Confrontados por uma série de desafios estratégicos, como a votação do Reino Unido para deixar o bloco, ataques de violentos extremistas e o aumento de popularidade de partidos populistas anti-imigração, os governos e as instituições da União Europeia responderam, em 2016, com ações que frequentemente deixaram de lado valores essenciais e proteções a direitos, em vez de trabalharem em conjunto para defendê-los.
Migração e refúgio
A UE como um todo fracassou em mostrar liderança e solidariedade frente à maior crise global de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial. Muito do debate em torno das respostas políticas a esta crise restringiu-se às preocupações quanto ao impacto na segurança e na identidade cultural europeia e ao fortalecimento de partidos populistas de plataformas xenofóbicas. Políticas da UE voltaram-se principalmente à prevenção de novas chegadas de imigrantes e terceirização da responsabilidade pelos solicitantes de refúgio e refugiados a outros países e regiões.
O fechamento de fronteiras ao longo da rota dos Balcãs e um acordo no mês de março com a Turquia contribuíram para uma sensível diminuição na chegada de refugiados às ilhas gregas no Mar Egeu, enquanto a migração em barcos do Norte da África para a Itália continuou no ritmo dos últimos anos. Nos primeiros 10 meses de 2016, quase 328.000 pessoas cruzaram o mar para chegar às costas europeias, comparado com 736.646 durante o mesmo período do ano anterior, de acordo com a Agência da ONU para Refugiados (UNHCR, em inglês; ACNUR, em português).
Cinquenta e oito por cento destes que chegaram pelo mar vieram dos 10 países que mais produzem refugiados no mundo, como Síria, Afeganistão, Iraque e Eritréia, de acordo com o ACNUR. Nigerianos, paquistaneses, gambianos, marfinenses e guineenses juntos representaram 21 por cento dos recém-chegados. Quase um terço dos imigrantes em busca de refúgio eram crianças, e a proporção de menores desacompanhados aumentou em relação aos anos anteriores.
Apesar da maior capacidade para operações de busca e resgate no Mediterrâneo e das diversas organizações não-governamentais (ONGs) conduzindo missões de resgate, até a metade de novembro 4.271 migrantes morreram ou desapareceram no mar, tornando 2016 o ano com o maior número de mortes registradas. A UE começou a treinar funcionários da guarda costeira da Líbia em meio a preocupações com a violência e as péssimas condições em centros de detenções líbias e com a falta de um sistema em funcionamento para o processamento de refúgios.
O fechamento das fronteiras na rota dos Balcãs e o aumento do controle nas fronteiras da Áustria, França e Suíça deixou os migrantes e as pessoas em busca de refúgio presos na Grécia e na Itália. Houve violentas tentativas de mandá-los de volta por meio das fronteiras entre Bulgária e Turquia e entre Macedônia e Grécia. Áustria, Dinamarca, Hungria, Suécia e Alemanha estão entre os Estados da UE que adotaram leis mais restritivas para refúgios.
Houve pouca vontade dos governos da UE em dividir a responsabilidade pelos solicitantes de refúgio de forma mais igualitária entre os países da união. De acordo com a Comissão Europeia, até a metade de novembro apenas 7.224 pessoas em busca de refúgio foram realocadas da Grécia e da Itália para outros países da UE, conforme um plano de emergência que havia sido acordado no grupo. A comissão propôs a criação de um mecanismo permanente de realocação para ajudar países que abrigam números desproporcionais de pessoas em busca de refúgio, mas este mecanismo permitiria a países fazerem pagamentos para evitar aceitarem realocações, preservando a convenção de Dublin, que confere a responsabilidade do processo dos casos de solicitantes de refúgio ao primeiro país de entrada do imigrante na UE.
Uma nova Guarda Costeira e de Fronteiras Europeia começou a funcionar em outubro. Substituindo a agência de fronteiras externas Frontex, a instituição tem mais autonomia dos Estados-membros e um papel reforçado em retornos, assim como um mecanismo de reclamações. Ela não possui um encargo explícito para buscas e resgates.
Em março, a UE assinou um controverso acordo com a Turquia para devolver ao país pessoas em busca de refúgio que chegavam à Grécia pelo mar em troca de bilhões de euros em assistência, além de comprometer-se a assentar um sírio no bloco para cada sírio devolvido à Turquia. Em junho, a Comissão anunciou uma nova “sistemática de parcerias nas migrações” criticada por ONGs de desenvolvimento, que prevê auxílios para cooperação em migrações, e começou a implantar projetos de controle de migrações com países como o Sudão e a Eritreia.
Governos da UE avançaram pouco em relação aos reassentamentos. Até julho de 2016, apenas 8.268 refugiados haviam sido trazidos a países da UE conforme um plano de julho de 2015 da UE para reassentar mais de 22.000 pessoas em até dois anos, embora alguns Estados tenham recebido números adicionais de pessoas por meio de acordos bilaterais. Dez países da UE falharam em reassentar sequer uma pessoa. O pouco progresso diminuiu as expectativas para a implementação por parte da Comissão de uma Estrutura Permanente de Reassentamentos na UE. A proposta transformaria a cooperação em imigrações num elemento para a decisão de reassentar ou não refugiados provenientes de um país anfitrião.
A Comissão Europeia apresentou um grande número de propostas em julho para reformar o defasado sistema de refúgios da UE. Elas incluem proteções mais sólidas às crianças e maior acesso a advogados, mas puniriam solicitantes de refúgio por mudarem-se de um país da UE para outro e tornariam mais fácil a rejeição sumária de pedidos de refúgio e a revogação da condição de refugiado. As leis ainda precisavam ser aprovadas pelo Conselho e pelo Parlamento até a elaboração deste relatório.
Discriminação e intolerância
A crise de refugiados em andamento, os ataques feitos por extremistas armados na Bélgica e na França e os reforçados sentimentos xenofóbicos, islamofóbicos e anti-imigrantes na Alemanha resultaram em ataques contra muçulmanos, migrantes e àqueles percebidos como estrangeiros e no apoio a partidos populistas anti-imigração em muitos países da UE.
O antissemitismo, incluindo crimes de ódio contra judeus, continua a constituir uma séria preocupação para alguns Estados da UE, incluindo a França e o Reino Unido. Em uma resolução de abril para o combate ao antissemitismo na Europa, a Assembleia Parlamentar do Conselho Europeu observou que membros da comunidade judaica frequentemente sofrem insultos e violências físicas por toda a Europa.
Em setembro, o Alto Comissário da ONU para Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, alertou líderes de partidos populistas da Europa para os efeitos corrosivos na sociedade causados pela instrumentalização que fazem da intolerância e da xenofobia para fins políticos.
