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Argentina

Eventos de 2019

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, acena da varanda da Casa Rosada após sua posse, em Buenos Aires, Argentina, em 10 de dezembro de 2019.

 

© 2019 REUTERS/Ricardo Moraes

Problemas de direitos humanos que perduram na Argentina incluem abuso policial, más condições nas prisões e violência endêmica contra mulheres. Restrições ao aborto e dificuldade no acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva continuam a suscitar sérias preocupações, bem como a impunidade do atentado a bomba no centro judeu AMIA em Buenos Aires em 1994 e atrasos na nomeação de juízes permanentes.

A Argentina continua a realizar progressos significativos na proteção dos direitos de pessoas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros) e na responsabilização de autoridades por abusos cometidos durante a última ditadura militar do país (1976-1983), embora os julgamentos tenham sido adiados.

Em outubro, Alberto Fernández foi eleito presidente da Argentina. Ele assumiu o cargo em dezembro.

Confrontando abusos do passado

As leis de perdão e anistia que protegiam ex-funcionários envolvidos nos crimes da ditadura foram anuladas pelo Supremo Tribunal e juízes federais no início dos anos 2000. Até março de 2019, a Procuradoria Geral da Nação contava com 3.161 pessoas acusadas, 901 condenadas e 142 absolvidas. Dos 611 casos alegando crimes contra a humanidade, os juízes haviam proferido sentenças para 221 deles.

Até setembro de 2019, 130 pessoas retiradas ilegalmente de seus pais durante a ditadura, quando crianças, foram identificadas e muitas delas foram reunidas com suas famílias.

O grande número de vítimas, de suspeitos e de casos torna difícil para promotores e juízes levarem os responsáveis à justiça enquanto respeitam seu direito ao devido processo legal. A lei argentina permite que juízes encaminhem presos com 70 anos ou mais para prisão domiciliar. A Procuradoria Geral informou em março que 650 detidos em prisão preventiva e condenados se encontravam em prisão domiciliar.

Condições prisionais e abusos das forças de segurança

Um relatório de 2018 das Nações Unidas constatou que as prisões e cadeias estão tão lotadas que alguns detidos em prisão preventiva ficam em delegacias de polícia. Carcereiros levam presos “desobedientes” a células de isolamento sem seguir os procedimentos de sanção estabelecidos. As forças de segurança detiveram crianças e as submeteram a abusos.

O Serviço Penitenciário Nacional, encarregado de supervisionar prisões federais e proteger os direitos dos detidos, relatou 558 casos de tortura ou maus-tratos em prisões federais em 2018 e 232 casos de janeiro a junho de 2019.

Estatísticas oficiais revelam que mais da metade dos 14.400 detidos em prisões federais não foram condenados por um crime: eles aguardam julgamento.

As forças de segurança ocasionalmente empregam força excessiva. Em dezembro de 2018, o Ministério da Segurança aprovou uma resolução sobre o uso de armas de fogo por membros das forças de segurança federais que concede aos agentes federais amplo poder discricionário quanto ao uso de armas de fogo.

Liberdade de expressão

Em junho, um tribunal federal de Buenos Aires convocou Daniel Santoro, jornalista investigativo do jornal Clarín, para dar esclarecimentos quanto a sua suposta participação em um esquema de extorsão de pessoas, ameaçando-as com uma cobertura negativa de notícias. O tribunal solicitou e obteve "detalhes de todas as chamadas recebidas ou feitas" no telefone de Santoro entre janeiro de 2016 a abril de 2019, comprometendo seu direito de proteger fontes. Em setembro, um juiz ordenou a destruição do documento contendo os registros telefônicos de Santoro, alegando que ele violava sua privacidade, segundo Clarín. O caso permanecia não resolvido até a elaboração deste relatório.

Em abril de 2017, o governo argentino comprometeu-se a reformar seu código criminal para restringir a definição de “sedição” (ou rebelião contra autoridades públicas), mas ainda não tinha apresentado uma nova definição até a redação deste relatório.

Ao assumir o cargo, o ex-presidente Mauricio Macri adotou um conjunto "temporário" de decretos para "regular" a mídia e criar uma agência "temporária" para implementar novas regras. A agência está sob o Ministério da Modernização, comprometendo sua capacidade de agir independentemente dos interesses do governo. Em 2016, o governo disse estar redigindo uma lei de comunicações que afirmava respeitar a liberdade de expressão. Em novembro de 2019, no entanto, nenhuma lei abrangente sobre a mídia foi adotada pelo Congresso e a agência "temporária" havia adotado decisões regulamentando a mídia.

Uma lei de 2016 criou uma agência nacional para garantir o acesso público às informações do governo. A agência também é responsável pela proteção de dados pessoais. Até julho, 6.785 pedidos de informações haviam sido apresentados. As autoridades responderam à maioria dos pedidos dentro de um mês, mas até novembro, cidadãos haviam apresentado 524 recursos perante a agência, na maioria dos casos depois das autoridades não responderem devidamente aos pedidos originais.

Algumas províncias e municípios ainda carecem de leis de liberdade de informação, comprometendo a transparência nesses níveis de governo.

Independência do Poder Judiciário

Em março, o governo pediu ao Conselho da Magistratura que investigasse o Juiz Alejo Ramos Padilla, argumentando que ele havia realizado uma investigação de "forma política e jornalística" e "não havia cumprido com seus deveres de imparcialidade e sigilo". O juiz tinha testemunhado perante uma comissão do Congresso sobre uma investigação sobre denúncias de que agentes de inteligência teriam realizado operações ilegais. A maior parte das informações citadas pelo juiz já tinha sido divulgada on-line no site oficial do Poder Judiciário.

