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Brasil tem de proibir bombas de fragmentação

Submunições destruirão vidas e meios de subsistência por muitos anos, até que sejam removidas e destruídas

Publicado em: O Globo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem frequentemente demonstrado interesse em liderar negociações de paz para o conflito entre a Rússia e a Ucrânia e expressado preocupação com gastos militares excessivos. Isso se revelou, mais uma vez, em seu discurso de 17 de julho, em Bruxelas, na reunião de cúpula de presidentes da América Latina e do Caribe com presidentes da União Europeia.

Ele poderia ter usado melhor seu capital político e criticado a recente decisão do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, de enviar munições de fragmentação para a Ucrânia, medida que poderá colocar em risco a vida de mais civis ucranianos nos próximos anos. A voz de Lula está inacreditavelmente ausente no clamor global contra a decisão de Biden. Entretanto qualquer crítica que ele fizesse à transferência e ao uso de bombas de fragmentação poderia ter colocado os holofotes sobre o papel do Brasil na produção e comercialização desse tipo de arma, que mata e fere civis, deixando submunições não detonadas que representam um perigo por um longo período de tempo após o fim dos conflitos.

Desde a invasão em grande escala da Rússia na Ucrânia em fevereiro de 2022, a Human Rights Watch tem documentado amplamente que as forças russas usaram de forma repetida bombas de fragmentação em ataques que resultaram em centenas de civis mortos e feridos, inclusive crianças, danificaram a infraestrutura civil e contaminaram terras agrícolas. Um relatório recente da ONG concluiu que as forças ucranianas também usaram esse tipo de munição numa cidade e seus arredores, causando mortes e ferimentos em civis.

As munições de fragmentação que a Rússia e a Ucrânia estão usando agora estão contaminando o país com submunições explosivas que destruirão vidas e meios de subsistência por muitos anos, até que sejam removidas e destruídas.

Mais da metade dos países do mundo — 123 — assinou ou ratificou a Convenção sobre Munições de Fragmentação de 2008, que proíbe qualquer produção, uso, transferência e armazenamento dessas armas. A Convenção também determina a destruição dos estoques, a limpeza das terras contaminadas por fragmentos de munição e a assistência às vítimas. A Ucrânia, a Rússia e os Estados Unidos não ratificaram a convenção. O Brasil também não.

O Brasil produziu munições de fragmentação no passado e não tomou nenhuma medida para parar a produção dessas armas. Uma coalizão de países liderada pela Arábia Saudita usou munições de fragmentação de fabricação brasileira no Iêmen em 2017, de acordo com investigações da Human Rights Watch e de outros. Os ataques da coalizão à cidade de Saada, por exemplo, no norte do Iêmen, usando munições de fragmentação brasileiras, mataram dois civis e feriram pelo menos seis, incluindo uma criança.

Em junho, o Congresso brasileiro arquivou um Projeto de Lei que teria proibido o uso, a produção e o comércio de munições de fragmentação. Um parlamentar não escondeu o cinismo do raciocínio em oposição ao projeto, dizendo que ele teria como “único efeito prejudicar a indústria bélica brasileira”.

Se o presidente Lula está realmente preocupado com a devastação causada pelo que chama de “máquina da guerra”, deveria dar fim à produção brasileira de bombas de fragmentação e articular, sem demora, com o Congresso a aprovação da Convenção sobre Munições de Fragmentação, com vistas à sua ratificação.

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