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China

Eventos de 2023

Chow Hang-tung (R) chega ao Tribunal de Última Instância em Hong Kong em 8 de junho de 2023. 

 

© 2023 ISAAC LAWRENCE / AFP via Getty Images

No fim de 2022, o governo chinês abruptamente encerrou sua política draconiana de “Covid zero”. Como grande parte da população e dos estabelecimentos de saúde estavam despreparados, houve um aumento nas infecções, hospitalizações e mortes por Covid-19. Oficialmente, o país estimou que havia 60 mil “mortes em excesso” em dezembro de 2022. Um estudo acadêmico dos Estados Unidos apontou o número de 1,87 milhões de mortes entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023. É provável que o número real de vítimas permaneça desconhecido devido à forte censura.

Dez anos sob o mandato do presidente Xi Jinping, a repressão se aprofunda por todo o país. O governo chinês prossegue com suas abusivas políticas contra os uigures e outros grupos mulçumanos turcos em Xinjiang, que constituem crimes contra a humanidade. No Tibete e em Xinjiang, aqueles que contatam familiares e amigos no exterior, ou que lutam pela promoção e defesa de sua cultura, idioma e religião, correm o risco de serem tratadas como “separatistas”, sendo alvos de duras sentenças de prisão. Em toda a China, o Estado vem endurecendo ainda mais os controles sociais. Não existe uma sociedade civil independente, e até pequenos focos de liberdade são eliminados. Em Hong Kong, o governo chinês assumiu pleno controle da cidade desde a imposição da Lei de Segurança Nacional em 2020.

A lista do governo chinês de alvos políticos continua em expansão. Mesmo aqueles que trabalham em empresas estrangeiras nas cidades cosmopolitanas da China encontram-se  na mira, com as revisões de uma lei “antiespionagem” em julho e com o Ministério de Segurança encorajando a população a denunciar supostos espiões.

Conforme a desaceleração da economia, pequenos protestos eclodiram no país, como as manifestações de aposentados contra cortes de benefícios de saúde em fevereiro. Aspirações por uma sociedade mais justas prevalecem entre muitos e muitas, especialmente entre aqueles que têm enfrentado situações de injustiça, incluindo mulheres, pessoas LGBTQI+, tibetanos, uigures, congueses e pessoas que se encontram na base da hierarquia socioeconômica. Alguns que foram para o exílio aderiram a movimentos ativistas em diáspora.

Em novembro, multidões de pessoas por todo o país prestaram homenagens após a inesperada morte do ex-primeiro-ministro Li Keqianga. Para muitos, ele representou uma China economicamente mais vibrante, em contraste com Xi Jinping, o qual priorizou o controle social que está levando a China a um retrocesso.

Liberdade de expressão

Por meio de leis e regulamentos, condenações criminais, assédio, intimidação e uso de tecnologia, o governo chinês opera um dos regimes de censura mais severos do mundo.

Em abril, as autoridades que foi uma das primeiras pessoas a denunciar o surto de Covid-19, após três anos em detenção. . Entretanto, a ativista de Xangai e ex-advogada Zhang Zhan, que foi até Wuhan para noticiar a eclosão em fevereiro de 2020, continua presa. Em julho de 2023, ela foi transferida para um hospital penitenciário devido à deterioração de sua saúde.

O governo libertou, sob fiança, alguns manifestantes que participaram da onda de protestos no fim de 2022 conhecida como “Movimento do Livro Branco”, incluindo Cao Zhixin, Li Yuanjing, Zhai Dengrui e Li Siqi. Porém, no mês de março, um tribunal condenou a estudante universitária uigur  Kamile Wayit a três anos de prisão por “promoção de  extremismo” após ela ter compartilhado na internet um vídeo das manifestações. Não se sabe quantos manifestantes permanecem em cárcere.

Em abril, o Departamento Nacional de Segurança chinês prendeu, o político pró-independência de Taiwan , que estava residindo na  província de Zhejiang, sob a alegação de “separatismo”.

