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Relatório Mundial 2012: Angola

Acontecimentos de 2011

Em 2011, o Presidente José Eduardo dos Santos, no poder há 32 anos, enfrentou uma onda de críticas sem precedentes. Inspirado nos movimentos pró-democracia da Primavera Árabe, Angola assistiu ao nascimento de um movimento de manifestações contra o governo. Em resposta, as autoridades serviram-se de força excessiva para reprimirem os protestos, a maioria dos quais foi organizada através da Internet, e restringiram a sua cobertura mediática.

De forma mais ampla, o governo de Angola continuou a restringir os direitos à liberdade de expressão, associação e reunião, apesar de a constituição de 2010 salvaguardar expressamente estes direitos.

Liberdade dos Média

Os média enfrentam uma vasta gama de restrições que prejudicam a livre expressão e encorajam a autocensura. O partido no poder limita o acesso à informação e, ao controlar os média detidos pelo Estado, bem como alguns média privados, restringe gravemente as críticas ao governo nos meios de comunicação. As classes urbanas instruídas usam frequentemente a Internet e os média sociais como canais de crítica ao governo devido às restrições impostas aos meios de comunicação tradicionais. À data da elaboração deste relatório, os estatutos necessários e outra legislação complementar à lei de imprensa de 2006, que levantariam restrições administrativas impostas à radiodifusão de estações privadas, ainda não foram apresentados ao parlamento.

A 31 de março, o parlamentoaprovou uma proposta de lei sobre a criminalidade no domínio das tecnologias de informaçãoque atentava contra a liberdade de expressão e informação. No seguimento das críticas nacionais e internacionais, o parlamento acabou por retirar a proposta de lei, mas membros do governo anunciaram que algumas das suas disposições seriam integradas num novo código penal que ainda não foi aprovado pelo parlamento.

A difamação continua a ser crime em Angola, e delitos como o “abuso da liberdade de imprensa”, estipulados pela lei de imprensa de 2006, são vagos e passíveis de serem usados contra jornalistas e meios de comunicação social.

A 3 de março, um juiz do tribunal provincial de Namibe condenou Armando Chicoca, jornalista da Voz da América e do semanário privado Folha 8, a um ano de prisão por difamação. A 6 de abril, foi libertado sob caução enquanto aguarda a decisão do recurso. A 10 de outubro, o tribunal condenou William Tonet, diretor do Folha 8, um ano de pena suspensa por difamação contraquatro altos funcionários do governo.Foi também ordenado a pagar 100 mil dólares de indemnização, uma quantia extraordinariamente elevada.À data deste relatório, o recurso de Tonet estava pendente.

Em setembro, a polícia prendeu e deteve por um curto período de tempo vários jornalistas, que pretendiam cobrir manifestações contra o governo. Indivíduos que aparentemente agiam sob ordens policiais, atacaram fisicamente e feriram vários jornalistas, cujo equipamento foi confiscado ou destruído.

Direito à Reunião Pacífica

A constituição de 2010 garante a liberdade de reunião e manifestação pacífica, e a legislação angolana permite explicitamente manifestações públicas sem a autorização do governo. No entanto, desde 2009, o governo baniu ou obstruiu uma série de manifestações antigovernamentais, e a polícia impediu a realização da maioria das manifestações.

Desde o início de 2011, um movimento juvenil apartidário, inspirado nos movimentos pró-democracia da primavera Árabe, organizou uma série de manifestações em Luanda, a capital, exigindo liberdade de expressão, justiça social e a demissão do presidente. As autoridades responderam de forma repressiva, com a intimidação dos manifestantes e organizadores e espalhando o medo entre a população alegando o risco iminente de guerra civil. A 15 de setembro, o governo provincial de Luanda baniu todas as manifestações no centro da cidade de Luanda, violando efetivamente o direito à reunião pacífica. A ordem de interdição foi retirada após os partidos da oposição terem recorrido ao Tribunal Constitucional.

A 7 de março, a polícia deteve por um curto período de tempo 17 músicos de rap que pretendiam juntar-se à manifestação contra o governo na Praça da Independência de Luanda, organizada anonimamente através da Internet. Três jornalistas do semanário privado Novo Jornal, que pretendiam cobrir os eventos, foram igualmente detidos. Os representantes de três partidos da oposição que haviam planeado juntar-se aos protestos, recuaram após terem recebido ameaças de morte anónimas. Com o intuito de desincentivar a participação da população, o partido no poder, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), organizou uma campanha destinada a desacreditar os protestos contra o governo como uma tentativa de fazer o país regressar a uma guerra civil. A 5 de março, o partido dirigente organizou uma marcha pela paz à escala nacional.

A 2 de abril, várias centenas de pessoas do mesmo movimento juvenil manifestaram-se pacificamente na Praça da Independência em Luanda.A manifestação realizou-se sem quaisquer incidentes.No entanto, os manifestantes disseram terem recebido ameaças de morte anónimas e terem sido sujeitos a outras formas de intimidação antes dos protestos.A 25 de maio, a polícia dispersou uma manifestação organizada pelo movimento juvenil e deteve 12 manifestantes por um curto período de tempo.

A 3 de setembro, a polícia dispersou violentamente uma manifestação contra o governo com várias centenas de jovens e deteve pelo menos 24 pessoas. Durante a manifestação, grupos de homens não identificados, que agiam ao abrigo da polícia, atacaram e feriram manifestantes. Foram feridos vários jornalistas e manifestantes. A 12 de setembro, um tribunal de polícia condenou 18 manifestantes a penas de prisão entre 45 a 90 dias por alegada desobediência, danos e por alegadamente terem ferido quatro agentes da polícia. Aos detidos foi-lhes negado um processo justo, bem como o acesso a advogados e familiares antes do julgamento. Já as testemunhas de defesa, disseram terem sido intimidadas e ameaçadas por alegados agentes de segurança do Estado.

