de encaminhar alguns dos casos aos tribunais federais civis.

Embora a confirmação do compromisso do governo de processar na justiça criminal suspeitos de terrorismo seja um passo bem vindo, a Human Rights Watch se opõe firmemente ao uso continuado de julgamentos por comissões militares. A corte federal americana permanece o único meio legítimo e viável de processar suspeitos de terrorismo. As comissões militares de Guantanamo foram prejudicadas por problemas processuais, pelo uso de provas obtidas por coerção, pela aplicação inconsistente de regras variáveis de evidências, má tradução, e falta de acesso público. Qualquer veredicto nelas obtido está vulnerável à revisões de apelações e não oferecerá nenhum caráter definitivo de justiça.

Ademais, comparadas aos tribunais federais, as comissões militares caminham muito lentamente. Durante os nove anos desde que as comissões militares foram anunciadas pela primeira vez os juízes militares concluíram apenas seis casos, sendo quatro por autocomposição. Os tribunais federais, por outro lado julgaram centenas de atos relacionadas ao terrorismo durante o mesmo período, condenando entre outros o conspirador Zacarias Moussaoui do 11 de setembro, e Richard Reid conhecido como "shoe bomber".

"Qualquer julgamento pelo sistema de comissão militar carrega o estigma de Guantanamo e será maculado pela falta de devido processo legal", disse Prasow. "Um veredicto no sistema da corte federal, por outro lado, seria reconhecido internacionalmente como legítimo."

Embora no final de 2010 o Congresso tenha imposto restrições à capacidade do governo de transferir detentos para os EUA, mesmo para julgamento e para expatriá-los para outros países ou seu país natal, essas restrições se aplicam apenas ao uso de fundos do Departamento de Defesa e expiram no final deste ano. O governo ainda pode usar os fundos do Departamento de Justiça ou de Segurança Interna para o mesmo propósito.

"O presidente Obama deve usar imediatamente os fundos para dar continuidade aos julgamentos já muito atrasados dos casos de terrorismo ligados ao 11 de setembro e outros casos de terrorismo na corte federal", disse Prasow. "Ele deve oferecer um julgamento adequado a estes prisioneiros em vez de mantê-los detidos sem uma acusação sob este novo decreto."

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