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A Responsabilidade de Proteger os Retornados

Meu filho perdeu metade de sua perna em Setembro. O problema é que as pessoas estão com fome e vão a procura de mangas. Geralmente são as crianças que saem a procura de mangas, mas meu filho tem vinte anos. A área estava marcada com área de minas mas ele havia acabado de chegar e estava com tanta fome que ignorou o aviso.
– Feliza, Luau, 23 de Novembro, 2004.

Mesmo antes do fim da guerra, o governo de Angola reconheceu oficialmente sua responsabilidade na protecção dos direitos dos IDPs e refugiados retornados ao adoptar uma legislação nacional sobre o assunto, as Normas para o Reassentamento das Pessoas Deslocadas (as Normas) em Janeiro de 2001, e ao implementar seu regulamento (Regulamento) em 2002.1  Ao fazer isso, Angola tornou-se o primeiro país do mundo a incorporar os Princípios Guia das Nações Unidas sobre o Deslocamento Interno em sua legislação doméstica,2 e ampliou a aplicação desses princípios ao tratamento dos refugiados retornados. Além dessa legislação, segundo o Artigo 18 da Constituição Angolana, “Todos os cidadãos são iguais perante a lei e gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres sem distinção de sua cor, raça, etnia, sexo, lugar de nascimento, religião, grau de instrução, condição económica ou social.” Apesar dessas leis e das obrigações internacionais assumidas por Angola sob o Direito Internacional, uma cultura de impunidade em nível local e prolongadas tensões políticas e de suspeita tornam os retornados vulneráveis a abusos cometidos pelas autoridades locais e algumas autoridades comunitárias.

O Programa de Repatriamento Voluntário

Os Acordos Tripartite negociados entre o governo de Angola, o ACNUR e os principais países de asilo para os refugiados Angolanos (a República Democrática do Congo, a Zâmbia e a Namíbia) prevêem que Angola forneça as condições mínimas necessárias para o repatriamento voluntário, especialmente no tocante a eliminação de minas e o acesso à terra.3  A Convenção da Organização de Unidade Africana de 1969 sobre Aspectos Específicos dos Problemas dos Refugiados em África (“Convenção Africana sobre Refugiados”), ratificada pelo Governo de Angola em 1982, reconhece o carácter voluntário do repatriamento e fornece, especificamente, que “O país de origem que acolhe os refugiados que aí retomam deve facilitar a sua reinstalação, conceder todos os direitos e privilégios dos seus nacionais e sujeitá-los às mesmas obrigações.”4  Em termos de responsabilidades institucionais, facilitar e promover o repatriamento voluntário é a base e função estatutária do ACNUR.5  Através do Artigo 35 da Convenção de 1951 sobre o Status dos Refugiados e o Artigo VII da Convenção Africana sobre Refugiados, os Estados parte devem cooperar com o ACNUR nessa e em outras áreas. A Assembleia Geral reiteradamente reafirmou as amplas funções do ACNUR no país de origem.6  As Conclusões do Comité Executivo do ACNUR (ExCom)7 também reafirmam os princípios internacionais e contém normas que regem o processo de repatriamento voluntário.8

Os primeiros Acordos Tripartite alcançados com os governos da Zâmbia e RDC reconhecem que o repatriamento voluntário constitui a solução mais duradoura para os refugiados, ao passo que os refugiados sejam repatriados em condições de “segurança e dignidade”.9  A primeira pergunta a ser respondida na avaliação do processo de repatriamento é se o mesmo se dá em condições de voluntariado.10  Segundo o Manual do ACNUR sobre o Repatriamento Voluntário, os refugiados devem receber informação precisa sobre as condições de seu país de origem para que possam tomar uma decisão consciente, e não estar sujeito a “factores de expulsão” tais como pressão física, psicológica ou material para que deixem o país de asilo.11 

Usando essas normas, o repatriamento dos refugiados Angolanos na RDC e Zâmbia—os dois casos investigados pela Human Rights Watch—parece ser voluntário. O grande número de retornados espontâneos durante o programa do ACNUR demonstra o forte desejo dos Angolanos de retornar à casa. Longas listas de espera pelo repatriamento voluntário ainda existem nos campos da RDC e Zâmbia.12  A Human Rights Watch entrevistou vários retornados nos centros de recepção do Luau e Cazombo na província do Moxico que revelaram estarem ansiosos por retornar à Angola desde o fim da Guerra em 2002, apesar das dificuldades que eles esperavam encontrar.13  João N., pai de seis filhos expressou esse desejo a Human Rights Watch nos seguintes termos: 

O ACNUR explicou que não haveria comida, casas ou escola. Eles também nos contaram que haveria muitas minas. Mas, mesmo sem casa, sem comida, sem escola, nós queríamos voltar ao nosso país porque este é o nosso país.14 

Depois de indicarem a sua intenção, os refugiados participam do programa de repatriamento voluntário. A Organização Internacional para as Migrações (International Organization for Migration, IOM) organiza o transporte por via aérea ou por terra aos centros de recepção em Angola.  As ONGs actuando como parceiros do ACNUR prestam assistência tanto aos retornados pelo programa organizado quanto aos retornados espontâneos que chegam aos centros de recepção por seus próprios meios.15  ONGs de saúde avaliam os retornados e transportam aqueles com doenças mais sérias para postos de saúde, além de fornecer instrução sobre o HIV/SIDA. Organizações internacionais de Eliminação de Minas fornecem instrução aos retornados sobre os riscos das minas terrestres. Os retornados também deveriam receber kits de construção para estabelecerem suas novas casas e kits de agricultura com sementes e ferramentas mas esses kits nem sempre estão completos devido a restrições logísticas e financeiras.  No Cazombo, por exemplo, o ACNUR não pôde distribuir as sementes com os kits agrícolas em Setembro e Outubro de 2004.16 Outros retornados se queixaram de terem recebido kits de construção incompletos.

Como ressaltado anteriormente, o repatriamento deve não apenas ser voluntário mas também deve ocorrer sob condições de “segurança e dignidade”, o que ACNUR denomina de: segurança legal (tais como amnistias ou garantias públicas da segurança pessoal, não discriminatória e sem temor de perseguição ou punição após o retorno), segurança física (inclusive a protecção contra ataques armados e minas terrestres), e segurança material (acesso à terra ou meios de sobrevivência).17

Negação do Direito à Cidadania

O direito à cidadania é o pilar básico da protecção legal dos refugiados retornados.  O Regulamento exige que as delegações provinciais do Ministério da Justiça conduzam o registro de nascimento e garantam que cédulas de identidade sejam emitidas.18  Esse requisito corresponde ao Princípio 20 dos Guiding Principles da ONU, que determina que as autoridades devem emitir novos documentos em substituição dos documentos perdidos durante o deslocamento e não impor “condições irracionais” para a obtenção dos mesmos.  Esse princípio - - protege - o direito à nacionalidade no Direito Internacional Consuetudinário, cristalizado no Artigo 15 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e o direito ao reconhecimento da pessoa perante a lei, codificado no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP).19  A Convenção sobre os Direitos da Criança também determina o registro de nascimento para crianças para proteger seus direitos à nacionalidade.20 A Conclusão do ExCom no. 101 (LV) de 2004 também nota “a importância de garantir a nacionalidade e fornecer perante a lei nacional o reconhecimento do status civil como primeira etapa do retorno de refugiados e de ai em diante…”21

