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México

Acontecimentos de 2012

Na tentativa de combater poderosos grupos do crime organizado, as forças de segurança mexicanas têm cometido violações generalizadas dos direitos humanos, incluindo assassinatos, desaparecimentos e tortura. Quase nenhum desses abusos é investigado de modo adequado, propagando um clima de violência e impunidade em muitas partes do país.

Em uma decisão histórica tomada em agosto de 2012, o Supremo Tribunal decidiu que o uso de jurisdição militar para julgar violaçõesdedireitos humanos é inconstitucional. Entretanto, a maioria dos abusos cometidos por militares continua sendo julgada em tribunais militares, onde faltam independência e imparcialidade.

Grupos criminosos e membros das forças de segurança continuam ameaçando ou atacando defensores dos direitos humanos e jornalistas. O governo não está oferecendo proteção adequada a esses grupos vulneráveis, nem investigando os crimes cometidos contra eles. Em abril, o México aprovou uma lei para criar um mecanismo de proteção para defensores dos direitos humanos e jornalistas, mas os protocolos de avaliação de risco e atribuição de proteção ainda estão sendo desenvolvidos.

Abusos militares e impunidade

O México constantemente recorre ao exército para combater a violência relacionada às drogas e ao crime organizado. Ao envolver-se em atividades que visam o  cumprimento da lei, as forças armadas têm cometido graves violações dos direitos humanos. De janeiro de 2007 a meados de novembro de 2012, a Comissão Nacional de Direitos Humanos do México publicou relatórios detalhados sobre 109 casos em que constatou que membros do exército haviam cometido violações graves dos direitos humanos. Além disso, recebeu denúncias de 7.350 abusos por militares.

Um dos principais motivos pelos quais os abusos por militares persistem é que os soldados que os cometem quase nunca são responsabilizados. Isso acontece principalmente porque esses casos continuam sendo investigados e julgados na justiça militar. A promotoria militar inicioucerca de 5.000 investigações de violações de direitos humanos por soldados contra civis de janeiro de 2007 a abril de 2012. Durante esse período, os juízes militares condenaram somente 38 militares por violações dos direitos humanos.

Em agosto de 2012, o Supremo Tribunal decidiu que o assassinato de uma pessoa desarmada por soldados em um ponto de controle militar deve ser julgado em foro civil e que o artigo do Código de Justiça Militar usado para reivindicar a jurisdição de casos de direitos humanos é inconstitucional. No entanto, os esforços visando à reforma do Código de Justiça Militar no Congresso mexicano encontramforte resistência. O exército afirmou que continuará reivindicando a jurisdição de casos de supostos abusos até que seu código de justiça seja reformado.

Tortura

A tortura para obter confissões forçadas e extrair informações sobre o crime organizado ainda é uma prática generalizada no México. Ela é aplicada com mais frequência no período entre a detenção arbitrária das vítimas e o momento em que estas são entregues aos promotores públicos – um período em que, muitas vezes, são mantidas incomunicáveis em bases militares ou outros locais de detenção ilegais. As táticas comuns incluem espancamentos, asfixia, afogamento, choques elétricos, tortura sexual e ameaças de morte.

Um fator potencializador é que alguns juízes continuam aceitando as confissões obtidas por meio de tortura e maus-tratos, embora a constituição proíba a admissão de tais declarações. Outro fator é a falta de investigação e julgamento da maioria dos casos de tortura. Apenas dois agentes federais foram condenados por tortura desde 1994. No entanto, a Comissão Nacional de Direitos Humanos recebeu mais de 100 denúncias de tortura e mais de 4.700 denúncias de maus-tratos entre 2007 e 2011.

O México se comprometeu a aplicar o Protocolo de Istambul – um conjunto de diretrizes reconhecido internacionalmente, cujo objetivo é avaliar as condições de uma possível vítima de tortura ou maus-tratos. Contudo, os oficiais de justiça raramente o seguem e muitos médicos-legistas omitemas evidências de abusosem seus relatórios.

Sistema de justiça criminal

Rotineiramente, o sistema de justiça criminal deixa de fornecer justiça às vítimas de crimes violentos e de violações dos direitos humanos. As várias causas dessa falha incluem corrupção, treinamento e recursos inadequados e a conivência de promotores e defensores públicos.

Em junho de 2008, o México aprovou uma reforma constitucional que cria a base para um sistema de justiça criminal acusatório com julgamentos orais e prevê medidas que são críticas para promover maior respeito pelos direitos fundamentais. No entanto, a implementação da reforma – que as autoridades têm até 2016 para concluir – está sendo lenta e a maioria das mudanças ainda não foi colocada em prática. Muitos estados continuam usando o sistema tradicional do México e toleram suas práticas mais insidiosas. Enquanto isso, os poucos estados onde o novo sistema foi introduzido aprovaram contrarreformas significativas ou inseriram exceções que limitam as principais mudanças introduzidas pelo sistema oral.

