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Crianças que trabalham nas lavouras de tabaco dos Estados Unidos estão expostas à nicotina, pesticidas tóxicos e outros riscos, segundo um relatório divulgado hoje pela Human Rights Watch.

Big tobacco profits from child labor in US tobacco fields. Take action now:  https://www.hrw.org/ChildFreeTobacco %23ChildFreeTobacco

A legislação dos Estados Unidos proíbe a venda de produtos de tabaco para crianças, mas permite o trabalho infantil nas lavouras de tabaco dos Estados Unidos. As maiores empresas de tabaco do mundo compram o tabaco cultivado em fazendas norte-americanas, mas nenhuma delas possui políticas de trabalho infantil que ofereçam proteção suficiente às crianças contra esse trabalho perigoso.

O relatório de 138 páginas intitulado “Tobacco’s Hidden Children: Hazardous Child Labor in US Tobacco Farming (As Crianças Escondidas da Indústria do Tabaco: Os Perigos do Trabalho Infantil no Cultivo do Tabaco dos EUA),” documenta as condições de trabalho de crianças nas lavouras de tabaco em quatro Estados, nos quais 90% do tabaco americano é cultivado: Carolina do Norte, Kentucky, Tennessee e Virgínia. As crianças relataram a ocorrência de vômito, náusea, dores de cabeça e tontura durante o trabalho nas lavouras, sintomas condizentes com a intoxicação grave por nicotina. Muitas também afirmaram trabalhar longos períodos sem receber pagamento de hora extra, frequentemente em condições de calor extremo, sem sombra ou intervalos suficientes, e sem o uso de equipamentos de proteção - ou fazendo uso de equipamentos inadequados.

“Quando o calendário escolar termina, as crianças seguem para as plantações de tabaco, onde não conseguem evitar a exposição nociva à nicotina, mesmo sem fumarem um único cigarro” denunciou Margaret Wurth, pesquisadora da Divisão dos Direitos das Crianças da Human Rights Watch e coautora do relatório. “Não é surpresa que as crianças expostas aos venenos das plantações de tabaco estejam adoecendo.”

O relatório baseia-se em entrevistas com 141 trabalhadores infantis da lavoura de tabaco com idade entre sete e 17 anos. (veja o infográfico).

As crianças que trabalham nessas lavouras também correm outros sérios riscos, de acordo com a Human Rights Watch. Elas podem estar usando ferramentas e equipamentos perigosos, levantando cargas pesadas e subindo diversos andares, sem proteção, para estocar o tabaco nos celeiros. As crianças também relataram que os tratores pulverizam pesticidas em campos vizinhos. Elas comentaram que o spray passava por cima delas, provocando vômitos, tontura e dificuldade de respirar, e ainda uma sensação de ardor nos olhos.

Muitos dos pesticidas utilizados na produção do tabaco são neurotoxinas conhecidas, venenos que alteram o sistema nervoso. Os efeitos em longo prazo da exposição a pesticidas na infância podem incluir câncer, problemas de aprendizagem e cognição, e problemas com a saúde reprodutiva. As crianças são especialmente vulneráveis porque seus corpos e cérebros ainda estão em desenvolvimento. A Human Rights Watch enviou cartas a 10 empresas de tabaco americanas e internacionais, e se reuniu com muitas delas para encorajá-las a adotarem políticas ou fortalecerem as políticas existentes, a fim de evitar o trabalho infantil perigoso em suas cadeias de suprimento.

“As empresas de tabaco não deveriam se beneficiar com o trabalho de crianças expostas ao perigo,” protestou Wurth. “Elas têm a responsabilidade de adotar políticas claras e abrangentes que retirem as crianças do trabalho perigoso nas lavouras de tabaco, e de assegurar que os fazendeiros respeitem as regras.”

Perigos à Saúde das Crianças
Centenas de milhares de crianças são empregadas na agricultura dos EUA todos os anos, mas não há dados disponíveis sobre o número de crianças que trabalham nas lavouras de tabaco. Muitas crianças entrevistadas pela Human Rights Watch contaram que iam trabalhar nas lavouras de tabaco com 11 ou 12 anos de idade, principalmente durante o verão, para ajudar suas famílias.  A maior parte delas era filhos de imigrantes hispânicos que viviam nas comunidades onde o tabaco era cultivado e que frequentavam a escola em período integral.

As crianças entrevistadas pela Human Rights Watch descreveram se sentir  muito mal repentinamente quando trabalhavam nas lavouras de tabaco. “Acontece quando você está trabalhando no sol,” afirmou uma garota de 16 anos do Kentucky. “Você sente vontade de vomitar. E bebe água porque está com muita sede, mas a água faz você se sentir pior. Você vomita ali mesmo enquanto corta as plantas de tabaco, mas continua cortando.” Um menino de 12 anos da Carolina do Norte descreveu uma dor de cabeça que sentiu enquanto trabalhava: “Foi terrível. Eu sentia como se alguma coisa estivesse tentando devorar minha cabeça.”

A intoxicação grave por nicotina – frequentemente chamada de Doença do Tabaco Verde – ocorre quando os trabalhadores absorvem nicotina através da pele enquanto manuseiam as plantas do tabaco, principalmente quando elas estão molhadas. Os sintomas comuns incluem náusea, vômito, dores de cabeça e tontura. Embora os efeitos a longo prazo sejam incertos, algumas pesquisas sugerem que a exposição à nicotina durante a adolescência pode ter consequências para o desenvolvimento do cérebro.