Em maio, o governo chinês multou uma companhia de comédia em 14,7 milhões yuans chineses (cerca de 10 milhões de reais) por uma piada feita pelo comediante de stand-up Li Haoshi, o qual comparou o Exército de Libertação Popular a cachorros. No mesmo mês, a rede social chinesa Weibo suspendeu um comediante malasiano conhecido como  Uncle Roger após ele ter feito uma piada sobre a vigilância do governo chinês e sobre as reinvindicações  de soberania sobre Taiwan.

Em agosto, um tribunal na província de  Guizhou sentenciou o ex-professor de Economia Yang Shaozheng a 4,5 anos de prisão por “incitar  subversão” após ele ter expressado suas preocupações acerca do alto custo anual dos funcionários públicos na China.

Em setembro, o governo chinês divulgou um projeto de lei que, se aprovado, criminalizaria as pessoas que vestissem roupas em público que “ferem os sentimentos do povo chinês”. O projeto parece ter como alvo quem usa roupas japonesas ou itens que desafiam os padrões de gênero.

O governo chinês continua a recorrer às empresas de tecnologia para impor a censura. Após o desabamento de um telhado na província de Heilongjiang, matando 10 crianças e o técnico de um time de vôlei do ensino fundamental, as autoridades rapidamente , inclusive os nomes das crianças.

Em abril, pesquisadores descobriram que as plataformas de busca da China aplicaram para censurar conteúdos on-line. Entre os mecanismos de busca na internet, a censura política mais abrangente foi feita pelo Bing da Microsoft, cujas regras são menos numerosas, mas mais amplas e afetam mais resultados de pesquisa do que as normas aplicadas por empresas chinesas como o Baidu. O Bing disse que “analisaria esses achados”. Em agosto, a Apple supostamente removeu mais de 100 aplicativos de Inteligência Artificial (IA) generativa da loja de aplicativos na China, uma vez que Pequim reprimiu a nova tecnologia, em parte visando manter o controle social. A Apple disse que esses aplicativos “incluem conteúdo que é ilegal na China”. Em maio, o LinkedIn anunciou que desativaria gradualmente seu aplicativo na China, o InCareer, tornando-se a mais recente  grande rede social  dos EUA a fechar na China.

Em maio, o Wall Street Journal revelou que funcionários do TikTok, rede social de propriedade da empresa chinesa ByteDance, supostamente monitoraram   o conteúdo acessado pelos usuários, inclusive quem assistia a conteúdo LGBT. O TikTok relatou que havia suspendido tais práticas e que “proteger a privacidade e a segurança” dos usuários é uma de suas “principais prioridades”. Isso ocorreu após a revelação, em dezembro de 2022, de que o TikTok monitorou jornalistas americanos que estavam escrevendo críticas sobre a empresa. O TikTok considerou isso como uma “má conduta de certos indivíduos” que não eram mais seus funcionários.

Liberdade de religião

O controle estatal sobre a religião aumentou desde 2016, quando o presidente Xi Jinping ordenou a “sinização” das religiões”. A polícia prendem, detém e assedia líderes e membros de diversos grupos religiosos “ilegais”, incluindo as “igrejas domésticas” (congregações que se recusam a integrar as igrejas católicas e protestantes oficiais). As autoridades também interrompem as atividades pacíficas desses grupos (não importam se eles estejam pregando sua fé ou organizando acampamentos de verão para crianças), e proíbem esses grupos completamente.

Além de ditar o que constitui atividade religiosa legal, autoridades agora visam reformular as religiões de forma abrangente para que sejam coerentes com a ideologia do partido e promovam a lealdade ao partido e à Xi.

Em províncias com uma grande proporção de muçulmanos, as autoridades os minaretes e as cúpulas das mesquitas para “sinicizá-las” ou para remover as influências estrangeiras. Na província de Yunnan, as autoridades removeram as características islâmicas da Mesquita Najiaying, o que suscitou um de centenas de muçulmanos da etnia Hui em maio.

