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(Beirute) – As alterações propostas ao Código Penal do Irã violam os direitos de pessoas acusadas e réus criminais, afirmou a Human Rights Watch em relatório lançado hoje. As autoridades iranianas devem suspender a promulgação das alterações propostas e realizar uma revisão minuciosa de leis penais abusivas, disse a Human Rights Watch.

O relatório de 48 páginas, “Codificando a Repressão: Uma Avaliação do Novo Código Penal do Irã”, afirma que muitas disposições do código penal vigente são problemáticas e não são tratadas nas alterações propostas. Algumas alterações enfraqueceriam ainda mais os direitos dos réus ou pessoas condenadas por crimes e dariam aos juizes amplos poderes para impor punições que violam os direitos dos acusados. Membros do legislativo e do judiciário tem citado as emendas como uma tentativa séria por parte do Irã de cumprir com as suas obrigações internacionais em direitos humanos.

“Essas alterações pouco abordam as disposições do Código Penal que permitem que o governo prenda, torture e execute pessoas que criticam o governo”, disse Joe Stork, diretor adjunto para o Oriente Médio da Human Rights Watch. “Se o Irã quiser cumprir com as suas obrigações de direitos humanos, deve proibir categoricamente práticas deploráveis como a execução de crianças e as punições de amputação e apedrejamento.”

Em janeiro de 2012, o Conselho Guardião, órgão não eleito de 12 juristas religiosos encarregados de examinar toda legislação a fim de garantir a sua constitucionalidade e compatibilidade com a Lei Sharia ou Lei Islâmica, aprovou o texto final das alterações ao Código Penal. O Parlamento e outros órgãos de fiscalização também aprovaram o texto final mas o Presidente Mahmoud Ahmadinejad ainda não promulgou a proposta. O Aiatolá Sadegh Larijani, chefe do judiciário iraniano, ordenou que os tribunais do Irã apliquem o Código Penal antigo até que Ahmadinejad sancione as novas alterações em lei, o que pode acontecer a qualquer momento.

O Código Penal do Irã de 1991 reflete a interpretação de clérigos da Lei Sharia com base na jurisprudência da escola de Jafari ou Twelver Shia. Essa interpretação inclui punições discricionárias (ta’zir) não especificamente previstas na lei Sharia que se aplicam à maioria das leis nacionais iranianas de segurança, segundo as quais os dissidentes políticos são condenados e sentenciados em tribunais revolucionários.

As alterações mais recentes modificam os três tipos de punições previstas na lei Sharia: hadd - crimes contra Deus, como o adultério e a bebida alcólica, para os quais a lei Sharia atribui punições fixas e específicas; qesas – justiça retributiva, muitas vezes reservada para casos de assassinato; e diyeh – a indemnização das vítimas, ou “dinheiro de sangue”.

As deficiências mais graves das novas disposições incluem a manutenção da pena de morte para menores e por crimes que não são considerados graves no direito internacional, disse a Human Rights Watch. As alterações também não definem de forma clara e não estabelecem no código vários crimes passíveis de punições graves, inclusive a pena de morte.

As propostas também incluem leis relacionadas a segurança nacional que são definidas ou formuladas amplamente e criminalizam o exercício de direitos fundamentais. Além disso, continuam permitindo punições que equivalem à tortura ou tratamento cruel e degradante, como o apedrejamento, o açoitamento e a amputação.

As alterações também reforçam disposições discriminatórias contra as mulheres e minorias religiosas.

Ao contrário das afirmações oficiais de que as alterações proibiriam a execução de pessoas com menos de dezoito anos, a nova lei mantém a pena de morte para crianças em certas circunstâncias. Crianças condenadas por crimes ta’zir ou discricionários, como aqueles relacionados às drogas, já não poderão ser condenados à morte, mas sim a programas correcionais e de reabilitação.

Mas o novo código explicitamente liga a idade de responsabilidade penal à idade da maturidade ou puberdade segundo a lei da Sharia na jurisprudência iraniana – nove anos para meninas e quinze anos para meninos. Um juiz poderá, portanto, sentenciar à morte uma menina de apenas 9 anos ou um menino de apenas quinze anos condenado por um "crime contra Deus" (qesas), tal como a sodomia ou assassinato, se o juiz determinar que a criança compreendia a natureza e as consequências do crime.

