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Às 20:00 horas, todas as noites, são apagadas as luzes da cela de dois metros quadrados do líder de oposição Leopoldo López, preso na base militar de Ramo Verde, próximo à Caracas. López é o único preso no complexo e para chegar até ele é necessário atravessar ao menos seis portões fechados. Por si só, este isolamento em que se encontra já favorece o risco de abusos e maus tratos. Há que se perguntar se os agentes de segurança seriam capazes de atravessar todos esses portões fechados de forma rápida o suficiente para ajudá-lo em caso de uma emergência – real ou fabricada.

Em 10 de setembro, López foi condenado a aproximadamente 14 anos de prisão depois de um julgamento que envolveu sérias violações do devido processo legal e deixou de apresentar evidências que o conectassem com a prática de um crime. Durante o período em que ficou preso provisoriamente, agentes de segurança da base militar fizeram buscas em sua cela de forma agressiva, levando seus pertences pessoais e impondo infundadas punições que o privaram de visitas familiares por meses. Nenhum dos recursos da defesa em relação às violações do devido processo legal e aos abusos que ele sofreu na prisão progrediu.

Em um país onde as instituições criadas para proteger as vítimas de violação de direitos fundamentais pelo Estado não mais são capazes de atuar com independência, quem poderá defender López?

Instituições internacionais de proteção e defesa dos direitos humanos da ONU e do sistema interamericano, além de grupos como a Human Rights Watch, vêm reiteradamente questionando a detenção arbitrária de López e sua consequente condenação. Mais recentemente, o Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária da ONU demandou a libertação imediata de López, dizendo que o processo judicial estava sendo “conduzido a portas fechadas e marcado por sérias irregularidades”.

Essas demandas têm sido ignoradas completamente. A reação do Governo venezuelano tem sido a de defender o indefensável, alegando que o caso de López foi decidido por um juiz independente.

Esta alegação não resiste a uma análise mais detalhada. O judiciário venezuelano tem em grande parte deixado de operar como um órgão independente do governo desde que, em 2004, a Suprema Corte ficou sujeita à autoridade do presidente Hugo Chávez e seus partidários. Os membros da Suprema Corte rejeitaram abertamente o princípio da separação de poderes, confirmaram publicamente seu compromisso de avançar a agenda política do governo e decidiram em favor do governo de forma reiterada, validando a sua desconsideração em relação aos direitos humanos. Além disso, a maioria dos juízes venezuelanos não têm estabilidade e podem ser removidos por meio de processos que carecem de garantias básicas do devido processo legal, dando margem a remoções arbitrárias em consequência de qualquer decisão que o governo desaprove.

No entanto, foi somente após a condenação de López que governos latino-americanos, incluindo Chile, Costa Rica, Paraguai e Peru, fizeram um apelo à Venezuela – em variados tons – pelo respeito aos direitos básicos do devido processo. Antes disso, as autoridades colombianas e dos Estados Unidos, bem como ex-chefes de Estado de vários países, manifestaram suas preocupações em relação aos abusos na Venezuela, inclusive no caso López.

Na semana passada, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos, Luis Almagro, respondeu a uma carta de Elías Jaua, ex-ministro de Relações Exteriores da Venezuela, afirmando que ele tinha o direito de se reunir com a oposição venezuelana. Almagro declarou que "a democracia é o governo das maiorias", mas que também exige "garantia dos direitos das minorias."

Porém, infelizmente, a maioria dos aliados da Venezuela permanecem em silêncio, mais notavelmente o governo brasileiro e a organização regional Unasul.

Enquanto não houver uma mensagem clara de governos latino-americanos de que eles estão monitorando atentamente a situação dos direitos humanos na Venezuela, incluindo as condições de detenção de López, a administração de Maduro continuará a operar sob a suposição de que ele tem carta branca para fazer o que quer. E no caso de López, isso poderia implicar riscos enormes.

 

Uma versão deste artigo foi publicada hoje no jornal O Globo.

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