Muitos dos retornados entrevistados pela Human Rights Watch não possuíam documentos de identidade necessários para estabelecer sua cidadania, garantir seu acesso aos serviços públicos do governo e à educação pública e para que possam trabalhar e votar.  Previsto nas Normas e no Regulamento, o Ministério da Justiça deve conduzir o registro de nascimento e emitir as cédulas de identidade (fornecidas às crianças) e bilhetes de identidade (fornecida aos adultos) a todos retornados.22

A guerra destruiu o sistema de registro de nascimento e arquivos na maior parte do país, portanto, o Ministério da Justiça, com a assistência do UNICEF e outras ONGs, instituiu uma campanha em 1988 de registro gratuito.23  A segunda campanha, que teve início em 2001 e foi estendida até o final de 2004, incluía crianças de famílias da UNITA em áreas de recepção durante o processo de desmobilização.  A campanha tinha como alvo crianças com menos de dezoito anos nas áreas de retorno e os registros eram feitos em centros de recepção para refugiados e através do envio de equipes aos destinos finais dos deslocados.

O registro de nascimento gratuito para crianças é vital para garantir seu direito à cidadania e identidade. Em uma pesquisa recente conduzida pelo UNICEF e o Instituto Nacional de Estatística, grande parte das pessoas citou o custo excessivo como maior impedimento ao registro de seus filhos. A segunda dificuldade mais citada foi a distância até o local de registro civil.24  O UNICEF está clamando ao governo que torne o registro de nascimento gratuito um programa permanente, mas até o momento de elaboração deste relatório, o UNICEF planejava limitar em 2005 o seu apoio a campanha de registro a crianças com menos de cinco anos de idade.25  Além das restrições financeiras, a campanha de registro da nascimento também corre o risco de ser estrangulada pela burocracia. Em Luau, por exemplo, o escritório local do Ministério da Justiça não tinha mais livros de registro desde Outubro de 2004; os governos provincial e nacional ignoraram os pedidos por mais livros de registro, o que significa que as crianças que retornaram através do centro de recepção do Luau entre Outubro e Novembro de 2004 não foram registradas.26 

Um oficial internacional contou à Human Rights Watch que o Ministério da Justiça parecia receptivo à necessidade de registro de nascimento, mas suspeitava que alguns oficiais locais estavam ansiosos pelo fim da campanha para que pudessem novamente cobrar pelo registro, o que poderia abrir possibilidades para extorsão.27 Apoiadores da UNITA levantaram a possibilidade de uma razão ainda mais sinistra para a negativa de documentos de identidade a adultos—um plano para impedir que os apoiadores da UNITA e ex-soldados votem.  Segundo um deputado membro da UNITA, “Nada impediu o governo de entrar no interior do país numa campanha exitosa contra a pólio. Mas quando há uma razão política para não visitar áreas da UNITA [como parte de uma campanha móvel de registro], não há o mesmo entusiasmo.”28  Embora a Human Rights Watch não tenha encontrado evidências que corroborem essa denúncia, a desculpa do governo de que lhe faltam recursos adequados não pode ser usada para negar o direito humano básico à cidadania.   

A Human Rights Watch entrevistou vários adultos no Moxico e no Huambo que não puderam arcar com as despesas para obtenção das cédulas e bilhetes de identidade para si mesmos, ficando vulneráveis a abuso cometido pelas autoridades locais. Um refugiado recém retornado da RDC contou à Human Rights Watch que a polícia o interpelara em Luau em 2003 e demandara ver seus documentos de identidade, os quais ele ainda não obtivera.  A polícia o prendeu tendo que passar a noite na cadeia e sendo solto somente depois que um parente pagou o suborno de 500 Kwanzas.29  Um representante da Organização Internacional para as Migrações em Luau disse que um de seus funcionários testemunhou quando a polícia—que pode reconhecer os recém retornados da RDC pela forma de vestir e porque falam francês—molestavam pessoas sem documentos de identidade.30  A polícia normalmente pede por uma gasosa (termo que se refere a um refresco mas com o sentido de suborno).  Um policial contou à Human Rights Watch casualmente, “a polícia deve parar as pessoas para checar seus documentos porque precisam de dinheiro”.31

A Human Rights Watch tem recebido relatórios preocupantes de ONGs e agências da ONU que em alguns casos, o abuso contra os retornados foi escalonado resultando em espancamentos e estupro. Na cidade de Maquela do Zombo, na província do Uíge, próximo a fronteira entre a RDC e Angola, militares têm atacado o tráfico ilegal de diamantes numa operação conhecida como Operação Brilhante, uma campanha do governo que expulsou brutalmente em 2004 aproximadamente 12.000 trabalhadores imigrantes considerados ilegais.  Autoridades da fronteira acusam os retornados Angolanos de serem “Congoleses”. Uma ONG em Maquela do Zombo tem trabalhado com mulheres que foram detidas na fronteira, espancadas e estupradas. Segundo essa ONG, em um caso, uma mulher grávida sofreu aborto depois de ter sido apanhada na fronteira e espancada em um caminhão que a levou à prisão em Maquela do Zombo.32

Problemas semelhantes foram relatados na província do Malanje, que também tem fronteira com a RDC e também é parte da varredura da Operação Brilhante.33  O abuso de mulheres, no entanto, não se limita às areas alvo da Operação Brilhante.  Um funcionário da ONU contou à Human Rights Watch que em Lumbala N’Guimbo, onde está localizado um centro de recepção e uma base militar no Moxico, militares exploram sexualmente mulheres retornadas,34 embora não seja claro se as relações constituem prostituição ou estupro.35  O ACNUR tem financiado associações de mulheres em Lumbala N’Guimbo desde que a comunidade decidiu por si própria ajudar o retorno de mulheres livres da prostituição, mais uma vez, demonstrando o papel fundamental do ACNUR na protecção dos retornados. 

Em resposta a esses incidentes, o ACNUR e algumas ONGs também organizaram programas de treinamento em direitos humanos para membros do governo local, policiais e soldados. Como sinal positivo, uma ONG admitiu não estar apta a atender todos os pedidos de treinamento solicitados pelos militares em nível nacional e provincial.36  Além disso, autoridades do governo garantiram ao ACNUR que aceitarão formas alternativas de identificação, tais como o Formulário de Repatriamento Voluntário emitido pelo ACNUR e/ou cartões de suprimentos da FAO, dos retornados que não possuírem cédula ou bilhete de identidade.37  Embora essas garantias e pedidos de treinamento sejam bem-vindas, não são suficientes. Os comandantes militares e policiais devem investigar as denúncias de abuso e disciplinar os responsáveis de maneira adequada. 

