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João Maria Figueiredo em serviço. Foto da conta de facebook pessoal de Figueiredo
O policial militar do Rio Grande do Norte João Maria Figueiredo tinha apenas 34 anos quando o conheci no final de 2016 em um encontro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Na época, eu e um colega coletávamos depoimentos de policiais que, como João, tinham enfrentado punição desproporcional do comando da polícia por expressarem opiniões divergentes de seus superiores.

Com seu sotaque melódico nordestino e voz imponente, João fazia uma defesa apaixonada e convincente dos direitos dos policiais. Ele entendia a importância de uma polícia eficiente para proteger a sociedade da criminalidade e criticava práticas abusivas de alguns policiais que prejudicavam a eficácia da instituição como um todo. João contribuiu imensamente para a nossa pesquisa, detalhando sua história de luta e compartilhando contatos.

Infelizmente, às vésperas do natal, assassinos tiraram a vida desse jovem e ativo policial. Dois homens ainda não identificados atiraram em João enquanto ele passava de moto nos arredores de Natal. Ferido no ombro, João tentou fugir, mas os assassinos continuaram a atirar até ele sucumbir.

A notícia me deixou profundamente triste mas não me espantou. João era um policial franco e direto, com visões fortes sobre segurança pública. Amigos relataram que ele estava recebendo ameaças.
 
Não poderia haver pior momento para perder uma voz tão poderosa como a de João. A opção generalizada por uma política de segurança baseada no confronto tem escalado a matança de civis e de policiais. E ao invés de denunciar o uso excessivo da força por parte de policiais, o novo governo vem defendendo uma estrategia de segurança pública cada vez mais militarizada e brutal.
 
João era um dos líderes no Rio Grande do Norte do movimento “Policiais Antifascismo”, que reúne policiais civis e militares a favor de uma polícia mais próxima da população, com vistas a melhorar a segurança pública.
 
Melhorar a segurança pública é essencial em um país que em 2017 atingiu um novo recorde, com cerca de 64.000 homicídios, e onde policiais mataram 5.144 pessoas no mesmo ano, 20% a mais do que no ano anterior.
 
As pessoas que atiraram em João podem ter cumprido as ameaças que fizeram contra ele. Investigadores de polícia disseram à imprensa que os assassinos não levaram o dinheiro, nem a moto de João. Acreditam que foi provavelmente executado.
 
O fato é que João se tornou parte de uma triste estatística, a de que, em média, um policial é morto a cada dia no Brasil - 367 só em 2017, último ano para o qual existem estatísticas oficiais. Este é o outro lado da horrível tendência de uma alta taxa de mortes causadas pela polícia.
 
Ao defender uma força policial mais próxima e mais cooperativa com a comunidade, João provavelmente sabia que o elevado número de mortes de civis e de policiais pode estar relacionado. Quando a polícia se comporta como um exército em guerra, combatendo o inimigo, nas comunidades que eles deveriam proteger, é muito menos provável que os moradores cooperem com a polícia, alertando-a de ataques ou auxiliando-a em suas investigações. Criminosos, quando encurralados, são menos propensos a se renderem pacificamente se acreditarem que serão executados pela polícia.
 
O novo governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, vem defendendo que a polícia ”abata” qualquer indivíduo que carregue um fuzil, sem aviso, mesmo que a pessoa não esteja ameaçando ninguém. É preciso esclarecer que os padrões internacionais de direitos humanos somente permitem que a polícia mate alguém deliberadamente quando necessário para proteger sua própria vida ou a de terceiros.
 
Como João continuava a repetir, muito mais precisa ser feito pra proteger os direitos e a vida dos policias, e também pra garantir que eles estejam protegendo adequadamente as comunidades que servem.

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