| (Luanda, 16 de Dezembro de 1999) - Os civis continuam a sofrer de fome aguda e de abuso massivo dos direitos humanos como resultado da reactivação da guerra em Angola, diz um relatório da organizção de direitos humanos ''Human Rights Watch''.
O relatório, intitulado "Angola Explicada: Ascensão e Queda do Processo de Paz de Lusaka", contém 300 paginas, actualizado na sua edição em portugues. O livro é o resultado de cinco anos de estudo do processo de paz angolano, desde os
acordos de Lusaka em Novembro de 1994. A sua publicação coincide com o
primeiro aniversário do retorno à guerra e o colapso daqueles acordos.
''As Nações Unidas cometeram o erro de desviar a sua atenção enquanto o abuso aos
direitos humanos crescia de modo assustador'', diz Peter Takirambudde, Director
Executivo para África na ''Human Rights Watch''. ''Este erro não deve ser cometido outra vez".
Durante o processo de paz de Lusaka havia maior liberdade de expressão. Mas,
Só em 1999 ocorreram mais de 30 incidentes de perseguição e detenção
de jornalistas locais e estrangeiros pelo governo, que quer, mais uma vez, impor uma
censura rígida. O julgamentos do jornalista independente Gustavo Costa iniciou esta semana ao passo que o do Rafael Marques foi suspenso ontem.. Marques foi encarcerado
por 40 dias antes de ser solto por caução e acusado formalmente um dia antes da sua libertação provisória.
Os civis, no interior de Angola, continuam a sofrer um abuso massivo e
enfrentam uma aguda fome que tem estado a causar muitas mortes.
A Human Right Watch apela ao governo angolano e aos rebeldes da Unita a
permitir corredores humanitários neutros para que a assistência chegue aos
civis, que se encontram no interior. Este grupo apela também no sentido de se reforçarem as
sanções internacionais contra a UNITA, e diz que o governo deveria
desmantelar o envolvimento dos seus funcionários no contrabando de diamantes
e combustível com a Unita. As exportações da UNITA em diamantes,
nos últimos cinco anos, renderam aos rebeldes cerca de $1,72 biliões, grande
parte dos quais foram gastos em armas.
O conflito em Angola desalojou mais de um milhão de pessoas, 10 por cento da
populacao do país. Os rebeldes da UNITA retomaram a guerra em 1998, tendo
cercado um bom número de localidades, notavelmente as cidades de Malanje e do Kuito. O
bombardeamento de Malanje começou em janeiro de 1999 e continuou até
setembro, tendo resultado na morte de pelo menos 1000 civis.
A guerra das minas anti-pessoal intensificou desde o recomeço das
hostilidades, com novas colocações de minas anti-pessoal pelo governo, formando
uma cintura de minas a volta das cidades sitiadas e estradas para obstruir o acesso da
UNITA. O governo angolano assinou o Tratado de Banimento de Minas de 1997,
mas já provou claramente que falhou no cumprimento das suas premisssas.
O relatório documenta como abusos e violações às leis de guerra foram
catalizados pelo novo fluxo de armas dentro do pais - apesar do embargo de
armas das Nações Unidas sobre a UNITA, que tem estado em vigor desde 1993. A
UNITA comprou, de fontes estrangeiras, grandes quantidades de armamento. A Human
Rights Watch acredita que algumas destas armas vieram de fontes privadas na
Albânia, Bulgária e Ucrânia. A UNITA foi efectiva em ''furar as
sanções'' atraves de países africanos, especialmente a África do Sul,
Congo-Brazzaville, Zâmbia, RD do Congo, Uganda e também Togo e Burquina
Faso.
Em Outubro de 1997, as Nações Unidas impuseram um pacote adicional de
restrições sobre a UNITA, bloqueando as viagens ao estrangeiro pelos seus
oficiais e encerrando as suas representações no exterior.
Surpreendentemente, apenas em Julho de 1998 as Nações Unidas passaram a ter,
como alvo directo e indirecto, as exportações de diamantes provenientes das
áreas da UNITA e congelaram as contas bancárias da UNITA, apesar dos diamantes serem
a primeira fonte de receita para as aquisições de armas e combustível da
UNITA.
A decisão, de outubro último, pela companhia multinacional de diamantes De
Beers, de suspender as suas aquisições de diamantes angolanos não lapidados é bem-vindo, no apoio ao embargo, mas há necessidade de haver passos semelhantes por outras companhias diamantiferas. O governo
angolano deveria também demonstrar que está a estreitar o controlo do
comércio, incluindo um estrito controlo sobre quem emite os certificados de
origem dos diamantes.
Enquanto a UNITA compra armas com diamantes, o governo angolano paga pelas
suas aquisições atraves de empréstimos dos bancos, lucros das exportações
do pretróleo, minas e outras concessões. Alguns dos $870 milhoes de dólares americanos, de fundos resultantes do pagamento de bónus pela assinatura da
exploração de três blocos de petróleo, foram usados para pagar aquisições de
armas. As multinacionais petrolíferas BP-Amoco, Exxon e ELF jogaram um
papel dominante nestes blocos.
Portugal e Brasil estão a aumentar a sua assistência militar ao governo
Angolano, apesar do pobre perfil de Luanda no tocante aos direitos humanos.
O relatório da Human Right Watch conclui que as Nações Unidas deveriam ter
enviado sem mais delongas, capacetes azuis e muni-los de poder para terem
uma acção pro-activa de monitoria, e dar a conhecer os casos de violações
do cessar-fogo e do embargo, bem como os flagrantes abusos dos direitos
humanos. As Nações Unidas deveriam também ter colocado um embargo inicial em
ambas as partes, e um embargo sobre o uso dos diamantes assim que se
tornasse evidente que os rebeldes estavam usando este recurso para se
rearmarem.
Em Outubro passado, o Conselho de Segurança autorizou a abertura duma missão
constituida de um escritório de 30 pessoas das Nações Unidas em Angola
(UNOA). O governo angolano deveria encorajar os especialistas dos direitos
humanos da UNOA a conduzir um sério trabalho de investigação em toda Angola. Os
especialistas dos direitos humanos deverão disseminar o que irão detectar
no terreno.
O relatorio conclui que, embora as Nações Unidas tenham cometido erros, os
líderes angolanos devem também ser responsabilizados e prestar contas por acções que
possam constituir crimes de guerra contra a humanidade.
Este texto está disponível na seguinte website da Human Rights Watch
website:
http://www.hrw.org/portuguese/reports/angopor/
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