Além de seus aspectos positivos, a reforma também introduziu a disposição de arraigo, que permite que promotores públicos com autorização judicial detenham indivíduos suspeitos de participarem do crime organizado por até 80 dias antes de serem acusados de um crime. A detenção sem acusação por até 80 dias viola as obrigações do México relacionadas à liberdade, à segurança e ao devido processo legal de acordo com o direito internacional. Muitas pessoas ficam detidas por mais do que o limite de 80 dias e, em alguns casos, são submetidas à tortura em centros de detenção de arraigo.

Condições das prisões

As prisões são superlotadas, anti-higiênicas e não fornecem segurança básica à maioria dos detentos. Os presos que acusam guardas ou detentos de ataques ou outros abusos não têm um sistema efetivo para obter reparação.

Segundo a Comissão Nacional de Direitos Humanos, aproximadamente 60% das prisões estão sob o controle do crime organizadoe acorrupção e a violência são generalizadas. Os grupos criminosos usam seu controle para extorquir as famílias de presos, ameaçando torturar os detentos se não receberem dinheiro. Em fevereiro de 2012, guardas da prisão de Apodaca, no estado de Nuevo León, permitiram que presos de um grupo criminoso executassem 44 presos que pertenciam a um grupo rival. A seguir, permitiram que muitos dos responsáveis escapassem.

Liberdade de expressão

Jornalistas – especialmente aqueles que fizeram relatos sobre o tráfico de drogas ou criticaramas forças de segurança e as autoridades – têm enfrentando assédios e ataques graves. De 2000 a julho de 2012, 82 jornalistas foram assassinados e outros 16 desapareceram. Cada vez mais, participantes de mídias sociais e escritórios de agências de notícias têm sido alvos de violência. Embora muitos ataques à imprensa ocorridos em 2012 tenham sido atribuídos ao crime organizado, evidências sugerem o envolvimento de oficiais do estado em alguns casos.

Com frequência, as autoridades deixam de investigar e julgar crimes contra membros da imprensa de modo adequado ou de proteger jornalistas que enfrentam um risco grave, contribuindo para um clima de impunidade e autocensura. O México criou uma promotoria especial para crimes contra a liberdade de expressão em 2006 e lhe deu maior autoridade em 2010, mas ela não tem conseguido julgar os casos efetivamente. Mais de 630 ataques contra a imprensa foram registrados de 2006 a meados de 2012; no entanto, a promotoria especial obteve apenas uma condenação criminal.

Em junho de 2012, o México aprovou uma emenda constitucional que transforma os ataques contra a imprensa em crime federal, dando aos promotores federais o poder de assumir essas investigações de promotores locais, que são mais suscetíveis à corrupção e a ameaças. A implementação da legislação de reforma está pendente.

Violência degênero

As leis mexicanas não protegem adequadamente as mulheres e meninas de violência doméstica e violência sexual. Algumas disposições (incluindo aquelas que associam a severidade das punições para alguns crimes sexuais à "castidade" da vítima) contradizem as normas internacionais. As mulheres que sofreram esses tipos de violações dos direitos humanos geralmente não informam as autoridades; as que o fazem costumam ser recebidas com desconfiança, apatia e desrespeito.

Direitos reprodutivos

Em agosto de 2008, o Supremo Tribunal afirmou a constitucionalidade de uma lei da Cidade do México que legalizou o aborto nas primeiras 12 semanas de gravidez. Desde então, 16 dos 32 estados mexicanos adotaram reformas que reconhecem o direito à vida a partir do momento da concepção, limitando a capacidade da mulher de exercer seu direito à saúde. Em 2010, o Supremo Tribunal decidiu que todos os estados devem fornecer contracepção emergencial e acesso ao aborto para vítimas de estupro. Contudo, na prática, muitas mulheres e meninas enfrentam sérias dificuldades no acesso ao aborto após a violência sexual, incluindo informações imprecisas, atrasos indevidos e intimidação por parte de servidores públicos.

Casamento entre pessoas do mesmo sexo

Em agosto de 2010, o Supremo Tribunal reconheceu que casais formados por pessoas do mesmo sexo têm o direito de adotar crianças e de se casar na Cidade do México. O Supremo Tribunal também decidiu que todos os estados mexicanos devem reconhecer os casamentos entre pessoas do mesmo sexo realizados na Cidade do México. No entanto, essa decisão não exige que os próprios estados reconheçam essedireito e muitos ainda negam o direito de casar a casais formados por pessoas do mesmo sexo.

Acesso a tratamento paliativo

Desde 2009, a lei mexicana prevê o direito a tratamento paliativo em casa para pacientes com doenças terminais, sendo um dos poucos países no mundo a fazer isso. Entretanto, a regulamentação de implementação não foi aprovada. Consequentemente, dezenas de milhares de pacientes continuam enfrentando obstáculos grandes e, muitas vezes, intransponíveis ao acesso a cuidados no fim da vida. O resultado é um sofrimento desnecessário.

