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IV.  MAUS TRATOS PELOS monitores

Há alguns [monitores] que param para pensar, que vêem que eles também têm filhos e que amanhã seus próprios filhos podem acabar aqui.  Estes monitores são legais, eles entendem nossa situação. Mas os outros só querem nos espancar.  Batem na cara. . .  às vezes vêm quatro ou cinco para me bater.  Isto acontece diariamente.
—Alfonso S., 15 anos, Cai-Baixada, 28 de Julho de 2003

Depois das crianças serem transferidas aos centros de detenção, elas geralmente sofrem com ações violentas perpetradas pelos monitores.  Ao contrário do que declarou o Dr. Sergio Novo, diretor geral do DEGASE – que, de modo geral, os monitores não são abusivos49 – a  Human Rights Watch ouviu relatos de casos repetidos de abuso, exacerbados pela falta de um sistema eficaz de prestação de contas.

Os monitores abusivos gozam geralmente de impunidade, tanto no Rio de Janeiro como em outras partes do Brasil.  Uma exceção surpreendente ocorreu em maio de 2004, quando o ex-diretor de um centro de detenção juvenil e sete outros funcionários de um centro de detenção do estado de São Paulo foram condenados a sete a dez anos de prisão por atos de tortura cometidos em 2001 contra cinco jovens.50  E no Rio de Janeiro, o DEGASE afastou o diretor e vários monitores do Padre Severino em outubro de 2004, como resposta a alegações de maus tratos dos internados, apesar dos mesmos não terem sido, até a data de preparação deste relatório, sujeitos a sanções penais.51

Estes exemplos ilustram que a impunidade não precisa ser a regra.  Os promotores públicos do Rio de Janeiro já demonstraram disposição para investiga r condições abusivas de detenção no Padre Severino e em outras partes.  Estes esforços louváveis devem ser reforçados por meio de uma investigação determinada e inquebrantável dos oficiais que cometeram os abusos, seguida de processo penal e punição, conforme apropriado.

A falta de pessoal adequado também contribui provavelmente para gerar abusos contra os jovens.  O centro Padre Severino tinha em média um monitor para cada trinta jovens, conforme informou um oficial de detenção à Human Rights Watch.52  No CAI-Baixada, dez membros do quadro de pessoal, inclusive o motorista e o porteiro, eram designados a cada turno para cobrir uma população de 187 jovens.  E nem todos os monitores estavam no centro de detenção todos os dias.  A cobertura era particularmente escassa quando vários jovens tinham suas audiências no mesmo dia.  “Temos que enviar um agente para cada um deles”, o diretor do CAI-Baixada nos disse.53

Finalmente, a falta de treinamento eficaz é provavelmente um fator que contribui às práticas abusivas.  Muitos monitores não têm nenhuma experiência prévia com jovens, além do curso de treinamento de uma semana de que participam antes de começar a trabalhar num centro de detenção, declarou-nos Peter da Costa, diretor do Centro João Luis Alves.54  Flávio Moreno, presidente do ASDEGASE, sindicato que representa alguns dos monitores dos centros de detenção juvenil do Rio de Janeiro, informou que o pessoal dos centros de detenção dispõe de poucas oportunidades de treinamento e as que existem são bastante superficiais.55  Na opinião de Sidney Telles da Silva, ex-diretor do DEGASE,  a falta de treinamento adequado produz “oficiais de centro de detenção que não são educadores, mas sim repressores.”56

Espancamentos pelos monitores

Ouvimos relatos de abuso físico por monitores em todos os centros de detenção que visitamos.  “Os monitores são muito violentos”, disse uma voluntária de uma organização não governamental que trabalha com jovens detidos.57 

Em particular, ouvimos de muitos jovens que estes tipos de maus tratos são comuns no centro Padre Severino.  “No centro Padre Severino, as coisas eram muito ruins”, disse Jorge N., jovem de 17 anos que havia passado ali um mês, em 2002.  “Os monitores batiam nos rapazes.  Eram muito grossos com a gente.  Não tinham o menor respeito.”58  Víctor M., 15 anos, contou que viu monitores do Padre Severino agredindo jovens com os p unhos e batendo neles com porretes.59 

