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World Report 2014: Mexico

Events of 2013

Após assumir o cargo em dezembro de 2012, o Presidente Enrique Peña Nieto reconheceu que a “guerra contra as drogas” iniciada por seu predecessor Felipe Calderón havia levado a graves abusos por parte das forças de segurança. No início de 2013, o governo informou que mais de 26.000 pessoas haviam sido dadas como desaparecidas desde 2007—um problema que chamou de “crise humanitária”. Foi promulgada uma ampla legislação destinada a assegurar os direitos das vítimas.

No entanto, o governo avançou pouco na repressão aos homicídios generalizados, desaparecimentos forçados e torturas cometidos por soldados e policiais durante esforços para combater o crime organizado, inclusive no mandato de Peña Nieto. Os militares acusados de violações dos direitos humanos continuam sendo julgados dentro do tendencioso sistema de justiça militar, o que garante a impunidade. Alguns suspeitos de crimes podem ficar detidos por 80 dias sem nenhuma acusação no âmbito da cláusula de arraigo.

Desaparecimentos

As forças de segurança do México têm participado de desaparecimentos forçados generalizados desde que o ex-presidente Calderón (2006-2012) iniciou uma “guerra contra as drogas”. Membros de todos os ramos das forças de segurança continuam causando desaparecimentos durante o governo Peña Nieto; em alguns casos, colaboram diretamente com grupos criminosos. Em junho de 2013, a Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) do México informou que estava investigando 2.443 desaparecimentos nos quais havia encontrado provas de envolvimento de agentes do Estado.

De forma rotineira, promotores e policiais não realizam etapas básicas de investigação para procurar pessoas desaparecidas ou identificar os responsáveis pelos desaparecimentos. Muitas vezes, eles culpam as vítimas e dizem às famílias para investigar. As famílias dos desaparecidos podem perder o acesso a serviços sociais básicos que estão ligados ao emprego da vítima, como assistência infantil.

Em fevereiro de 2013, o governo Peña Nieto reconheceu que mais de 26.000 pessoas haviam sido dadas como desaparecidas desde dezembro de 2006. Em maio, foi criada uma unidade na Promotoria de Justiça Federal para investigar desaparecimentos forçados e outros. No momento da elaboração deste relatório, referida Promotoria ainda não tinha apresentado um progresso significativo nas investigações criminais ou buscas pelas vítimas. O México ainda não tem um banco de dados nacional para pessoas desaparecidas nem um banco de dados nacional dos milhares de restos mortais não identificados, muitos dos quais foram encontrados em valas comuns.

Abusos militares e impunidade

O México depende muito dos militares para combater a violência e o crime organizado relacionados às drogas. Isso resultou em violações generalizadas de direitos humanos. Entre dezembro de 2006 e meados de setembro de 2013, a CNDH recebeu 8.150 denúncias de abusos cometidos pelo Exército. Ela emitiu relatórios sobre 116 casos em que foi constatado que militares haviam cometido graves violações dos direitos humanos.

Os soldados que cometem esses abusos quase nunca são levados à justiça. O principal motivo é que tais casos continuam sendo investigados e julgados no sistema de justiça militar, no qual não há independência nem transparência. A Promotoria de Justiça Militar abriu mais de 5.600 investigações sobre supostos abusos cometidos por soldados contra civis entre janeiro de 2007 e meados de 2013. Contudo, até outubro de 2012, os juízes militares haviam condenado apenas 38 militares por violações dos direitos humanos.

No momento em que este relatório foi escrito, a Comissão de Justiça do Senado estava considerando uma proposta de reforma do código de justiça militar cujo objetivo seria garantir que abusos cometidos por militares contra civis fossem julgados no sistema de justiça civil.

Tortura

A tortura é uma prática generalizada no México para obter confissões e extrair informações. Ocorre com mais frequência no período entre a detenção arbitrária das vítimas e o seu encaminhamento aos promotores. Durante este período, elas costumam ficar incomunicáveis em bases militares ou outros locais de detenção ilegal. As táticas mais comuns incluem espancamentos, afogamentos simulados, choques elétricos e tortura sexual. Muitos juízes continuam aceitando confissões obtidas por meio de tortura, apesar da proibição constitucional de tais provas.

Os agentes de justiça raramente aplicam o Protocolo de Istambul, isto é, um conjunto de princípios para avaliar uma possível vítima de tortura ou maus-tratos. A Promotoria de Justiça Federal aplicou o protocolo em 302 casos entre 2003 e agosto de 2012; sinais de tortura foram encontrados em 128. No entanto, durante esse período, referida Promotoria abriu somente 39 investigações por tortura e nenhuma delas resultou em condenação. Entre janeiro e setembro de 2013, a Comissão Nacional de Direitos Humanos recebeu mais de 860 denúncias de tortura ou tratamento cruel ou desumano por parte de agentes federais.