Em seu relatório anual de maio, o Conselho da Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância observou a existência de uma tendência à islamofobia e aos sentimentos anti-imigração, e enfatizou a necessidade do combate à violência racista. O Comissário do Conselho Europeu para Direitos Humanos, Nils Muižnieks, solicitou aos países europeus que priorizem a integração de migrantes, incluindo por meio da garantia de proteções efetivas contra a discriminação.
Em junho, a Comissão Europeia lançou o Grupo de Alto Nível para combate ao racismo, à xenofobia e a outras formas de intolerância, de forma a aumentar os esforços feitos pelos Estados-membros da UE para impedir crimes de ódio. Em um relatório de abril, a Agência dos Direitos Fundamentais da UE afirmou que crimes de ódio frequentemente não são reportados e tampouco resultam em processos criminais, e instou os Estados-membros a melhorarem o acesso das vítimas à justiça.
Em maio, a Rede Europeia contra o Racismo relatou que mulheres muçulmanas eram o principal alvo de islamofobia em oito países da UE pesquisados.
Em fevereiro, Muižnieks, o Comissário do Conselho Europeu para Direitos Humanos, pediu o fim da expulsão forçada de pessoas da etnia Roma de diversos países europeus, e observou que essa prática aumenta ainda mais a vulnerabilidade das famílias de etnia Roma, impedindo sua inclusão social e a possibilidade de frequência escolar regular para suas crianças.
Em maio, o Secretário-Geral do Conselho Europeu, Thorbjørn Jagland, instou os governos a garantirem um ambiente escolar seguro para crianças, livre de violências, bullying e discriminação de todos os tipos, incluindo de suas orientações sexuais ou identidade de gênero.
Em março, a Comissão Europeia propôs que a UE ratificasse a Convenção de Istambul sobre Violência Doméstica. A Comissária da UE para Justiça, Vera Jourova, afirmou que uma em cada três mulheres na UE já passou por violência física ou sexual ou por ambas, e instou os 12 Estados-membros que ainda não ratificaram a convenção a fazê-lo.
Malta foi um dos oito países da UE que começou a implantar um projeto piloto para adoção de um cartão da UE para pessoas com deficiência, que garantiria o reconhecimento mútuo de direitos e benefícios para os 80 milhões de pessoas com deficiência que vivem na Europa. Num relatório publicado em agosto, a Agência dos Direitos Fundamentais da UE observou que brechas nas triagens impediam migrantes com deficiência de receberem o apoio adequado durante os procedimentos de chegada, registro e solicitação de refúgio.
Terrorismo e combate ao terrorismo
Ataques na Bélgica, França e Alemanha, atribuídos por muitos ao Estado Islâmico (ISIS, na sigla em inglês), mataram juntos muitas pessoas e feriram outras centenas. Os ataques geraram ou reforçaram medidas e propostas em países da UE para aumentarem os poderes policiais e de vigilância, para fortalecerem cooperações de inteligência e revogarema dupla cidadania daqueles envolvidos em atos terroristas.
Na Bélgica, país que sofreu ataques coordenados em 22 de março no aeroporto de Bruxelas e em uma estação de metrô, o governo propôs uma série de novas leis de combate ao terrorismo para expandir poderes de vigilância e detenção. Nenhuma havia entrado em vigor até a elaboração deste relatório.
Em março de 2016, os ministros da Justiça e dos Assuntos Internos da UE fizeram um acordo para uma diretiva preliminar para fortalecer a estrutura legal da UE para a prevenção de ataques terroristas, especialmente por meio da criminalização de atividades preparatórias, como o treinamento e as viagens ao exterior com fins terroristas. Grupos de direitos humanos manifestaram preocupação com as proteções insuficientes e as imprecisões da diretiva preliminar. Esta permanecia em consideração até a elaboração deste relatório.
Em abril, o Conselho da UE adotou a diretiva para regulamentar a transferência de informações pessoais de viajantes aéreos para forças de segurança dos Estados-membros, de forma a identificar possíveis ameaças terroristas e outros crimes graves.
Em junho, o Parlamento Europeu solicitou novamente investigações sobre a cumplicidade de países da UE com torturas da CIA e prisões secretas em solo europeu, refletindo o pouco progresso feito até o momento pelas investigações nacionais. As investigações criminais da Polônia e da Lituânia permaneciam estagnadas e as do Reino Unido foram concluídas sem nenhuma denúncia feita.
Croácia
Menos de 500 pessoas pediram refúgio na Croácia nos nove primeiros meses de 2016. Trinta e quatro receberam alguma forma de proteção durante o mesmo período. Restrições nas rotas de migração dos Balcãs Ocidentais diminuíram o número de chegadas. A Croácia continua a repelir pessoas em busca de refúgio e migrantes que tentam entrar no país pela Sérvia.
Embora o governo tenha avançado na oferta de abrigos para um pequeno número de migrantes de fora dos Balcãs Ocidentais que recebeu proteção, refugiados e solicitantes de refúgio de fora da região continuam a enfrentar dificuldades para acessar empregos e educação. Crianças migrantes e solicitantes de refúgio desacompanhadas continuam a ser encaminhadas para instituições de abrigos, incluindo abrigos para crianças com problemas comportamentais, sem acesso à educação e tutela adequados.
Pessoas com deficiência seguem enfrentando exclusão e discriminação, incluindo barreiras que as impedem de participar na sociedade em condições iguais aos outros. O sistema de tutela nega o direito de quase 18.000 pessoas com deficiência de fazerem uma série de escolhas sobre suas próprias vidas.
Em fevereiro, a Corte Europeia de Direitos Humanos (ECtHR, em inglês) concluiu que a Croácia discriminou uma mulher da Bósnia e Herzegovina com base em sua orientação sexual, ao negar a ela o seu direito de obtenção de um visto de residência na Croácia para unir-se à sua parceira.
Em abril, Muižnieks, o Comissário do Conselho Europeu para Direitos Humanos, expressou preocupação com o relatado aumento da discriminação, da intolerância étnica e dos discursos de ódio dirigidos a membros de minorias, sobretudo a judeus, Roma e sérvios. O Comissário também alertou para a resposta estatal inadequadaa ataques físicos, ameaças de morte e intimidações contra jornalistas.
Segundo dados de agosto de 2016, mais de 2.800 pessoas, a maioria delas da etnia Roma, permaneciam apátridas ou sob o risco de perderem a nacionalidade. Elas enfrentam especiais dificuldades para acessar serviços estatais básicos, como cuidados de saúde, assistência social e moradia adequada. Crianças Roma sofrem uma segregação de facto no sistema educacional.