Os retornados também se queixaram de que o governo interfere em seu direito ao trabalho ao recusar o reconhecimento das qualificações profissionais e educacionais obtidas nos países de asilo.  No Moxico, a Human Rights Watch entrevistou profissionais da saúde treinados na RDC que trabalham para ONGs internacionais mas temem que o governo não permita a continuação de seu trabalho uma vez que as actividades da ONG sejam remetidas ao Ministério da Saúde:

Eu voltei com meus diplomas da RDC mas eles não têm valor aqui. O governo nunca rejeitou definitivamente minha solicitação de equivalência—ficam simplesmente retardando o processo. Pelos últimos dois anos, o Ministério da Justiça remete minha solicitação por um bilhete para correcção de supostos erros, tais como fotos de baixa qualidade e tipo errado de papel.  Eu até já paguei a taxa para a solicitação duas vezes. Eu não entendo—o nível de educação do nosso país é tão baixo—não poderíamos mobilizar outras pessoas cuja experiência possa ajudar nosso país?38

As leis internacionais sobre refugiados exigem que Angola forneça aos retornados um acesso não discriminatório aos processos, quando existam, de reconhecimento e equivalência dos ensinos primário e secundário recebidos no exterior assim como equivalência académica, profissional e certificados dos níveis alcançados no exterior.39

Tensões Políticas e Violência

Em geral, parece haver poucas tensões entre os ex-soldados da UNITA, apoiadores da UNITA e apoiadores e soldados do MPLA.  As pessoas estão exaustas após 30 anos de luta e poucas se preocupam com a política o suficiente para arriscar um novo conflito. Como ambos os lados forçaram o recrutamento de muitos combatentes durante a Guerra, eles guardam pouco se é que algum melindre ideológico ou lealdades partidárias e estão simplesmente aliviados de que a Guerra acabou.  Os retornados recordam que a derrota da UNITA nas eleições de 1992 levaram a retomada da guerra e expressaram sua razoável preocupação de que as próximas eleições gerem novos conflitos e violência.  Eles estão de maneira semelhante desgastados pelas actividades políticas da UNITA.

Embora esses temores de um retorno a um passado violento tenha deixado a população amplamente subjugada e tranquila, algumas comunidades têm demonstrado suas suspeitas actuando violentamente contra membros do partido da UNITA que tentam estabelecer escritórios em areas que foram devastadas pela guerra.  O incidente mais notório disso ocorreu no Cazombo em Julho de 2004, quando um ex-general da UNITA, Moises Cayumbu Jolomo, e sua delegação de membros da UNITA tentou inaugurar o escritório do partido. Os moradores da cidade atribuiram ao General Jolombo a responsabilidade pela destruição da ponte sobre o Rio Zambeze durante a Guerra, o que deixou o Cazombo isolado do restante de Angola. A delegação da UNITA solicitou ao administrador local um novo escritório, que respondeu que não haviam edificações disponíveis.  A delegação então identificou um apoiador local da UNITA e passou a usar sua casa para mostrar vídeos sobre Jonas Savimbi ao público. Cedo numa manhã após a exibição do vídeo, um grande grupo de pessoas reunidas da comunidade de Chipoya, onde estava localizado o novo “escritório” da UNITA, se reuniu e começou a confusão:

Foi no dia 17 de Julho por volta das 6 da manhã. Eu estava dentro de casa com minha esposa e três filhos quando a multidão se aproximou.  Nós fugimos. A multidão queimou a minha casa—destruiu tudo que tinha dentro. Eles gritavam que eu era da UNITA e que a UNITA não deveria viver em Chipoya.40

Ao todo, 51 casas foram destruídas em menos de dois dias. Uma outra vítima, ex-combatente da UNITA, revelou como um dos sobas (líder tradicional ou chefe da vila) se viu entre uma atmosfera de raiva:

Minha casa foi destruída. O grupo que incendiou minha casa estava se preparando para incendiar outras casas quando outro grupo os interpelou.  Algumas pessoas correram para buscar ajuda na casa de nosso vizinho Dominga.  Quatro dias depois, o Soba White Kaumba foi a casa do Dominga e demandou saber como ela poderia abrigar pessoas da UNITA.  Seus filhos fugiram quando viram o soba.  O soba gritou com ela e então acendeu um pedaço de madeira com grama e incendiou a sua casa. A polícia prendeu o soba e levou-o para a prisão em Luena por três meses.  Ele retornou há alguns dias. Ele ainda é o soba de Chipoya, mas ele não pode mais distribuir a terra—o Soba Supremo do Moxico tirou dele essa autoridade. Nós não confiamos mais nesse soba. Um líder não faria tal coisa. As pessoas fazem esse tipo de coisa mas os sobas não.41

Segundo as vítimas entrevistadas pela Human Rights Watch, a polícia entrevistou algumas das vítimas mas não prendeu ninguém além do Soba White Kaumba. As autoridades provinciais prometeram indemnizar as vítimas mas todavia não cumpriram com sua promessa.42 Apesar disso, as vítimas entrevistadas pela Human Rights Watch se sentiam seguras o suficiente para reconstruir suas casas nas proximidades de onde as antigas haviam sido queimadas. Até mesmo o General Jolombo permanecia em sua casa. “Estamos confiantes na polícia porque eles nunca fizeram nada contra nós. As autoridades me protegeram”, afirmou uma das vítimas.43 

A ONU investigou o incidente e concluiu que se tratou de um caso isolado de mobilização direccionado contra o retorno do General Jolombo.44  Essa explicação pode ser verdadeira para o Cazombo, que permanece pacífico desde esse incidente, mas não explica casos semelhantes de violência e vandalismo que ocorreram em outras partes do país, especialmente no Huambo e em outras áreas para onde retornou um grande número de ex-combatentes da UNITA. A secretária provincial da UNITA no Huambo descreveu assim o que aconteceu com ela, dois outros deputados da UNITA e alguns outros membros do partido que tentaram inaugurar um escritório na vila de Galanga (na comunidade de Londuimbali) em 9 de Junho de 2004:

Eu me encontrei com o administrador de Londuimbali e com líderes do MPLA antes de viajar a Galanga para avisá-los de que nós planejávamos visitar as vilas de Londuimbali.  Não pretendíamos hastear a bandeira da UNITA em Galanga porque sabíamos que as pessoas não seriam receptivas ao ato—apenas queríamos conversar com as pessoas.  Quando chegamos em Galanga, uma multidão de talvez cerca de 100 ou 150 pessoas chegou e ameaçou matar-nos. Nós nos escondemos dentro do prédio onde pretendíamos abrir um escritório e nos reunimos com o soba local, o administrador e o padre da igreja local. Todos concordamos que em Angola deveria haver paz—o MPLA decepou o meu pai com uma foice, mas se nos apegarmos a essas memórias, não faremos nenhum progresso.  Quando nossa delegação ficou só no escritório, a multidão começou a atirar pedras e quebrou algumas janelas. O administrador de Galanga e alguns policiais chegaram para nos escoltar na saída. Quando eu deixava o prédio, fui atingida por uma pedra na cabeça e um dos deputados foi ferido no maxilar e no ombro.45

Uma ONG Angolana que tem trabalhado na resolução de conflitos em Galanga desde esse incidente contou à Human Rights Watch que a secretaria do MPLA recomendou aos ex-combatentes da UNITA que se juntassem ao MPLA para evitar maiores conflitos.46