Ouvimos histórias de espancamentos perpetrados por monitores em outros centros de detenção.  Por exemplo, Luis A., 16 anos, contou-nos que tanto ele como outros jovens foram espancados por monitores do CAI-Baixada.60  Fernando R., 17 anos, também relatou que os monitores batiam freqüentemente nele e em outros jovens do Santo Expedito.61

No Santos Dumont, centro de detenção de jovens do sexo feminino, ouvimos menos relatos de espancamentos.  Mayra J., 16 anos, disse-nos que não havia visto nenhum espancamento,62 enquanto que Patrícia K., 16 anos, disse que eram raros.63  Mas há também outras jovens cujos relatos são semelhantes aos que ouvimos nos centros de detenção de rapazes.  “Eles batem com os punhos”: assim Flávia L., 18 anos, descreveu as ações dos monitores.  “Isto já me aconteceu duas vezes.  Na primeira vez, foi porque não respondi a uma pergunta.  Na segunda, o monitor gritou comigo e eu respondi de volta.”64  E Valéria I., 15 anos, uma das poucas que relatou casos de violência por parte dos monitores do Santos Dumont, disse que foi espancada quando ali esteve detida, mas de uma forma que não deixou marcas aparentes no seu corpo.65

Os relatos dos próprios jovens não são a única indicação que tivemos de abusos.  Em alguns casos, jovens que entrevistamos nos mostraram cortes e contusões que realmente correspondiam às suas descrições de espancamentos.  E quando a Human Rights Watch entrevistou um grupo de pais de crianças detidas, relataram terem visto sinais visíveis de abuso enquanto visitavam seus filhos.  Por exemplo, um pai assim descreveu uma visita ao centro Santo Expedito em maio de 2003: 

Os monitores tinham entrado e batido em todo mundo, espancado mesmo.  Os garotos estavam contundidos, com braços e pernas quebrados, cobertos de sangue.  Eu vi isto.  Quinze rapazes me chamaram para dar uma olhada lá dentro e ver como estavam.  Eu os vi dentro do banheiro.  Levantaram suas camisas e me mostraram seus ferimentos.66

Além da violência física, o abuso verbal pelos monitores parece ser comum, tendo em vista o número de queixas que ouvimos dos jovens.  Luis A., de 16 anos, alegou que os monitores chamavam ele e outros jovens de “bandidos” e “vagabundos”.67  Miguel L., 21 anos, descreveu situações em que os monitores chamaram-no de “bandido,” “vagabundo,” “marginal” e “demônio”.68 Victor M., 15 anos, disse que os agentes gritavam repetidamente a ele e outros jovens: “Diabos, abaixem suas cabeças”.69

Finalmente, muitos dos jovens que entrevistamos disseram que temiam ser espancados depois porque estavam falando conosco.  Depois que Gilberto P., um rapaz de 19 anos em Santo Expedito, descreveu ter sido espancado pelos monitores, disse a Human Rights Watch que seria provavelmente espancado de novo naquele dia por ter conversado conosco.70  Ouvimos comentários semelhantes de outros jovens naquele centro de detenção.  (Depois de visitarmos o centro Santo Expedito, avisamos à Defensoria Pública do Estado que um grande número de jovens naquele centro de detenção haviam expressado medo de sofrer mais abusos como represália por terem conversado conosco.)

Pelas normas internacionais, os oficiais do centro de detenção só podem usar a força de forma restritiva para evitar que um jovem se imole, cause ferimentos a outros ou provoque a destruição de propriedade.  O uso da força deve se limitar a casos excepcionais, quando todos os outros métodos já tenham sido usados sem resultado; de qualquer forma, este uso da força nunca deve ser humilhante ou degradante.71  Os oficiais de centro de detenção devem sempre informar aos familiares sobre ferimentos que possam resultar de tal uso da força.  Em casos onde o uso da força resultar em ferimentos graves ou morte, um familiar ou guardião deve ser avisado imediatamente.72

