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O Brasil atrás das grades

Detentas
        INFRA-ESTRUTURA FÍSICA
        TRATAMENTO MÉDICO
        RELAÇÕES ENTRE AS DETENTAS
        DISCIPLINA, PUNIÇÃO, E TRATAMENTO PELOS GUARDAS
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        VISITAS CONJUGAIS
        TRABALHO

PREFÁCIO

RESUMO

SISTEMA PENITENCIÁRIO

SUPERLOTAÇÃO

DELEGACIAS

CONDIÇÕES FÍSICAS

ASSISTÊNCIA

ABUSOS ENTRE PRESOS

ABUSOS POR POLICIAIS

CONTATO

TRABALHO

DETENTAS

AGRADECIMENTOS

 

No Brasil, como em outros lugares, a população carcerária feminina é pequena em comparação com a população carcerária masculina. As prisões, cadeias e carceragens brasileiras mantém em confinamento cerca de 8.510 detentas, constituindo algo em torno de quatro por cento da população carcerária total. A proporção entre as populações carcerárias masculina e feminina é aproximadamente a mesma encontrada em outros países da região.

Como seus equivalentes masculinos, muitas detentas sofrem com duras condições de prisão e com maus-tratos, incluindo a superlotação dos estabelecimentos penais, assistência médica e legal insuficiente e atendimento inadequado às necessidades básicas. No entanto, as detentas são geralmente poupadas de alguns dos piores aspectos das prisões masculinas. De uma maneira geral, as detentas tendem a ter maior acesso a oportunidades de trabalho, sofrem menos violência dos funcionários e dispõem de mais apoio material. Por outro lado, as detentas também enfrentam obstáculos específicos, especialmente a limitação das instalações recreacionais e a discriminação no que tange ao direito a visitas conjugais.

A população carcerária feminina, ainda mais do que a masculina, inclui uma alta proporção de detentas acusadas ou condenadas pelas leis brasileiras sobre drogas. De fato, nos estabelecimentos que visitamos, cerca de metade das detentas estava presa por crimes ligados às drogas, especialmente delitos de pequena gravidade.

Como era comum na América Latina, muitas das prisões femininas eram antes administradas por freiras. A Penitenciária Feminina de São Paulo, por exemplo, era administrada por uma ordem de freiras católicas até 1980. Atualmente, as prisões femininas tendem a ter funcionários de nível melhor do que as prisões masculinas, o que resulta em mais supervisão e assistência.

Infra-estrutura Física

Devido ao pequeno número de detentas em cada estado, as prisões femininas são estabelecimentos pequenos, nenhum dos quais chega a atingir o tamanho das prisões masculinas. A Penitenciária Feminina de São Paulo, por exemplo, a maior prisão feminina do país, tem quatro pavilhões principais com capacidade para 256 detentas, embora mantenha cerca de 400; a Casa de Detenção Feminina em Tatuapé, no estado de São Paulo, também mantém cerca de 200 detentas. A grande maioria das prisões femininas, contudo, têm menos de cem detentas. Muitas estão localizadas em prédios convertidos de outros usos - o Presídio Feminino de João Pessoa está localizado em um ex-convento, por exemplo - ou em pequenos anexos adjacentes às prisões masculinas.(331)

A maioria das prisões femininas está superlotada, embora em grau menor do que as prisões masculinas. Na Penitenciária Feminina de São Paulo, por exemplo, vimos duas mulheres vivendo em cada cela individual, e disseram-nos que três mulheres foram amontoadas em algumas celas durante reformas recentes. Poucas prisões femininas, como os estabelecimentos de Natal e Brasília, atendem sua capacidade ideal, ou estão abaixo dela.(332) A infra-estrutura física dos estabelecimentos femininos estavam em boas condições - muito melhores que os estabelecimentos masculinos - com pintura decente, banheiros com azulejos e pias e privadas funcionando.

Ao contrário das prisões masculinas, a maioria das prisões femininas não tinha áreas de exercício muito grandes. Muitas delas incluíam apenas pequenos pátios pavimentados. A Penitenciária Feminina de Natal, um dos piores nesse aspecto, tinha um pátio interno com plantas, entre dois corredores de celas, que quase não oferecia espaço de exercício às detentas.

