Skip to main content

Cuba

Eventos de 2021

O cubano Rolando Remedios mostra uma foto dele sendo preso durante os protestos de 11 de julho em seu celular em sua casa em Havana, Cuba, em 7 de agosto de 2021.

© 2021 Photo by YAMIL LAGE/AFP via Getty Images.

O governo cubano continua a reprimir e a punir praticamente toda forma de dissidência e opinião crítica.  Ao mesmo tempo, os cubanos continuam a enfrentar uma grave crise econômica que impacta direitos econômicos e sociais.

Em julho, milhares de cubanos se juntaram em uma mobilização histórica para protestar contra restrições a direitos, escassez de alimentos e medicamento e a resposta do governo à pandemia de COVID-19. O governou reagiu aos protestos com repressão brutal.

Detenções arbitrárias e prisões de curta duração

O governo cubano utiliza detenções arbitrárias para perseguir e intimidar críticos, ativistas, adversários políticos, e outras dissidências.

Os oficiais de segurança raramente apresentam mandados de prisão para justificar a detenção de críticos. Em alguns casos, os detidos são soltos após receberem notificações oficiais, as quais promotores podem vir a usar posteriormente em processos criminais para mostrar um padrão de comportamento “delinquente”.

Mais de 1.000 pessoas, em sua maioria manifestantes pacíficos ou transeuntes, foram detidas durante os protestos de julho, segundo relatos de grupos cubanos de direitos humanos. As autoridades impediram pessoas de protestar ou documentar os protestos, detendo críticos e jornalistas que se dirigiam às manifestações ou limitando a circulação de pessoas que tentavam sair de suas casas. Muitos foram mantidos incomunicáveis por dias ou semanas, violentamente presos ou espancados e sujeitos a maus-tratos durante a detenção.

Gabriela Zequeira Hernández, uma estudante de 17 anos, foi presa em San Miguel de Padrón, província de Havana, enquanto passava por uma manifestação em 11 de julho. Durante a detenção, duas policiais a fizeram se despir e agachar-se nua cinco vezes. Uma das policiais disse a ela para inspecionar sua própria vagina com o dedo. Dias depois, um policial ameaçou levar Gabriela e dois homens à área conhecida como “pavilhão”, onde detidos recebem visitas conjugais. Policiais a acordaram várias vezes durante a noite para interrogatórios, perguntando por que ela havia protestado e quem a estava “financiando”. Dias depois, ela foi condenada e sentenciada a oito meses de prisão por “desordem pública”, embora tenha sido autorizada a cumprir sua pena em prisão domiciliar. Ela só teve permissão para ver seu advogado particular alguns minutos antes da audiência.

Em outubro de 2021, as autoridades cubanas afirmaram que uma manifestação organizada por um grupo de artistas e dissidente e prevista para o dia 15 de novembro era “ilegal”. Mais tarde naquele mês, o Gabinete do Procurador-Geral divulgou um comunicado “avisando” as pessoas que elas enfrentariam um processo criminal caso “insistissem” em realizar uma manifestação em 15 de novembro.

Autoridades cubanas também detiveram sistematicamente jornalistas e artistas independentes. As vítimas incluem membros das coalizões de artistas conhecidas como “San Isidro”, “27N” e “Archipiélago”, duas redes de artistas independentes, bem como aqueles envolvidos em “Pátria e Vida” - uma canção que critica a repressão no país e que ficou conhecida ao se apropriar e re-significar o antigo slogan do governo cubano, “Pátria ou Morte” (Patria o Muerte).

Em muitos casos, agentes de polícia e do serviço de inteligência se apresentaram às residências dos críticos, ordenando-lhes que não saíssem de suas casas, muitas vezes por dias ou semanas, resultando em privações arbitrárias de liberdade.

As autoridades usaram repetidamente as medidas de mitigação da disseminação da Covid-19 para perseguir e deter críticos do governo.

Liberdade de expressão

O governo controla praticamente todos os meios de comunicação em Cuba, e restringe o acesso a informações do exterior.

