Skip to main content

Relatório Mundial 2013: Angola

Acontecimentos de 2012

Angola realizou eleições gerais em 31 de agosto de 2012 reafirmando a posição no poder do partido Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e, pela primeira vez, atribuindo ao candidato José Eduardo dos Santos, no poder há 33 anos, a presidência através do voto.

O MPLA, que governa Angola desde 1975, garantiu a maioria de dois terços no parlamento—175 de 220 assentos—o suficiente para alterar a Constituição sem o apoio da oposição. Quarenta por cento dos eleitores não votaram. O Tribunal Constitucional rejeitou as acusações de fraude de três partidos da oposição por falta de provas. O principal partido de oposição, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), apresentou uma queixa adicional no Tribunal Constitucional contestando a constitucionalidade de atos da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) durante os preparativos para as eleições. Até o momento da elaboração deste relatório, a contestação continuava pendente.

As eleições foram, em geral, pacíficas durante a campanha e no dia da votação. No entanto, ficou aquém dos padrões internacionais e regionais. As condições para os partidos políticos foram desiguais, com acesso desigual aos recursos do Estado, aos meios de comunicação esmagadoramente dominados pelo MPLA, e com o órgão eleitoral alinhado ao partido do governo uma vez que não tomou qualquer ação quando o partido violou as leis eleitorais. Como ocorreu durante as últimas eleições nacionais em 2008, observadores eleitorais independentes ficaram seriamente prejudicados por enormes atrasos e restrições na acreditação de observadores nacionais e internacionais e jornalistas internacionais.

As eleições ocorreram em um ambiente mais restrito para a imprensa, a liberdade de expressão e de reunião pacífica do que em 2008. Numerosos incidentes de violência contra manifestantes pacíficos e ativistas nos meses antes das eleições aparentemente provocados por policiais à paisana contribuiram para um clima de medo.

Eleições


O CNE, apesar de ter uma composição mais equilibrada do que em 2008, não foi capaz ou mostrou-se disposto a cumprir o seu papel de órgão de supervisão imparcial. O CNE não conseguiu resolver graves violações das leis eleitorais, inclusive o acesso desigual dos partidos aos meios de comunicação públicos e o abusivo uso dos recursos e instalações do Estado por parte do partido governista. Além disso, o CNE dificultou a fiscalização independente de observadores nacionais e internacionais através da acreditação excessivamente tardia, restritiva e seletiva. O CNE também obstruiu a acreditação de funcionários da oposição nas zonas eleitorais, deixando até a metade dos representantes da oposição sem credenciamento no dia da votação.

A polícia não agiu com imparcialidade durante a campanha eleitoral e, em várias ocasiões, deteve ativistas da oposição de forma arbitrária. A maioria dos ativistas foi libertada sem acusações. Na véspera das eleições, a polícia arbitrariamente deteve pelo menos 19 militantes da oposição e outros ativistas, inclusive funcionários das zonas eleitorais e representantes da oposição, assim como outros que passavam pelos dois protestos em frente à sede do CNE, na capital Luanda. Embora cinco pessoas tenham sido liberadas sem acusações, 14 pessoas, inclusive militantes da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral, CASA-CE), funcionários das zonas eleitorais e aqueles que passavam durante o protesto ficaram presos por três dias e podem enfrentar acusações supostamente por organização de comício de campanha ilegal.

A Liberdade de Imprensa


Os meios de comunicação enfrentam uma ampla gama de restrições que dificultam o direito de livre expressão e incentivam a auto-censura. Os meios de comunicação do estado e vários meios de comunicação de propriedade de altos funcionários funcionam como porta-vozes do partido governista nos quais a censura e auto-censura são comuns.

Além disso, a lei de imprensa de 2006 e o Código Penal prevêm sanções penais por difamação e ofensas semelhantes, tais como “o abuso contra a liberdade de imprensa”. Até o momento da elaboração deste relatório, os estatutos e outras leis complementares necessárias à lei de imprensa de 2006 que levantariam pelo menos parcialmente as excessivas restrições administrativas às rádios e às emissoras de televisão privadas e permitiriam a radiodifusão comunitária ainda estavam pendentes no parlamento.