O pior estabelecimento que a Human Rights Watch visitou, em termos das condições nas quais as mulheres viviam, foi o 3o Distrito Policial em São Paulo. Localizado em uma área chamada de "Crackolândia", devido às drogas vendidas e consumidas ali, a carceragem do distrito tinha numerosos viciados em drogas e, entre as detentas, prostitutas. O estabelecimento não dispunha de um anexo feminino; em seu lugar, as detentas se apinhavam em uma cela de triagem na entrada da área masculina. O dia em que visitamos o local, dez mulheres estavam trancadas em uma cela longa e estreita com aproximadamente cinco metros por um metro, sendo que o último meio metro era ocupado por um buraco no chão que servia de privada. Com uma lâmpada quebrada pendendo do teto, a cela não tinha luminosidade além da luz do sol que entrava pelas grades. Uma das detentas, grávida de cinco meses, reclamava que estava doente e sentia dores, mas os guardas a ignoravam. Ela tinha passado os últimos dez dias trancada na cela escura e lotada.

Tratamento Médico

Apesar das detentas geralmente necessitarem de mais cuidados médicos do que os detentos, a assistência médica é, com freqüência, extremamente deficiente nos estabelecimentos penais femininos. A Casa de Recuperação Feminina Bom Pastor, em João Pessoa, por exemplo, não tinha nem enfermaria nem médico; o tratamento médico era fornecido por uma enfermeira que ia ao estabelecimento três manhãs por semana. Lá, falamos com uma mulher que estava grávida de sete meses mas que nunca havia feito um exame médico pré-natal.

A Aids é uma ameaça séria à saúde das detentas; na verdade, estudos indicam que a doença atinge uma percentagem ainda mais alta de mulheres do que de homens encarcerados. Vinte por cento das detentas eram soropositivas.(333)

Supõe-se que uma alta proporção dessas mulheres havia contraído o HIV através de seringas compartilhadas, conclusão baseada na alta freqüência de uso de drogas entre essas pessoas.

Relações entre as Detentas

O número reduzido da população carcerária em cada estado significa que cada prisão feminina geralmente serve a uma área geográfica extensa. Devido a esse fato, cada estabelecimento reúne todos os tipos de detentas, sem separação por status legal ou histórico criminal, ou por qualquer outro critério. Dentro de cada prisão, da mesma forma, as detentas se misturam de forma bastante aleatória. Poucos estabelecimentos visitados pela Human Rights Watch separavam as mulheres de acordo com seu status legal: apenas a Penitenciária Feminina Madre Pelletier de Porto Alegre e o Penitenciária Feminina de Brasília. O estabelecimento de Porto Alegre tinha diversos pavilhões separando diferentes grupos de detentas, de forma a separar detentas que aguardavam julgamento de detentas já condenadas pela Justiça, por exemplo. O estabelecimento de Brasília, de maneira semelhante, tinha dois pavilhões diferentes: um para detentas condenadas que mantinham boa conduta, outro para detentas aguardando julgamento e detentas condenadas com problemas de comportamento.

Apesar da ausência de separação por categoria, relatos de violência entre as detentas são raros. "A briga aqui não termina nunca, só que é com palavra e não com armas," explicou-nos uma mulher, num comentário típico.(334)

A única prisão na qual as detentas descreveram uma atmosfera de perigo foi o pavilhão feminino da Penitenciária Central João Chaves, em Natal, na qual a Human Rights Watch encontrou três mulheres vivendo em duas minúsculas celas em uma área de isolamento, separadas da população carcerária geral. Essas mulheres, que viviam isoladas por escolha própria, alegaram estar temendo por suas vidas. Uma delas tinha sido esfaqueada treze vezes pelas companheiras dentro da prisão, passou três dias no hospital e tinha cicatrizes terríveis no peito. Outra delas disse-nos: "Tem um pequeno grupo que manda aqui. Elas batem nas outras, mandam matar e controlam o tráfico de drogas".(335)

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