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Angola

Events of 2024

Milhares de pessoas participam na marcha "Por uma Angola sem fome", num protesto convocado pelos partidos da oposição que compõem a Frente Patriótica Unida (FPU) em Luanda, Angola, 23 de novembro de 2024.

© 2024 AMPE ROGERIO/EPA-EFE/Shutterstock

Durante todo o ano de 2024, a polícia angolana foi implicada em assassinatos, violência sexual, uso excessivo da força, detenção arbitrária, tortura e outros maus-tratos contra ativistas e manifestantes. Crianças continuam a enfrentar as consequências de uma seca e crise alimentar, com 38% delas sofrendo de desnutrição crônica. O presidente João Lourenço assinou leis que não atendem aos padrões internacionais de direitos humanos e que restringem severamente as liberdades de imprensa, de expressão e de associação. As prisões angolanas continuaram a sofrer com a superlotação.

Brutalidade policial

Detidos acusaram a polícia de realizar execuções extrajudiciais, violência sexual, tortura e outros maus-tratos, bem como de uso excessivo da força durante as detenções. Em março, na província de Lunda Norte, a polícia usou balas letais para dispersar uma multidão de pessoas que protestavam contra o suposto assassinato de um garimpeiro de diamantes pela polícia.

A associação de vendedores ambulantes de Angola acusou a polícia de agressão sexual, espancamento, assédio e apreensão ilegal de bens de mulheres vendedoras ambulantes em todo o país.

Segundo um relatório do movimento local Mudei, policiais supostamente torturaram seis pessoas nas províncias de Luanda, Bié e Lunda Sul entre abril e junho, para coagi-las a confessar crimes.

Em setembro, o então ministro do Interior, Eugénio Laborinho, reconheceu que alguns policias em serviço “lamentavelmente cometem erros, alguns dos quais culminam com a perda de vidas humanas”. Ele acrescentou que cerca de 78 policias foram expulsos da polícia nacional por má conduta entre janeiro de 2023 e meados de 2024.

Direitos das crianças

Crianças e adolescentes continuam a enfrentar as consequências do agravamento da seca e da crise alimentar, com 38% sofrendo de desnutrição crônica. O país é um dos mais afetados por uma grande crise alimentar que atinge a África Central e Austral, de acordo com o Programa Mundial de Alimentos. Em maio, 1,5 milhão de pessoas, incluindo milhares de crianças e adolescentes de famílias rurais de baixa renda, enfrentavam insegurança alimentar aguda no sul de Angola. Pelo menos 22 crianças teriam morrido de desnutrição aguda.

No início de 2024, autoridades da Namíbia repatriaram angolanos, incluindo dezenas de crianças e adolescentes — muitos desacompanhados — que foram encontrados pedindo dinheiro ou vendendo artefatos de madeira nas cidades e vilarejos da Namíbia. Muitas das crianças são de áreas afetadas pela seca nas províncias de Cunene, Huila e Namibe, no sul de Angola. Elas fugiram da região e atravessaram a fronteira para a Namíbia em busca de alimentos e empregos.

Em maio, autoridades de saúde disseram que estavam a investigar a morte de mais de 30 crianças com menos de 12 anos em Luanda, que apresentaram sintomas como dor de estômago e febre, após consumirem “água muito turva e amarelada” que saiu das torneiras do bairro de Viana. Até o final de novembro, as autoridades não haviam apresentado publicamente o resultado de sua investigação.

Dezenas de lares de adopção para crianças na província de Malange correm o risco de fechar, em meio às dificuldades do país para se recuperar de uma crise econômica. 

No orçamento para 2024, o governo angolano reduziu em 50% os recursos financeiros para a linha de apoio SOS Criança, a única linha de apoio nacional na qual crianças podem buscar ajuda em casos de violência, abuso ou negligência ou para obter informações e encaminhamentos, segundo o UNICEF.

Liberdade de imprensa, expressão e associação

Em 29 de agosto, o presidente Lourenço assinou duas leis que não atendem aos padrões internacionais de direitos humanos e que restringem severamente as liberdades de imprensa, expressão e associação.

A nova Lei sobre Crimes de Vandalismo de Bens e Serviços Públicos prevê penas de prisão de até 25 anos para pessoas que participarem de protestos que resultem em vandalismo e interrupções de serviços públicos. A nova Lei de Segurança Nacional autoriza as forças de segurança do governo a proibir a transmissão de estações de rádio públicas ou privadas e a interromper alguns serviços de telecomunicações em “circunstâncias excepcionais” sem ordem judicial, o que restringiria seriamente a liberdade de imprensa.

A relatora especial das Nações Unidas sobre direito à liberdade de reunião pacífica e associação pacífica, Gina Romero, instou o governo e a Assembleia Nacional de Angola a não adotar uma legislação que pudesse ser usada para limitar direitos fundamentais.

O Comitê para a Proteção dos Jornalistas disse que o projeto de lei poderia “gravemente minar a liberdade de imprensa, expondo ainda mais jornalistas ao assédio, à intimidação e à censura por parte das autoridades”.

Repressão a protestos pacíficos

A polícia angolana deteve arbitrariamente ativistas e manifestantes pacíficos ao longo do ano. Alguns detidos foram posteriormente libertados sem acusação, enquanto outros foram absolvidos nos tribunais por falta de provas.

Em abril, um tribunal de Luanda absolveu 33 pastores e trabalhadores da Igreja Pentecostal Universal do Reino de Deus (IURD) que foram detidos durante um protesto pacífico contra a nova liderança da igreja. Promotores acusaram o grupo de perturbação de reunião religiosa, participação em tumulto, desobediência a ordens policiais e ofensas a integridade física. O tribunal decidiu que não encontrou provas dos crimes.

Em junho, autoridades libertaram, sem apresentar acusações, 11 ativistas detidos pela polícia durante um protesto pacífico contra políticas governamentais, as quais, segundo eles, estavam “empobrecendo os angolanos”. O grupo também exigia a libertação de presos políticos.  

Em agosto, autoridades detiveram e depois liberaram após várias horas, sem acusação, dezenas de ativistas e manifestantes que protestavam pacificamente contra a nova lei de vandalismo. A polícia também deteve jornalistas que cobriam os protestos e confiscou seus equipamentos de trabalho.

Condições precárias nas prisões

Prisões angolanas continuaram a sofrer com a superlotação. As 43 unidades prisionais do país têm capacidade para 22.554 detentos. A população carcerária atual é de 24.068 pessoas, com metade em prisão preventiva ou em prisão pré-julgamento. O diretor nacional de direitos humanos, Yannick Bernardo, atribuiu o excesso de prisão preventiva como a principal causa da superlotação.

Autoridades enfrentam dificuldades para implementar alternativas à pena de prisão, introduzidas pelo novo Código Penal de 2020, incluindo serviços comunitários e prisões domiciliares.

Relatos indicam que autoridades penitenciárias cometeram abusos contra quatro ativistas detidos que foram condenados e sentenciados, juntamente com outros três, por um tribunal de Luanda em setembro de 2023 por “insultar o presidente”. Eles foram detidos três dias antes de um anunciado protesto. A Anistia Internacional acusou as autoridades angolanas de negar deliberadamente assistência médica aos ativistas, inclusive cirurgias urgentes, o que pode configurar tortura ou outros maus-tratos.