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Angola

Eventos de 2022

Polícia montada vigiando membros do partido UNITA, durante uma manifestação em Luanda, no dia 24 de Setembro de 2022.

© 2022 JULIO PACHECO NTELA/AFP via Getty Images

O presidente João Lourenço foi reeleito para um segundo mandato nas eleições realizadas em 24 de agosto, cujos resultados foram muito contestados. O Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA), no poder, prolongou o seu mandato de cinco décadas, mas perdeu a maioria de dois terços no parlamento. A coligação liderada pela União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) conseguiu, pela primeira vez, mais votos na capital, Luanda, do que o partido no poder.

Na sua maioria, a votação decorreu de forma pacífica, mas foi marcada por fortes restrições à liberdade de expressão e reunião, bem como por um acesso limitado à informação devido à repressão e censura do governo nos órgãos de comunicação do Estado e nos meios de comunicação privados controlados por oficiais do partido no poder.

O presidente prometeu dar prioridade à criação de emprego para os jovens, bem como respeitar os direitos humanos, especialmente os das minorias e dos grupos marginalizados, como crianças e idosos.

As forças de segurança continuaram a usar força excessiva, intimidação e detenções arbitrárias contra manifestantes pacíficos, com impunidade. A imprensa foi atacada em diversas ocasiões ao longo de 2022.

Em julho, o ex-presidente de longa data de Angola, José Eduardo dos Santos, morreu em Barcelona, Espanha, aos 79 anos, após anos de doença prolongada.

Abusos cometidos pelas forças de segurança do Estado

As forças de segurança do Estado continuaram a ser implicadas em graves abusos dos direitos humanos, incluindo uso excessivo e desnecessário de força contra manifestantes pacíficos, bem como intimidação e detenções arbitrárias de ativistas.

Em 10 de Janeiro, a polícia deteve arbitrariamente pelo menos 17 pessoas em Luanda, entre elas taxistas pacíficos que se reuniram para uma greve nacional anunciada, em protesto contra as regras da COVID-19, que limitavam o número de passageiros permitidos nos transportes públicos e privados. As restrições da COVID-19, segundo a associação de taxistas, afetaram negativamente os rendimentos e a subsistência dos seus membros. Um porta-voz da polícia afirmou que os taxistas atacaram um escritório do MPLA e incendiaram um autocarro. No entanto, vários taxistas disseram à Human Rights Watch que o ataque ao autocarro e ao escritório foi iniciado por habitantes locais, antes do início da greve.

No dia 9 de abril, em Luanda, a polícia deteve e acusou 22 pessoas que protestavam pacificamente contra a detenção de presos políticos e pela realização de eleições livres e justas em agosto. Entre os detidos estavam Laurinda Gouveia e o seu bebé de seis meses. Mãe e bebé foram mantidos mais de 48 horas numa cela sobrelotada, sem comida nem água. Em 14 de abril, um juiz do Tribunal Provincial de Luanda ordenou a libertação de 20 dos 22 manifestantes por falta de provas que os ligassem aos crimes de motim e desobediência à ordem de dispersão. Os outros dois foram condenados por desobediência civil e ordenados a pagar o equivalente a 135 USD em multas.

No dia 31 de julho, a polícia usou cassetetes e paus para impedir que um grupo de ativistas pacíficos se reunisse para protestar contra a detenção de presos políticos em Luanda. A polícia também deteve pelo menos 10 ativistas, que foram libertados posteriormente, na esquadra.

Em 17 de agosto, a polícia deteve dezenas de manifestantes e ativistas da sociedade civil que se reuniram perto do cemitério de Santa Ana, para protestar contra supostas irregularidades eleitorais. Entre os detidos estava o correspondente da Voz da América (VOA), Coque Mokuta.

No dia 29 de agosto, o grupo angolano de direitos Amigos de Angola denunciou atos de intimidação policial contra membros do movimento cívico “Mudei”. Numa carta ao Gabinete do Provedor de Justiça, à Comissão de Direitos Humanos e ao Ministério da Justiça e Direitos Humanos, o grupo exigiu a libertação incondicional de seis ativistas, entre eles duas mulheres, que foram detidos arbitrariamente enquanto tentavam protestar contra as eleições, na província do Uije, nos dias 25 e 26 de agosto.

Em 14 de setembro, um dia antes da tomada de posse do presidente, a polícia impediu a realização de uma manifestação contra os resultados das eleições perto do cemitério de Santa Ana e deteve três ativistas políticos, de forma arbitrária, durante uma entrevista à rádio no local da manifestação. Amigos e familiares de Zola Mandela, um ativista político, disseram à Human Rights Watch que, no mesmo dia, este foi levado de sua casa, contra sua vontade, por homens que se identificaram como agentes da polícia.

Liberdade dos meios de comunicação social

A imprensa foi atacada em diversas ocasiões ao longo de 2022. Em alguns casos, membros do público e das forças de segurança foram implicados em casos de intimidação, ataques físicos e verbais, bem como na detenção arbitrária de jornalistas.