As Medidas sobre a Administração de Locais de Atividade Religiosa entraram em vigor em setembro. Elas impõem restrições adicionais às atividades religiosas, exigindo que os espaços religiosos doutrinem seus seguidores na ideologia do Partido Comunista da China, bem como proibindo-os de “criar conflitos (...) entre seitas” ou de receber recursos sem a aprovação do Estado.

Em julho, o governo chinês transferiu o bispo católico Joseph Shen Bin para dirigir a diocese de Xangai sem consultar o Vaticano, violando o acordo entre China e Vaticano de 2018. Embora tenha se manifestado publicamente contra a decisão de Pequim, o Vaticano aprovou a medida e permaneceu praticamente em silêncio sobre a perseguição religiosa de Pequim.

Ataques aos defensores de   direitos humanos

Defensores e defensoras de direitos humanos e críticos ao governo continuam sendo perseguidos.

Em janeiro, as autoridades libertaram o advogado de direitos humanos Tang Jitian após seu desaparecimento forçado por 398 dias. Em março, um tribunal de Guangxi condenou o advogado de direitos humanos Qin Yongpei a cinco anos de prisão por “incitar a subversão do poder do Estado”. Em abril, um tribunal da província de Shandong condenou o proeminente acadêmico de Direito Xu Zhiyong e o advogado de direitos humanos Ding Jiaxi a 14 e 12 anos de prisão, respectivamente, sob a justificativa de “subversão do poder do Estado”.

Em abril, as autoridades prenderam o advogado de direitos humanos Yu Wensheng e sua esposa, Xu Yan, quando eles estavam a caminho de  uma reunião com o embaixador da União Europeia em Pequim. As autoridades também colocaram os advogados de direitos humanos Wang Quanzhang, Wang Yu e Bao Longjun , em prisão domiciliar. Entre maio e junho, a polícia perseguiu e forçou Wang e sua esposa, Li Wenzu, a  13 vezes.

Em maio, um tribunal de Guangzhou condenou o proeminente advogado e ativista de direitos humanos Guo Feixiong a oito anos de prisão por “incitar a subversão do poder do Estado”. Guo foi detido em janeiro de 2021 no aeroporto de Xangai quando tentava visitar sua esposa gravemente doente nos Estados Unidos. Ela morreu um ano depois.

Ainda em maio, o jornalista exilado Yang Zewei desapareceu de sua casa no Laos e reapareceu em detenção na província de Hunan. Em julho, a polícia do Laos deteve o advogado de direitos humanos Lu Siwei quando ele estava a caminho da Tailândia. Apesar de apelos dos especialistas da ONU, em 15 de setembro Laos deportou Lu para a China, onde ele aguarda julgamento por “ ilegalmente cruzar a fronteira”.

Hong Kong

Desde que Pequim impôs a draconiana Lei de Segurança Nacional a Hong Kong, em junho de 2020, as liberdades reduziram drasticamente. As autoridades de Hong Kong prenderam pelo menos 279 pessoas por terem supostamente violado essa legislação e a lei de sedição da era colonial.  Os processos movidos sob a Lei de Segurança Nacional possuíam uma taxa de condenação de 100% no momento da redação deste documento.

Em julho, começou o julgamento sobre segurança nacional de 47 políticos pró-democracia. Outro julgamento de segurança nacional,  do magnata da mídia Jimmy Lai, de 75 anos,  estava programado para começar em 18 de dezembro. Em outubro, quatro ex-líderes estudantis foram condenados a dois anos de prisão por “incitação a lesão corporal dolosa”. Eles foram presos por presidir uma reunião de um conselho estudantil em 2021, na qual foi aprovada uma deliberação manifestando pesar por um homem que cometeu suicídio após esfaquear e ferir um policial.

