Skip to main content

Brasil

Eventos de 2024

Barcos encalhados em bancos de areia expostos devido à seca no Rio Solimões, um dos maiores afluentes do Rio Amazonas, durante a seca mais intensa e generalizada que o Brasil já enfrentou desde o início dos registros em 1950, perto de Manacapuru, estado do Amazonas, Brasil, em 30 de setembro de 2024.

© 2024 Sipa via AP Images

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tomou importantes medidas para reduzir o desmatamento da Amazônia, mas planeja investir bilhões de reais em combustíveis fósseis. No Sul do Brasil houve enchentes devastadoras, e uma seca recorde em todo o país contribuiu para graves queimadas.

Abusos policiais continuam a assolar o Brasil. No estado de São Paulo, houve um dramático aumento nas mortes cometidas pela polícia desde que o atual governador assumiu o cargo em 2023.

O Brasil avançou na proteção dos direitos digitais de crianças e adolescentes.

Estado Democrático de Direito

Até novembro, o Ministério Público Federal havia denunciado mais de 1.600 pessoas que supostamente apoiaram ou fizeram parte de uma multidão que invadiu e depredou o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal em Brasília em 8 de janeiro de 2023, pedindo um golpe. Dessas, 284 tinham sido condenadas. Enquanto isso, o Congresso estava considerando um projeto de lei para conceder anistia a elas.

Em novembro, a polícia indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras 36 pessoas, incluindo ex-ministros e militares, por planejar um golpe de Estado. Quatro militares e um policial foram detidos por supostamente conspirar para matar o presidente Lula, o vice-presidente, Geraldo Alckmin, e o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes em 2022, para impedir a posse de Lula.

Também em novembro, um homem detonou explosivos e se matou em frente ao Supremo Tribunal Federal, depois de supostamente fazer ameaças contra a Corte.

O Congresso eliminou a exigência de que os partidos alocassem fundos eleitorais proporcionalmente entre candidatos negros e não negros. Os partidos também concederam anistia a si mesmos após amplo descumprimento das regras de repasse em eleições anteriores, nas quais vários partidos favoreceram candidatos brancos.

Pesquisadores compilaram 338 casos de ameaças e violência, incluindo 33 assassinatos, contra lideranças políticas ou familiares no período que antecedeu as eleições municipais de outubro.

Corrupção e transparência

O Congresso estava analisando um projeto de lei que reduziria o período em que políticos condenados por crimes são proibidos de concorrer a cargos eletivos.

Em março, a polícia federal indiciou o ex-presidente Bolsonaro com base em alegações de fraude em cartão de vacinação e, em julho, por suposta apropriação de joias recebidas de governos estrangeiros.

Em maio, o Ministério Público denunciou um deputado federal e seu irmão, um conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro , como mandantes do assassinato, em 2018, da vereadora e defensora de direitos humanos Marielle Franco, que eles supostamente viam como um “obstáculo” a atividades ilegais, envolvendo grilagem e milícia. O Ministério Público também acusou o então chefe da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro de auxiliá-los. O motorista de Marielle, Anderson Gomes, também foi morto. Em outubro, dois ex-policiais que confessaram a execução do assassinato foram condenados a décadas de prisão.

Em agosto, o Supremo Tribunal Federal suspendeu a execução das emendas parlamentares até que o Congresso estabelecesse regras para garantir maior transparência. Em 2024, o Congresso controlava um quarto dos gastos discricionários do governo, totalizando cerca de R$ 49 bilhões. O Procurador-geral da República denunciou três deputados por corrupção relacionada a emendas.

Em 2023, o governo negou 1.339 pedidos de informação, alegando que continham dados pessoais. Determinou sigilo de 100 anos na lista de visitas à primeira-dama e uma declaração de conflito de interesses de um ministro do governo. Em setembro, o governo anunciou algumas medidas para aumentar a transparência.

Liberdade de expressão

Um levantamento identificou mais de 47.800 publicações nas mídias sociais atacando a imprensa durante a campanha eleitoral.

Em maio, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a abertura de vários processos sobre os mesmos fatos contra jornalistas em diferentes jurisdições constitui assédio judicial com o objetivo de silenciá-los. A Corte concluiu que a responsabilidade civil de jornalistas se configura somente em caso inequívoco” de dolo ou “evidente negligência” na sua apuração dos fatos.