Sistema de justiça criminal

Rotineiramente, o sistema de justiça criminal não proporciona justiça às vítimas de crimes violentos e violações dos direitos humanos. As causas dessa falha incluem corrupção, treinamento e recursos inadequados e a cumplicidade de promotores e defensores públicos. Em resposta às demandas de um movimento amplo, o México promulgou a Lei das Vítimas em janeiro de 2013. Sua finalidade é garantir justiça, proteção e reparações para vítimas de crimes. Na época de elaboração deste relatório, os regulamentos para sua implementação ainda não tinham sido aprovados. Em algumas partes do país, o fracasso da aplicação da lei tem contribuído para o surgimento de novos grupos de autodefesa formados por cidadãos armados.

Em 2008, o México aprovou uma reforma constitucional para transformar seu sistema de justiça inquisitorial escrito em um sistema litigioso oral. A implementação da reforma (que as autoridades têm até 2016 para concluir) tem sido lenta. No momento em que este relatório foi escrito, apenas três dos 32 estados mexicanos haviam implementado a reforma totalmente; 13 tinham migrado parcialmente para o novo sistema.

A reforma também introduziu a cláusula de arraigo, que permite que os promotores tenham autorização judicial para prender suspeitos de crime organizado por até 80 dias antes de acusá-los. Em abril de 2013, a Câmara dos Deputados aprovou reformas destinadas a reduzir o tempo máximo que esses indivíduos podem ficar presos sem acusação para 35 dias—mas a medida não foi erradicada. O Senado ainda não havia aprovado a reforma no momento em que este relatório foi escrito.

Em setembro de 2013, a Suprema Corte decidiu que os direitos garantidos por tratados internacionais de direitos humanos têm o mesmo peso que aqueles garantidos pela Constituição. Entretanto, nos casos em que a Constituição limita um direito expressamente, essa limitação prevaleceria sobre os tratados internacionais. Tal restrição vai contra o princípio pro homine, que exige que os Estados interpretem obrigações legais da maneira que ofereça a melhor proteção aos direitos humanos do indivíduo.

Condições das prisões

Além de superlotadas e sujas, as prisões não oferecem segurança básica para a maioria dos presos. Os presos que acusam guardas ou outros presos de ataques ou outros abusos não têm um sistema eficaz para solicitar reparação.

Aproximadamente 65% das prisões são controladas pelo crime organizado. Segundo a CNDH, a corrupção e a violência não param de crescer. Cerca de 108 presos haviam morrido até novembro de 2013.

Liberdade de expressão

Os jornalistas—principalmente aqueles que escrevem sobre crimes ou fazem críticas a agentes—sofrem perseguição e ataques. Pelo menos 85 jornalistas foram mortos entre 2000 e agosto de 2013; outros 20 desapareceram entre 2005 e abril de 2013, de acordo com a CNDH. Rotineiramente, as autoridades não investigam crimes contra jornalistas de forma adequada. Muitas vezes, sua profissão não é considerada um motivo.

Os jornalistas frequentemente optam pela autocensura em função de ataques realizados por agentes do governo e grupos criminosos. A falta de regulamentação da publicidade do Estado também pode limitar a liberdade de imprensa, pois permite que o governo tenha uma influência financeira desproporcional sobre os meios de comunicação.

O México criou uma procuradoria especial para Crimes contra a Liberdade de Expressão em 2006. Até o momento, porém, foi obtida apenas uma sentença criminal nas 378 investigações iniciadas. Com a legislação promulgada em maio de 2013, a Promotoria de Justiça Federal passou a ter poder para assumir qualquer investigação sobre ataques contra a imprensa. 

Violência baseada em gênero

As leis mexicanas não protegem mulheres e meninas de forma adequada contra a violência doméstica e a violência sexual. Algumas cláusulas contradizem as normas internacionais. Um exemplo são as cláusulas que relacionam a gravidade da punição para alguns crimes sexuais à “castidade” da vítima. As mulheres e meninas que sofrem esses tipos de violações dos direitos humanos geralmente não as informam às autoridades; aquelas que o fazem costumam enfrentar desconfiança, apatia e desrespeito. Em janeiro de 2013, o México alterou sua lei de violência contra a mulher para agilizar as medidas de proteção emergencial para vítimas de violência baseada em gênero.

Direitos reprodutivos

Em agosto de 2008, a Suprema Corte confirmou a constitucionalidade de uma lei da Cidade do México que legalizou o aborto nas primeiras 12 semanas de gestação. Desde então, 16 das 32 entidades federais do México criaram leis para reconhecer o direito à vida a partir do momento da concepção. Isso limita a capacidade da mulher de exercer seu direito à saúde. Em 2010, a Suprema Corte decidiu que todos os Estados devem oferecer contracepção de emergência e acesso ao aborto para vítimas de estupro. Contudo, na prática, muitas mulheres e meninas enfrentam graves barreiras no acesso ao aborto após a violência sexual, incluindo informações incorretas e intimidação por parte de agentes.

