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Angola

Acontecimentos de 2009

Mais de um ano após as eleições legislativas de Setembro de 2008-as primeiras eleições em Angola desde 1992-ao contrário do esperado, os angolanos não puderam votar numa eleição presidencial em 2009. O governo adiou a votação enquanto aguarda a conclusão da revisão constitucional, que ainda decorria no momento em que este documento foi redigido. A revisão tem sido fortemente influenciada pelo actual presidente José Eduardo dos Santos, no poder há 30 anos. A Comissão Constitucional, dominada pelo partido no poder, Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), seguiu as sugestões do presidente propondo um novo modelo de eleição presidencial parlamentar, em vez de eleições separadas. Continua imprevisível saber quando a nova constituição será adoptada e que implicações terá para as próximas eleições.

As eleições legislativas de 2008 produziram uma vitória esmagadora para o MPLA. Nenhuma investigação independente foi feita às numerosas falhas nessas eleições.

Cabinda

Apesar de Angola estar em paz desde 2002, e de um acordo de paz ter sido assinado em Cabinda em 2006, desde 1975 tem persistido um intermitente conflito armado separatista no enclave. A presença das Forças Armadas Angolanas (FAA) em Cabinda continua a ser mais forte do que noutras partes do país, e os militares aumentaram as operações que visam eliminar o remanescente das forças rebeldes, com o aproximar do Campeonato Africano das Nações (em Janeiro de 2010), pois alguns jogos decorrerão na cidade de Cabinda.

Em Cabinda o escrutínio dos direitos humanos continua restrito, especialmente no interior. O governo não respondeu a pedidos de realização duma investigação independente a alegações de tortura e outras violações graves dos direitos humanos cometidas pelas FAA, e os autores de actos de tortura não são processados.

Desde Setembro de 2007 os militares prenderam mais de 40 suspeitos rebeldes. A maioria diz ter sido sujeita a tortura e maus tratos durante longos períodos de detenção sem comunicação, com o objectivo de extrair confissões. Foram depois transferidos para uma prisão civil e acusados de "crimes contra a segurança do Estado" e outros crimes relacionados, mas em vários casos foram-lhes negados direitos e garantias processuais fundamentais.

Em Setembro de 2008, num julgamento manifestamente injusto, um tribunal militar condenou Fernando Lelo, um civil e antigo correpondente da Voz da América, a 12 anos de prisão, e cinco soldados das FAA co-acusados, a 13 anos de prisão por alegado envolvimento em acções armadas rebeldes em 2007. Em Agosto de 2009 o Supremo Tribunal Militar reviu a pena de Fernando Lelo e absolveu-o. Mas o tribunal também voltou a condenar três dos seus co-acusados a 24 anos e os outros dois a 20 anos de prisão, apesar da falta de provas e de sérias alegações de tortura. Em quatro julgamentos realizados entre Junho e Novembro de 2009, o Tribunal Civil de Cabinda condenou nove homens acusados de crimes contra a segurança nacional a penas de prisão até 20 anos apesar de sérias alegações de tortura sob detenção militar, e absolveu 11 por falta de provas.

Liberdade de Imprensa

O ambiente nos mídia continua a sofrer restrições, apesar do surgimento de novos órgãos de comunicação social desde 2008. Mais de três anos após a promulgação da lei de imprensa, em Maio de 2006, ainda não foi aprovada a legislação necessária para implementar partes cruciais da lei, que visam melhorar a protecção jurídica da liberdade de expressão e acesso à informação. Rádios privadas independentes não podem emitir a nível nacional, enquanto que as práticas de licenciamento do governo favoreceram novas rádios e estações de televisão próximas do MPLA. Os mídia públicos continuam fortemente tendenciosos a favor do partido no poder.

A difamação continua a ser crime na nova lei de imprensa. Outras infracções vagas tais como "abuso da liberdade de imprensa", estão sujeitas a manipulação oficial. Desde 2007 aumentou o número de membros do governo que apresentou queixas contra editores e jornalistas de mídia privados por difamação e crimes relacionados. Esta tendência continuou em 2009. Em Julho um tribunal condenou Eugénio Mateus, jornalista do semanário privado O País, a três meses de prisão, suspensa por dois anos, por difamação e "abuso da liberdade de imprensa", por queixa apresentada pelo chefe do Estado-Maior das Forças Armadas Angolanas. A acção judicial teve como origem um artigo publicado em 2007 no semanário A Capital que criticava as FAA por alegadamente arrendarem propriedade do Estado. Também em Julho o editor de A Capital, Tandala Francisco, foi informado de uma acção judicial contra si, por difamação, devido a um artigo de opinião em que criticou o presidente Eduardo dos Santos. Em Outubro, Welwitchia "Tchizé" dos Santos, a filha do presidente e, até recentemente deputada parlamentar, moveu acção judicial contra a secretária geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA), Luísa Rogério, e contra Vítor Silva, director do semanário privado Novo Jornal, e ainda contra Ana Margoso, jornalista do mesmo semanário, por difamação. Luísa Rogério tinha criticado a nomeação de "Tchizé" para a comissão de gestão da TPA, televisão estatal, apontando incompatibilidade com o seu papel de deputada, e o Novo Jornal noticiou a controvérsia. Até ao momento o processo continua nos tribunais.