Eventos semelhantes ocorreram em duas outras vilas na municipalidade de Bailundo, o refúgio de Savimbi nos anos 90, quando a UNITA tentou abrir escritórios do partido em Julho e Setembro de 2004.47  Os incidentes seguiram um padrão semelhante: uma multidão de pessoas que nunca são identificadas vandalizam o escritório da UNITA e as vezes queimam suas casas.  A polícia entrevistou as vítimas mas ninguém foi preso. Membros do partido da UNITA e vários outros ex-combatentes da UNITA contaram à Human Rights Watch que as autoridades do governo pressionam os apoiadores da UNITA a se juntarem ao MPLA para evitar conflitos e, se empregados pelo governo, para serem promovidos em suas carreiras.48 

A Human Rights Watch não encontrou evidência da cumplicidade do governo nesses episódios violentos. No entanto, esses incidentes demonstram que obstáculos a reconciliação e reintegração continuam, apesar das provisões do Memorando de Luena que deu amnistia a todos os autores de ambos os lados pelos actos cometidos durante a guerra.49  No Huambo, o MPLA e a UNITA formaram uma comissão conjunta para investigar esses incidentes. A polícia local e o governo provincial e nacional devem apoiar plenamente o trabalho dessa comissão para inibir outros antes que as eleições de 2006 polarizem ainda mais a sociedade.

O governo de Angola recentemente nomeou o ex-Ministro da Justiça Paolo Tjipilica como novo Ouvidor da Justiça e tem trabalhando juntamente com o Escritório de Direitos Humanos da ONU em Angola na criação de uma comissão nacional de direitos humanos. Isso pode ser um avanço promissor para a protecção dos direitos humanos em Angola. Infelizmente, o governo não garantiu a participação dos membros da sociedade civil Angolana no processo de selecção para o Ouvidor de Justiça.50  Todas as futuras comissões de direitos humanos devem ter o apoio da sociedade civil e recursos adequados para que tenham a credibilidade e capacidade necessárias à sua eficácia.

O Perigo das Minas Terrestres

É muito difícil estimar a ameaça das minas terrestres e artefactos não detonados (ANDs) em Angola hoje em dia. No final da guerra, a agência internacional de desminagem de minas, HALO Trust, estimou que haveriam pelo menos um milhão de minas terrestres em Angola, de cerca de 76 tipos diferentes manufacturadas em 22 países.51 O governo estima que existam 80.000 sobreviventes de acidentes com minas terrestres em Angola.52 

As minas terrestres isolam comunidades da assistência humanitária porque organizações humanitárias não podem viajar em grande parte do país devido ao perigo das minas, o que é agravado na estação das chuvas que expõem as minas e causa sua detonação. As pessoas também não podem cultivar suas terras com segurança.  Os pesquisadores da Human Rights Watch pessoalmente observaram ameaças de minas em Luau, onde as pessoas estão literalmente vivendo em campos de minas. As crianças brincam muito próximas às áreas marcadas com bandeiras vermelhas sinal que indicam presença de minas. Um retornado explicou um acidente recente com mina terrestre em sua família:

Meu filho perdeu metade de sua perna em Setembro. O problema é que as pessoas estão com fome e vão a procura de mangas. Geralmente são as crianças que saem a procura de mangas, mas meu filho tem vinte anos. A área estava marcada com área de minas mas ele havia acabado de chegar e estava com tanta fome que ignorou o aviso.53 

A organização internacional Mine Advisory Group (MAG) é a principal agência de eliminação de minas no Moxico. O ACNUR solicitou ao MAG que avaliasse a situação das minas na localidade do Luau onde fora proposto um centro de recepção, mas o MAG não pôde avaliar o destino final dos refugiados antes que o processo de repatriamento começasse. Como consequência disso, a extensão da contaminação do terreno ao redor de Luau somente ficou aparente quando as pessoas passaram a se mudar para a região e se deparavam com minas. “Nós suspeitávamos que haveria problemas, mas não na extensão do que ocorre em Luau”, disse o director de programa do MAG à Human Rights Watch. Além da desminagem manual de minas terrestres, o MAG também conduz cerca de 30 “trabalhos localizados” por mês para destruir artefactos não detonados encontrados em Luau.54

Uma vez que a pressão por terras disponíveis em Luau aumentar com o retorno de mais refugiados, mais pessoas serão forçadas a escolher entre viver em terras com minas terrestres próximas a Luau ou se mudar para terras mais distantes e perder o acesso aos serviços sociais (inclusive saúde e escola) e mercados.55  Alguns refugiados decidiram tomar esses riscos e viver na região mais próxima mas também com minas terrestres. Em nível nacional, as agências da ONU reconhecem o dilema enfrentado pelos retornados mas expressam receio que eles optem por se mudarem para áreas reconhecidamente minadas.56 Um director do ACNUR explicou o dilema enfrentado pela agência com respeito ao direito do retornado de escolher seu destino final e a prevenção de que se assentem em áreas perigosas. “Não podemos impedi-los—tudo que podemos fazer é fornecer informação. É uma escolha muito intencional.”57  Mas a decisão de viver entre as minas não é tão difícil de ser compreendida quando a alternativa é o quase completo isolamento.  A minas parecem impor um problema menor para os retornados em áreas rurais da província do Huambo (possivelmente porque as autoridades nacionais têm priorizado as terras altas densamente habitadas nas actividades de desminagem), embora os pesquisadores da Human Rights Watch tenham observado extensas áreas minadas ao longo das maiores estradas no Huambo.

Segundo as Normas para o Reassentamento, o governo é responsável por garantir que “todas as localidade de reassentamento e retorno sejam avaliadas como livres de minas terrestres”, e o governo deve fornecer treinamento sobre os perigos das minas e conduzir actividades de desminagem, trabalhando com parceiros e ONGs sempre que necessário.58

Os esforços do governo na desminagem têem sido confinados as operações de desminagem militar designados a limpar artérias de transporte estratégicas e não para preparar áreas para o reassentamento. Até agora, o papel do governo tem sido principalmente de coordenação.  A Comissão Nacional Intersectorial de Desminagem e Assistência Humanitária, CNIDAH, que presta contas directamente ao Conselho Ministerial, trabalha para melhorar a colaboração entre a comunidade internacional, o Instituto Nacional de Desminagem (INAD) e outras instituições governamentais e ministeriais relevantes. O INAD espera estabelecer escritórios em dez das províncias mais afectadas no país e apoiar as Forças Armadas Angolanas (FAA) na adopção de normas humanitárias de desminagem, que são bastante diferentes das normas militares.59 O CNIDAH elaborou um plano de acção de desminagem nacional para priorizar intervenções baseadas na densidade populacional, número de campos de minas, número de vítimas de explosões com minas, incidentes registrados em 2003, e número de pessoas vulneráveis, especialmente aquelas em trânsito, IDPs e refugiados retornados.60  Apesar desse planejamento e esforços de coordenação, todavia, a capacidade operacional para desminagem do governo Angolano permanece mínima, e os Angolanos comuns continuam a depender das agências internacionais de desminagem quando encontram minas terrestres.