Práticas disciplinares abusivas

Uso excessivo do encarceramento

Além de espancamentos e abusos verbais freqüentes, muitos jovens relataram terem sido sujeitos a períodos excessivamente longos de encarceramento.73  Em um exemplo extremo, quando a defensoria pública realizou uma inspeção de surpresa do Padre Severino em julho de 2003, os promotores encontraram 13 jovens confinados a uma cela apertada e sem janelas.  Ao descrever a cela como “desumana”, os oficiais da defensoria nos informaram que os monitores haviam espancado os jovens várias vezes e que muitos terminaram com problemas respiratórios e dermatológicos causados pela exigüidade do espaço em que foram confinados.74  Contestando tais declarações, o diretor do DEGASE, Sérgio Novo, informou à Human Rights Watch que as alegações dos promotores eram “fantasiosas”.  E acrescentou: “Tudo que encontraram foram 13 a 16 crianças numa sala que diferia de outras salas porque a porta estava trancada.”75

Ouvimos casos de confinamentos prolongados na cela também no Santo Expedito e Santos Dumont.  Os jovens daquele centro nos informaram que, por infrações graves, eles poderiam ser isolados durante uma a duas semanas em uma das duas alas não utilizadas do centro de detenção.  “Tenho um amigo que estava na Galeria E.  Ele ficou lá há duas semanas”, disse Luciano G.  “Um monitor colocou-o na E.  Passou uma semana ali porque o monitor acusou-o de ter posse de droga.”76  De igual modo, algumas jovens do Santos Dumont nos contaram que eram colocadas numa cela de punição durante uma semana se fossem pegas com maconha.77  Quando perguntamos a Luciano se houve uma audiência ou se tiveram o direito de apelar a dita decisão, ele nos disse que nunca soube que os jovens poderiam tomar tais providências.78

Em outros lugares, os jovens relataram ter sido encarcerados por períodos mais curtos.  Nestes casos, o tempo que se passa trancafiado é aparentemente decidido de forma totalmente arbitrária.  Quando perguntamos aos jovens do João Luis Alves o que acontecia quando eles se envolviam em brigas, por exemplo, disseram-nos que não havia um período de tempo padrão para o confinamento na cela.  “Você é trancafiado, é confinado.  É para você pensar na merda que fez”,  disse Eric T., de 15 anos, em João Luis Alves.  “Você continua lá se não obedecer aos monitores.  Alguns ficam um dia.  Outros ficam lá quatro dias.”79

Outras punições

Os jovens relataram o uso de outras medidas disciplinares que podem violar as normas internac ionais de justiça juvenil.  Uma prática deste tipo foi a de forçar os jovens a permanecer durante longos períodos de tempo em posições desconfortáveis.  “Tínhamos que ficar assim, com nossas mãos para cima”, disse Alfonso S., colocando as mãos na cabeça para mostrar.  “Permanecemos assim onze horas.”  Ele relatou que esta punição foi imposta no CAI-Baixada depois de uma rebelião dos jovens em junho de 2003.80  Dário P., jovem de 18 anos do Cai-Baixada, informou-nos que punições semelhantes eram impostas rotineiramente em casos de infrações menores.  “Às vezes você tem que sentar numa cadeira durante muito tempo ou ficar de pé contra a parede, com a cabeça contra a parede e o corpo dobrado”, disse ele.  “Geralmente, é um castigo.  Já passei por isto várias vezes.  Se você provocar qualquer problema no centro, vai ter que passar por isto, entre outras razões.”  Quando perguntamos a Dário se havia outras razões para impor tais castigos, ele respondeu: “Se você levar comida do refeitório.  Se eles virem que você estava conversando durante a refeição.”81  A suspensão das visitas dos pais era uma outra forma comum de punição, disseram-nos os jovens.82

Normas legais das práticas disciplinares

Sob as normas internacionais, as práticas disciplinares devem manter a segurança, mas de uma forma que respeite a dignidade inerente do internado e o objetivo reabilitador da detenção.83  Em particular, estas normas proíbem o uso do confinamento fechado, colocação em cela escura, “ou qualquer outra punição que possa comprometer a saúde mental e física do jovem em questão.”84

