(Rio de Janeiro) – Execuções extrajudiciais e tortura cometidos por policiais contribuem para um ciclo de violência no Brasil, prejudicando a segurança pública e colocando em risco as vidas de policiais, disse hoje a Human Rights Watch em seu Relatório Mundial 2017.
Execuções tornam menos provável que membros de facções criminosas se entreguem pacificamente quando abordados pela polícia, motivando-os a matarem policiais sempre que tiverem oportunidade, disse a Human Rights Watch. As execuções também diminuem a probabilidade de residentes das comunidades denunciarem atividades criminosas ou cooperarem com as investigações como testemunhas.
“A cooperação da comunidade com a polícia é essencial para a redução das altas taxas de criminalidade no Brasil”, disse Maria Laura Canineu, diretora do escritório Brasil da Human Rights Watch. “Fechar os olhos para a violência policial significa não apenas negar justiça às famílias das vítimas, como também afastar comunidades e colocar policiais que nela atuam em risco”.
Nas 687 páginas da 27ª edição do Relatório Mundial, a Human Rights Watch analisa práticas de direitos humanos em mais de 90 países. No capítulo introdutório, o Diretor Executivo, Kenneth Roth, observa que uma nova geração de populistas autoritários busca derrubar o conceito de proteção aos direitos humanos, tratando o respeito aos direitos como um impedimento à realização da vontade da maioria da população. A sociedade civil, a imprensa e o público em geral têm papéis importantes na reafirmação dos valores sobre os quais as democracias que respeitam direitos se baseiam, sobretudo para aqueles que se sentem abandonados pela economia global e que sofrem com o crescente temor a crimes violentos.
De acordo com os últimos dados disponíveis, policiais mataram ao menos 3.345 pessoas em 2015 no Brasil. Embora algumas mortes sejam o resultado de uso legítimo da força, outras resultaram de execuções extrajudiciais, como documentado pela Human Rights Watch e por outros grupos.
Mulheres e adolescentes brasileiras enfrentam novos desafios de saúde devido à disseminação do vírus do Zika. Autoridades brasileiras devem fortalecer os programas de prevenção e informação, além de oferecer maior apoio às famílias com crianças diagnosticadas com síndrome de Zika, disse a Human Rights Watch.
As condições desumanas nas prisões e cadeias brasileiras são um problema urgente. De acordo com os últimos dados oficiais, mais de 622.000 adultos estão atrás das grades, 67 por cento a mais do que as prisões comportam. Superlotação e falta de agentes penitenciários e técnicos tornam impossível às autoridades prisionais manter o controle nos estabelecimentos prisionais, deixando detentos vulneráveis à violência e às atividades de facções criminosas.
Noventa e nove presos foram mortos em prisões nos estados do Amazonas, Roraima e Paraíba nos primeiros oito dias de janeiro de 2017, e outros 22 foram mortos em prisões de Roraima, Rondônia e Acre em outubro de 2016. Onze adolescentes foram mortos em dois estabelecimentos do sistema socioeducativo no estado de Pernambuco em outubro de 2016.
Mais de 24.000 crianças e adolescentes estão em estabelecimentos do sistema socioeducativo, quase 24 por cento a mais do que a capacidade máxima das instalações. Um projeto de lei em discussão deterioraria ainda mais a situação da superlotação ao aumentar o tempo máximo da internação.
Tortura e maus-tratos a presos, incluindo a crianças e adolescentes no sistema socioeducativo, são um problema grave, como documentado pela Human Rights Watch e por outras organizações. O Mecanismo Nacional de Combate e Prevenção à Tortura identificou casos de tortura e tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes em “quase todas, se não todas” as 17 cadeias e prisões que visitou entre abril de 2015 e março de 2016.
Um avanço em 2016 foi a expansão das “audiências de custódia” para todas as capitais de estado e para algumas outras jurisdições. Essas “audiências de custódia” – realizadas imediatamente após a prisão em flagrante – ajudam os juízes a decidirem quem deve ficar preso preventivamente e quem deve aguardar o julgamento em liberdade. O Congresso brasileiro deve aprovar um projeto de lei para tornar essas audiências obrigatórias por todo o país.