Direitos digitais

Em agosto, um ministro do Supremo Tribunal Federal suspendeu as operações da plataforma X no Brasil por mais de cinco semanas após a rede social se recusar a bloquear contas que provavelmente praticavam doxing. O ministro também determinou multas para usuários que acessassem o X por meio de redes virtuais privadas (VPNs). A falta de transparência sobre as ordens de bloqueios de contas pelo Supremo Tribunal Federal e a inadequada moderação de conteúdo pelo X prejudicaram usuários.

Em junho, descobriu-se que as fotos pessoais de 358 crianças brasileiras foram usadas indevidamente para treinar ferramentas de inteligência artificial (IA) que, por sua vez, são usadas por outras pessoas para criar deepfakes maliciosos de outras crianças.

Entre novembro de 2023 e abril de 2024, pelo menos 85 meninas de seis estados denunciaram à polícia que suas fotos nas mídias sociais haviam sido manipuladas, por meio de IA, para criar deepfakes de caráter sexual explícito.

Em junho, o governo se comprometeu a desenvolver uma política nacional para proteger os direitos das crianças no ambiente digital.

Em julho, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados proibiu a Meta de usar dados pessoais de usuários crianças e adolescentes para treinar seus sistemas de IA.

Educação

As disparidades raciais no acesso à educação continuaram. 48% dos brasileiros negros com 25 anos ou mais tinham concluído o ensino médio em 2023, em comparação com 62% dos brasileiros brancos da mesma idade.

Em junho, o Observatório Nacional de Violência contra Educadores/as, apoiado pelo governo, lançou uma iniciativa para pesquisar o assédio contra professores que discutem gênero e sexualidade, racismo e outros tópicos em sala de aula. Em agosto, o governo criou um grupo de trabalho para tratar de bullying, preconceito e discriminação nas escolas.

G20

Em novembro, o G20 concordou em garantir que pessoas muito ricas paguem impostos adequados, combatendo a evasão fiscal e promovendo o diálogo sobre questões tributárias, como proposto pelo Brasil. O G20 também endossou a aliança global criada pelo Brasil para combater a fome e a pobreza, que busca promover programas de transferência de renda e merenda escolar, entre outras iniciativas.

Segurança pública e conduta policial

As mortes violentas intencionais caíram 5% de janeiro a setembro, em comparação com o mesmo período de 2023.

Até setembro, a polícia havia matado 4.565 pessoas. Análises de anos anteriores mostraram que mais de 80% das pessoas mortas pela polícia eram negras. Embora algumas mortes pela polícia sejam em legítima defesa, muitas resultam do uso ilegal da força.

Em São Paulo, as mortes decorrentes de ação policial aumentaram 55% de janeiro a setembro, em comparação com o mesmo período de 2023. A polícia matou pelo menos 84 pessoas em duas operações na região da Baixada Santista, em 2023 e 2024. Até novembro, o Ministério Público havia apresentado denúncias em relação a apenas cinco mortes.

Desde que uma decisão do Supremo Tribunal Federal em 2020 ordenou que o estado do Rio de Janeiro tomasse medidas para conter o abuso policial, as mortes pela polícia caíram drasticamente. De janeiro a setembro, elas caíram 24% no estado, em comparação com o mesmo período de 2023.

Em junho, o Supremo Tribunal Federal descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal. Em resposta, o Congresso considerava uma emenda constitucional para criminalizar a posse e o porte. A lei de drogas é frequentemente usada como justificativa para incursões policiais letais em comunidades.

Em 2023, 118 policiais morreram por suicídio, um aumento de 26% em relação a 2022, informou o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Esse número superou as mortes de policiais em serviço (54) e fora de serviço (73).

Em duas decisões publicadas em março, a Corte Interamericana de Direitos Humanos concluiu que a polícia dos estados de São Paulo e Paraná cometeram graves violações de direitos humanos. O tribunal ordenou que o Brasil parasse de julgar crimes contra civis cometidos por policiais militares em tribunais militares e passasse a julgá-los em tribunais civis.

Em um relatório apresentado ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em outubro, os especialistas da ONU em justiça racial e igualdade na aplicação da lei denunciaram o racismo sistêmico e instaram o Brasil a adotar uma estratégia nacional para reduzir as mortes causadas pela polícia e garantir investigações adequadas nos casos de abuso policial.