De modo mais geral, as práticas disciplinares devem levar em consideração o fato de que o contato com os colegas, familiares e a comunidade em geral contrabalança os efeitos deletérios da detenção sobre a saúde mental e emocional da criança e promove sua eventual reintegração na sociedade.85  Ao refletir sobre esta realidade, as normas internacionais recomendam a colocação de crianças no ambiente menos restritivo possível, dando-se prioridade a instalações “abertas” ao invés de “fechadas”.86  Toda instalação, seja aberta ou fechada, deve dar a consideração devida à necessidade das crianças de contar com “estímulos sensoriais, oportunidades de associação com colegas e participação em esportes, exercícios físicos e atividades de lazer”.87  Neste sentido, as Regras da ONU recomendam que os centros de detenção permitam aos jovens uma “comunicação adequada com o mundo externo”88; a prática diária de exercícios físicos, de preferência ao ar livre;89 e integrem sua educação, oportunidades de trabalho e atendimento médico o máximo possível à comunidade local.90  De forma coerente com esta abordagem, a “negação de contato com membros da família deve ser proibida, em qualquer circunstância”.91

Além disso, as sanções disciplinares devem ser impostas em cumprimento estrito das normas estabelecidas, o que deve incluir identificar condutas que constituem delitos, delinear o tipo e duração das sanções e permitir apelações.92  Os jovens devem ter a oportunidade de serem ouvidos em sua própria defesa antes da imposição de sanções disciplinares e nas apelações.93

Quando estas normas não são seguidas, particularmente quando os jovens são confinados em espaços exíguos por longos períodos de tempo, as práticas disciplinares poderão ser equivalentes ao tratamento cruel, desumano ou degradante, em violação à Convenção sobre os Direitos da Criança, ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e à Convenção contra a Tortura.94

Impunidade

Quando um rapaz agride um monitor, eles o levam para a delegacia.  Por que não fazem o mesmo com os monitores que espancam nossos filhos?
—Pai de um jovem internado, Rio de Janeiro, 1 de agosto de 2003

A Human Rights Watch constatou que a maioria dos centros de detenção não investigava as queixas de abusos; na verdade, a maioria dos centros não dispunha de nenhum mecanismo significativo de apresentação de queixas.  Os abusos persistem em parte devido à falta de procedimentos eficazes e seguros para a apresentação de queixas, à omissão das autoridades em investigar prontamente as denúncias de abusos, e ao fato de que os que cometem tais abusos não são responsabilizados de forma condizente. 

Exacerbando a falta de um sistema de queixas, o DEGASE não mantém um registro centralizado do desempenho do pessoal e de ações disciplinares a que foi sujeito.  “No momento, o DEGASE não sabe se o oficial A, B ou C tem ou não registro de ocorrências, histórico de agressões ou outros incidentes”, disse à Human Rights Watch a Dra. Simone Moreira de Souza, defensora pública, em novembro de 2004.  Estes registros, disse ela, “não existem”.95

Com medo da retaliação, as crianças raramente apresentam queixas; as poucas que o fazem, normalmente desistem delas logo depois, disse a Dra. Souza à Human Rights Watch.  Ela relatou também que assistentes sociais e advogados de defesa enfrentam uma decisão difícil: denunciarem os abusos físicos ou permanecerem quietos para manter protegidas as crianças e acelerar sua liberação.96 

Um artigo do Jornal do Brasil examinou o fracasso de um processo de 2002 em que os promotores acusaram os monitores de perpetrarem abusos contra jovens em detenção.97  Nesse caso, a promotoria apresentou queixa por motivo de tortura contra dez monitores do Centro de Triagem e Reabilitação, um centro de detenção temporário localizado próximo à sede do DEGASE.  Os promotores acusaram os monitores de “colocarem os meninos em celas ‘solitárias’ repletas de fezes e água de esgoto no chão”, e “ameaçá-los de terem de comer fezes”, além de “estimularem brigas entre eles fazendo apostas em dinheiro, dando-lhes tapas e socos, muitas vezes sem motivo aparente”.98