Diversas crianças contaram à Human Rights Watch que já se machucaram ao trabalhar com ferramentas pontiagudas e equipamentos pesados.  No Kentucky, Tennessee e na Virgínia, as crianças muitas vezes colhem com as mãos altas plantas de tabaco, cortando-as em partes pequenas e separando os caules em galhos longos com pontas afiadas As crianças disseram que era comum se cortarem ou furarem as mãos, braços, pernas e pés. Um garoto de 16 anos descreveu um acidente que sofreu enquanto colhia tabaco no Tennessee: “Eu me cortei com o machado... Provavelmente acertei uma veia ou algo assim porque não parava de sangrar e tive que ir ao hospital.... Meu pé estava todo coberto de sangue.” Um rapaz de 17 anos entrevistado pela Human Rights Watch perdeu dois dedos em um acidente com um cortador de relva usado em pequenas plantas de tabaco. Praticamente nenhum dos trabalhadores infantis que a Human Rights Watch entrevistou afirmou ter recebido de seus empregadores algum treinamento de segurança e de saúde ou equipamentos de proteção. Em vez disso, as crianças normalmente cobriam o corpo com sacolas plásticas de lixo pretas para tentar manter suas roupas secas quando trabalhavam nos campos molhados da chuva ou do orvalho.

Dados federais sobre lesões ocupacionais fatais indicam que a agricultura é a indústria mais perigosa aberta a trabalhadores jovens. Em 2012, dois terços dos trabalhadores menores de 18 anos mortos em decorrência de lesões ocupacionais eram trabalhadores rurais, e há registros de mais de 1.800 lesões não fatais em menores de 18 anos que trabalham nas fazendas dos EUA. A maioria das crianças entrevistadas pela Human Rights Watch declarou não ter acesso a banheiros ou a um local para lavar as mãos em seus locais de trabalho, permanecendo com as mãos contaminadas com resíduos de tabaco ou pesticidas, mesmo durante as refeições.

Ausência de Proteção na Legislação dos EUA 
Segundo a legislaçãotrabalhista dos EUA, crianças que trabalham na agricultura podem trabalhar longas horas, mesmo sendo menores de idade e em condições mais perigosas do que as crianças que trabalham em qualquer outra indústria. Mediante a permissão dos pais, crianças a partir dos 12 anos de idade podem ser contratadas para trabalhar por um número ilimitado de horas, fora do  período escolar, em fazendas de qualquer tamanho, e não há idade mínima exigida para o trabalho infantil em pequenas fazendas. Aos 16 anos, essas crianças lavradoras podem realizar trabalhos considerados perigosos pelo Ministério do Trabalho dos Estados Unidos. Em qualquer outro setor, as crianças precisam ser maiores de 18 anos para executar trabalhos perigosos. Segundo os regulamentos propostos pelo Ministério do Trabalho em 2011, seria proibido empregar menores de 16 anos nas lavouras de tabaco, mas tais regulamentos foram revogados em 2012.

“Os Estados Unidos têm falhado com as famílias norte-americanas por não oferecerem aos lavradores infantis uma proteção significativa contra os riscos à sua segurança e saúde, inclusive nas lavouras de tabaco,” declarou Wurth. “O governo de Obama deveria endossar regulamentos que esclareçam que o trabalho nas fazendas de tabaco é perigoso para crianças, e o Congresso deveria aprovar leis que ofereçam às crianças lavradoras as mesmas proteções garantidas a todos os outros trabalhadores infantis.”

O Papel das Empresas de Tabaco
A Human Rights Watch apresentou seus levantamentos e recomendações a 10 empresas que compram o tabaco cultivado nos Estados Unidos, incluindo oito empresas produtoras de cigarros: Altria Group (controladora da Philip Morris USA), British American Tobacco, China National Tobacco, Imperial Tobacco Group, Japan Tobacco Group, Lorillard, Philip Morris International, Reynolds American, e dois comerciantes internacionais da folha do tabaco, que fazem a compra e revendem para os produtores: a Alliance One e a Universal Corporation .

Todas as empresas com exceção da China National Tobacco responderam e afirmaram que estão preocupadas com o trabalho infantil em suas cadeias de fornecimento. Entretanto, as propostas dessas empresas não oferecem a tais crianças proteção suficiente contra os riscos do trabalho, alertou a Human Rights Watch. Em alguns casos, os padrões de proteção que essas empresas exigem para as crianças em sua cadeia de fornecimento nos EUA são inferiores se comparados aos das crianças que trabalham em lavouras de tabaco em todos os outros países dos quais compram o produto.

Dentre as empresas contatadas, a Philip Morris International é a que possui a política global de trabalho infantil mais abrangente. Desde 2010, a Philip Morris International busca implementar a política por meio de treinamento e monitoramento em sua cadeia de fornecimento global. Em 2009, a Human Rights Watch documentou abusos nas fazendas fornecedoras de tabaco para uma subsidiária da Philip Morris International no Cazaquistão.

A Human Rights Watch fez um apelo às empresas para que proíbam as crianças de se envolverem em qualquer tarefa que possa colocar sua saúde e segurança em risco, incluindo qualquer trabalho envolvendo o contato direto com as plantas de tabaco ou com o tabaco seco, em virtude do risco de exposição à nicotina. As empresas também deveriam implementar um eficiente monitoramento interno e de terceiros em relação às políticas de trabalho. “O trabalho na lavoura é mesmo pesado, mas as crianças que trabalham nas fazendas de tabaco ficam tão doentes a ponto de vomitar, são encobertas por pesticidas e não usam roupas de proteção apropriadas,” protestou Wurth. “As empresas de tabaco deveriam retirar as crianças do trabalho perigoso nas lavouras de tabaco e apoiar as iniciativas para proporcionar a elas oportunidades educacionais e vocacionais alternativas”. 

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