Segundo o Manual sobre Repatriamento Voluntário, o ACNUR é responsável “do momento de planejamento do repatriamento, a obter informação confiável sobre as áreas seriamente afectadas pela presença de minas.”61 A Consulta Global sobre o Repatriamento Voluntário reconhece que as minas terrestres são uma das principais ameaças à segurança física nas operações de repatriamento e que “a desminagem e programas educacionais sobre o risco das minas são portanto essenciais.”62  Dada a magnitude do problema das minas terrestres em Angola, o ACNUR não pode prever toda área minada em potencial, mas a Human Rights Watch está preocupada que a capacidade limitada de fiscalização do ACNUR possa impedir que a agência obtenha informação suficiente sobre as áreas minadas e que possam compartilhar essa informação com os retornados antes que estes tomem sua decisão pelo local de destino. A Human Rights Watch também se preocupa com o fato do ACNUR não incluir regularmente uma agência de desminagem sob sua coordenação e reuniões com seus parceiros de trabalho, o que significa que as agências não estão plenamente integradas no processo de repatriamento. Ao mesmo tempo, o ACNUR tem tido bastante sucesso em garantir que os refugiados recebam treinamento sobre os riscos das minas terrestres.  Todos os refugiados entrevistados nos centros de recepção do ACNUR afirmaram à Human Rights Watch terem recebido treinamento sobre os riscos das minas antes de deixarem seu país de asilo e também ao chegarem nos centros de recepção. As agências de desminagem deveriam viajar também às comunidades de retorno para ampliar o treinamento sobre os riscos das minas terrestres.

A Necessidade de uma Fiscalização Internacional

Os perigos impostos pelas minas terrestres e os incidentes de violência contra retornados e apoiadores da UNITA ilustram a contínua necessidade de fiscalização internacional do processo de reintegração em Angola.  Historicamente, a OCHA tem actuado na fiscalização da protecção em Angola mas a OCHA actualmente está cessando as suas actividades e já reduziu drasticamente sua capacidade de fiscalização.63  A OCHA continua compartilhando informações com propósito de protecção em nível nacional e está desenvolvendo a capacidade do governo através da Unidade Técnica de Coordenação da Ajuda Humanitária, a UTCAH, que assumirá essa função.64

Além do envolvimento da OCHA nas actividades de fiscalização e protecção, o ACNUR é a única organização internacional com mandato legal sobre a fiscalização do retorno e reintegração dos refugiados.65 O Comité Executivo do ACNUR elaborou o mandato da organização para que supervisionasse as condições do repatriamento voluntário dos refugiados para seu país de origem.

O Alto Comissariado deve ser reconhecido como portador de uma preocupação legítima sobre as consequências do retorno... O Alto Comissariado deve poder insistir sobre suas preocupações legítimas sobre o resultado de qualquer retorno que esteja assessorando. Nos moldes de seu trabalho de consultas aos Estados em questão, deve receber acesso directo e ilimitado aos retornados de modo a garantir que os Estados estejam na posição de monitorar o cumprimento das amnistias, garantias e promessas sobre as quais os refugiados tenham decidido retornar. Isso deve ser considerado inerente ao seu mandato.66 (Ênfase do autor)

O Cazombo é um bom exemplo do impacto que o ACNUR pode ter ao actuar na política de fiscalização e protecção.  No relatório A Luta em Tempos de Paz, a Human Rights Watch documentou que oficiais de fronteira estavam molestando, abusando e extorquindo retornados espontâneos quando eles cruzavam a fronteira entre a Zâmbia e Angola.  Depois da publicação do relatório, o escritório do ACNUR no Cazombo vem desenvolvendo uma relação mais próxima com o comandante local das FAA, a coordenar frequentes reuniões e a oferecer treinamento em direitos humanos aos soldados e oficiais que patrulham as fronteiras. O ACNUR também intervém no ato quando recebe denúncia de abuso. O ACNUR agora relata que quando os oficiais de fronteira encontram retornados espontâneos atravessando as fronteiras da Zâmbia para Angola, contactam o pessoal do ACNUR e organizam o transporte dos retornados para o centro de recepção do Cazombo.67

Infelizmente, restrições financeiras forçaram o ACNUR a reduzir seu pessoal encarregado da protecção dos retornados. Um director de protecção do ACNUR em Luanda contou à Human Rights Watch que: 

Estou muito preocupado com nossa habilidade de fiscalizar os retornos uma vez que estamos encerrando o retorno organizado e passando à fase de reintegração. Se não tivermos financiamento e trouxemos de volta todas essas pessoas, como poderemos ajudá-los a ficar?68

Há somente um funcionário de protecção fiscalizando os retornos no Moxico e em Caundo Cubando—duas províncias enormes e frequentemente inacessíveis. O director regional do ACNUR no Cazombo lamentou não poder contar com um funcionário de protecção que possa entrevistar os retornados e fiscalizar o processo de retorno amiúde. O funcionário de campo da UNHCR lamentou a perda de um funcionário de protecção que estava capacitado para entrevistar os retornados e monitorar de perto seu progresso.69  O director regional do ACNUR em Luau ecoou o desapontamento de seu colega em não poder contar com funcionário de protecção tão dedicado: “A protecção é nossa função principal. Você não pode ser o ACNUR e não ter um funcionário de protecção.”70

Em alguns casos, o ACNUR tem se voltado aos seus parceiros (ONGs financiadas directamente pelo ACNUR) para a prestação de assistência na condução de actividades de protecção. No Uíge e no Moxico, por exemplo, o Centro Common Ground (CCG) facilita a negociação de conflitos e treinamentos em direitos humanos para as forças de segurança e liderança para mulheres. O CCG também treina as pessoas locais, chamadas de Promotores Sociais, em técnicas de resolução de conflito e encoraja que eles fiscalizem o retorno dos refugiados e compartilhem as informações caso ocorram problemas de segurança.71

A Human Rights Watch está confiante de que esses esforços de treinamento dos Angolanos para que resolvam eles mesmos os conflitos e tenham um diálogo aberto com as autoridades do governo são bem-vindos porque, no fim, a solução duradoura depende do acesso dos cidadãos aos meios de se protegerem eles mesmos. Ao mesmo tempo, os esforços das ONGs e cidadãos locais não substituem uma intervenção e fiscalização activa do ACNUR em casos de abuso que possam vir a ocorrer nessa fase delicada de transição.  

O ACNUR também é responsável pela fiscalização das condições às quais os refugiados retornam. Segundo o Manual do ACNUR para as actividades de Repatriamento e Reintegração (Handbook for Repatriation and Reintegration Activities), a agência deveria garantir que as necessidades básicas são atendidas durante um período inicial de reintegração e de ai em diante, inclusive avaliando a assistência médica, educação e outros serviços públicos.72 Em Angola, no entanto, os recursos do ACNUR parecem ser destinados quase exclusivamente à organização e implementação do processo de repatriamento, com poucos recursos destinados à protecção e fiscalização dos direitos humanos, independentemente da fiscalização das condições materiais para o retorno.



