Background Briefing

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A resposta do Governo

Desde a decisão da Suprema Corte em 1996, os crimes cometidos por soldados contra civis estão sujeitos à jurisdição dos tribunais civis.76  Os promotores militares investigam esses casos em primeira instância e determinam se os casos deveriam ser levados para os tribunais civis.77 Em todas as violações enumeradas acima, excepto pelo recente assassinato de Luís Bundu, as FAA se omitiram na investigação. Em algumas das mortes, as FAA “reconheceu” sua responsabilidade ao transferir unidades inteiras, inclusive oficiais, para outras partes da província de Cabinda ou para outras províncias, além de arcar com as despesas funerárias das vítimas. No entanto, as autoridades civis têm ignorado os casos de violações trazidos à sua atenção. A prisão dos supostos responsáveis pela morte de Bundu e o envolvimento de um procurador do distrito municipal de Cacongo e a exumação do seu corpo são passos positivos, mas ainda não se sabe ao certo se haverá uma investigação e processo devidos sobre sua morte, tendo em vista a falta de capacidade e vontade tanto da polícia quando do Judiciário.  De modo geral, os Cabindenses não acreditam que as violações sejam levadas seriamente pelas FAA ou pela polícia. Como ressaltou um homem:

Os soldados são como porcos selvagens e as autoridades civis são como porcos domésticos. Você não pode procurar um porco domesticado para apresentar queixa contra um porco selvagem.78

O sub-promotor civil de Cabinda declarou que a detenção e a tortura de civis pelas FAA em bases militares é ilegal, conforme Artigo 291 do Código Penal de Angola, uma vez que as FAA não tem poderes de prisão.79 Não só as pessoas cujos casos são citados neste relatório foram detidas em locais e situações irregulares, como também foram violados seus direitos de contar com um processo devido, conforme garante a Lei Angolana, inclusive de serem informadas prontamente sobre quaisquer acusações que pairem sobre si; de serem levadas imediatamente à presença de um juiz com poderes para julgar sobre a legalidade da detenção; e de terem acesso a um(a) advogado(a).  A Human Rights Watch também se preocupa com o facto de que os acusados geralmente acabam sendo representados por pessoas que não têm formação jurídica para tal função.80 O governo de Angola deveria garantir que a implementação da lei seja conduzida pelas autoridades civis competentes, tais como a polícia e não os próprios militares.

Além das exigências de processar segundo a lei doméstica, Angola é obrigada a processar os implicados em violações graves da lei humanitária internacional. Como signatária do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (TPI), Angola deveria processar actos perpetrados por todas as partes que sejam contrários ao propósito do Estatuto do TPI.81 Entre os actos absolutamente proibidos e descritos neste relatório estão: a) o assassinato, b) a tortura, c) o tratamento humilhante ou degradante de civis ou combatentes capturados, e d) o estupro e outras formas de violência sexual. 

O comandante regional das FAA informou à Human Rights Watch que, como parte da campanha do governo de “conquistar os corações e mentes” dos Cabindenses, os soldados das FAA recebem um curso de “educação patriótica”, que inclui algum treinamento sobre as leis humanitárias internacionais e instruções de como tratar os civis com respeito – mas esse treinamento é claramente insuficiente.82 O comandante regional das FAA também recebeu líderes comunitários em reuniões para discutir suas queixas e informar-lhes que devem denunciar todas as violações cometidas pelas FAA à atenção dos oficiais de campo.83



[76] Ver, Acordão do Tribunal Supremo sobre a Inconstitucionalidade Parcial da Lei da Justice Penal Militar (Processo n. ° 10), emitido em 11 de Outubro, 1996.

[77] Ibid.

[78] Entrevista da Human Rights Watch, distrito municipal de Cabinda, 2 de Agosto, 2004.

[79] Código Penal, Capítulo XIII, Artigo 291.

[80] Entrevista da Human Rights Watch com um advogado, distrito municipal de Cabinda, 17 de Agosto, 2004.

[81] Angola assinou o Estatuto de Roma em 7 de Outubro de 1998, mas ainda precisa ratificá-lo.

[82] Entrevista da Human Rights Watch com o General Marques Correia Banza (Comandante regional das FAA em Cabinda), cidade de Cabinda, 16 de Agosto, 2004.

[83] Ibid.


<<precedente  |  índice  |  seguinte>>dezembro de 2004