Em junho, o governo de Hong Kong solicitou uma liminar para proibir a transmissão e a distribuição da canção de protesto “Glory to Hong Kong”,(Glória a Hong Kong, em tradução livre). O tribunal negou o pedido no mês de julho, mas o governo entrou com um recurso. Em agosto, um tribunal condenou um homem a três meses de prisão por “insultar” o hino nacional chinês depois que ele substituiu a trilha sonora de um vídeo online por “Glory to Hong Kong”.

Desde 2020, o governo de Hong Kong tem retirado das bibliotecas públicas algumas centenas de títulos que classificou como “politicamente sensíveis”. Em julho, também criou um canal para incentivar o público a denunciar publicações que possam “comprometer a segurança nacional”. Em setembro, a polícia acusou um homem de “insubordinação” por supostamente ter recebido 18 exemplares de um livro infantil pró-democracia intitulado Sheep Village (Vila das Ovelhas, em tradução livre) do exterior.

A autocensura se tornou ainda mais corriqueira. Em fevereiro, a plataforma de streaming da Disney em Hong Kong retirou um episódio de Os Simpsons que mencionava campos de trabalho forçado na China.

Desde junho de 2020, nenhuma grande  reunião pública  ocorreu em Hong Kong. Em março, a polícia havia inicialmente permitido uma manifestação no Dia Internacional das Mulheres, mas o organizador cancelou o protesto quando a polícia declarou, sem dar maiores detalhes, que “grupos violentos” poderiam participar do protesto. Uma manifestação planejada para o Dia Internacional dos Trabalhadores foi cancelada em abril pelos organizadores após um deles ter sido brevemente preso pela força de segurança nacional.

Os alvos de repressão do governo se estenderam para além das fronteiras de Hong Kong. Em julho, a polícia emitiu mandados de prisão infundados e recompensas em relação a oito políticos e ativistas exilados, residentes no exterior, sob a alegação de delitos previstos na Lei de Segurança Nacional. A polícia congelou suas contas bancárias, interrogou seus familiares que vivem em Hong Kong e invadiu as casas de ativistas associados a eles.

Em novembro, uma mulher honconguesa foi condenada a dois meses de prisão por “subversão” devido a publicações divulgadas por ela nas mídias sociais enquanto estudava em uma universidade no Japão. Em 2023, as autoridades de imigração negaram a entrada de três jornalistas e artistas japoneses que eram críticos do governo de Hong Kong.

Houve algum progresso nos direitos LGBT. Em fevereiro, o tribunal de última instância decidiu que era inconstitucional a obrigatoriedade estabelecida pelo governo de que homens transgêneros fossem submetidos a uma “cirurgia completa de redesignação sexual” como condição para mudar o gênero legal. Em setembro, o tribunal ordenou que o governo estabelecesse uma estrutura legal para o reconhecimento de parcerias entre pessoas do mesmo sexo.

Xinjiang

Pequim continua com seus massivos abusos em Xinjiang, os quais a Human Rights Watch concluiu constituírem crimes contra a humanidade. Embora alguns campos de educação política aparentem  ter sido fechados, estima-se que  cerca de meio milhão de uigures e outros muçulmanos turcos continuam encarcerados, detidos durante a campanha de repressão chinesa contra o “Terrorismo Violento” iniciada em 2017. Não houve libertações em massa. Em setembro, um tribunal condenou a proeminente antropóloga uigur Dr. Rahile Dawut à prisão perpétua por supostos crimes contra a segurança do Estado. Muitos uigures no exterior continuam a ter pouco ou nenhum contato com seus familiares em Xinjiang.

As autoridades de Xinjiang estão forçadamente assimilando os uigures, inclusive por meio da sinização do Islã. O governo tem promovido o turismo na região, onde apresenta   uma versão higienizada e controlada da cultura uigur aos turistas nacionais.

Em agosto, o presidente Xi Jinping visitou Xinjiang as vésperas do primeiro aniversário de um relatório da ONU que detalhava os abusos generalizados em Xinjiang, incluindo ataques a práticas culturais e religiosas, separação familiar, prisões e detenções arbitrárias, estupros, tortura e desaparecimentos forçados. O relatório inferiu que as políticas de Pequim na região “podem constituir crimes contra a humanidade”. Xi anunciou que suas políticas em Xinjiang foram um “sucesso”.