Litígios como este, num ambiente de cada vez maior dificuldade económica para os mídia privados, perpetuam uma cultura enraízada de auto-censura que restringe o acesso do público a informação independente.

Direito à Habitação e Despejos Forçados

A lei angolana não dá protecção adequada contra despejos forçados, nem inclui o direito à habitação adequada. Em 2009, o governo aumentou despejos forçados e demolições de casas em áreas que diz estarem reservadas para a construção pública, em Luanda, mas também cada vez mais em cidades provinciais. Em Julho, na maior operação de demolição de sempre em Luanda, polícias e militares armados destruíram 3.000 casas nos bairros Iraque e Bagdad, estima-se que deixando 15.000 residentes sem casa e sem haveres. Imediatamente após as demolições, forças de segurança impediram os residentes de se manifestarem em frente ao palácio do presidente, e em Agosto o governo provincial repetidamente adiou autorizar uma manifestação de protesto preparada por organizações locais dos direitos humanos.

O novo governo anunciou em 2008 a intenção de disponibilizar mais recursos para habitação social durante os próximos cinco anos e de construir um milhão de casas no país. Contudo, muitas das pessoas despejadas à força nos últimos anos continuam a aguardar indemnização e habitação alternativa.

Expulsão em Massa de Imigrantes

Em 2009 as autoridades angolanas expulsaram dezenas de milhar de imigrantes alegadamente em situação irregular e as suas famílias-a maioria originários da República Democrática do Congo (RDC). As operações de expulsão em massa foram realizadas nas províncias do leste, ricas em diamantes, na primeira metade de 2009 e em províncias do norte, Cabinda e Zaire, em Setembro. O Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários das Nações Unidas (OCHA) noticiou que militares e polícia angolanos cometeram sérios abusos, incluindo violações e pilhagem, durante essas expulsões em massa. Em Nzage, Lunda Norte, refugiados e requerentes de asilo disseram à Human Rights Watch que em operações porta-a-porta em Maio, militares prenderam-nos temporariamente, pilharam as suas casas e violaram diversas mulheres durante uma operação de expulsão em massa. Em Cabinda, tanto imigrantes como Cabindenses disseram à Human Rights Watch que a polícia de fronteira bateu e feriu pessoas que consideraram ser imigrantes em situação irregular, transportou e deteve-as em condições desumanas e degradantes durante operações de expulsão em massa, em Setembro e Outubro.

A expulsão em massa de estrangeiros, particularmente das áreas de exploração diamantífera, tem ocorrido repetidamente desde 2003 apesar de alegações de abusos sérios dos direitos humanos cometidas por militares e polícias angolanos. Em Outubro de 2009 as autoridades da RDC, numa atitude sem precedentes, ordenaram a expulsão recíproca de imigrantes angolanos em situação irregular do Baixo Congo, e dezenas de milhar de angolanos foram forçados a regressar a Angola.

Defensores dos Direitos Humanos

O ambiente para os defensores dos direitos humanos continua restrito. Ameaças proferidas por funcionários do governo em 2007, de interditar várias organizações nacionais e internacionas da sociedade civil não se materializaram, e a revisão da legislação que rege o funcionamento das organizações da sociedade civil, há muito anunciada pelo governo, continua pendente. Contudo, algumas das organizações dos direitos humanos mais activas têm continuado a enfrentar dificuldades, com processos judiciais de interdição ainda por resolver e com ameaças. Continua pendente no Tribunal Supremo um apelo contra a decisão do Tribunal Provincial de Cabinda de 2006, de interditar a associação cívica Mpalabanda. O processo judicial de interdição da Associação Justiça Paz e Democracia (AJPD) referente à acção judicial iniciada em 2003, não conheceu nenhum desenvolvimento desde que transitou para o Tribunal Supremo em Maio de 2009.

Em Agosto o coordenador da organição dos direitos à habição SOS Habitat, Luiz Araújo, afirmou ter sido sujeito a intensa vigilância e a uma tentativa de assalto às instalações do seu escritório e de atentado contra a sua vida.

Actores Chave a Nível Internacional

Angola é um dos maiores produtores de petróleo de África, deteve a presidência da Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP) em 2009, é o segundo maior exportador de petróleo para a China e o seu principal parceiro comercial em África. A riqueza do petróleo e o poder militar regional de Angola limitaram bastante a capacidade dos parceiros e organizações internacionais de exercerem pressão a favor da boa governação e o respeito dos direitos humanos. Parceiros comerciais continuam relutantes em criticar o governo, de modo a protegerem os seus interesses económicos.

Contudo, a queda dos preços do petróleo e dos diamantes e a crise económica global atingiram a economia de Angola, em rápido crescimento. Em 2009 o governo fez um esforço maior na procura de apoio de parceiros internacionais, incluindo do Fundo Monetário Internacional, para lidar com a quebra de receitas.

Na sua primeira visita a Angola, em Março de 2009, a convite do presidente Dos Santos, o Papa Bento XVI levantou publicamente questões importantes dos direitos humanos, tais como a necessidade urgente de boa governação e melhor distribuição da riqueza do país, de modo a beneficiar a maioria pobre. Contudo, os esforços diplomáticos do Vaticano não foram bem sucedidos no que respeita ao desbloqueio há muito aguardado do sinal da emissora Católica Rádio Ecclésia, além de Luanda.