Estônia
De acordo com dados de janeiro de 2016 do Ministério do Interior, aproximadamente 6,1 por cento da população de 1,3 milhões de pessoas do país permanece apátrida, uma pequena diminuição em relação a 2015.
A falta de nacionalidade afeta desproporcionalmente russos étnicos, que perderam suas cidadanias após a Estônia declarar independência da União Soviética em 1991 e declarar políticas de retirada de cidadania de não-estonianos. Pessoas apátridas continuam a enfrentar obstáculos significativos para o acesso a todos os direitos de trabalho e são impedidos de assumir alguns cargos públicos, como os de juiz, policial e promotor.
Novas emendas à Lei de Cidadania entraram em vigor no dia 1º de janeiro de 2016. Elas garantem a cidadania estoniana automática às crianças nascidas de pais apátridas, enquanto antigamente era necessário que os pais a solicitassem para que as crianças pudessem obtê-la. Pais podem recusar a garantia de cidadania estoniana aos seus filhos por até um ano. As emendas também isentam pessoas de 65 anos ou mais de fazer a parte escrita do exame obrigatório de língua estoniana para a naturalização.
A exigência da língua estoniana permanece sendo a maior barreira para a naturalização da população do país que fala russo. Os custos da naturalização, incluindo a preparação e a aplicação de exames de língua e a exigência de renda para a obtenção de cidadania, impedem a naturalização de residentes de longo prazo mais pobres, contribuindo para o número significativo de apátridas de língua russa. O governo só reembolsa os custos com aulas de idioma depois que o candidato é aprovado no exame.
O governo fracassou na adoção de emendas que permitiriram que a Lei de Coabitação passasse a vigorar integralmente em 2016. A lei estende os direitos do casamento a casais não casados - incluindo os de mesmo sexo – abrangendo, entre outras coisas, direitos de adoção e propriedade.
A Estônia mantém uma política minimalista de refugiados. Até novembro, o governo havia recebido 66 solicitantes de refúgio da Grécia conforme o programa de realocação da UE, de acordo com a Comissão Europeia.
França
A França sofreu três ataques de autoria assumida do Estado Islâmico em junho e julho, incluindo um ataque com um caminhão que matou 86 pessoas e feriu outras centenas. O estado de emergência declarado pelo presidente François Hollande após os ataques de 2015 em Paris e em Saint-Denis foi renovado pelo Parlamento em fevereiro e em maio de 2016.
No dia 21 de julho, alguns dias após os ataques de Nice, o Parlamento acolheu uma nova lei estendendo o estado de emergência por mais seis meses e expandindo poderes policiais já amplos de busca, apreensão e detenção.
A nova lei endurece diversas medidas relacionadas ao terrorismo no código penal e nas leis criminais francesas. Ela restabelece apreensões, sem autorização prévia, de informações de computadores e celulares, que já haviam sido previamente consideradas inconstitucionais pela mais alta corte da França, adicionando proteções que continuam longe da fiscalização judicial devida.
A lei veio apenas poucas semanas após a adoção pelo Parlamento, em junho de 2016, de uma lei de amplo combate ao terrorismo criticada pela Comissão Nacional Consultiva de Direitos Humanos da França (CNCDH, em francês) por restrições de liberdades.
Entre novembro de 2015 e julho de 2016, a polícia conduziu quase 4.000 invasões sem autorização prévia e colocou quase 400 pessoas em prisão domiciliar, respaldada pela lei de emergência. Essas ações, no entanto, levaram a apenas seis investigações criminais relacionadas a terrorismo. As medidas visaram principalmente muçulmanos e levaram a abusos de direitos à liberdade, à privacidade, liberdade de ir e vir e de não-discriminação.
Uma comissão francesa de inquéritos sobre os ataques de Paris concluiu, em 5 de julho, que o estado de emergência teve “impacto limitado” na melhoria da segurança. A comissão descreveu falhas importantes em análises de inteligência que poderiam ter ajudado a impedir os ataques. Num relatório de maio sobre a França, o Comitê da ONU contra Tortura manifestou preocupação com o uso excessivo da força pela polícia em suas buscas realizadas em casas no contexto do estado de emergência, assim como durante manifestações.
Em agosto de 2016, prefeitos de aproximadamente 30 cidades adotaram decretos proibindo mulheres de usar roupas de banho que cobrem todo o corpo (conhecidas como “burkinis”) ou qualquer outra roupa que esconda o corpo na praia, sob a alegação de que estas podem colocar em risco a ordem pública.
A Liga Francesa para os Direitos do Homem e do Cidadão e o Coletivo contra a Islamofobia na França contestaram essas proibições diante de cortes administrativas. Em agosto, o Conselho de Estado, a mais alta corte administrativa da França, julgou que a proibição em uma das cidades violou liberdades fundamentais e ordenou que fosse suspensa. Algumas proibições foram posteriormente revogadas por algumas cidades ou derrubadas por cortes inferiores, enquanto outras cortes mantiveram as proibições apesar da ordem do Conselho de Estado.
O número de migrantes em um acampamento em Calais conhecido como “a selva” chegou a 6.900, mais do dobro do estimado um ano mais cedo, de acordo com autoridades. ONGs insistem que os números são ainda maiores do que os divulgados. No dia 7 de julho, a Comissão Nacional Consultiva de Direitos Humanos da França manifestou preocupação com o aumento do número de migrantes vivendo em Calais em condições “contrárias à dignidade humana”.
Um levantamento de 2016 sobre crianças desacompanhadas nos acampamentos de Calais e Dunkirk feito pela UNICEF descobriu que essas estavam sujeitas à exploração sexual, violência e trabalhos forçados. Na última semana de outubro, as autoridades francesas desmontaram o acampamento. Entre 24 e 26 de outubro, aproximadamente 5.600 pessoas foram realocadas para centros de recepção pela França, com algumas crianças desacompanhadas sendo levadas ao Reino Unido (ver abaixo). Verificações arbitrárias de idade resultaram na exclusão de alguns menores desacompanhados do processo específico voltado às crianças.
A França havia aceitado 2.091 pessoas em busca de refúgio realocadas da Grécia e 231 da Itália até a elaboração deste relatório, o maior número de todos os Estados da UE sob o plano de realocação.
Em julho, o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU criticou a recepção e as instalações de acomodação “abaixo dos padrões” para solicitantes de refúgio na França.
Também em julho, a Assembleia Nacional considerou muito onerosa a medida que obrigaria policiais que fazem a verificação das identidades dos migrantes a registrarem o procedimento em documentos por escrito. A proposta havia sido considerada como uma importante maneira de identificar verificações discriminatórias, por parte de defensores de direitos humanos.