Em fevereiro e abril, dois homens uigures morreram em uma detenção da imigração tailandesa, após nove anos detidos no estabelecimento, chamando atenção para as condições precárias dos uigures presos em países suscetíveis à influência de Pequim, mesmo depois de terem escapado da China.

Tibete

As autoridades nas áreas tibetanas impuseram severas restrições   às liberdades de religião, de expressão, de circulação e de reunião. Os tibetanos que se manifestam sobre questões como realocações em massa, degradação ambiental ou a eliminação progressiva da língua tibetana na educação primária enfrentam repressão. As autoridades locais são obrigadas a educar o público a “obedecer à lei”, e recompensas financeiras são oferecidas aos cidadãos dispostos a delatar outros. Ações como guardar conteúdo proibido no celular ou simplesmente entrar em contato com tibetanos no exílio podem resultar em prisão. Um monge respeitado, Geshe Phende Gyaltsen, preso em bom estado de saúde pela polícia do condado de Litang em março de 2022, morreu sob custódia policial em janeiro de 2023.

Em junho de 2023, um grupo de relatores especiais da ONU solicitou informações sobre os casos de seis tibetanos detidos por posse de fotos do líder exilado religioso Dalai Lama. O governo chinês não respondeu à solicitação.

Direitos das mulheres e meninas

Em 1º de janeiro, as revisões da Lei de 1992 sobre Proteção dos Direitos e Interesses das Mulheres entraram em vigor. Esta lei  discorre sobre discriminação no local de trabalho e assédio sexual. Entretanto, as vítimas ainda enfrentam dificuldades para buscar responsabilização, ao passo que juristas questionam a eficácia das alterações legislativas.

Devido em grande parte à política do “filho único”, que perdurou por décadas, pela primeira vez em 60 anos as mortes superaram o número de nascimentos na China. Alguns governos regionais passaram a incentivar a geração de filhos, incluindo por meio de recompensas em dinheiro para noivas com 25 anos ou menos no condado de Zhejiang e de planos de subsídios para nascimentos em várias cidades do país. A linguagem usada na redação oficial de algumas leis e políticas sugere um restritivo papel para as mulheres. As emendas à Lei de Proteção dos Direitos e Interesses das Mulheres, por exemplo, dizem às mulheres para “respeitar a moral social... e os valores familiares”.

A Associação de Tênis Feminino retomou as operações na China em setembro, encerrando sua suspensão dos torneios no país após Peng Shuai, tricampeã olímpica e bicampeã de duplas do Grand Slam, ter acusado  o antigo vice-primeiro-ministro Zhang Gaoli, de abuso sexual em 2021.

A jornalista Huang Xueqin e o ativista dos direitos trabalhistas Wang Jianbing foram levados a julgamento por um tribunal de Guangzhou em setembro, sob a alegação de “incitação a subversão” por envolvimento no  Movimento #MeToo.

Orientação sexual e identidade de gênero

Integrantes e ativistas da comunidade LGBT têm enfrentado cada vez mais assédio e censura.

Em fevereiro, duas alunas da Universidade de Tsinghua abriram um processo contra o Ministério da Educação depois que  a instituição universitária as puniu, em julho de 2022, por deixarem bandeiras de arco-íris em um supermercado do campus.

Uma das organizações LGBT mais antigas da China, o Centro LGBT de Pequim, anunciou repentinamente o encerramento de suas atividades em maio por motivo de “força maior”. Esse é o mais recente de uma série de fechamentos forçados de grupos LGBT desde 2019.