Em fevereiro e agosto de 2021, o governo cubano expandiu o número de atividades econômicas privadas permitidas, mas o jornalismo independente continuou proibido.

Jornalistas, blogueiros, influenciadores, artistas e acadêmicos que publicam informações consideradas críticas ao governo são rotineiramente sujeitos a assédio, violência, campanhas difamatórias, restrições de circulação, cortes no serviço de internet, assédio online, invasões a seus domicílios e escritórios, confisco de materiais de trabalho e prisões arbitrárias. Eles são regularmente mantidos incomunicáveis.

Em 2017, o governo cubano anunciou que ampliaria gradualmente o serviço de internet para os lares cubanos. Em 2019, novos regulamentos permitiram a importação de roteadores e outros equipamentos, e a criação de redes privadas de internet com e sem fio em residências e empresas.

A ampliação do acesso à internet permitiu que muitos se comunicassem, relatassem abusos e organizassem protestos de maneiras praticamente impossíveis alguns anos atrás. Alguns jornalistas e blogueiros conseguem escrever artigos e publicar vídeos e notícias em sites ou redes sociais como Twitter e Facebook. No entanto, o alto custo - e o acesso limitado - à internet impede que quase todos, com exceção de um pequeno grupo de cubanos, leiam sites e blogs de notícias independentes.

O governo bloqueia rotineiramente o acesso a muitos sites de notícias e blogs em Cuba e repetidamente impõem a seus críticos restrições de acesso de pacote de dados de telefonia móvel. Em 11 de julho de 2021, quando os protestos começaram, várias organizações relataram interrupções no serviço de internet em todo o país, seguidas por problemas de conexão, incluindo restrições a redes sociais e plataformas de mensagens.

Em 17 de agosto, o governo publicou o Decreto-Lei 35/2021 que regulamenta o uso das telecomunicações. O decreto, que afirma que seu objetivo é “defender” a revolução cubana, exige que os provedores interrompam, suspendam ou encerrem os serviços quando um usuário publica informações que são “falsas” ou afetam a “moralidade pública” e o “respeito à ordem pública”.

Uma resolução de “cibersegurança” que acompanha o Decreto-Lei 35 contém perigosas disposições que rotulam conteúdos protegidos pela liberdade de expressão como “incidentes de cibersegurança”, os quais as autoridades são obrigadas a “prevenir” e “erradicar - incluindo publicações que “incitem protestos”, “promovam a indisciplina social” e “difamem o prestígio do país”.

O Decreto-Lei 370/2018 em vigor ainda proíbe a divulgação de informações "contrárias ao interesse social, à moral, aos bons costumes e à integridade das pessoas". As autoridades têm usado o decreto para interrogar e multar jornalistas e críticos e confiscar seus materiais de trabalho.

Prisioneiros políticos

Os Defensores dos Prisioneiros, um grupo de direitos humanos com sede em Madri, relatou que, até setembro de 2021, Cuba mantinha detidas 251 pessoas que preenchiam à definição de prisioneiras políticas, além de outras 38 que estavam detidas por suas convicções políticas; outras 92 que haviam sido condenadas por convicções políticas estavam em prisão domiciliar ou em liberdade condicional.

Os cubanos que criticam o governo continuam enfrentando a ameaça de serem processados criminalmente. A eles não são garantidas condições básicas do devido processo legal, como o direito a audiências justas e públicas por um tribunal competente e imparcial. Na prática, os tribunais estão subordinados aos poderes executivo e legislativo, negando substantiva independência judicial.

Muitas pessoas que protestaram pacificamente em julho foram sentenciadas por meio de julgamentos criminais “sumários”, que careciam das garantias básicas do devido processo legal, incluindo o direito a representação legal. Os manifestantes costumavam ser julgados por crimes vagamente definidos, como “desordem pública” e “desacato”. Em agosto, as autoridades disseram que 66 pessoas tinham sido condenadas por conta dos protestos; a maioria não tinha advogado. Algumas foram absolvidas após recurso.

