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Novos casos de Zika no Brasil ofuscados por Covid-19

579 casos em três meses revelam a importância de se garantir direitos reprodutivos e saneamento

Raquel, 25, com sua filha Heloisa, no município de Areia, no estado da Paraíba, no Brasil. Raquel deu à luz filhas gêmeas com síndrome de Zika em abril de 2016. “Eu quero dar o melhor de mim para minhas filhas”, disse ela em entrevista à Human Rights Watch.  © 2017 Ueslei Marcelino/Reuters

Com a Covid-19 ocupando maior parte das manchetes, o vírus Zika continua silenciosamente deixando mulheres e crianças expostas a graves riscos no Brasil. O país não tem adotado medidas suficientes para combater a doença transmitida por mosquitos, tampouco para ajudar as famílias afetadas pelo vírus.

O Ministério da Saúde do Brasil identificou 579 novos casos suspeitos de Zika entre dezembro de 2019 e fevereiro de 2020. Uma infecção por vírus Zika durante a gravidez pode causar microcefalia e outras condições congênitas em bebês.

O surto de Zika entre 2015 e 2016 no Brasil afetou desproporcionalmente mulheres e meninas, e ampliou problemas de direitos humanos de longa data, incluindo acesso inadequado à água e saneamento, acesso desigual à serviços de saúde para as famílias mais pobres, e restrições a direitos sexuais e reprodutivos. A resposta do governo ao surto não conseguiu, em grande parte, resolver esses problemas e deixou mulheres e meninas à mercê da doença quando ela voltou.

Milhares de crianças no nordeste do Brasil nasceram com deficiências ligadas ao vírus e suas famílias lutam por seus direitos desde então. A Covid-19 piorou a situação: os estados concentraram seus esforços na resposta ao coronavírus e, pelo menos em alguns locais, cancelaram a terapia e acompanhamento para crianças afetadas pelo Zika.

Em abril de 2020, o Supremo Tribunal Federal rejeitou, por questão técnica, sem discutir o mérito da ação, uma petição que poderia ter ajudado essas famílias. O caso buscava garantir acesso a benefícios e serviços, incluindo atendimento médico, para as famílias afetadas pelo Zika, bem como medidas preventivas para populações em risco. Buscava também garantir acesso a contraceptivos e assegurar o direito das pessoas infectadas durante a gestação de escolherem prosseguir ou não com a gravidez.

O aborto é legal no Brasil apenas em casos de estupro, ou quando necessário para preservar a vida da mulher, ou quando o feto tem anencefalia. Muitas mulheres grávidas precisam escolher entre continuar uma gravidez de risco ou indesejada e procurar métodos inseguros para interrompê-las.

As gestantes deveriam ter acesso a informações e a testes de diagnóstico que mostrem se a gravidez pode ser afetada pelo Zika, e deveriam contar com aborto seguro, legal e acessível, caso decidam interromper a gravidez.

A prevenção básica de doenças permanece fora do alcance de muitos brasileiros. Mais de um terço dos mais de 208 milhões de pessoas no Brasil não tem acesso a um fornecimento contínuo de água. Isso pode ser letal, quando a lavagem frequente das mãos é fundamental na prevenção da Covid-19, e a água armazenada de forma inapropriada em residências sem água corrente pode ser um criadouro de mosquitos que transmitem o Zika.

O Brasil deveria responder tanto à Covid-19 quanto ao Zika, com base nos direitos humanos – como o direito à água e ao saneamento, e direito de acesso aos serviços e informações relacionados à saúde reprodutiva, incluindo abortos legais, métodos contraceptivos e assistência pré-natal e ao parto.

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