Em 22 de agosto, data da versão chinesa do Dia dos Namorados (conhecida como Qixi), várias organizações LGBT —incluindo a TransBrotherhood China, o Centro das Mulheres Lésbicas de Pequim e a filial em Pequim da Trueself —e outras contas públicas de comunidade no WeChat—incluindo Beijing Lala Salon, Wandouhuang, Transtory, Outstanding Partners, Ace e Flying Cat Brotherhood—descobriram que o serviço de mensagem instantânea havia removido suas contas da plataforma. Isso aconteceu após o WeChat ter excluído dezenas de contas LGBT administradas por estudantes universitários em 2021.

Direitos das pessoas com deficiência

Em um caso que teve repercussão nacional, no mês abril, um tribunal na província de Jiangsu condenou Dong Zhimin a nove anos de prisão por manter  Xiaohuamei, uma mulher com esquizofrenia, injustamente aprisionada. Em 2022, um internauta filmou Xiaohuamei acorrentada pelo pescoço dentro de um barraco precário. As autoridades locais tentaram persistentemente restringir as pesquisas dos ativistas sobre as origens da mulher, mas acredita-se que ela tenha sido traficada, vendida à Dong e mantida acorrentada e como escrava sexual —dando à luz oito filhos—por anos. A história de Xiaohuamei é um raro exemplo de casos de acorrentamento de pessoas com deficiências psicossociais (reais ou presumidas) —geralmente devido a cuidados e serviços de saúde mental inadequados— que foram descobertos e os agressores responsabilizados.

Políticas e impactos das mudanças climáticas

Como o maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, com emissões per capita na 11ª posição entre os países do G20, a China está contribuindo para a crise climática e o crescente impacto ambiental sobre os direitos humanos em todo o mundo. O Estado chinês é o maior produtor e consumidor de carvão do mundo, com uma queima anual de carvão maior do que do que o resto do mundo somado. O país também o maior importador de petróleo e gás. Um banco chinês foi o maior financiador de combustíveis fósseis entre 2016 e 2022. Os planos da China de prosseguir com o aumento da produção de combustíveis fósseis são contrários às suas obrigações de direitos humanos, as quais exigem que todos os governos eliminem gradualmente os combustíveis fósseis.

Apesar das melhorias das metas chinesas, o grupo de pesquisa Climate Action Tracker classifica a meta de redução de emissões domésticas da China como “altamente insuficiente” para cumprir a meta do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais.

A China é líder mundial na produção de energia renovável. Ela também processa a grande maioria dos minerais e metais necessários para a produção de baterias e outras tecnologias de energia renovável. Alguns desses materiais são produzidos por empresas em Xinjiang, levando ao risco de vínculos com trabalho forçado. Pesquisadores documentaram, por exemplo, a relação entre a produção de polissilício, um material essencial para a produção de energia solar, e o trabalho forçado em Xinjiang.

Principais atores internacionais

O fim da política chinesa de “Covid zero” gerou uma onda de visitas de alto escalão à China ao longo de 2023, do chanceler alemão Olaf Scholz a ao presidente do Brasil Lula da Silva. Poucas pessoas manifestaram publicamente suas preocupações na área dos direitos humanos.

Diplomatas alinhados ao governo chinês —como os da Indonésia, Irã, México, Coreia do Norte, Arábia Saudita, entre outros—, representantes da Liga dos Estados Árabes e acadêmicos islâmicos visitaram Xinjiang como parte das excursões de propaganda do governo chinês. O Ministério das Relações Exteriores da China e a mídia estatal declararam que essas visitas confirmam a “paz” e a “felicidade” na região.

O governo alemão publicou sua aguardada estratégia para a China, a qual revela uma visão sóbria dos laços da Alemanha com Pequim.

Em junho, chefes de Estado da União Europeia (UE) reiteraram suas preocupações com o histórico da China, mas não iniciaram novas ações. Muitos grupos de direitos humanos questionaram a relevância da retomada do diálogo sobre direitos humanos entre a União Europeia e a China em fevereiro. Em outubro, Josep Borrell, principal diplomata da União Europeia, visitou Pequim e, em dezembro, o bloco econômico e o governo chinês fizeram a Cúpula UE-China.