Condições prisionais

Mais de 668.500 pessoas estavam encarceradas em junho de 2024, excedendo em 37% a capacidade do sistema prisional brasileiro. Outras 220.221 pessoas estavam em prisão domiciliar.

Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura e o Conselho Nacional de Justiça constataram superlotação, condições insalubres, maus-tratos e tortura em estabelecimentos penais de pelo menos seis estados em 2023.

O número de jovens cumprindo medida socioeducativa em meio fechado continuou a diminuir, totalizando 11.757 em 2023, uma redução de 6% em comparação com 2022.

Violência de gênero

De janeiro a setembro, cerca de 3.060 mulheres e meninas foram mortas. A polícia registrou cerca de um terço dos casos como feminicídio, definido pela lei brasileira como assassinatos “por razões da condição de sexo feminino”.

Houve aproximadamente 51.400 registros de estupros de mulheres e meninas no mesmo período. Em 2023, meninas com menos de 14 anos foram vítimas de três quartos de todos os estupros registrados. Meninas negras têm o dobro de chances de serem vítimas de estupro do que brancas, segundo um estudo.

Em uma pesquisa nacional publicada em 2024, quase metade das mulheres disse ter sofrido violência doméstica.

Em setembro, o presidente Lula demitiu o ministro dos Direitos Humanos e Cidadania após alegações de que ele havia assediado sexualmente a ministra da Igualdade Racial e outras mulheres. Ele negou as alegações. Entre janeiro e agosto, as ouvidorias registraram 557 casos de assédio sexual envolvendo servidores de órgãos e repartições federais.

Aborto

No Brasil, o aborto é legal apenas em casos de estupro, para salvar a vida da mulher ou em casos de anencefalia do feto. A criminalização do aborto afasta mulheres, meninas e pessoas grávidas do sistema de saúde. As pessoas que fazem abortos ilegais podem ser condenadas a até três anos de detenção, e terceiros que realizam o procedimento podem ser condenados a até quatro anos de reclusão.

Em junho, milhares de pessoas protestaram contra um projeto de lei que equipararia os abortos após 22 semanas ao homicídio, mesmo quando decorrentes de estupro.

Abusos durante a ditadura militar

Desde 2012, o Ministério Público apresentou mais de 50 denúncias criminais relacionadas a violações de direitos humanos durante o regime militar no Brasil (1964-1985). Os tribunais rejeitam a maioria dos casos, citando a prescrição ou a Lei de Anistia aprovada pela ditadura e mantida por uma decisão do Supremo Tribunal Federal de 2010. A Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou que essa decisão do Supremo Tribunal Federal viola o direito internacional.

Em maio, promotores denunciaram quatro ex-agentes e um médico legista por envolvimento no assassinato, em 1969, de Carlos Marighella, ex-deputado que liderava a oposição armada à ditadura. Promotores também entraram com ações civis contra mais de 100 ex-agentes por tortura, desaparecimentos e assassinatos.

Em março, o presidente Lula orientou seu governo a não realizar eventos em memória do 60º aniversário do golpe militar. O relator especial da ONU sobre verdade, justiça e reparação disse que o silêncio “revitimiza” as vítimas.

O governo Lula pediu desculpas pelos abusos cometidos contra povos indígenas durante a ditadura e restabeleceu uma comissão especial sobre mortos e desaparecidos políticos que o governo Bolsonaro havia desmantelado.

Direitos dos povos indígenas, quilombolas e defensores do meio ambiente

O governo Lula homologou 13 territórios indígenas e avançou no reconhecimento de outros 11, mas centenas de outros processos ainda estão em andamento.

Um obstáculo importante tem sido o marco temporal, uma tentativa de ruralistas de negar o direito dos povos indígenas às terras tradicionais se não estavam ali presentes quando a Constituição foi promulgada em 1988. Em 2023, o Supremo Tribunal Federal decidiu que essa tese era inconstitucional, mas o Congresso aprovou uma lei instituindo o marco temporal. A questão está pendente no tribunal novamente.

A demarcação de terras indígenas é fundamental para garantir direitos territoriais e pode ajudar a conter o desmatamento. Entre 1985 e 2023, os territórios indígenas perderam menos de 1% de sua área de vegetação nativa, em comparação com 28% em áreas privadas, informou o MapBiomas.