A nomeação tardia de juízes permanentes pelo Conselho da Magistratura culminou em nomeações temporárias de juízes que não dispõem de inamovibilidade no cargo, o que o Supremo Tribunal entendeu em 2015 prejudicar a independência judicial. Até outubro, 460 juízes permaneceram vagos.

Impunidade no atentado a bomba de AMIA

Vinte e quatro anos depois do atentado a bomba contra a Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA) em Buenos Aires, em 1994, que deixou 85 pessoas mortas e feriu mais de 300, supostamente promovido por suspeitos iranianos, ninguém foi condenado pelo crime. Em março de 2018, um tribunal de apelação manteve uma decisão que ordenava a prisão preventiva da ex-presidente Cristina Fernández de Kirchner por suposta participação em uma conspiração com autoridades iranianas para enfraquecer a investigação do atentado à bomba. A decisão não foi implementada porque ela tinha imunidade parlamentar como senadora, e é atualmente a vice-presidente da Argentina.

Alberto Nisman, promotor encarregado de investigar o atentado, foi encontrado morto em sua casa em janeiro de 2015, com um único disparo na cabeça e uma pistola que correspondia à arma usada contra ele ao seu lado. Em junho de 2018, um tribunal de apelação considerou a morte de Nisman como uma execução.

Em fevereiro, um tribunal absolveu o ex-presidente Carlos Menem por suposta interferência na investigação inicial do atentado, mas condenou um ex-chefe da inteligência e um juiz por interferência no caso. Um recurso da absolvição ainda não tinha sido julgado até setembro de 2019.

Direitos Indígenas

Os povos indígenas na Argentina geralmente enfrentam problemas no acesso à justiça, à terra, à educação, aos cuidados de saúde e a serviços básicos. A Argentina continua a falhar na implementação das leis existentes para proteger o direito dos povos indígenas ao consentimento livre, prévio e informado das decisões governamentais que possam afetar seus direitos – como previsto no direito internacional.

Em novembro de 2017, o Congresso aprovou uma lei que prorroga até 2021 o prazo para a conclusão de uma pesquisa, que está sendo conduzida lentamente, sobre terras indígenas.

Direitos de mulheres e meninas

O aborto é ilegal na Argentina, exceto em casos de estupro ou quando a vida ou saúde da mulher está em risco. Mas mesmo nesses casos, mulheres e meninas são por vezes submetidas a processos criminais por procurarem realizar aborto, e encontram dificuldade no acesso aos serviços de saúde sexual e reprodutiva, como contracepção e esterilização voluntária.

Em maio, uma coalizão de legisladores, ativistas e organizações mobilizados na "Campanha Nacional pelo Aborto Legal e Livre" apresentou ao Congresso um projeto de lei para descriminalizar completamente o aborto durante as primeiras 14 semanas de gravidez e, após esse período, permitir que mulheres e meninas terminem a gravidez quando resultante de estupro, quando a vida ou saúde da mulher ou menina está em risco, ou quando o feto sofre de condições severas não compatíveis com a vida fora do útero. O Congresso aprovou um projeto de lei semelhante em 2018, mas o Senado o rejeitou.

Apesar de uma lei de 2009 estabelecer medidas abrangentes para prevenir e punir a violência contra as mulheres, a impunidade nos casos de feminicídio continua a ser uma séria preocupação. Em 2018, o Registro Nacional de Feminicídios, administrado pela Suprema Corte, relatou 278 casos, mas apenas 7 condenações.

Orientação sexual e identidade de gênero

Em 2010, a Argentina se tornou o primeiro país latino-americano a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. A Lei do Casamento Civil permite que casais do mesmo sexo celebrem casamentos civis e lhes oferece as mesmas proteções conjugais legais que casais heterossexuais. Desde 2010, mais de 20.000 casais do mesmo sexo se casaram em todo o país.

Principais atores internacionais e política externa

Em abril, a Argentina, juntamente com o Brasil, a Colômbia e o Paraguai, assinou uma declaração proposta pelo Chile, solicitando às instâncias interamericanas do sistema de direitos humanos que levassem em consideração as “realidades políticas, econômicas e sociais” de cada país em suas decisões, algo que prejudicaria o trabalho dessas instâncias.

Em março, após uma visita ao país, o Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Afrodescendentes expressou preocupação com a “invisibilidade” e a “discriminação estrutural” contra os afro-argentinos. O grupo de trabalho informou ter recebido informações sobre casos de prisão e abuso arbitrários contra vendedores ambulantes de origem africana.

Durante o governo Macri, a Argentina foi um membro ativo do Grupo de Lima – uma coalizão de governos que monitora e denuncia o frágil histórico de direitos humanos da Venezuela – e pediu a libertação de seus presos políticos. Em junho, a Argentina proibiu a entrada no país de mais de 400 autoridades venezuelanas implicadas em violações de direitos humanos e corrupção. O número de venezuelanos que se mudaram legalmente para a Argentina tem aumentado constantemente desde 2014, atingindo mais de 170.000 em novembro.

Durante a campanha presidencial de 2019, Fernández adotou uma abordagem mais leniente em relação à Venezuela e sugeriu que a Argentina se retirasse do Grupo de Lima.