Jornalistas são frequentemente presos, detidos, perseguidos e interrogados pelas autoridades quando tentam cobrir os protestos em Luanda e em outros lugares, e tem sido alvo de ameaças e cooptação por parte do partido governista. Alguns jornalistas que criticaram o governo estão enfrentando acusações criminais, algumas delas pendentes há anos. Em outubro de 2011, um tribunal impôs a William Tonet, diretor do semanário privado Folha 8, uma sentença de suspensão por um ano e US$100.000 em danos. Até o momento da elaboração deste relatório, a apelação de Tonet ainda estava pendente. Em 12 de março, a polícia invadiu o escritório do Folha 8 confiscando equipamentos e apresentando um mandado de busca sob a acusação de “atentado contra o presidente”, uma ofensa alegada sob os crimes contra a lei de 2010, ou Crimes Contra a Segurança do Estado.

Liberdade de Reunião

A Constituição de 2010 garante os direitos à liberdade de reunião e de manifestação pacífica. Além disso, as leis angolanas permitem explicitamente manifestações públicas sem autorização do governo. No entanto, desde 2009, o governo proibiu uma série de manifestações contra o governo e a polícia tem impedido que a maioria das manifestações pacíficas se realizem.

Desde o início de 2011, um movimento de jovens, sem ligação a qualquer partido político e inspirados pelos movimentos pró-democracia da Primavera Árabe, organizou uma série de manifestações em Luanda e na cidade de Benguela apelando para a liberdade de expressão, a justiça social e renúncia do presidente. Desde maio de 2012, um outro conjunto de protestos ganhou impulso, encenado por ex-soldados de todos os antigos movimentos armados de Angola. Os manifestantes protestavam contra as pensões e outros benefícios não pagos.

As autoridades reagiram aos protestos, até mesmo aos protestos menores, com força excessiva, detenções arbitrárias, julgamentos injustos e intimidação de jornalistas e outros observadores. Desde fevereiro de 2011, o partido governista espalha medo entre a população alegando que os protestos poderiam resultar em guerra civil. Tais mensagens tem um efeito intimidatório sobre a maior parte da população de Angola, devido a prolongada guerra civil que terminou há 10 anos.

Os principais prepertores de violência durante as manifestações tem sido grupos de indivíduos armados que atuam em completa impunidade e parecem ser agentes de segurança à paisana. Nos meses que antecederam a campanha eleitoral, as ameaças e os ataques contra as lideranças juvenis que protestavam e ativistas da oposição por esses agentes de segurança à paisana aumentaram, pareciam sistemáticos, e incluiam ataques contra manifestantes em suas casas particulares, sequestros e desaparecimentos forçados.

Em 10 de março, em uma das repressões mais violentas contra protestos pacíficos em 2012, uma dúzia de agentes de segurança à paisana armados com bastões de madeira e metal, facas e pistolas, atacou uma multidão de 40 manifestantes no bairro Cazenga, em Luanda, ferindo gravemente três organizadores do protesto. No mesmo dia, agentes de segurança à paisana atacaram dois políticos senior do partido da oposição Bloco Democrático no centro da cidade de Luanda.

Em outro caso, particularmente grave, dois organizadores de um protesto para o dia 27 de maio, os ex-guardas presidenciais que reivindicavam salários não pagos, Isaias Cassule e Antonio Alves Kamulingue, foram ambos sequestrados por assaltantes não identificados. O paradeiro deles permanece desconhecido. A polícia tem rejeitado os pedidos de seus familiares para investigar os sequestros. Em setembro, a organização local de advogados Mãos Livres apresentou uma denúncia ao escritório da Procuradoria Geral. A Human Rights Watch desconhece qualquer medida tomada sobre o caso por parte do procurador-geral desde a denúncia feita.

Os manifestantes que se tornaram vítimas de violência, ameaças e sequestros tem apresentado inúmeras queixas contra seus agressores na polícia desde 2011. Até o momento da elaboração deste relatório, a Human Rights Watch não estava ciente de qualquer investigação policial crível em qualquer desses casos.