Foram detidas 27 pessoas numa manifestação a 8 de setembro que pedia a libertação dos detidos. A polícia também deteve por um curto período de tempo dois jornalistas da agência noticiosa estatal Angop e do semanário privado Continente, que estavam a cobrir as manifestações. A 19 de setembro, um tribunal de polícia absolveu os 27 detidos por falta de provas das acusações de desobediência, incitação à violência e danos. A 14 de outubro, o Supremo Tribunal ordenou a libertação dos manifestantes condenados a 12 de setembro, admitindo haver falta de provas.

A polícia também fez uso de força excessiva para dispersar manifestações espontâneas em Cabinda, Bié e Benguela. A 8 de setembro, agentes da polícia mataram dois alegados manifestantes em Kuito, Bié, durante um protesto de mototaxistas contra a violência policial. A 26 de setembro, a polícia deteve durante um curto período de tempo doze manifestantes que protestavam contra expropriações de terras alegadamente ilegais em Benguela.

Cabinda

Um conflito intermitente com um movimento separatista persiste no enclave de Cabinda desde 1975, apesar do acordo de paz de 2006. Em março, o governo retomou oficialmente as operações militares de combate às forças rebeldes no enclave. As autoridades continuam a usar o conflito para justificar restrições à liberdade de expressão, reunião e associação.

Em dezembro de 2010, todos os dissidentes políticos que haviam sido condenados e detidos no seguimento dos ataques armados à equipa de futebol togolesa durante o Campeonato Africano das Nações em Cabinda, a 8 de janeiro de 2010, foram libertados, no seguimento de uma revisão parlamentar da abusiva lei dos crimes contra a segurança do Estado de 1978, ao abrigo da qual haviam sido condenados.

No entanto, a 13 de fevereiro, o governo baniu manifestações antigovernamentais em Cabinda e, a 7 de março e 10 de abril, a polícia deteve uma série de alegados manifestantes durante um curto período de tempo. Foram libertados sem qualquer acusação. A 26 de julho, a polícia deteve nove ativistas que pretendiam apresentar uma carta a uma delegação de embaixadores da União Europeia que visitava o enclave. Apesar de terem sido absolvidos por um juiz a 3 de agosto, que decidiu que haviam sido vítimas de maus-tratos por parte da polícia aquando da detenção, a polícia intentou uma ação por difamação contra um jornalista da Voz da América que cobriu o evento, bem como contra dois dos seus entrevistados que comentaram a violência policial e as detenções. À data deste relatório, não tinha havido progressos no caso.

Expulsões em Massade Imigrantes em Situação Irregular

A 7 de julho, entrou em vigor uma lei destinada a prevenir e punir a violência doméstica. A lei define a violência sexual de uma forma mais ampla do que a legislação anterior. Apesar de ser um passo positivo, o governo não investigou ou puniu aqueles que cometeram violência sexual contra imigrantes do sexo feminino durante a mais recente onda de expulsões em massa de migrantes em situação irregular, que começou em outubro 2010.

Em março, o relator especial da ONU para a tortura e a relatora especial da ONU para a violência contra as mulheres questionaram o governo de Angola sobre novas alegações de violações graves dos direitos humanos, incluindo violência sexual contra imigrantes do sexo feminino em situação irregular, na sua maioria congolesas, durante a recente onda de expulsões em massa nas províncias de Cabinda, Zaire e Lunda Norte. Tal como em anos anteriores, o governo negou as alegações, afirmando que foram esclarecidas por uma comissão criada para investigar as referidas alegações.

No seguimento da visita a Angola em março de Margot Wallstöm, representante especial da ONU para a violência sexual em conflitos, o governo angolano disse apenas poder verificar um caso isolado de violação que estava a ser tratado através dos tribunais. As autoridades ainda não publicaram qualquer relatório da sua própria investigação, tal como haviam prometido à ONU, nem divulgaram quaisquer detalhes sobre o alegado processo judicial.

No entanto, testemunhos reunidos pela Human Rights Watch em Kamako e Muanda em maio e junho sugerem a necessidade urgente de uma investigação credível, independente e minuciosa em ambos os lados da fronteira entre Angola e a República Democrática do Congo. A investigação da Human Rights Watch apurou que membros das forças de segurança – incluindo a polícia fronteiriça, a polícia de intervenção rápida e os funcionários dos serviços de imigração – continuam a cometer violência contra imigrantes congolesas numa série de estabelecimentos prisionais temporários onde os imigrantes ficam detidos até serem deportados. Os abusos corroborados contra mulheres incluem violação, coerção sexual, espancamentos, privação de alimentos ou água e, em alguns casos, abuso sexual na presença de crianças e outras detidas.

Atores Internacionais Fundamentais

Angola continua a ser um dos maiores produtores africanos de petróleo e é não só a segunda fonte mais importante de petróleo da China, mas também o seu parceiro comercial mais importante em África. A riqueza petrolífera, bem como o poder militar regional de Angola, têm restringido bastante a pressão exercida por outros governos e organizações regionais e internacionais em matéria de boa governação e de direitos humanos.

Em agosto, Angola assumiu a presidência da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC). No entanto, o governo recusou-se a conceder vistos de entrada a ativistas de ONG regionais que planeavam assistir a eventos paralelos durante a cimeira de chefes de estado da SADC de agosto.