Em novembro, a Corte de Cassação francesa tomou decisões contra o Estado em três casos de verificações de identidade feitas pela polícia envolvendo discriminação étnica, considerando as verificações “discriminatórias” e que o Estado havia cometido um “grave erro”. De acordo com um relatório da CNCDH publicado no mesmo mês, há cada vez mais provas de estudos diferentes de que jovens visivelmente pertencentes a minorias são sobrerrepresentados em verificações policiais.
Um relatório de abril feito pela CNCDH expressou preocupação com o aumento de denúncias à polícia de incidentes racistas, antissemitas e islamofóbicos em 2015.
As prisões francesas continuam gravemente superlotadas e a taxa de suicídios de presos permanece alta, especialmente entre mulheres, o que levou a críticas em julho do Comitê da ONU para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres (CEDAW, em inglês). Presos com deficiências psicossociais frequentemente têm acesso inadequado a cuidados de saúde mental.
Alemanha
Em 2016, a Alemanha continuou a lidar com as implicações da chegada de 890.000 solicitantes de refúgio e migrantes em 2015. Uma série de ataques em julho, alguns inspirados ou atribuídos ao EI, colocaram em evidência as políticas de combate ao terrorismo do país.
Autoridades buscaram responder a uma onda de incêndios criminosos de abrigos de pessoas em busca de refúgio. Polícias federais relataram mais de 850 ataques do tipo entre janeiro e a metade de novembro de 2016.
Autoridades tomaram algumas medidas para solucionar as falhas nas respostas da Alemanha aos crimes de ódio, incluindo o treinamento de forças de segurança e de autoridades judiciais para que aperfeiçoassem a investigação e o processo criminal de crimes motivados por raça. Em março, um juiz de uma corte distrital sentenciou três pessoas à prisão por jogarem uma bomba de gasolina em um apartamento de um solicitante de refúgio e apontou para os motivos racistas e xenofóbicos por trás do ataque.
Diversas mudanças foram feitas nas leis e políticas de refúgio. Em fevereiro, o Parlamento federal aprovou restrições aos direitos de reunião familiar para pessoas que não se encaixam completamente na condição de refugiados, e, em julho, aprovou uma lei voltada à integração de refugiados, beneficiários de proteção subsidiária e alguns solicitantes de refúgio. A lei concede o acesso a benefícios e à residência permanente sob a condição da cooperação do migrante com a língua e com outras exigências para integração.
Após uma série de ataques em julho, a Alemanha introduziu emendas em diversas leis existentes de combate ao terrorismo, num esforço para aumentar a coordenação entre as agências de inteligência. A corte superior da Alemanha derrubou em abril, baseada no argumento de garantias inadequadas de proteção à privacidade, partes de uma lei de combate ao terrorismo de 2009 que aumentava a autoridade da polícia federal para investigar e reunir informações sobre ameaças terroristas.
Em outubro e novembro, respectivamente, ambas as casas do parlamento alemão aprovaram uma lei permitindo a vigilância de jornalistas fora da UE, apesar das críticas contundentes feitas à medida por parte de grupos de direitos humanos, pela representante da OSCE (Organização para Segurança e Cooperação na Europa) para liberdade de imprensa e por três relatores especiais da ONU. Diversos grupos anunciaram em seguida a intenção de desafiar a constitucionalidade da lei nas cortes.
Ataques sexuais em massa contra mulheres em Colônia, Hamburgo e outras cidades alemãs na véspera de ano novo levantaram debates sobre o fracasso da polícia em responder efetivamente à violência contra mulheres. Em julho, a Alemanha tornou mais fácil processar criminalmente suspeitos de violência sexual ao remover um requisito que exigia a resistência física da vítima ao violador para que esta pudesse fazer acusações.
Grécia
Apesar de reformas voltadas a resolver problema crônicos, o defasado sistema de recepção e refúgio da Grécia piorou. Embora o número de migrantes pelo mar tenha caído após o acordo UE-Turquia, o fechamento de fronteiras ao longo da rota dos Balcãs impediu a saída de solicitantes de refúgio, e a solidariedade limitada de outros governos da UE e as chegadas em andamento de pessoas pelo mar deixaram mais de 60.000 indivíduos em busca de refúgio e migrantes “presos” no país.
Milhares de pessoas que chegaram após o acordo UE-Turquia tiveram a permanência restrita às ilhas do Egeu, frequentemente em instalações fechadas, enquanto dezenas de milhares enfrentam condições horríveis por todo o país. Até a metade do mês de novembro, apenas 5.654 solicitantes de refúgio haviam sido realocados da Grécia para outros países da União Europeia, frente aos 66.400 planejados inicialmente, mesmo com a pressão da Comissão Europeia para que a Grécia passasse a aceitar o retorno de refugiados que haviam passado pelo país conforme a convenção de Dublin.
Uma lei grega adotada em abril para facilitar a implementação do acordo UE-Turquia permite a análise acelerada da admissibilidade de solicitantes de refúgio, de forma a determinar se essas pessoas podem retornar em segurança para a Turquia para receber proteção temporária ou se devem ter seus pedidos avaliados na Grécia. Até a elaboração deste relatório, apenas 12 solicitantes de refúgio haviam tido seus casos considerados inadmissíveis após entrarem com recursos, mas nenhum deles havia sido deportado para a Turquia. Pelo menos um sírio está questionando a decisão à mais alta corte da Grécia, o Conselho de Estado.
Conforme o acordo da UE com os turcos, mais de 700 pessoas foram “devolvidas” para a Turquia após terem seus pedidos analisados e rejeitados por um procedimento acelerado feito na fronteira da Grécia, sob a alegação de não atenderem aos critérios para serem consideradas refugiadas, de não terem preenchido um pedido de refúgio ou por concordarem em sair voluntariamente do país.
A maioria dos solicitantes de refúgio que entrou na Grécia chegou pela ilhas do Egeu e teve seus pedidos processados em centros de triagem da UE. Mais de 16.000 pessoas em busca de refúgio e migrantes que permanecem nos centros de triagem das ilhas enfrentam condições espantosas de recepção e detenção, incluindo grave superlotação, escassez considerável de abrigos básicos e condições pouco higiênicas. Mulheres, crianças e pessoas com deficiência são especialmente afetadas.
Filas gigantes para alimentos de baixa qualidade, má administração e falta de informação contribuíram para uma atmosfera caótica e instável. Brigas aconteceram com frequência, às vezes sem intervenção policial, especialmente nas filas para comida, e mulheres e meninas ficaram expostas à violência e ao assédio sexual.