O Irã continua sendo o líder mundial em execuções de pessoas condenadas por delitos cometidos quando tinham menos de dezoito anos. O governo afirma que o Irã não executa crianças porque as autoridades esperam até os menores completarem dezoito anos para executá-los. Em 2011, havia pelo menos 143 menores condenados a morte em prisões iranianas, a grande maioria por supostos crimes de estupro e assassinato. Essas sentenças de morte não serão afetadas pelas alterações previstas.

“A proibição absoluta contra a execução de menores condenados por crimes discricionários, como o tráfico de drogas, já deveria ter sido aprovada há muito tempo”, disse Stork. “Mas a proibição é de pouco consolo para as famílias de dezenas de crianças atualmente condenadas a morte por outros crimes.”

As novas alterações ainda permitem a pena de morte para atividades que não deveriam sequer constituir crimes – como é o caso de determinados tipos de relações sexuais consensuais fora do casamento – ou que não deveriam constar entre os “crimes mais sérios” (geralmente aqueles que levam a morte da vítima) perante o direito internacional. Outros crimes que levam à pena de morte nas novas disposições incluem insultar o Profeta Maomé e a posse ou venda de drogas ilícitas.

O novo Código Penal permite que juízes usem fontes religiosas, incluindo a lei da Sharia e fatwas emitidas por clérigos de alto escalão xiitas, para condenarem pessoas por apostasia ou emitirem sentenças de apedrejamento em casos de adultério. Mas não há crime de apostasia no novo código penal, e a punição de apedrejamento em casos de adultério foi eliminada nas novas disposições.

As novas disposições também expandem os crimes de segurança nacional vagamente definidos e impõe punições ao exercício do direito à liberdade de expressão, associação e reunião. Uma emenda preocupante diz respeito ao artigo 287, que define o crime de efsad-e fel arz, ou “semeadura de corrupção sobre a terra.” Os legisladores expandiram a definição de efsad-e fel arz, um crime de hadd anteriormente mal definido relacionado ao moharebeh (inimizade contra Deus), usado para condenar à morte dissidentes políticos que estariam envolvidos em atividades armadas ou relacionadas com “organizações terroristas.” A nova definição também inclui atividades claramente não-violentas, como a “publicação de mentiras”, “operação ou gerenciamento de centros de corrupção ou prostituição”, ou “que produz danos à economia do país” se essas ações “perturbarem gravemente a ordem pública e a segurança da nação.”

Sob o código penal vigente, as autoridades executaram pelo menos 30 pessoas desde janeiro de 2010 sob a acusação de “inimizade contra Deus” ou “semeadura de corrupção na terra” por supostos vínculos com grupos armados ou terroristas. Sabe-se que pelo menos 28 presos curdos aguardam execução por crimes contra a segurança nacional, inclusive “inimizade contra Deus”. A Human Rights Watch documentou vários casos onde as provas sugerem que as autoridades judiciais iranianas condenaram, sentenciaram e executaram pessoas simplesmente porque eram dissidentes políticos e não por terem cometido atos terroristas.

A Human Rights Watch se opõe à pena de morte em todas as circunstâncias porque é uma medida unicamente cruel e marcada pela arbitrariedade, pelo preconceito e por erros. Além disso, os julgamentos iranianos envolvendo crimes capitais apresentaram violações graves ao devido processo legal e as normas internacionais sobre julgamentos justos.

As autoridades iranianas deveriam revogar as penas mantidas ou permitidas que equivalem à tortura ou tratamento cruel e desumano, como o açoitamento, a amputação e o apedrejamento, disse a Human Rights Watch.

“Estas alterações do Código Penal não são nada mais do que uma continuação do condenável histórico do Irã no que diz respeito a administração da justiça nos tribunais,” disse Stork. “Uma reforma penal real no Irã exigiria a suspensão e revisão do código penal iraniano que tem sido uma ferramenta de repressão sistemática nas mãos das autoridades, inclusive do judiciário.”

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