O relatório de inspeção dos promotores detalhou as evidências que encontraram para corrobora r os relatos desses abusos, inclusive “pedaços de madeira com as extremidades cobertas de pano, cabos de vassoura e munições para arma de fogo. Também foi constatada a superlotação do local e a imundície dos banheiros, ‘celas’ e alojamentos.  Durante a inspeção, foram constatadas diversas lesões aparentes nos internos que, em depoimento, acusaram os agentes pela prática de tortura.”99 

Apesar dos monitores terem sido removidos inicialmente do trabalho, no final foram todos absolvidos.100 Erika da Rocha Figueiredo, a promotora pública da 8ª Promotoria de Investigação Penal que apresentou a queixa inicial, explicou: “Há um corporativismo muito grande entre os agentes educativos. É muito difícil saber quem praticou a tortura. Ninguém quer depor e a desculpa é de que os menores escorregaram. Se não há provas, não se pode fazer nada.”101

Em outras situações em que as investigações são levadas a cabo, a lentidão do processo pode impedir a resolução dos casos.  A Dra. Souza fez referência a um caso de 2004 em que cinco monitores enfrentaram sanções penais por abusos que supostamente haviam cometido.  Os cinco foram absolvidos por falta de provas, disse ela.  “Isto que dizer que nenhum dos jovens foi encontrado.  O processo levou tanto tempo que quando chegaram ao estágio de coleta da evidência, os jovens já haviam sido liberados e era então muito mais difícil encontrá-los.”102

A punição previsível dos monitores abusivos varia desde uma advertência à suspensão, demissão ou prisão.103  Mas um defensor público informou à Human Rights Watch que quando se descobre que agentes abusaram fisicamente os jovens, eles são “demitidos” apenas por transferência dos a outros centros.  “Ser demitido significa ser transferido de um centro a outro”, ele nos contou.  “Em um caso em que um jovem havia sido espancado por um monitor”, descreveu, “o jovem foi enviado para o Padre Severino para sua própria proteção, enquanto que o monitor foi “demitido”, do que resultou sua transferência ao mesmo centro de detenção alguns meses depois”.104

Nenhum monitor foi processado criminalmente por conduta abusiva.  “Não há histórico de condenação de tortura [por monitores] no Rio de Janeiro,” disse Simone Moreira de Souza, oficial da defensoria pública.  “Hoje não há nenhum agente preso por tortura. Prisões preventivas são decretadas mas posteriormente revogadas por meio de Habeas Corpus.”105  Quando conversamos em novembro de 2004, ela confirmou que nunca um monitor tinha sido condenado por abusos praticados contra jovens em detenção.  “ Nunca ouvi falar de uma condenação real” de um caso deste tipo, disse ela.106

Normas internacionais recomendam o estabelecimento de mecanismos eficazes de apresentação de queixas em todo centro de detenção.  No mínimo, além de dar a oportunidade de apresentar queixas ao diretor e seu representante autorizado, todo centro de detenção deve garantir os seguintes aspectos básicos de um processo eficaz de queixa:

  • O direito de apresentar uma petição ou queixa, sem censura de conteúdo, à administração central, à autoridade judicial ou a outras autoridades apropriadas.107

  • O direito de ser informado sem demora sobre a resposta a uma petição ou queixa.108

  • O direito a receber assistência freqüente de familiares, advogados, grupos humanitários ou outros indivíduos, para apresentar a queixa.  No caso de crianças analfabetas, elas devem poder receber a assistência de que necessitam para apresentar a queixa.109

    Além disso, as normas internacionais recomendam o estabelecimento de um serviço independente, como o de um “ombudsman”, para receber e investigar queixas feitas por crianças privadas de sua liberdade.110

    Mas como ilustra o caso de 2002, a mera existência de mecanismos de defesa não é suficiente.  As autoridades estaduais têm também que conduzir investigações completas e independentes das queixas.  Os que praticam a violência devem ser disciplinados de forma adequada, inclusive com a possibilidade de demissão e apresentação de queixa formal, quando for o caso.  Mais particularmente, os casos de morte, lesões corporais graves ou alegações de represálias devem ser encaminhadas às autoridades judiciais para fins de investigação e, se for adequado, ação judicial e punição.




