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(Jacarta) – Na região serrana central da remota província de Papua, uma área fechada a observadores externos, a polícia parece cometer, impunemente, recorrentes e sérios abusos, como execuções extrajudiciais, tortura e estupro, disse a Human Rights Watch em um relatório divulgado hoje. O abuso policial endêmico tem aprofundado a desconfiança no governo nacional em Jacarta e tem, potencialmente, inflamado tensões separatistas.

O relatório de 93 páginas, Out of Sight: Endemic Abuse and Impunity in Papua’s Central Highlands (Fora de alcance: Abuso e impunidade endêmicos na região serrana central de Papua), é o produto de mais de um ano de pesquisas. O relatório documenta abusos diários por agentes policiais e por outras forças de segurança na montanhosa e isolada região serrana da província indonésia de Papua, localizada na metade ocidental da ilha de Nova Guiné.

Uma descoberta importante do relatório é o fato de a polícia, principalmente os agentes da BRIMOB (brigada móvel da polícia, efetivo de elite paramilitar usado para emergências), ser responsável pelas mais sérias violações na região atualmente, apesar de continuarem a surgir denúncias de tratamento brutal por soldados indonésios.

“As condições na região serrana central de Papua são um teste importante de como as forças de segurança indonésias atuam quando as tensões políticas são grandes e as regiões são fechadas a observadores externos”, disse Joseph Saunders, diretor adjunto de programas da Human Righs Watch. “A polícia está falhando terrivelmente no teste.”

O novo relatório é uma continuação do relatório da Human Rights Watch publicado em fevereiro, Protest and Punishment: Political Prisoners in Papua (Protesto e castigo: Prisioneiros políticos em Papua), que documentou restrições graves às liberdades de expressão, assembléia e associação em Papua.

Muitos dos abusos policiais documentados no relatório são particularmente cruéis. Um homem contou a Human Rights Watch o que aconteceu quando 12 oficiais da BRIMOB o prenderam junto com alguns amigos por fazer um levantamento pacífico da bandeira de independência:

“Meus dentes caíram. O sangue escorreu. Me bateram. Fui chutado por duas vezes e depois recebi mais dois chutes no estômago. Me chutaram no nariz, na boca e nos dentes. Outra ordem foi dada e tudo se repetiu. Perdi as contas de quantas vezes. Vi meus amigos recebendo o mesmo tratamento. O sangue deles escorria e não era permitido que fossem ao banheiro. Mandaram que engolíssemos nosso sangue. Meu nariz sangrava. Mandaram que engolíssemos o sangue novamente. Eu não sei o nome do agente que estava no comando. Todos eles nos bateram, um de cada vez.”

Outro homem contou que apanhou da polícia enquanto testemunhava a prisão de outra pessoa:

“Apanhei nas costas com o cabo de uma arma e no rosto com os punhos. Minha boca e olhos foram golpeados e estavam sangrando. Me senti tonto e caí. Imediatamente, fui chutado por cinco membros da polícia e da BRIMOB. Todos vestiam uniformes oficiais completos e estavam armados... Eu estava praticamente inconsciente quando cinco membros da polícia me colocaram no carro. Enquanto me levavam, me bateram nas costas três vezes com cabos de fuzis e, quando estava no carro, me bateram com um cassetete.”

A Human Rights Watch escreveu aos chefes da polícia e do comando militar em Papua, solicitando informações a respeito dos casos documentados no relatório, mas não obteve resposta.

A falta de responsabilização interna e um sistema judiciário que funciona precariamente significam impunidade para os autores de abusos em Papua.

“Ninguém está sendo processado pelos crimes que documentamos”, disse Saunders. “A polícia está agindo como se fosse a própria lei.”

As províncias indonésias de Papua e Papua Ocidental estão fechadas a observadores externos de direitos humanos. Jornalistas têm acesso extremamente limitado. Muitos diplomatas contaram à Human Rights Watch que têm pouco conhecimento da situação nas províncias, uma vez que não há muitos relatos independentes a respeito das condições no local. É ainda mais difícil conseguir informações confiáveis sobre a remota região serrana central.

A Human Rights Watch solicitou ao governo indonésio que abra as províncias a observadores independentes para que haja um aumento da quantidade e da qualidade das informações sobre as condições na região, e que permita que investigações independentes e transparentes ocorram.

“Ao manter a região fechada à vigilância externa, oficiais em Jacarta estão recebendo informações tendenciosas e parciais do que está acontecendo”, disse Saunders. “Informações confiáveis são essenciais caso as autoridades estejam genuinamente interessadas em identificar problemas e encontrar soluções duradouras.”

Por anos, a região serrana central tem servido de cenário para confrontos geralmente tensos entre a polícia indonésia e unidades militares e pequenas células de guerrilhas do movimento separatista Papua Livre (Organisasi Papua Merdeka, ou OPM). As guerrilhas pró-independência têm realizado ataques armados de baixo nível contra as forças de segurança indonésias, que continuam a conduzir operações “de limpeza” em áreas civis, espalhando medo e pânico na região e levando muitos habitantes a abandonarem seus lares.

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