[1] Decreto do Conselho Ministerial No. 1/01, adoptado em 5 de Janeiro, 2001, e Decreto do Conselho Ministerial No. 79/02 (Regulamento para a Aplicação das Normas para o Reassentamento das Populações Deslocadas, ou Regulamento), adoptado em 6 de Dezembro de 2002.

[2] Os Guiding Principles on Internal Displacement (ou Guinding Principles) foram adoptados em Setembro de 1998 pela Assembleia Geral da ONU.  Ver, ONU Doc. E/CN.4/1998/53/Add.2 (1998). Embora não estabeleça obrigações directas, fornecem uma normativa internacional para a protecção dos IDPs. Os Guiding Principles são uma reafirmação contundente da legislação dos direitos humanos internacionais e das leis para refugiados relevantes aos IDPs.  Se baseiam nas normas atuais e fornecem direcção e explicação para quando ocorrem omissões. Têm ainda a intenção de fornecer uma direcção prática aos governos, outras autoridades competentes, à ONU e outras agências governamentais e ONGs em seus trabalhos com os IDPs. Os Guiding Principles estão disponíveis em: http://www.reliefweb.int/ocha_ol/pub/idp_gp/idp.html.

[3] Ver, por exemplo, o Acordo sobre o Estabelecimento de uma Comissão Tripartite para o Repatriamento Voluntário de Refugiados Angolanos entre os Governos da República de Angola, Zâmbia e o ACNUR, de 15 de Março de 2003. O Artigo 13 (sobre minas terrestres) do Acordo Tripartite demanda que o governo de Angola priorize nas suas actividades de desminagem, as rotas e áreas de destino dos retornados, e o Artigo 14 (sobre o acesso à terra e recuperação da propriedade) determina que o governo de Angola empregue seus maiores esforços para garantir que os retornados tenham acesso à terra de acordo com a lei Angolana, inclusive as Normas para o Reassentamento das Populações Deslocadas.

[4] Artigo V, Convention Governing the Specific Aspects of Refugee Problems in Africa (Convenção Africana sobre Refugiados, African Refugee Convention), 1001 UNTS 45, que entrou em vigor em 20 de Junho de 1974.

[5] Estatuto do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, Assembleia Geral, Resolução 428 (V) de 14 de Dezembro de 1950. Ver também, “Voluntary Repatriation” (Repatriamento Voluntário), Consulta Global sobre a Protecção Internacional, EC/GC/02/5, 25 de Abril, 2002.

[6] Ver, especificamente, Resoluções da Assembleia Geral 1672 (XVI) de 18 de Dezembro, 1961; 40/118 de 13 de Dezembro de 1985; e 44/137 de 15 de Dezembro de 1989.

[7] O Comité Executivo do Programa do Alto Comissariado (“ExCom)” é o corpo administrativo do ACNUR. Desde 1975, o ExCom tem aprovado uma série de Conclusões em suas reuniões anuais. As Conclusões têm como objectivo guiar os Estados em seu tratamento de refugiados e aqueles que buscam asilo e em suas interpretações da existente legislação internacional sobre refugiados. Embora as Conclusões não sejam obrigações directas, sim constituem parte do Direito Internacional e os Estados membros do ExCom estão obrigados ao seu cumprimento. Além disso, as Conclusões são adoptadas por consenso pelos Estados membros e amplamente representam a visão da comunidade internacional, implicando em autoridade persuasiva.

[8] As Conclusões mais relevantes do ExCom são as Conclusões 18 (XXXII) de 1980, Conclusão 40 (XXXVI ) de 1985 e Conclusão 101(LV) de 2004. As Conclusões 74 (XLV) de 1994 e 85(XLXIX) de 1998 também são relevantes.

[9] Acordo de Estabelecimento de Comissão Tripartite para o Repatriamento Voluntário de Refugiados Angolanos entre os Governos da República Angolana, o Governo da República da Zâmbia e o ACNUR, 28 de Novembro de 2003.  Ver também, o Acordo de Estabelecimento de Comissão Tripartite para o Repatriamento Voluntário de Refugiados Angolanos entre o Governo da República de Angola, o Governo da República Democrática do Congo e o ACNUR, 11 de Dezembro de 2002.

[10] O carácter voluntário do repatriamento é reafirmado pelo ExCom na Conclusão 18 (XXXII) de 1980, Conclusão 40 (XXXVI ) de 1985 e Conclusão 101(LV) de 2004. Esta última Conclusão reafirma o carácter voluntário do repatriamento de refugiados, que envolve a tomada de decisão individual, livre e informada, através da disposição de informação completa, correcta e objectiva sobre o país de origem.

[11] A Sessão 2.3 (sobre o carácter voluntário), o Manual do ACNUR, Voluntary Repatriation: International Protection (Genebra: Março 1996).  Embora o manual não implique os Estados a obrigações directas, fornece uma série de sugestões de actividades para o ACNUR e governos durante o processo de repatriamento baseadas nas leis internacionais de direitos humanos, no Direito Humanitário Internacional e nas leis internacionais sobre refugiados. 

[12] Entrevista da Human Rights Watch com Paulo Moisés, Diretor regional do ACNUR, Cazombo, 24 de Novembro, 2004.

[13] Entrevistas da Human Rights Watch com João N., Bernard C., Maria I., Manuel C. e Jose L., recém retornados da RDC no centro de recepção de Luau, 22 de Novembro, 2004, e entrevistas da Human Rights Watch com Julio V., Evelina N., Adelino U. e Ihemba K., refugiados recém retornados da Zâmbia no Centro de recepção do Cazombo, 24 de Novembro, 2004.

[14] Entrevista da Human Rights Watch com João N., centro de recepção do Luau, 22 de Novembro, 2004.  O Director regional do ACNUR em Luau contou à Human Rights Watch que o governo da RDC teria permitido que alguns campos com alguns poucos refugiados angolanos permanecessem abertos até que a etapa de repatriamento de 2005 começasse (aproximadamente até a primavera de 2005, depois do fim da estação chuvosa), uma indicação de que a RDC não está pressionando os refugiados Angolanos a retornarem ao seu país. Entrevista da Human Rights Watch com Acacio Julião, Director regional do ACNUR, Luau, 22 de Novembro, 2004.

[15] Os centros de recepção permanecem abertos durante todo o ano para acomodar retornados espontâneos, mas com capacidade reduzida durante a estação chuvosa quando o processo de repatriamento assistido está temporariamente suspenso. Entrevista da Human Rights Watch com representante de uma ONG actuante no Moxico, Luanda, 18 de Novembro, 2004.

[16] Entrevista da Human Rights Watch com Paulo Moises, Director regional do ACNUR, centro de recepção do Cazombo, 24 de Novembro, 2004.

[17] Para uma discussão detalhada sobre esses conceitos ver o Manual do ACNUR: Voluntary Repatriation: International Protection, sessão 2.4 e “Voluntary Repatriation ” (Repatriamento Voluntário), Consulta Global sobre a Protecção Internacional, EC/GC/02/5 25 de Abril 2002, sessão IV.