    [49] Entrevista da Human Rights Watch com o Dr. Sérgio Novo, 31 de julho de 2003.

    [50] Ver “Diretor da Febem punido por prática de tortura pelo Poder Judicial,” Boletim Estatuto Aqui, 15-31 de maio de 2004, http://www.ilanud.org.br/boletim9.htm (consultado em 23 de junho de 2004).

    [51] Entrevista da Human Rights Watch pelo telefone com a Dra. Simone Moreira de Souza, defensora pública, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2004.

    [52] Entrevista da Human Rights Watch com o oficial do centro de detenção Instituto Padre Severino, 29 de julho de 2003.

    [53] Entrevistas da Human Rights Watch com o quadro de pessoal, CAI-Baixada, 28 de julho de 2003; diretor do CAI-Baixada, 28 de julho de 2003.

    [54] Entrevista da Human Rights Watch com Peter da Costa, diretor da Escola João Luis Alves, 29 de julho de 2003.

    [55] Entrevista da Human Rights Watch pelo telefone com Flávio Moreno, presidente do ASDEGASE, 6 de novembro de 2003.

    [56] Entrevista da Human Rights Watch com Sidney Telles da Silva, diretor executivo, Rede Criança, Rio de Janeiro, 1 de agosto de 2003.

    [57] Entrevista da Human Rights Watch com voluntária, Rio de Janeiro, 28 de julho de 2003.

    [58] Entrevista da Human Rights Watch com Jorge N., Escola João Luis Alves, 29 de julho de 2003.

    [59] Entrevista da Human Rights Watch com Víctor M., Instituto Padre Severino, 29 de julho de 2003.

    [60] Entrevista da Human Rights Watch com Luis A., CAI-Baixada, 28 de julho de 2003.

    [61] Entrevista da Human Rights Watch com Fernando R., Educandário Santo Expedito, 30 de julho de 2003.

    [62] Entrevista da Human Rights Watch com Mayra J., Educandário Santos Dumont, 29 de julho de 2003.

    [63] Entrevista da Human Rights Watch com Patrícia K., Educandário Santos Dumont, 29 de julho de 2003.

    [64] Entrevista da Human Rights Watch com Flávia L., Educandário Santos Dumont, 29 de julho de 2003.

    [65] Entrevista da Human Rights Watch com Valéria I., Educandário Santos Dumont, 29 de julho de 2003.

    [66] Entrevista da Human Rights Watch com o pai de um jovem internado, Rio de Janeiro, 1 de agosto de 2003.

    [67] Entrevista da Human Rights Watch com Luis A., CAI-Baixada, 28 de julho de 2003.

    [68] Entrevista da Human Rights Watch com Miguel L., Instituto Padre Severino, 29 de julho de 2003.

    [69] Entrevista da Human Rights Watch com Victor M., Instituto Padre Severino, 29 de julho de 2003.

    [70] Entrevista da Human Rights Watch com Gilberto P., Educandário Santo Expedito, 30 de julho de 2003.

    [71] Ver as Regras da ONU para a Proteção de Jovens Privados da Liberdade, G.A. Res. 45/133 (1990), art. 64.

    [72] A Regra 56 das Nações Unidas para a Proteção de Jovens dispõe: “A família ou guardião de um jovem ou qualquer outra pessoa designada pelo jovem tem o direito de serem informados do estado de saúde do jovem, quando solicitado, bem como sobre quaisquer mudanças importantes no estado de saúde do jovem.  O diretor do centro de detenção deve avisar imediatamente à família ou guardião do jovem em questão, ou a outra pessoa designada, em caso de morte ou ferimento grave.”  Ibid., art. 56.

    [73] As normas internacionais que regem tais práticas são discutidas na seção “Normas Legais para as Práticas Disciplinares” abaixo.

    [74] Entrevista da Human Rights Watch com a Dra. Regiane Cristina Dias Pinto e a Dra. Ferreira Gonçalves, promotoras públicas, 4º. Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça da Infância e Juventude, Rio de Janeiro, 31 de julho de 2003.

    [75] Entrevista da Human Rights Watch com o Dr. Sérgio Novo, 31 de julho de 2003.