Autoridades gregas receberam críticas sobre suas falhas em implantar sistemas que permitiriam o desembolso integral da assistência da UE para melhorar as condições de recepção.
Estima-se que 4.370 crianças migrantes desacompanhadas entraram na Grécia durante o ano, de acordo com o Centro Nacional de Solidariedade Social (EKKA, em grego). Crianças migrantes e em busca de refúgio foram frequentemente presas em celas policiais ou em instalações fechadas nas ilhas, devido à falta de abrigos adequados para a acomodação de menores. Até a elaboração deste relatório, um número estimado de 1.610 crianças estavam à espera de alocação para instalações próprias a elas.
Um processo em larga escala de pré-registro de refúgio entre junho e julho destinava-se a melhorar o acesso ao refúgio e acelerar a realocação, beneficiando 27.592 solicitantes de refúgio. Apesar desses esforços, o acesso ao refúgio permanecia difícil e sujeito a atrasos.
Grupos da sociedade civil relataram um aumento de ataques e intimidações contra solicitantes de refúgio e migrantes nas ilhas e no continente na segunda metade do ano, além de denunciarem as respostas inadequadas da polícia à situação. Em uma decisão histórica, a ECtHR criticou a Grécia por fracassar em investigar adequadamente um ataque racista contra um afegão em 2009.
Em setembro, Muižnieks, o Comissário do Conselho Europeu para Direitos Humanos, instou a Grécia a proteger os direitos humanos de pessoas com deficiência intelectual e psicossocial e tirá-las de instalações inapropriadas e integrá-las à comunidade. Crianças com deficiência foram removidas de uma instituição na cidade de Lechaina famosa por práticas abusivas, mas, em alguns casos, foram enviadas a outras instituições similares em vez de creches comunitárias.
Hungria
A Hungria teve uma diminuição significativa nas solicitações de refúgio em 2016. Até o começo de setembro, a Hungria havia registrado 26.192 solicitantes de refúgio, comparado com mais de 150.000 pedidos durante o mesmo período de 2015, de acordo com o ACNUR. A maioria desses pedidos em 2016 veio do Afeganistão e da Síria.
O fechamento das fronteiras da rota dos Balcãs Ocidentais em fevereiro de 2016, somado às medidas cada vez mais restritivas na fronteira da Hungria com a Sérvia e à perseguição criminal daqueles que cruzam as fronteiras de forma irregular contribuiu para essa diminuição.
Uma lei de abril restringiu os direitos das pessoas em busca de refúgio e cortou o apoio à integração daqueles reconhecidos como refugiados. No mesmo mês, o governo anunciou o fechamento da maior instalação para recepção de migrantes até o fim de 2016.
Um procedimento acelerado na fronteira efetivamente barra solicitantes de refúgio de ter acesso significativo ao processo de refúgio. Uma lei de julho legalizou ações contra o avanço de migrantes, empurrando-os à fronteira com a Sérvia, e permitindo que policiais levassem à fronteira qualquer pessoa que estivesse oito quilômetros dentro da Hungria em situação irregular. A lei, junto às poucas permissões de entrada no país, deixa solicitantes de refúgio – incluindo crianças, famílias e pessoas com deficiência – “presas” nas fronteiras por semanas em péssimas condições.
Durante o ano de 2016, o governo seguiu com sua retórica anti-imigração. Em fevereiro, o governo anunciou um referendo nacional sobre o plano de realocação da UE que exige que a Hungria aceite 1.294 refugiados e, em julho, lançou uma campanha anti-imigrantes que patrocinou e financiou com impostos. O baixo comparecimento ao referendo de outubro levou a resultados inválidos, ainda que a maioria dos votantes tenha apoiado o posicionamento do governo.
Jornalistas continuaram a trabalhar em ambientes hostis. Em setembro, o editor chefe do Budapest Business Journal, Tom Popper, demitiu-se após os donos da publicação lhe pedirem para parar de mencionar questões de refugiados na coluna editorial. O maior jornal diário de oposição, Nepszabadsag, fechou junto com sua página na internet sem nenhum aviso prévio em outubro, sob alegações do dono de perdas financeiras e circulação em queda.
A etnia Roma continua enfrentando discriminação em moradias, educação e cuidados de saúde públicos. Em setembro, o Comitê Consultivo do Conselho Europeu sobre a Convenção da Estrutura para a Proteção de Minorias Nacionais instou a Hungria a acabar com a segregação discriminatória de crianças de escola da etnia Roma.
Em agosto, uma corte inferior sentenciou um extremista de direita a 10 anos de prisão por ataques violentos cometidos entre 2007 e 2009, incluindo o arremesso de coquetéis molotov contra casas de parlamentares socialistas e um ataque a um bar gay em Budapeste.
Em janeiro, a ECtHR considerou que vigilâncias secretas conduzidas pela Força Tarefa Anti-Terrorismo da Hungria haviam violado direitos de privacidade. As bases para essa decisão incluíam o fracasso da Hungria em providenciar fiscalização judicial às ações da Força Tarefa e a instauração de outras garantias necessárias e efetivas.
Em julho, a ECtHR julgou que a Hungria havia detido arbitrariamente um homem gay iraniano e fracassado em considerar sua vulnerabilidade na prisão devido à sua orientação sexual.
Até o fim de outubro, 26 pessoas sem-teto haviam sido acusadas de mau comportamento conforme decretos locais proibindo desabrigados de viver em espaços públicos, comparado com 71 pessoas acusadas pelo mesmo motivo nos 10 primeiros meses de 2015.
Itália
Até a metade de novembro, 164.695 migrantes e solicitantes de refúgio haviam chegado à Itália pelo mar, de acordo com o ACNUR. Nigerianos, eritreus e sudaneses representavam os maiores grupos nacionais. O número de crianças desacompanhadas aumentou significativamente, com uma estimativa de 23.000 viajando sozinhas à Itália até a metade de setembro comparado com 12.360 em todo o ano de 2015. A Organização Internacional para Migração estimou que 80 por cento das mulheres nigerianas que chegam na Itália haviam sido traficadas ou corriam risco de ser traficadas para realizar trabalhos sexuais.
Novos pedidos de refúgio e taxas de rejeição aumentaram se comparados com 2015, assim como o maior controle de fronteiras por países vizinhos diminuiu o avanço do movimento de migrantes. A maioria das pessoas em busca de refúgio passou por instalações temporárias de emergência de padrões variados. A preocupação com o uso da força para coleta de impressões digitais, assim como com as superlotações e com a falta de proteção às crianças desacompanhadas em centros de triagem continuava a existir. Até a elaboração deste relatório, apenas 1.570 solicitantes de refúgio haviam sido realocados para outros países da UE, contra 39.600 inicialmente previstos pelo plano da UE.