Defensores dos Direitos Humanos

Durante muitos anos, os defensores dos direitos humanos foram alvos de ameaças, intimidações, tentativas de cooptação, censura e difamação na mídia estatal ou controlada pelo partido governista.

As autoridades também usaram as leis de difamação para restringir relatórios de direitos humanos no país. Em janeiro de 2012, Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, ministro de Estado e há muito tempo chefe do Gabinete Militar do presidente (recentemente renomeado de Gabinete de Segurança) e seis outros generais e altos funcionários, todos acionistas da Teleservice e da empresa de diamantes Sociedade Mineira do Cuango, entraram com um processo por difamação em Portugal contra o ativista de direitos humanos e anti-corrupção Rafael Marques.

A ação foi em resposta a uma denúncia apresentada por Marques em novembro de 2011 ao escritório da Procuradoria Geral de Angola em Luanda contra 17 funcionários angolanos, inclusive nove generais das Forças Armadas Angolanas, alegando que eles foram responsáveis ​​por mais de 100 casos documentados de graves abusos dos direitos humanos, assassinatos, inclusive estupro e tortura, na Lunda Norte, província rica em diamantes. Um tribunal de Luanda apenas ouviu quatro vítimas de abusos que testemunharam em casos documentados por Marques. Até o momento da elaboração deste relatório, o processo judicial contra os funcionários ainda estava pendente.

Rafael Marques tem sido regularmente ameaçado por documentar casos de corrupção no alto escalão em Angola, envolvendo a presidência e uma ampla gama de altos funcionários. Seu blog anti-corrupção www.makaangola.org aparentemente sofreu uma série de ataques de "negação de serviço" em 2011, o que efetivamente minou o acesso público ao site, mesmo que temporariamente.

Expulsão em Massa de Imigrantes

Num lado positivo, o governo tem empreendido esforços para construir novos centros trânsito com condições mais humanas para imigrantes. No entanto, a Human Rights Watch não tem conhecimento de qualquer investigação crível e completa ou de qualquer processo contra funcionários das forças de segurança responsáveis ​​por graves violações dos direitos humanos contra imigrantes congoleses durante expulsões de Angola. As expulsões da Lunda Norte, província rica em diamantes, tem sido frequentes, mas também ocorrem em outras áreas que fazem fronteira com a República Democrática do Congo, como o enclave de Cabinda. Corroborados abusos incluem estupro, coerção sexual, espancamentos, privação de comida e água e, em alguns casos, abuso sexual de mulheres e meninas na presença de crianças e outros detentos.

Finanças Públicas e Direitos Econômicos e Sociais

Preocupações de longa data sobre a má gestão das receitas petrolíferas de Angola como obstáculo chave para a realização dos direitos econômicos e sociais ressurgiram em 2012. Apesar das receitas do petróleo, os indicadores de desenvolvimento de Angola continuam baixos, com altos níveis de pobreza e acesso limitado aos serviços sociais. O Fundo Monetário Internacional (FMI) revelou em dezembro de 2011, que dos gastos do governo angolano entre 2007 e 2010, cerca de US$ 32 bilhões em receitas do petróleo foram gastos fora do processo orçamental, sem auditoria ou qualquer outra forma de fiscalização pública. Este valor, equivalente a 25 por cento do PIB do país, foi gasto em grande parte pela companhia petrolífera estatal, Sonangol.

Principais Atores Internacionais

Angola continua a ser um dos maiores produtores de petróleo da África. É a segunda fonte mais importante de petróleo e o parceiro comercial mais importante na África para a China. Esta riqueza petrolífera, o elevado crescimento econômico e o poder militar angolano na África tem limitado em muito a alavancagem de outros governos e organizações regionais e internacionais que promovem a boa governação e os direitos humanos.

Em março, o FMI emitiu o último pagamento de um empréstimo de emergência de 2009 a Angola. Grupos da sociedade civil pediram ao FMI que suspendesse o financiamento até que o governo explicasse adequadamente como gastou os US$ 32 bilhões das receitas do petróleo que não foram incluidos no orçamento durante o período de empréstimo. Esses grupos argumentavam que efetuar o pagamento final poderia dar a impressão de que o FMI não estava preocupado com a falta de transparência do governo angolano para com seus cidadãos.