[18] Artigo 12 (identificação das populações), Decreto do Conselho Ministerial No. 79/02, 6 de Dezembro, 2002.

[19] Artigo 16,Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, aberto para assinaturas em 16 de Dezembro, 1966, entrou em vigor em 23 de Março de 1976.

[20] Ver, Artigo 7, Convenção dos Direitos das Crianças,  aberto à assinaturas em 20 de Novembro de 1989, entrou em vigor em 20 de Setembro de 1990: “(1) A criança será registrada imediatamente após seu nascimento e terá direito, desde o momento em que nasce, a um nome, a uma nacionalidade e, na medida do possível, a conhecer seus pais e a ser cuidada por eles. (2) Os Estados Partes zelarão pela aplicação desses direitos de acordo com a legislação nacional e com as obrigações que tenham assumido em virtude dos instrumentos internacionais pertinentes, sobretudo se, de outro modo, a criança tornar-se-ia apátrida.”

[21] ExCom, Conclusão 101(LV) de 2004, parágrafos k e l.

[22] Artigo 12 (sobre a identificação das populações), Decreto do Conselho Ministerial No. 79/02, 6 de Dezembro, 2002.

[23] Em 2004, o governo estimava que 4.5 milhões de crianças não tinham registro e o funcionamento de poucos postos de registro sofriam de baixa motivação devido aos baixos salários e as pobres condições de trabalho. Ver, Sessão IV(A) (Civil Rights and Freedoms: Name and Nationality), Committee on the Rights of the Child, Angola Initial Report (submetido sob o Artigo 44 da Convenção dos Direitos da Criança), 10 de Agosto, 2004.

[24] Sessão IV(A) (Civil Rights and Freedoms: Name and Nationality), Committee on the Rights of the Child, Angola Initial Report (submetido sob o Artigo 44 da Convenção dos Direitos da Criança), 10 de Agosto, 2004.

[25] Entrevista da Human Rights Watch com oficial da UNICEF, Luanda, 10 de Novembro, 2004.

[26] Entrevista da Human Rights Watch com Manuel Kaiombo, Oficial de Registro do Ministro da Justiça, Luau, 24 de Novembro, 2004.

[27] Entrevista da Human Rights Watch com autoridade internacional, Luanda, Novembro 2004. No Moxico, o ACNUR superou a relutância local para continuar a campanha de registro de nascimento apresentando às autoridades em Luau uma petição para continuar a campanha assinada por membros do Grupo de Protecção local; as autoridades locais então conseguiram através de negociações com o governo provincial explicando a necessidade de continuar a campanha até o fim de 2004.  Esse incidente ilustra o papel vital do ACNUR em actividades de protecção.   Entrevista da Human Rights Watch com Acacio Julião, Diretor Regional do ACNUR, Luau, 24 de Novembro, 2004. 

[28] Entrevista da Human Rights Watch com Jaka Jamba, Deputado da UNITA, Luanda, 2 de Dezembro, 2004.

[29] Entrevista da Human Rights Watch com Ismail M., Luau, 22 de Novembro, 2004. O soba da área de Capamba de Luau contou à Human Rights Watch que a polícia havia molestado e/ou detido muitos homens em sua comunidade por não possuírem documentos de identidade.  Entrevista da Human Rights Watch com Soba Raul Isak, Luau, 23 de Novembro, 2004.

[30] Entrevista da Human Rights Watch com Ponteiro Tunguna, Oficial responsável, IOM, Luau, 22 de Novembro, 2004.

[31] Conversa informal com policial, Luau, 24 de Novembro, 2004.

[32] Devido a chegada da estação chuvosa, a Human Rights Watch não pode viajar à Maquela do Zombo para verificar este incidente. A ONG citada verificou o incidente ao entrevistar a vítima quando ela foi liberada e admitida no hospital assim como ao entrevistar o pessoal médico que a tratava e o comandante da polícia local. Entrevista da Human Rights Watch com representante de ONG, Luanda, 16 de Novembro, 2004.

[33] Entrevista da Human Rights Watch com Heather Kulp, Director para Angola, Center for Common Ground, Luanda, 16 de Novembro, 2004, e Prasant Nalk, Gerente de Operações, Oxfam, Luanda, 15 de Novembro, 2004.

[34] Entrevista da Human Rights Watch com Thomas Vargas, Protection Officer do ACNUR, Luanda, 12 de Novembro, 2004.

[35] Entrevista da Human Rights Watch com Thomas Vargas, Protection Officer do ACNUR, Luau, 18 de Novembro, 2004.

[36] Entrevista da Human Rights Watch com Heather Kulp, Director para Angola, Center for Common Ground, Luanda, 16 de Novembro, 2004.

[37] Entrevista da Human Rights Watch com Thomas Vargas, Protection Officer do ACNUR, Luanda, 12 de Novembro, 2004.

[38] Entrevista da Human Rights Watch com C.K., Luau, 24 de Novembro, 2004.  Outro assistente medico treinado na RDC suspeita que a administração local o está impedindo assim como aos seus colegas de obter trabalhos porque eles temem a competição com retornados mais bem qualificados:  “Nós somos cidadãos—nós temos o direito ao trabalho. Eu fugi da guerra porque eu não estava envolvido em política e agora eu quero ajudar a reconstruir o meu país e não posso... A administração não aceita empregar retornados da RDC.”  Entrevista da Human Rights Watch com J.K., Luau, 24 de Novembro, 2004.

[39] ExCom Conclusão 101 (LV) de 2004, para. (o).

[40] Entrevista da Human Rights Watch com Pedro Z., Cazombo (Chipoya), 2 de Novembro, 2004.

[41] Entrevista da Human Rights Watch com Agostoo K., Cazombo (Chipoya), 2 de Novembro, 2004. Nhakatolo Chilombo, o Soba Supremo da Província do Moxico, disse que o Soba White estava bêbado e que ele foi removido de sua autoridade de distribuir as terras. Entrevista da Human Rights Watch, Cazombo, 25 de Novembro, 2004.

[42] Entrevista da Human Rights Watch com oficial internacional, Cazombo, 24 de Novembro, 2004.

[43] Entrevista da Human Rights Watch com Agostoo K., Cazombo (Chipoya), 2 de Novembro, 2004.

[44] Entrevista da Human Rights Watch com Philippe Lazzarini, Representante da OCHA/UCT, Luanda, 10 de Novembro, 2004.

[45] Entrevista da Human Rights Watch com Alda Juliana Paulo Sachiambo, Secretária Provincial da UNITA, cidade do Huambo, 29 de Novembro, 2004. 

[46] Entrevista da Human Rights Watch com Martinho Tchissingui, Director do LONGA, cidade do Huambo, 29 de Novembro, 2004.

[47] Em Setembro de 2004, uma multidão raivosa destruiu seis casas em Luvemba. Entrevistas da Human Rights Watch com Alda Juliana Paulo Sachiambo, Secretária Provincial da UNITA, cidade do Huambo, 29 de Novembro, 2004, e Manuela Gonzalez, Representante local da OCHA, cidade do Huambo, 26 de Novembro, 2004.  Um incidente semelhante ocorreu em Hengue em Julho de 2004. Entrevistas da Human Rights Watch com Martinho Tchissingui, Director do LONGA, cidade do Huambo, 29 de Novembro, 2004, e Manuela Gonzalez, Representante local da OCHA, cidade do Huambo, 26 de Novembro, 2004.