A Itália intensificou negociações sobre controle de migrações com países como o Sudão, Gâmbia e Líbia, incluindo para a facilitação de deportações. Em agosto, após um memorando de entendimento com o Sudão, a Itália deportou 48 sudaneses que supostamente não haviam buscado refúgio em meio a preocupações com o procedimento.
Uma proposta para tornar a tortura uma ofensa criminal na legislação nacional, aprovada pela câmara baixa do Parlamento em 2015, enfraquecia-se no Senado até a elaboração deste relatório.
Em fevereiro, a ECtHR ordenou à Itália que compensasse um clérigo egípcio conhecido como Abu Omar pela cumplicidade com sua rendição em 2003 e por fracassar em garantir a punição efetiva dos responsáveis pelo crime. Até a elaboração deste relatório, um dos 22 agentes da CIA condenados in absentia no caso por cortes italianas lutava pela sua extradição para Portugal. A recusa da Itália em conceder-lhe um novo julgamento está em discussão.
A Itália continuou a expulsar suspeitos de terrorismo sob um procedimento que explicitamente negava o direito a recorrer da decisão no país. A Itália expulsou 47 pessoas nos primeiros oito meses de 2016, muitas delas da Tunísia e do Marrocos.
Em abril, o Conselho do Comitê Europeu de Direitos Sociais afirmou que o fato de que 7 em cada 10 médicos na Itália serem “opositores conscientes” – o que significa que eles se recusam a praticar abortos em algumas ou todas as circunstâncias – cria graves dificuldades para mulheres acessarem abortos seguros e legais.
Em maio, casais do mesmo sexo passaram a ter a possibilidade de ter suas relações reconhecidas legalmente como uniões civis, embora não tenham o direito de adotar.
Letônia
Os apátridas continuam a ser uma grande preocupação. O ACNUR estima que, até o final de 2015, por volta de 252.000 habitantes do país eram efetivamente apátridas (referidos pelas autoridades como “não-cidadãos” ou “pessoas de nacionalidade indeterminada”). Apesar das reformas de 2013, milhares de crianças permaneciam apátridas.
A discriminação contra falantes da língua russa persiste, particularmente nas esferas do mercado de trabalho, do uso da língua e da educação. Não-cidadãos da Letônia são impedidos de ocupar certos cargos no serviço público e outras profissões. Eles também enfrentam restrições à propriedade de terras.
As autoridades continuaram a impor sanções contra indivíduos por supostamente não utilizarem o idioma letão para comunicações profissionais. De acordo com uma agência do governo intitulada Centro de Línguas da Letônia, 180 pessoas foram multadas por violações à lei de línguas do país nos primeiros seis meses de 2016. Em março, um funcionário de limpeza em uma escola que usa a língua russa foi demitido por não ter um nível adequado de domínio da língua letã, após uma inspeção realizada pelo Centro de Línguas da Letônia. Em junho, um terapeuta da fala foi forçado a abandonar o cargo num jardim de infância devido a uma inspeção similar. Em julho, o órgao multou o prefeito de Riga pelo uso de língua russa em publicações de mídias sociais da administração da cidade. O prefeito recorreu da decisão.
Em setembro, o Parlamento letão adotou na primeira leitura emendas preliminares à Lei de Fundações e Associações Públicas, criando amplas premissas para o governo fiscalizar ONGs consideradas prejudiciais à segurança nacional e à ordem e segurança pública.
De acordo com ativistas LGBT letões, autoridades usaram uma lei de 2015 sobre “educação moral constitucional” para censurar debates sobre pessoas LGBT em pelo menos duas escolas em 2016.
Até a elaboração deste relatório, a Letônia havia aceitado um total de 148 solicitantes de refúgio realocados da Grécia e da Itália conforme o plano de realocação da UE.
Holanda
Em fevereiro, o governo aumentou a lista de países terceiros considerados seguros. Presume-se que cidadãos de países considerados seguros não precisem de proteção internacional, o que significa, em muitos casos, que passarão por procedimentos de análise apressados, levantando questões sobre a qualidade da análise individual de pedidos de refúgio. Em setembro de 2016, a mais alta corte administrativa do país confirmou a legalidade da designação da Albânia como um país seguro.
O governo holandês continuou a oferecer um apoio limitado tanto em escopo quanto em tempo para solicitantes de refúgio rejeitados. A assistência é condicionada à cooperação do migrante em deixar o país. Em fevereiro, diversos relatores especiais da ONU pediram ao governo holandês que forneça assistência de emergência a solicitantes que tiveram seus pedidos de refúgio negados.
Grupos de direitos dos refugiados criticaram as autoridades holandesas pela demora do país em processar pedidos de refúgio e pelos longos procedimentos para a reunião de famílias.
No começo de 2016, ONGs relataram ameaças e discriminação contra solicitantes de refúgio LGBT em abrigos para migrantes, e um órgão independente de monitoramento, o Conselho Holandês de Proteção aos Direitos Humanos, descobriu em fevereiro que pessoas LGBT em busca de refúgio sofrem discriminação em uma grande instalação para migrantes.
Em maio, a Holanda adotou uma lei permitindo autoridades a retirar a cidadania holandesa de pessoas maiores de 16 anos com dupla cidadania, caso as autoridades considerem que essas juntaram-se ou lutaram com um grupo terrorista fora do país e representam uma “ameaça imediata” à segurança nacional. Nenhuma acusação criminal é necessária para o processo. Aqueles que tiverem a cidadania holandesa revogada têm apenas quatro semanas para recorrer da decisão.
Em janeiro, a Holanda ratificou a Convenção da ONU para os Direitos de Pessoas com Deficiência.
Polônia
A Polônia sofreu críticas internacionais pelas tentativas do Parlamento recém-eleito, liderado pelo Partido da Lei e Justiça, de enfraquecer a independência do Tribunal Constitucional, a mais alta corte do país.
Em novembro de 2015, o Parlamento cancelou as nomeações de todos os cinco juízes do colegiado do Tribunal Constitucional, eleitos pelo governo passado, e aprovou uma lei em dezembro que minou o funcionamento do tribunal. Quando o tribunal julgou em março que as mudanças eram inconstitucionais, o governo recusou-se a publicar a sentença ou a mudar a lei.
Em julho, o Parlamento adotou uma versão revisada da Lei do Tribunal Constitucional. ONGs polonesas manifestaram preocupação com a nova lei, afirmando que ela poderia paralisar a corte e afetar sua independência. O Tribunal Constitucional determinou que parte da nova lei era inconstitucional. Até a elaboração deste relatório, o Partido da Lei e Justiça estava preparando mais uma revisão preliminar da lei do Tribunal Constitucional.