Migrantes

Centenas de milhares de migrantes sem documentos passam pelo México todos os anos e muitos são submetidos a abusos graves no caminho (como desaparecimentos e agressões físicas e sexuais) nas mãos do crime organizado, autoridades de migração e forças de segurança. Segundo a Comissão Nacional de Direitos Humanos, aproximadamente 22.000 migrantes são sequestrados a cada ano – muitas vezes, com o objetivo de extorquir pagamentos de seus parentes. As autoridades não adotaram medidas adequadas para proteger os migrantes ou para investigar e julgar aqueles que cometem os abusos. Os funcionários da migração raramente informam os migrantes sobre seus direitos, como o direito de procurar asilo. As autoridades e grupos criminosos ameaçam e assediam os funcionários de abrigos de migrantes por lhes ajudarem.

Direitos trabalhistas

Acordos feitos entre a administração e sindicatos pró-administração continuam obstruindo as atividades legítimas de organizaçõessindicais. Muitas vezes, esses acordos restringem a capacidade detrabalhadores de obteremuma representação efetiva, impedindo-os de realizarembarganhas coletivas e de conquistarembenefícios além dos mínimos exigidos pela lei mexicana. Os trabalhadores que tentam formar sindicatos independentes podem perder seus empregos, uma vez que as brechas nas leis trabalhistase a aplicação inadequada geralmente não os protegem de demissões por retaliação. Em novembro de 2012, o Congresso aprovou uma ampla reforma das trabalhistasque impõe condições prévias onerosas para greves. Além disso, facilita a situação dos empregadores, que podem substituir funcionários regulares por trabalhadores em contratos de curto prazo disponibilizados por terceiros, prejudicando ainda mais os direitos trabalhistas fundamentais e as proteções para os trabalhadores.

Defensores dos direitos humanos

Defensores dos direitos humanos continuam sofrendo assédios e ataques, às vezes diretamente nas mãos de funcionários do estado. Enquanto isso, as autoridades consistentemente deixam de fornecer proteção adequada ou de investigar crimes contra defensores como Margarita Martinez, que fugiu do estado de Chiapas em junho de 2012 depois de repetidas ameaças de morte e ataques associados ao seu trabalho para denunciar abusos cometidos por policiais.

Em abril de 2012, o Congresso mexicano aprovou uma lei para proteger defensores dos direitos humanos e jornalistas. Ela exige que protocolos formais avaliem o risco enfrentado por indivíduos desses grupos e que proteção seja oferecida, se necessário. Até o momento, a implementação desses processos – comaparticipação da sociedade civil – continua pendente.

Principais agentes internacionais

Os Estados Unidos destinaram mais de US$2 bilhões em auxílio ao México por meio da Iniciativa Mérida – um pacote de auxílio de muitos anos acordado em 2007 para ajudar o México a combater o crime organizado. Quinze por cento de partes selecionadas da assistência podem ser distribuídas somente depois que a Secretária de Estado dos EUA informar o Congresso americano de que o governo mexicano está cumprindo quatro requisitos de direitos humanos, incluindo assegurar que abusos militares sejam investigados no sistema de justiça civil e proibir o uso de depoimentos obtidospor meio detortura.

Entretanto, o impacto desses requisitos tem sido prejudicado pelo fato de que o Departamento de Estado dos EUA vem informando o Congresso de que eles estão sendo cumpridos, o que leva o Congresso a liberar os fundos, apesar de fortes evidênciasaocontrário. Por exemplo, o relatório de direitos humanos sobre o Méxicodo Departamento de Estado em 2012 constatou que "a impunidade generalizada em casos de abusos dos direitos humanos cometidos por oficiais ainda é um problema em jurisdições civis e militares", o que viola um dos requisitos.

Em novembro de 2011, um advogado mexicano apresentou uma petição pedindo que a Procuradoria (OPT) do Tribunal Penal Internacional abrisse uma investigação sobre a suposta responsabilidade do Presidente Felipe Calderón e de outros oficiais por crimes de guerra e crimes contra a humanidade. A petição foi assinada por mais de 23.000 mexicanos. Um comunicado à imprensa divulgado pela presidência em resposta chamou as acusações da petição de caluniosas e disse que estava estudando as opções legais contra seus autores. Até o momento, a procuradoria ainda está revisando essa petição.

Desde 2009, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) emitiu decisões em quatro casos exigindo que o sistema de justiça militar não sejausado para investigar e julgar os abusos dos direitos humanos cometidos pelo exército. Essesparecereslevaram o Supremo Tribunal a tomar uma decisão em julho de 2011 reconhecendo que a jurisprudência da Corte Interamericana era vinculativa e afirmando que os juízes mexicanos deveriam considerar suas decisões em seus julgamentos.

O Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Desaparecimentos Forçados ou Involuntários (WGEID) realizou uma missão investigativa no México em 2011econcluiuque "esforços suficientes não estão sendo feitos para determinar o destino ou o paradeiro de pessoas que desapareceram, para punir os responsáveis e para garantir o direito à verdade e à reparação".

O México compareceu perante o Comitê da ONU Contra a Tortura (CAT) em outubro de 2012. Durante a audiência, especialistas do comitê expressaram preocupação com relação ao uso contínuo de tortura para obter confissões e à prática ilegal da detenção de arraigo, entre outros padrões abusivos.