Em 10 de janeiro, seis jornalistas ao serviço dos meios de comunicação TV Zimbo e TV Palanca foram agredidos por pessoas não identificadas e forçados a fugir para um local seguro quando cobriam uma greve nacional de taxistas em Luanda. O secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos, Teixeira Cândido, disse ao Comité para a Proteção dos Jornalistas que os jornalistas dos órgãos de comunicação públicos em Angola são cada vez mais alvo da raiva por subentendimento do preconceito contra o governo e o partido no poder.

No dia 10 de Fevereiro, um correspondente da rede de notícias alemã Deutsche Welle (DW) no Cuanza Norte, foi brutalmente agredido por seguranças privados de um grande supermercado regional, enquanto investigava um caso de intoxicação alimentar. Os seguranças também apreenderam os equipamentos do jornalista da DW e de dois outros funcionários da rádio local Eclesia.

No dia 17 de agosto, o correspondente da Voz da América (VOA) em Luanda, Coque Mokuta, foi detido arbitrariamente pela polícia enquanto filmava uma manifestação. Coque Mokuta disse à Human Rights Watch que foi mantido dentro de um carro que circulou por Luanda durante várias horas enquanto era interrogado. Mais tarde, foi libertado sem qualquer acusação e autorizado a levar o seu equipamento.

Em 25 de agosto, a DW apresentou uma queixa oficial ao Ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, depois de um dos seus jornalistas ter sido arbitrariamente detido e interrogado durante uma hora por agentes da polícia em Malange, por ter filmado os procedimentos numa assembleia de votação, durante as eleições de 24 de agosto.

Milhões de angolanos em todo o país continuam sem acesso a informação gratuita, diversificada e imparcial. Isto deve-se ao facto de Angola continuar a ser o único país da África Austral sem estações de rádio comunitárias. A lei angolana de radiodifusão, atualmente em análise, estipula taxas de licença de mais de 100 000 USD para estações locais e comunitárias, um valor que os grupos locais de direitos de comunicação consideram proibitivo.

Antes das eleições gerais de 24 de agosto, ativistas e grupos de direitos da comunicação social acusaram os órgãos de comunicação do Estado, que têm a maior cobertura do território angolano, de serem parciais em relação ao partido no poder e aos seus candidatos. O representante do grupo de direitos da comunicação social Misa-Angola, André Mussano, disse que, em alguns casos, “90% do tempo de antena [durante a campanha eleitoral] foi dedicado a uma das partes [o partido no poder]”.

Direitos das mulheres e meninas

Persistiram em Angola as desigualdades de género generalizadas, especialmente nos níveis mais altos do poder político. No entanto, o país registou avanços significativos no número de mulheres em cargos ministeriais e cargos relevantes, no seguimento das eleições de 24 de agosto. Os cargos de topo do Estado, incluindo o vice-presidente e presidente do parlamento, serão ocupados por mulheres. Ao nível do governo, as mulheres encabeçarão 10 dos 28 cargos ministeriais.

Em maio, Angola lançou um capítulo nacional da African Women Leaders Network (AWLN), um movimento de mulheres africanas na liderança implementado com o apoio do Gabinete da Enviada Especial da União Africana para as Mulheres, Paz e Segurança e a Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Género e o Empoderamento das Mulheres (ONU Mulheres). Este capítulo nacional visa reforçar a liderança das mulheres na transformação de África.

Angola carece de uma política de readmissão ou de continuação dos estudos que proteja o direito das meninas grávidas à educação. Esta situação levou a uma aplicação irregular dos direitos à educação, deixando as estudantes à mercê dos funcionários das escolas a quem cabe decidir o rumo da sua educação ou das atitudes discriminatórias e barreiras sociais que as pressionam a desistir de estudar.

Principais atores internacionais

Vários países e organismos internacionais, incluindo a União Africana (UA), a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), a União Europeia (UE) e os Estados Unidos (EUA) felicitaram os angolanos pelo “ambiente pacífico” durante as eleições de agosto. A UE também instou as autoridades angolanas a responderem às queixas da oposição.

No seu discurso de posse, o presidente angolano João Lourenço reiterou o compromisso do seu governo com a resolução pacífica dos conflitos na região da SADC e na República Centro-Africana, bem como nas zonas fronteiriças entre a República Democrática do Congo, o Ruanda e o Uganda.

No início de julho, o presidente Félix Tshisekedi da República Democrática do Congo (RDC) e o seu homólogo ruandês, Paul Kagame, acordaram, numa cimeira organizada por Angola, abrandar as tensões da insurgência rebelde na fronteira dos dois países.

Em Agosto, durante a sua visita a Kinshasa, o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, manifestou o seu apoio aos esforços de mediação entre a RDC e o Ruanda, liderados em parte por Angola.