Em março, a Comissão de Veneza, o órgão consultivo do Conselho Europeu sobre questões constitucionais, sentenciou que as emendas de dezembro de 2015 colocavam em risco a primazia do Estado de direito e instou o governo a respeitar o julgamento da Corte Constitucional. Em outubro, a Comissão de Veneza criticou a lei revisada de julho como sendo uma limitação à efetividade e independência do tribunal.
A crise levou a Comissão Europeia a ativar em janeiro, pela primeira vez, seu mecanismo de defesa do Estado de direito – criado em 2014 para desafiar medidas tomadas por Estados-membros da UE que ameaçassem direitos. Em julho, a Comissão Europeia deu ao governo três meses para publicar as determinações da Corte Constitucional e implementar as recomendações da Comissão de Veneza. Até a elaboração deste relatório, a comissão ainda não havia anunciado nenhuma ação subsequente.
Em janeiro, o Parlamento adotou emendas à Lei da Polícia que levantaram preocupações com a proteção da privacidade online. Em junho, o presidente Andrzej Duda assinou uma nova Lei de Combate ao Terrorismo que definia de forma vaga um “evento de natureza terrorista”, aumentava os poderes de investigação, especialmente sobre estrangeiros, regulava o acesso ao conteúdo online e aumentava poderes de busca e detenção.
Em outubro, após protestos massivos, o Parlamento recuou em uma proposta controversa apoiada pelo Primeiro Ministro polonês Beata Szydło que previa uma proibição quase total ao aborto. Em meio a contínuos protestos, o Partido da Lei e Justiça seguiu pressionando para limitar ainda mais uma lei de aborto que já é considerada uma das mais restritivas da Europa.
Continua havendo pouca responsabilização para crimes de ódio baseados em orientação sexual. Discursos de ódio e violência contra migrantes são uma crescente preocupação. ONGs polonesas acusaram autoridades de impedirem solicitantes de refúgio na fronteira com a Bielorrússia de entrarem no país para buscar proteção.
Houve poucos sinais de avanço na longa investigação criminal da Promotoria de Apelações de Cracóvia sobre um programa secreto de detenção e interrogatórios da CIA no país.
Espanha
Uma política de retornos sumários e de controles reforçados na fronteira terrestre da Espanha com o Marrocos aparentemente resultou em migrantes tentando alcançar Ceuta e Melilha a nado ou em barcos. O número de mortes ao longo dessa rota triplicou para 45 nos primeiros seis meses de 2016 comparados com 2015.
Embora em menor número do que em anos anteriores, diversas tentativas de grupos de escalar as cercas ao redor do territorio, seguidas de retornos sumários, continuaram a acontecer. Em Julho, Muižnieks, o Comissário do Conselho Europeu para Direitos Humanos, solicitou à Espanha que adotasse procedimentos em fronteiras para impedir expulsões coletivas e retornos forçados. Um questionamento da ECtHR aos retornos sumários de Melilha em 2014 permanecia em análise até a elaboração deste relatório.
Até a metade de novembro, a Espanha havia realocado apenas 398 pessoas em busca de refúgio frente às 9.323 que havia se comprometido a receber da Grécia e da Itália. Embora o país tenha se comprometido a reassentar mais de 1.449 refugiados de outras regiões, até a elaboração deste relatório havia recebido apenas 279.
Em abril, a Comissão Europeia deu o primeiro passo em direção a ações judiciais contra a Espanha por falhar em proteger consumidores contra termos injustos de hipotecas. Em julho, o advogado geral da Corte de Justiça da UE recomendou à corte apoiar um julgamento da Suprema Corte espanhola de 2013 que impedia consumidores de processarem bancos por taxas de juros de hipotecas que mais tarde foram consideradas ilegais; a corte da UE ainda não havia julgado a questão até a elaboração deste relatório.
Em junho, a Corte Constitucional da Espanha suspendeu uma lei catalã que protegia aqueles enfrentando expulsões de suas casas, incluindo pelo não pagamento de hipotecas. Um recurso está sendo examinado pelo governo central.
Em maio, a ECtHR considerou que a Espanha havia fracassado em investigar adequadamente alegações de tortura de um homem suspeito de afiliação ao grupo separatista basco ETA, enquanto ele era mantido incomunicável em detenção.
Pelo menos um jornalista foi multado, em abril, por publicar fotos de uma operação policial respaldada por uma controversa lei de segurança pública de 2015. Houve diversos casos de grande repercussão de denúncias contra músicos, marionetistas e ativistas por glorificação do terrorismo, incluindo em mídias sociais, conforme as medidas fortalecidas do código criminal.
Reino Unido
O referendo em junho que decidiu pela saída dos britânicos da União Europeia causou choques políticos no país, criando incerteza sobre futuros acordos comerciais e a condição de permanência de mais de 3 milhões de cidadãos de outros países da UE no Reino Unido.
O voto do Brexit foi precedido pelo assassinato da parlamentar Jo Cox, que havia feito campanhas vigorosas em defesa das pessoas em busca de refúgio e para a permanência do Reino Unido na UE. Após o resultado do referendo houve um aumento de relatos de crimes de ódio racistas e xenofóbicos, incluindo incêndios criminosos e ataques, sobretudo contra cidadãos da UE do leste europeu, de acordo com dados divulgados pela polícia. A Polônia mandou policiais a uma cidade inglesa após a morte de um polonês por espancamento, causada possivelmente por um crime de ódio.
Em uma análise de agosto sobre o Reino Unido, o Comitê da ONU para Eliminação da Discriminação Racial manifestou preocupação com a “retórica divisiva, anti-imigração e xenofóbica” empregada durante a campanha do Brexit e os crimes de ódio que se seguiram a ela, e solicitou às autoridades que formalmente rejeitem tais discursos.
O governo da Primeira Ministra Theresa May, eleita líder pelo Partido Conservador em julho, renovou o compromisso do Reino Unido de substituir sua legislação nacional de direitos humanos por uma carta de direitos, mas não tomou nenhuma ação palpável nessa direção. Após o voto do Brexit, May voltou atrás na sugestão de que o Reino Unido sairia do Conselho Europeu e da ECtHR.
May anunciou em sua primeira conferência de partido após ter se tornado Primeira Ministra que “advogados de direitos humanos de esquerda” não poderiam “nunca mais” levar adiante processos criminais em defesa de vítimas de abuso de direitos humanos perpetrados por forças militares do Reino Unido. Ela aparentemente se referia aos casos contra o Ministério da Defesa em relação a abusos no Iraque e no Afeganistão. O governo quer isentar as forças britânicas que atuam fora do solo nacional de cumprirem a legislação de direitos humanos.