Em alguns casos, as autoridades solicitaram ou impuseram sentenças de prisão desproporcionais contra os manifestantes tidos como autores de atos de violência, muitas vezes por arremessar pedras durante os protestos.

Em 11 de julho, policiais prenderam José Daniel Ferrer, líder da União Patriótica Cubana, principal partido de oposição, quando ele se dirigia a uma manifestação. Em 17 de julho, um promotor ordenou sua prisão preventiva sob a acusação de “desordem pública” por “decidir participar” das manifestações. Em abril de 2020, Ferrer foi arbitrariamente condenado a quatro anos e meio de "restrições de liberdade" por suposta "agressão". Em 14 de agosto de 2021, um tribunal em Santiago de Cuba exigiu que ele cumprisse 4 anos e 14 dias de prisão, alegando que ele não tinha “cumprido estritamente as leis” nem “tido uma atitude honesta em relação ao trabalho”, condições legais para pessoas condenadas a “restrições à liberdade”.

Até a data da elaboração deste relatório, vários artistas, incluindo Luis Manuel Otero Alcántara e Maykel Castillo, que atuaram no videoclipe de “Pátria e Vida”, permanecem em prisão preventiva, enfrentando um processo arbitrário.

Restrições a viagens

Desde as reformas de 2013, muitas pessoas a quem anteriormente eram negadas a permissão de viajar puderam fazê-lo, incluindo defensores de direitos humanos e blogueiros independentes. As reformas, no entanto, deram ao governo amplos poderes discricionários para restringir o direito de viajar com base na “defesa e segurança nacional” ou “outros motivos de interesse público”. As autoridades continuam a negar, de maneira seletiva, a saída de dissidentes.

Em março de 2021, as autoridades cubanas negaram a Karla Pérez, uma jornalista cubana que estudava na Costa Rica, a possibilidade de voltar para casa. Um funcionário da companhia aérea a informou durante uma escala na Cidade do Panamá que o governo cubano recusava sua entrada. Pérez voltou para a Costa Rica, onde recebeu o status de refugiada.

Condições prisionais

A superlotação é frequente nas prisões cubanas. Os presos não dispõem de um mecanismo eficaz de denúncia para obterem reparação por abusos. Aqueles que criticam o governo ou se envolvem em greves de fome e outras formas de protesto muitas vezes enfrentam longos períodos de confinamento em solitária, espancamentos, restrições à visita familiar e lhes são negados cuidados médicos.

O governo continua a negar acesso às suas prisões aos grupos internacionais de direitos humanos e organizações cubanas independentes.

Em abril de 2020, para reduzir o risco de propagação da COVID-19 nas prisões, o governo suspendeu as visitas de familiares. Isso, juntamente com a recusa das autoridades em permitir que os detidos ligassem para suas famílias, fez com que muitos detidos durante as manifestações permanecessem incomunicáveis por dias e, em alguns casos, semanas.

Direitos trabalhistas

Apesar das atualizações na legislação trabalhista em 2014, Cuba continua a violar convenções da Organização Internacional do Trabalho ratificadas em relação à liberdade de associação e à negociação coletiva. Embora a legislação cubana permita a formação de sindicatos independentes, na prática, o país permite a operação de apenas uma confederação de sindicatos controlados pelo Estado – a União Central dos Trabalhadores de Cuba.

Cuba envia dezenas de milhares de profissionais de saúde ao exterior todos os anos para ajudar a enfrentar crises temporárias e desastres naturais. Eles prestam serviços valiosos a muitas comunidades, mas trabalham sob regras cubanas que violam seus direitos, incluindo os direitos à privacidade, à liberdade, à circulação e à liberdade de expressão e associação. Em 2020, Cuba enviou cerca de 4.000 médicos para ajudar cerca de 40 países a em suas respostas à pandemia de Covid-19 – eles se juntaram aos 28.000 profissionais de saúde previamente mobilizados.

Defensores de direitos humanos

O governo cubano se recusa a reconhecer o monitoramento dos direitos humanos como uma atividade legítima e nega o estatuto jurídico a grupos locais de direitos humanos. As autoridades governamentais perseguem, atacam e encarceram defensores de direitos humanos que tentam documentar abusos.