[48] Entrevistas da Human Rights Watch com Alda Juliana Paulo Sachiambo, Representante local da OCHA, cidade do Huambo, 26 de Novembro, 2004.  Dois ex-combatentes da  UNITA empregados pelo Ministério da Saúde em Chincala Cholohanga contaram à Human Rights Watch que seus supervisores haviam prometido a eles promoção se eles se filiassem ao MPLA. Entrevistas com Joaquim M. e Isac N., Chicala Cholohanga, 30 de Novembro, 2004.

[49] Na primavera de 2004, o líder do partido da UNITA, Isaias Samakuva, se reuniu com o Primeiro Ministro Fernando Da Piedade Dias dos Santos depois que a UNITA encaminhou denúncias oficiais de discriminação contra ex-soldados da UNITA e actos de violência e intimidação contra activistas do partido da UNITA. Durante a reunião, o Primeiro Ministro teria garantido ao líder da UNITA que tais incidentes eram actos espontâneos e localizados e não parte de uma agenda nacional do MPLA. OCHA, Humanitarian Situation in Angola, Quarterly Analysis (Abril-Junho 2004).

[50] IRIN News, “Angola: Appointment of New Justice Ombudsman Sparks Concern,” 26 de Janeiro, 2005, disponível em:

http://www.irinnews.org/report.asp?ReportID=45244&SelectRegion=Southern_Africa&SelectCountry=ANGOLA.

[51] “HALO Trust in Angola,” Journal of Landmine Action, volume no. 6.2 (Agosto 2002).

[52] Apresentação Angolana frente ao Comité sobre a Assistência às Vítimas e Reintegração Sócio-Econômica (Standing Committee on Victim Assistance and Socio-Economic Reintegration), Genebra, 10 de Fevereiro, 2004.

[53] Entrevista da Human Rights Watch com Feliza, Luau (Retornado), 23 de Novembro, 2004.

[54] Entrevista da Human Rights Watch com Greg Crowther, Diretor de Programa da MAG, Luanda, 17 de Novembro, 2004.

[55] Entrevistas da Human Rights Watch com retornados no Luau, 22-24 de Novembro; Acacio Julião, Diretor regional do ACNUR, Luau, 22 de Novembro, 2004; e Greg Crowther Director de Programa da MAG, Luanda, 17 de Novembro, 2004.  Fenómeno semelhante ocorreu em Lumbala N’Guimbo, localidade de outro centro de recepção no Moxico que é ainda mais isolado do que o Luau.

[56] Entrevista da Human Rights Watch com Philippe Lazzarini, Representante da OCHA/UCT, Luanda, 10 de Novembro, 2004. 

[57] Entrevista da Human Rights Watch com Thomas Vargas, Protection Officer do ACNUR, Luanda, 12 de Novembro, 2004

[58] O Artigo 4 (sobre segurança do local), Decreto do Conselho Ministerial No. 1/01, 5 de Janeiro, 2001.

[59] Comité Internacional para Banir as Minas Terrestres (International Committee to Ban Landmines), Landmine Monitor Report 2004: Toward a Mine-Free World (18 de Novembro, 2004), disponível em: http://www.icbl.org/lm/2004/, e Entrevista da Human Rights Watch com Greg Crowther, Diretor de Programa do MAG, Luanda, 17 de Novembro, 2004.

[60] Com base nesse critério, o CNIDAH tem priorizado as províncias de acordo com os cinco níveis de emergência, sendo o no. 1 o mais urgente: Bié (nível 1); Cuando Cubango, Benguela e Malanje (nível 2); Kwanza Sul, Huambo, Moxico e Huila (nível 3); Bengo, Kwanza Norte, Uige, Zaire, Lunda Norte, Cunene e Lunda Sul (nível 4); e Cabinda, Namibe e Luanda (nível 5).  Ver, International Committee to Ban Landmines, Landmine Monitor Report 2004: Toward a Mine-Free World (18 de Novembro, 2004), disponível em: http://www.icbl.org/lm/2004/.

[61] Secção 6.5 (Minas Terrestres), Manual do ACNUR, “Voluntary Repatriation: International Protection” (Genebra: Março 1996).

[62] Consulta Global sobre a Protecção Internacional (Global Consultations on International Protection), EC/GC/02/5, 25 de Abril, 2002

[63] Até recentemente, OCHA mantinha uma presença em quase todas as províncias dos país. Actualmente, a OCHA possui três representantes no campo, cada um responsável pela fiscalização de uma vasta região do país. Manuela Gonzalez, representante da OCHA para o Huambo, Bie, Benguela e Kwaza Sul, contou à Human Rights Watch que, “É impossível se ter uma ideia sobre os assuntos de protecção em quatro províncias.” Entrevista da Human Rights Watch, Huambo, 26 de Novembro, 2004.

[64] As agências da ONU e ONGs compartilham informações sobre direitos humanos e a protecção dos grupos de trabalho cerca de Luanda. Eles também possuem grupos de trabalho em nível local e provincial em muitas províncias inclusive o Huambo e Moxico.  O Escritório de Direitos Humanos da ONU em Angola está envolvido na capacitação de agentes do governo em nível nacional mas não possui mandato sobre fiscalização ou protecção dos direitos humanos. Entrevistas da Human Rights Watch com Vegard Bye, Director, Escritório de Direitos Humanos da ONU em Angola, Luanda, 12 de Novembro, 2004, e Philippe Lazzarini, Representante, OCHA/UCT, Luanda, 10 de Novembro, 2004.

[65] Ver, secção sobre o Programa de Repatriamento Voluntário para uma descrição do mandato do ACNUR.

[66] ACNUR, Conclusão do Comité Executivo No. 40 (Repatriamento Voluntário), 18 de Outubro, 1985, disponível em: http://www.unhcr.ch. Essa posição é reiterada no parágrafo q da Conclusão do Comité Executivo 101 (LV) de 2004.

[67] Entrevista da Human Rights Watch com Francis Olabode Olayiwola, Diretor regional do ACNUR, Cazombo, 24 de Novembro, 2004.

[68] Entrevista da Human Rights Watch com Thomas Vargas, Protection Officer ACNUR, Luanda, 12 de Novembro, 2004.

[69] Entrevista da Human Rights Watch com Francis Olabode Olayiwola, Diretor regional do ACNUR, Cazombo, 24 de Novembro, 2004.

[70] Entrevista da Human Rights Watch com Acacio Julião, Diretor regional do ACNUR, Luau, 22 de Novembro, 2004.

[71] Center for Common Ground in Angola, Proposal to UNHCR: Returnee Protection to Advance National Recovery and Reconstruction in Angola, Outubro 2004. 

[72] ACNUR, Handbook for Repatriation and Reintegration Activities (Genebra: Maio 2004), disponível em: http://www.unhcr.ch.


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