O Reino Unido avançou no compromisso de reassentar sírios e outros refugiados, mas optou por recusar o plano de realocação de solicitantes de refúgio da UE. No final de outubro, enquanto forças francesas fechavam o acampamento de Calais, o Reino Unido finalmente assumiu a responsabilidade de trazer crianças desacompanhadas que possuem familiares em solo britânico. Até a metade de novembro, o Reino Unido havia facilitado a ida de aproximadamente 300 crianças do acampamento para o país. No entanto, um pedido legislativo para que o governo facilitasse a realocação de crianças em busca de refúgio de Calais para o Reino Unido – mesmo que essas não tivessem familiares em solo britânico – não surtiu muito efeito. Poucas foram, de fato, as crianças trazidas ao país que não tinham um familiar no Reino Unido, e o governo impôs restrições de idade e país de origem àqueles que seriam aceitos.
Em uma análise de junho, o Comitê da ONU sobre os Direitos da Criança instou o Reino Unido a parar de deter crianças migrantes em busca de refúgio e a acelerar a reunião familiar para crianças desacompanhadas fora do Reino Unido.
Em janeiro, uma análise independente autorizada pelo governo sobre o visto vinculado para trabalhadores migrantes domésticos recomendou o restabelecimento do direito destes de trocarem de empregador – uma importante proteção contra abusos trabalhistas. O governo restabeleceu o direito, mas fracassou em permitir a extensão do visto para além dos seis meses previstos, debilitando a efetividade da medida.
Em junho, promotores anunciaram que autoridades do Reino Unido seriam responsabilizados pelo envolvimento no sequestro, tortura e transferência de dois dissidentes líbios e suas famílias em 2004, encerrando assim a última investigação criminal sobre a cumplicidade de autoridades do Reino Unido com abusos globais no combate ao terrorismo. Uma análise feita pelo Parlamento sobre a cumplicidade do Reino Unido com torturas e rendições continuava em andamento até a elaboração deste relatório.
A Unidade Iraquiana de Acusações Passadas, um órgão criado para investigar possíveis crimes de guerra cometidos pelas forças britânicas, continuou a trabalhar em 2016, apesar das injustificáveis críticas de políticos a sua existência e o princípio da análise legal de operações militares.
Em novembro, o Parlamento aprovou uma legislação controversa – a Lei de Poderes Investigativos – ampliando os poderes de vigilância do Estado sem oferecer as proteções adequadas aos civis.
Política externa
A agenda de política externa da UE foi dominada pelos conflitos na Síria e no leste da Ucrânia e pela deterioração das relações com o governo russo devido ao envolvimento de Moscou nesses conflitos. Outro foco da política externa da UE pareceu dominada pelo desejo de Países-membros da união de impedir a chegada do crescente número derefugiados, solicitantes de refúgio e migrantes à Europa.
A UE pressionou com sucesso a Ucrânia para que aceitasse a jurisdição da Corte Penal Internacional (ICC, em inglês) para crimes graves, por meio do artigo 12(§3) do Estatuto de Roma. Mas até a elaboração deste relatório, a UE ainda não havia garantido que a Ucrânia cumprisse sua obrigação de ratificar o Estatuto de Roma, como exigido pelo acordo legalmente vinculante de associação da Ucrânia à União Europeia.
A UE manteve uma série de sanções contra indivíduos e instituições russas em resposta ao envolvimento da Rússia no conflito no leste da Ucrânia e na ocupação da Crimeia. As sanções incluíam congelamento de bens e proibições de vistos contra 149 pessoas e 37 instituições.
Apesar das declarações críticas sobre a repressão russa contra as liberdades de expressão, associação e reunião, a UE e seus Estados-membros não parecem ter elaborado uma estratégia em conjunto para responder à situação de rápida deterioração de direitos humanos na Rússia.
Mas, numa nova e inovadora tentativa de responder à propaganda russa, a UE começou um esforço “caça mitos da UE” no twitter @EUvsDisinfo, no qual mentiras e mitos eram confrontados com fatos e números.
A UE como um todo continuou a ser a maior doadora humanitária para a crise síria. A assistência da UE foi além do auxílio de emergência e rapidamente voltou-se à ajuda sustentável, focada principalmente no acesso de refugiados sírios à educação e ao trabalho em seu países anfitriões: Jordânia, Líbano e Turquia.
Um novo acordo foi finalizado entre a UE e a Jordânia prevendo concessões comerciais em troca de oportunidades de trabalho para refugiados sírios. Abrangendo 10 anos, o acordo será aplicado para 52 tipos de produtos que são manufaturados em zonas econômicas especiais da Jordânia, sob a condição de que os produtores empreguem mais refugiados sírios. A exigência é de pelo menos 15 por cento de sírios na força de trabalho, subindo para um quarto após três anos. O acordo deve servir como um modelo benéfico a ambas as partes, tanto aos refugiados quanto à comunidade anfitriã.
A UE também começou a negociar e a concluir diversos acordos controversos para a cooperação com países terceiros para readmissões e migrações, traçando o caminho para o retorno de pessoas em busca de refúgio e migrantes para países que não são nem seguros nem estáveis. A natureza da maioria desses acordos – que servem também para impedir a chegada de solicitantes de refúgio e migrantes à UE – não parece voltar-se para o avanço nas proteções aos mais vulneráveis, e sim para proteger a UE de ter que lidar com a situação em seu próprio território.
A UE continuou a patrocinar e co-patrocinar algumas importantes resoluções de países no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, incluindo Myanmar, Coreia do norte e Burundi, garantindo o acompanhamento e o relatório de direitos humanos da ONU sobre esses países. A resposta da UE foi dividida, no entanto, em declarações conjuntas sobre a China e o Azerbaijão e na resolução sobre o Iêmen.
Em relação à contínua deterioração de direitos humanos no Turcomenistão, onde o governo recusa-se até mesmo a confirmar se diversos presos estão vivos ou mortos, o Parlamento Europeu tomou medidas importantes para suspender o processo de ratificação de um Acordo de Cooperação e Parceria UE-Turcomenistão.
O Parlamento Europeu também acolheu fortes resoluções convocando a adoção imediata de sanções contra autoridades responsáveis pelas graves violações de direitos humanos na República Democrática do Congo, e em outubro os ministros das relações exteriores da UE adotaram conclusões abrindo caminho à imposição de tais sanções.
A UE impôs medidas restritivas contra autoridades do Burundi consideradas responsáveis por abusos de direitos e pelo enfraquecimento da democracia no país.