Casamento entre pessoas do mesmo sexo

Em agosto de 2010, a Suprema Corte reconheceu que casais do mesmo sexo na Cidade do México tem o direito de adotar crianças e se casar. Também determinou que os 31 Estados mexicanos devem reconhecer os casamentos entre pessoas do mesmo sexo realizados na Cidade do México. Todavia, a decisão não exige que os próprios Estados reconheçam esse direito; muitos ainda negam o direito de casar a casais do mesmo sexo. Em dezembro de 2012, a Suprema Corte do México derrubou uma lei de Oaxaca que definia o casamento como sendo entre um homem e uma mulher.

Acesso a cuidados paliativos

Dezenas de milhares de pacientes enfrentam obstáculos enormes e, muitas vezes, intransponíveis no acesso a cuidados ao fim da vida, apesar de a lei mexicana conceder-lhes direito a tais cuidados. Os programas de seguro de saúde ainda não abordam adequadamente as necessidades de saúde de pacientes incuráveis; os regulamentos ligados ao controle de drogas restringem desnecessariamente o acesso à morfina (um medicamento essencial para dores intensas); e o treinamento na área de cuidados paliativos para profissionais da saúde continua sendo insuficiente.

Migrantes

Centenas de milhares de migrantes não documentados passam pelo México a cada ano. Muitos sofrem graves abusos no caminho—como desaparecimentos e violência sexual—nas mãos do crime organizado, autoridades de migração e forças de segurança. As autoridades não adotaram medidas adequadas para proteger os migrantes nem para investigar e julgar as pessoas que cometem abusos. Em 2011, foi aprovada uma nova lei da migração ostensivamente destinada a proteger os direitos dos migrantes. No entanto, a polícia continua detendo e perseguindo migrantes não documentados.

Os funcionários de abrigos para migrantes lidam com ameaças e perseguição de grupos criminosos e agentes. O governo não conseguiu implementar as medidas de proteção concedidas a esses centros por organismos de direitos humanos nacionais e internacionais. Pelo menos três centros de migrantes foram forçados a fechar ou seus funcionários foram forçados a fugir em 2013.

Em setembro, a Promotoria de Justiça Federal autorizou a criação de uma equipe (incluindo peritos forenses internacionais) para identificar mais de 200 restos mortais que supostamente pertencem a migrantes.

Direitos trabalhistas

O domínio de sindicatos pelegos continua obstruindo atividades legítimas de organização do trabalho. Com frequência, os sindicatos independentes são impedidos de entrar em negociação com a gerência, enquanto os trabalhadores que tentam formar sindicatos independentes correm o risco de perder seus empregos. Uma lei trabalhista de 2012 não conseguiu resolver a falta de transparência e democracia nos poderosos sindicatos pelegos. Além disso, foi incapaz de proteger os direitos dos trabalhadores em relação a formar sindicatos independentes e realizar negociações coletivas.

Defensores de direitos humanos

Defensores e ativistas de direitos humanos continuam sofrendo perseguições e ataques, muitas vezes no contexto da oposição a “megaprojetos” de infraestrutura ou extração de recursos. Em muitos casos, existem provas—incluindo testemunhos ou rastreamento de telefones celulares—de que agentes do Estado estão envolvidos em agressões contra defensores dos direitos humanos. Das 89 agressões contra defensores dos direitos humanos registradas pelo Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos entre novembro de 2010 e dezembro de 2012, nenhuma resultou em condenação.

Em junho de 2012, o México promulgou uma lei para proteger defensores dos direitos humanos e jornalistas. No momento em que este relatório foi escrito, o mecanismo de proteção criado pela lei não havia sido implementado de forma eficaz. As medidas de proteção demoram a chegar, são insuficientes ou, em alguns casos, incompletas. O mecanismo é prejudicado pelo número reduzido de funcionários, que tem treinamento inadequado, atrasos no acesso às verbas, falhas na coordenação com instituições estaduais, falta de disseminação para as pessoas em risco e falta de apoio público por parte de agentes do governo de alto nível.

Principais agentes internacionais

Os Estados Unidos destinaram mais de US$2 bilhões em auxílio ao México por meio da Iniciativa Mérida (um pacote de ajuda acordado em 2007, sem limite anual). O objetivo é ajudar o México a combater o crime organizado. Uma parcela de quinze por cento da assistência somente pode ser usada depois que o Secretário de Estado dos EUA declarar que o governo mexicano está cumprindo os requisitos de direitos humanos.

Entretanto, o impacto desses requisitos é prejudicado pelo fato de que o Departamento de Estado dos EUA tem informado repetidamente ao Congresso dos EUA que eles estão sendo cumpridos, apesar das provas esmagadoras do contrário. Muitas vezes, menciona-se um progresso vago e incompleto em relação ao cumprimento dos requisitos, levando o Congresso a liberar as verbas.

O enviado especial da ONU sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias realizou uma missão de inquérito no México em abril-maio de 2013 e informou que as execuções extrajudiciais por parte das forças de segurança eram generalizadas e frequentemente ocorriam sem responsabilização.

Em outubro de 2013, o México foi submetido à sua segunda Revisão Periódica Universal no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. As principais recomendações incluíram colocar as violações de direitos humanos cometidas por militares sob jurisdição civil e reforçar o mecanismo de proteção para defensores dos direitos humanos e jornalistas.