Em agosto, dois policiais compareceram à residência, em Havana, da mãe de Laritza Diversent, uma defensora dos direitos humanos que vive nos Estados Unidos, e ameaçaram processar Diversent e pedir sua extradição para Cuba. Diversent dirige a organização Cubalex, um dos principais grupos de direitos humanos que documenta abusos contra os manifestantes dos protestos de julho de 2021.

Orientação sexual e identidade de gênero

A constituição de 2019 proíbe explicitamente a discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero. No entanto, muitas pessoas lésbicas, gays, bissexuais e trans (LGBT+) sofrem violência e discriminação, especialmente no interior de Cuba.

Os primeiros projetos da Constituição aprovada em fevereiro de 2019 redefiniam o casamento para incluir casais do mesmo sexo, mas o governo retirou a proposta após protestos públicos. O governo declarou que iria introduzir uma reforma no Código da Família, que rege o casamento, que seguiria para revisão legislativa e posteriormente realizaria um referendo. Em setembro de 2021, o governo tornou público um projeto de reforma, que incluía uma definição de casamento neutra em termos de gênero. Até a elaboração deste relatório, o projeto não tinha sido aprovado.

Direitos sexuais e reprodutivos

Cuba descriminalizou o aborto em 1965 e continua sendo um dos poucos países latino-americanos com esse tipo de política. O procedimento é disponibilizado de forma gratuita em hospitais públicos.

Principais atores internacionais

O embargo dos Estados Unidos continua a fornecer ao governo cubano uma desculpa para os problemas, um pretexto para os abusos e a simpatia dos governos que poderiam, de outra forma, condenar com mais rigor as práticas repressivas no país.

Em junho de 2021, a Assembleia Geral das Nações Unidas votou massivamente pela condenação do embargo, pelo 29º ano consecutivo – 184 países apoiaram a resolução, enquanto os EUA e Israel se opuseram, e Brasil, Colômbia e Ucrânia se abstiveram.

Sob a administração do ex-presidente Donald Trump, o governo dos Estados Unidos limitou a capacidade das pessoas de enviar remessas financeiras dos Estados Unidos para Cuba e impôs novas restrições a viagens a Cuba, proibindo paradas de navios de cruzeiro, viagens educacionais e a maioria dos voos. Em janeiro de 2021, o governo Trump designou Cuba como um Estado Patrocinador do Terrorismo, argumentando que o país se recusava a extraditar para a Colômbia membros do Exército de Libertação Nacional (ELN) que tinham viajado a Havana para conduzir negociações de paz com o governo colombiano e lá permaneceram.

Em julho de 2021, o governo do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, condenou os abusos do governo cubano contra os manifestantes e impôs sanções direcionadas a vários oficiais vinculados à repressão contra as manifestações. No entanto, até setembro, os EUA não tinham dado passos significativos para se distanciar da política mais ampla de isolamento que se arraigou durante a era Trump, sem melhoras nas condições de direitos humanos em Cuba.

Em fevereiro, a União Europeia se engajou em um diálogo sobre direitos humanos com Cuba. O Alto Representante da UE, Josep Borrell, disse em julho que as manifestações em Cuba “refletem reivindicações legítimas”. Ele expressou preocupação com a repressão do governo e fez um apelo à Cuba para que liberte todos os manifestantes detidos arbitrariamente. O Parlamento Europeu aprovou resoluções condenando as violações dos direitos humanos de Cuba em junho e setembro.

O poder legislativo da Lituânia votou, em julho, contra a ratificação do Acordo de Diálogo Político e Cooperação da UE com Cuba, assinado em 2016, mas nunca ratificado, devido às preocupações da Lituânia com os direitos humanos.

Desde sua eleição para o Conselho de Direitos Humanos da ONU em 2020 - seu quinto mandato nos últimos 15 anos - Cuba se opôs às resoluções que destacavam os abusos dos direitos humanos na Eritréia, Etiópia, Síria e Nicarágua, entre outros países.