Em setembro de 2024, o governo Lula concedeu 21 títulos territoriais a comunidades quilombolas. No entanto, no ritmo atual, serão necessários 2.708 anos para que o governo titule as áreas pendentes, conforme demonstrou um estudo da organização Terra de Direitos.

Defensores e defensoras do meio ambiente e da terra continuaram a enfrentar violência.

A Comissão Pastoral da Terra registrou no primeiro semestre de 2024 mais de 1.000 conflitos no campo em todo o Brasil, muitos deles envolvendo extração ilegal de madeira, mineração ou grilagem. Esses conflitos resultaram em pelo menos 11 assassinatos até novembro.

Até novembro, permanecia pendente no Congresso a análise do Acordo de Escazú, que exige a proteção de defensores e defensoras ambientais e o acesso à informação e à participação pública em questões ambientais.

Meio ambiente

Eventos climáticos extremos causaram graves impactos ambientais e à saúde no Brasil. Especialistas apontam que as mudanças climáticas aumentam a probabilidadea intensidade desses eventos.

Entre abril e maio, mais de 180 pessoas morreram nas enchentes mais graves dos últimos 80 anos no estado do Rio Grande do Sul, que deixaram dezenas de milhares de desabrigados.

O Brasil sofreu com a pior seca já registrada, e as queimadas se alastraram no país, muitas delas provocadas para usar a terra para criação de gado ou agricultura, segundo especialistas. De janeiro a outubro, mais de 27 milhões de hectares foram queimados, mais do que o dobro do ano anterior.

O Brasil contribui para a crise climática como um dos 10 maiores emissores de gases de efeito estufa do mundo.

O governo Lula reduziu o desmatamento, uma importante fonte de emissões. De agosto de 2023 a julho de 2024, foram desmatados 6.288 quilômetros quadrados de floresta amazônica, uma redução de 31% em comparação com o mesmo período de 2023.

Em maio, o Ministério da Agricultura criou um grupo de trabalho para desenvolver um sistema de rastreabilidade do gado, em resposta a uma lei da União Europeia que restringe a venda de vários produtos ligados ao desmatamento, incluindo carne e couro. A pecuária é a maior responsável pelo desmatamento na Amazônia.

Em agosto, o Brasil adotou uma Política Nacional de Transição Energética que, segundo especialistas, carece de cronogramas e compromissos concretos. O governo Lula planejou R$ 288 bilhões em investimentos em petróleo e gás, majoritariamente com recursos públicos, de 2023 a 2026, em comparação com apenas R$ 87 bilhões em investimentos em energia renovável, todos vindo do setor privado. O presidente Lula defendeu a exploração de combustíveis fósseis.

Em maio, o Congresso derrubou vetos presidenciais ao projeto de lei conhecido como “Pacote do Veneno”, concedendo ao Ministério da Agricultura e Pecuária a autoridade principal sobre a regulamentação de agrotóxicos e reduzindo o papel das agências ambientais e de saúde. Os agrotóxicos causam graves danos à saúde e ao meio ambiente.

Direitos das pessoas com deficiência

Cerca de 18,6 milhões de adultos e crianças com deficiência com mais de 2 anos de idade vivem no Brasil. Milhares estão confinados em instituições, às vezes por toda a vida, onde podem enfrentar negligência e abuso. O governo lançou um plano para pessoas com deficiência, mas não incluiu medidas concretas para promover a desinstitucionalização.

Em dezembro, o Congresso aprovou um projeto de lei para implementar uma política de assistência que inclui apoio a pessoas com deficiência.

Migrantes, refugiados e solicitantes de asilo

Milhares de venezuelanos cruzaram a fronteira com o Brasil nos últimos anos, fugindo da fome, da falta de assistência médica ou de perseguição.

Cerca de 568.000 venezuelanos viviam no Brasil no início de junho, dos quais 23% tinham status de refugiado e mais de 84% tinham autorização de residência. Um programa voluntário de interiorização beneficiou mais de 141.000 pessoas até outubro.

Em agosto, o governo proibiu que as pessoas em trânsito sem visto solicitassem refúgio, exigindo que continuassem seu trajeto até o destino final ou retornassem ao país de origem.