    [76] Entrevista da Human Rights Watch com Luciano G., Educandário Santo Expedito, 30 de julho de 2003.

    [77] Entrevistas da Human Rights Watch com Alícia Q. e Flávia L., Educandário Santos Dumont, 29 de julho de 2003.

    [78] Entrevista da Human Rights Watch com Luciano G., Educandário Santo Expedito, 30 de julho de 2003.

    [79] Entrevista da Human Rights Watch com Eric T., Escola João Luis Alves, 29 de julho de 2003.

    [80] Entrevista da Human Rights Watch com Alfonso S., CAI-Baixada, 28 de julho de 2003.

    [81] Entrevista da Human Rights Watch com Dário P., CAI-Baixada, 28 de julho de 2003.

    [82] Entrevista da Human Rights Watch com Daniel C., CAI-Baixada, 28 de julho de 2003.

    [83] Regras da ONU para a Proteção de Jovens, art. 66.

    [84] Ibid., art. 67.

    [85] Ibid., arts. 1-3.

    [86] Ver Regras Padronizadas Mínimas da ONU para a Administração da Justiça Juvenil (as “Regras de Beijing”), G.A. Res. 40/33 (1985), comentário ao art. 19.

    [87] Regras da ONU para a Proteção de Jovens, art. 32.

    [88] Ibid., art. 59.

    [89] Ibid., art. 47.

    [90] Ibid., arts. 38, 45 e 49.

    [91] Ibid., art. 66.

    [92] Ibid., art. 68.

    [93] Ver ibid., art. 70.  Ver também a Convenção sobre os Direitos da Criança, art. 12(2).

    [94] Ver Convenção sobre os Direitos da Criança, art. 37(a); Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, aberto para assinatura em 16 de dezembro de 1966, 999 U.N.T.S. 171 (entrada em vigor em 23 de março de 1976, e aceito pelo Brasil em 24 de abril de 1992), art. 7; Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Punições Cruéis, Desumanos ou Degradantes, adotada em 10 de dezembro de 1984, 1465 U.N.T.S. 85 (entrada em vigor em 26 de junho de 1987, e ratificada pelo Brasil em 28 de outubro de 1989), art. 16.

    [95] Entrevista da Human Rights Watch pelo telefone com a Dra. Souza, 8 de novembro de 2004.

    [96] Entrevista da Human Rights Watch com a Dra. Souza, Rio de Janeiro, 28 de julho de 2003.

    [97] Marco Antônio Martins, “Territorio livre da tortura: Jovens mentem sobre idade e preferem presídios e internatos do Estado,” Jornal do Brasil (Rio de Janeiro), 21 de setembro de 2003, http://jbonline.terra.com.br/jb /papel/cidade/2003/09/20/jorcid20030920001.html (consultado em 16 de outubro de 2003).

    [98]   InformECA, maio/junho 2003, pág. 3.

    [99] Ibid.

    [100] “De acordo com autoridades e especialistas ouvidos pelo Jornal do Brasil, o não afastamento de servidores acusados de maus-tratos a menores leva as vítimas a optarem pelo silêncio.  Resultado de casos como o de dez agentes denunciados pelo Ministério Público estadual, no ano passado, pela prática de tortura no Centro de Triagem e Reabilitação (CTR), na Ilha do Governador.  Martins, “Territorio livre da Tortura.”

    [101]  Ibid.

    [102] Ibid.

    [103] Entrevista da Human Rights Watch com o Dr. Tadeau, defensor, Segunda Vara da Infância e da Juventude da Comarca da Capital, Rio de Janeiro, 31 de julho de 2003.

    [104] Entrevista da Human Rights Watch com defensor público, Rio de Janeiro, 6 de agosto de 2003.

    [105] Entrevista da Human Rights Watch pelo telefone com a Dra. Souza, 18 de fevereiro de 2004.

    [106] Entrevista da Human Rights Watch pelo telefone com a Dra. Souza, 8 de novembro de 2004.

    [107] Regras da ONU para a Proteção de Jovens, art. 76.

    [108] Ibid.

    [109] Ibid., art. 78.

    [110] Ibid., art. 77.


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