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Brasil: Avanço na Responsabilização de Crimes Ocorridos Durante o Governo Militar

Processo criminal em São Paulo contra militar reformado e delegado de polícia civil

(Washington, D.C) – A Human Rights Watch afirmou hoje que a denúncia oferecida no dia 24 de abril de 2012 contra um militar reformado e um delegado de polícia civil por graves abusos cometidos na década de 70 é um passo importante para a responsabilização destes atos no Brasil.

Trata-se do segundo caso no Brasil – e o primeiro em São Paulo – em que uma denúncia criminal é apresentada contra agentes estatais brasileiros por crimes contra os direitos humanos cometidos durante o regime militar no país (1964-1985). Neste período, pelo menos 475 pessoas foram mortas ou vítimas de desaparecimento forçado e milhares foram ilegalmente detidas ou torturadas.

“Essa é a segunda denúncia em dois meses por atrocidades cometidas durante o governo militar no Brasil”, afirmou José Miguel Vivanco, diretor executivo da Divisão das Américas da Human Rights Watch. “Pode ser o início de uma nova era de responsabilização no país, apesar de que, em última análise, serão os tribunais que determinarão se o país está finalmente disposto a julgar esses graves crimes”.

No caso de São Paulo, os procuradores da República acusaram Carlos Alberto Brilhante Ustra, militar reformado, e Dirceu Gravina, delegado de polícia civil,de“sequestro qualificado” por seu suposto envolvimento no desaparecimento forçado de Aluízio Palhano Pedreira Ferreira em maio de 1971.Um juiz federal de uma vara criminal da subseção judiciária de São Paulo determinaráse o caso irá a julgamento.

Em 14 de março, procuradores da República acusaram o coronel da reserva Sebastião Curió Rodrigues de Mourade“sequestro qualificado” por seu suposto envolvimento em cinco desaparecimentos forçados de militantes da Guerrilha do Araguaia no estado do Pará em 1974.

Ferreira era membro da Vanguarda Popular Revolucionária.  Segundo procuradores da República, testemunhas o viram pela última vez sob custódia policial no Destacamento de Operações Internas do Centro de Operações de Defesa Interna – DOI-CODI-SP. Até hoje, o seu destino é desconhecido.
Até recentemente, a lei de anistia de 1979 impediu a realização de processos criminais relacionados aos abusos cometidos durante o regime militar. Em novembro de 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos afirmou, em Gomes-Lund
et al. (Guerrilha do Araguaia) v. Brasil,que“as disposições da Lei de Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanossão incompatíveis com a Convenção Americana, carecem de efeitos jurídicos e não podem seguir representando um obstáculo para a punição dos responsáveis”.

O desaparecimento forçado é terminantemente proibido pelo direito internacionalhumanitário.   Não é justificável no contexto de conflitos armados ou operações policiais, podendo constituir um crime de guerra ou crime contra a humanidade.

Como membro da Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra o Desaparecimento Forçado, ratificada pelo país em novembro de 2010, o Brasil está especificamente obrigado a garantir que, sempre que houver crime, haja investigação e processo penal, além de uma reparação legal para a vítima. O Brasil não apresentou reservas a respeito da aplicação da Convençãoa casos de desaparecimentos em curso ou anteriores à ratificação dessa Carta. Enquanto o cadáver de uma vítima de desaparecimento forçado não for recuperado e não houver informações sobre o seu destino, o crime continua e as leis de anistia não se aplicam.

Além disso, o princípio da irretroatividade da lei penal não impede a punição de atos reconhecidos como criminosos pelo direito internacional no momento em que ocorreram, afirmou a Human Rights Watch. O Artigo 15 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (PIDCP), ratificado pelo Brasil em 1992, dispõe especificamente que “nenhuma disposição do presente Pacto impedirá o julgamento ou a condenação de qualquer indivíduo por atos ou omissões que, no momento em que foram cometidos, eram considerados delituosos de acordo com os princípios gerais de direito reconhecidos pela comunidade das nações”.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a natureza continuada do desaparecimento forçado no julgamento recente das Extradições 974 e 1150 requeridas pelo Estado argentino.  Na Extradição 1150, o Ministro Cesar Peluso entendeu que em casos de “desaparecimento” de pessoas seqüestradas por agentes estatais, somente uma sentença na qual esteja fixada a data provável do óbito é apta a fazer cessar a permanência de seqüestro.  Até então, “o homicídio não passa de mera especulação.”

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