Na UE, os esforços continuaram no processo legislativo para a aprovação de uma legislação sobre direitos humanos e devida diligência ambiental para empresas, bem como sobre a proibição de importações e exportações do mercado da União Europeia de produtos vinculados ao emprego de trabalho forçado. Nenhuma dessas medidas é destinada a um país específico, mas as restrições à importação podem desempenhar um papel fundamental para evitar que esses produtos sejam importados de Xinjiang.

No mês de maio, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, prometeu fazer um “acompanhamento concreto” do relatório sobre as graves violações do governo chinês em Xinjiang, que seu escritório publicou em agosto de 2022. Contudo, ele ainda não apresentou o relatório para o Conselho de Direitos Humanos da ONU, nem indicou qual tipo de “acompanhamento concreto” pretende fazer para prosseguir com a implementação das recomendações no relatório ou para acabar com os abusos.

Desde a entrada em vigor da Lei de Prevenção ao Trabalho Forçado Uigur em junho de 2022 e até 29 de novembro de 2023, as autoridades aduaneiras dos Estados Unidos já haviam proibido a entrada de mercadorias que chegam ao valor de US$ 561 milhões, devido a suspeitas de vínculos com o trabalho forçado em Xinjiang ou em outras partes da China.

As empresas estrangeiras na China sofreram uma pressão sem precedentes em 2023. Em abril, o governo chinês fez emendas vagas à Lei Antiespionagem, deixando as empresas estrangeiras sem saber se práticas comerciais anteriormente aceitáveis agora constituem crimes. Em março, as autoridades chinesas invadiram o escritório em Pequim da Mintz Group, empresa de auditoria corporativa dos Estados Unidos, e detiveram funcionários. Em abril, as autoridades invadiram o escritório em Xangai da Bain, empresa de consultoria global. Em junho, as autoridades obrigaram os funcionários das instituições financeiras Franklin Templeton e BlackRock a participar de aulas sobre o “Pensamento Xi Jinping”.

Política externa

Em 2023, Pequim lançou sua Iniciativa de Segurança Global, Iniciativa de Desenvolvimento Global e Iniciativa de Civilização Global, cada uma delas concebida para desafiar as normas e instituições existentes no âmbito da governança global, da segurança e dos direitos humanos.

O anterior programa de desenvolvimento global de Xi Jinping, a Nova Rota da Seda (denominada Iniciativa do Cinturão e Rota), criticada por sua falta de transparência e violações de direitos, teve seu escopo reduzido. Entretanto, Xi continua formando coalizões sólidas com o Sul Global, por exemplo, por meio da priorização de sua participação em cúpulas como a do Brics na África do Sul.

Xi Jinping continuou a dar um apoio crucial à Rússia, mesmo perante as sanções internacionais impostas ao governo russo como consequência da invasão da Ucrânia. Logo após o Tribunal Penal Internacional emitir um mandado de prisão contra o presidente russo Vladimir Putin, em março, Xi Jinping viajou a Moscou para se encontrar com Putin. Em setembro, o líder chinês recebeu em Pequim o presidente sírio, Bashar al-Assad, que supostamente cometeu crimes de guerra.

Os esforços do governo chinês para silenciar críticos fora de seu território atraíram mais atenção dos outros países, incluindo denúncias do Departamento de Justiça dos EUA contra 40 policiais chineses.

Diplomatas chineses continuaram sua campanha para silenciar as críticas ao histórico de direitos humanos do governo e para enfraquecer os órgãos de direitos humanos da ONU, inclusive interrompendo e assediando representantes da sociedade civil no Conselho de Direitos Humanos da ONU. Em setembro, diplomatas chineses enviaram uma nota verbal para desestimular a participação do governo em um evento da sociedade civil com foco em Xinjiang, que ocorreu às vésperas da Assembleia Geral da ONU, e outra nota com uma mensagem semelhante para as missões permanentes em Genebra acerca de um evento sobre liberdade de imprensa em Hong Kong.