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Por que os agrotóxicos deveriam estar na agenda da COP30

Publicado em: NEXO
Carina, uma estudante adulta de uma escola no município de Primavera do Leste, Mato Grosso, observa uma plantação de algodão. Carina sofreu uma intoxicação aguda quando frequentava a escola em 2017: “Eu comecei a vomitar várias vezes, até que vomitei tudo que tinha no estômago e continuei com ânsia. As aulas foram canceladas para todo mundo e eu fui para casa.” © 2018 Marizilda Cruppé para Human Rights Watch

Em junho, uma pequena agricultora do Maranhão, no nordeste do Brasil, me descreveu seu horror quando, em 2021, seu filho de oito anos apareceu encharcado depois que um avião pulverizou agrotóxicos sobre sua comunidade. A criança pensou que tinha sido molhada com água. “Aquele avião está pulverizando veneno”, ela se lembra de ter dito antes de levá-lo correndo para o banho. A mulher disse que, quando o menino saiu do chuveiro, sua pele estava inteiramente vermelha e, quando acordaram no dia seguinte, estava coberta de bolhas e erupções. As feridas que cobriam seu corpo infeccionaram a ponto de “as pessoas dizerem que ele estava começando a apodrecer”.

A experiência deles é a de muitas comunidades na linha de frente da expansão do agronegócio no Brasil, onde a pulverização de agrotóxicos faz parte da pressão imposta aos pequenos agricultores e às comunidades quilombolas e indígenas para que abram mão de suas terras para dar lugar a fazendas industriais. Em alguns casos, grandes fazendeiros têm usado pesticidas para desmatar a floresta, uma prática chamada de “desmatamento químico”.  

A cúpula climática global deste ano, COP30, que será realizada em Belém de 10 a 21 de novembro, será um campo de batalha entre as empresas agrícolas que utilizam agrotóxicos e os agricultores familiares, que apresentarão visões diferentes sobre os danos causado por essas práticas industriais e o futuro da produção sustentável de alimentos.

Será uma batalha difícil para os agricultores que adotam uma abordagem holística, evitando agrotóxicos nocivos. A Aliança Global para o Futuro dos Alimentos descobriu que apenas 1,5% do financiamento climático está sendo direcionado para sistemas agroecológicos sustentáveis. O Climate Focus, um grupo de analistas de políticas climáticas, estimou que os pequenos agricultores recebem cerca de 0,3% do financiamento climático internacional, apesar de produzirem cerca de um terço dos alimentos do mundo.  

Ao mesmo tempo, muitas empresas agrícolas poderosas estarão presentes na COP30 para proteger o status quo que promove e financia seus negócios movidos por agrotóxicos. Essas empresas agrícolas reforçarão sua presença na COP30 através da “Agrizone”, um espaço de eventos destinado ao setor, financiado com recursos privados e organizado pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), uma empresa pública.  

No entanto, a ênfase da COP30 na implementação de sistemas alimentares sustentáveis deveria abordar a questão das violações dos direitos humanos por parte do agronegócio contra aqueles que vivem nas margens de suas fazendas.

Apesar dos riscos da exposição a certos agrotóxicos, que incluem câncer, distúrbios hormonais, infertilidade, aborto espontâneo, impactos negativos no desenvolvimento fetal, doenças neurológicas e morte, os legisladores brasileiros continuam a reduzir as proteções para as comunidades vizinhas às fazendas industriais, inclusive diminuindo as zonas de segurança e enfraquecendo os sistemas regulatórios. À medida que as proteções enfraquecem, a intensidade e o risco dos danos causados pelos agrotóxicos aumentam.

“Há famílias que tentam resistir”, disse-me uma organizadora sindical rural no Pará. “Mas chega um momento em que elas não conseguem porque realmente não aguentam mais o problema dos agrotóxicos.” Sob essa pressão, toda a estrutura da comunidade desaparece. A escola fecha, a igreja fecha. Para aqueles que permanecem, as ameaças aumentam. Ela disse que capangas das fazendas vizinhas vão até as famílias remanescentes e ameaçam: “ou vocês vendem suas terras ou sofrerão as consequências… Vamos ver quanto tempo vocês aguentam”. E então são lançados mais agrotóxicos.

A pequena agricultora do Maranhão disse que gastou uma fortuna em cuidados médicos para seu filho, às vezes deixando a família sem comida para pagar os remédios. Ela disse que, desde então, o menino desenvolveu asma, que é desencadeada toda vez que os agrotóxicos são pulverizados nos campos das grandes fazendas industriais ao redor da comunidade, pelos quais ele precisa passar para chegar à escola. Depois que a mulher e seus vizinhos entraram com uma ação judicial contra a fazenda vizinha por causa da pulverização, ela disse que capangas apareceram ameaçando-a: se ela não desistisse, “acordaria com a boca cheia de formigas”.

Quando perguntamos a essa agricultora se ela já havia pensado em se mudar por causa das ameaças e da exposição constante aos agrotóxicos, nos disse que não. “Nascemos aqui; amamos este lugar. A única área florestal que temos é onde moramos. Vivemos no meio das fazendas, mas pertencemos a esta comunidade.”

As delegações da COP30 deveriam ouvir os pequenos agricultores e assumir compromissos financeiros para apoiar abordagens agroecológicas para a produção de alimentos. Os pequenos agricultores podem não ter uma “Agrizone” na COP30, mas têm soluções para a produção de alimentos diante da crise climática.

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